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CAPÍTULO 1 Data Science, Teoria Ator-Rede e Novos Métodos de Análise de Redes

1.4 A opção pela cartografia das controvérsias

A TAR, Teoria Ator-Rede, em sua origem, tendo como um dos criadores principais, o sociólogo Bruno Latour, se aplica para redes sociais reais, i.e., redes sociais do dia-a-dia, as conexões offlines. O desafio empregado nesta dissertação é de trazê-la ao mundo virtual, às redes sociais online e à uma sociedade que se encontra caminhando rumo uma rotina totalmente infiltrada na internet, em que as pessoas estão conectadas 24 horas por dia. Ou seja, utilizar da riqueza dos dados relacionais digitais para produzir análises de fenômenos sociais.

O professor e pesquisador André Lemos utiliza-se desse desafio ao discutir sobre o campo chamado de “Internet das coisas” utilizando a aplicação da TAR. Esse campo agrega questões técnicas e sociais sobre como a conexão entre os objetos e como essas conexões, de não-humanos, se tornam capazes de interagir e de se comunicar através de dados, podendo até influenciar e gerenciar eventos do mundo real/físico. (Lemos, 2013) “A TAR buscar identificar as mediações que se estabelecem na associação entre atores humanos e não-humanos. Para a TAR, o social é o que resulta dessas associações.” (idem, p. 20) Porém, o desafio, aqui inserido, se baseia nas redes sociais virtuais e os processos inserido nelas. Assim, a Cartografia das controvérsias se mostrou como uma solução para se aplicar o TAR nos estudos em redes sociais. A Cartografia das Controvérsias, e por consequência, a TAR, enfatiza a ideia de que os atores, humanos e não humanos, estão constantemente ligados a uma rede social de elementos - materiais e imateriais. Isto é, as redes são compostas não apenas por pessoas, mas também por máquinas, animais, textos, dinheiro, arquiteturas – enfim quaisquer materiais. Ela é uma técnica inspirada nos princípios fundamentais da TAR e pode trabalhar com as características das redes sociais virtuais. A técnica tem o foco nos rastros digitais deixados pelas ações feitas nas redes e nas análises da conectividade presente nas mesmas. Assim, essas cartografias, ao se localizar as controvérsias, exploram-nas e as representa de diversas maneiras, por exemplo, visualizações e redes complexas. As controvérsias, segundo Tommaso Venturini (2010), são um debate a respeito de uma técnica ou fato científico que ainda não foi determinado; é se confrontar com formas de conhecimento que ainda estão instáveis, sobre as quais não existe um guia claro. O

autor justifica o porquê focar em controvérsias, em vez de fatos científicos estabelecidos, afirmando que o conhecimento técnico e científico é sempre apresentado em sua forma final, sem sequer oferecer clareza sobre como sua certeza foi alcançada. A ideia é que se destitua ao máximo das certezas por meio do confronto direto com uma situação de conflito.

Através da técnica de Cartografia das Controvérsias e dos conceitos empregados na fundamentação teórica da pesquisa, a metodologia é formalizada e aplicada no estudo de caso apresentado como controvérsia. Na proposta de pesquisa empírica dessa dissertação, essas controvérsias formam e são formadas pelos conflitos encontrados nas interações realizadas nas redes sociais. A grande controvérsia estudada é a Copa do Mundo de Futebol FIFATM, realizada no ano de 2014 no Brasil.

A escolha dessa controvérsia se baseia na alarmante importância que os processos para a realização da Copa tiveram nos protestos que aglutinavam a multidão, tanto nas ruas quanto nas redes, e reivindicavam pelos seus direitos, enquanto os governos consumiam dinheiro público para as demandas necessárias para se instalar a copa no Brasil. Os protestos ganharam força e tiveram seus primeiros levantes logo depois das grandes manifestações de junho e julho que ocorreram no Brasil, quando um conjunto heterogêneo de demandas foi levado às ruas pela multidão que reivindicava por melhorias principalmente nos serviços públicos.

Tal escolha de controvérsia foi feita, e colocada em processo de análise empírico, embasada nas cinco características expostas por Venturini (2010): (1) Controvérsias envolvem diversos tipos de atores: As controvérsias em relação a Copa se fez de um emaranhado de interações entre diversos tipos de atores, desde ativistas, jogadores, jornalistas, blogueiros, políticos, agentes da FIFATM, etc.; (2) Controvérsias demonstram o social em sua forma mais dinâmica: devido à grande interação entre os actantes formada nas redes sociais, dando lugar a relações entre atores que antes não se conectariam por outros motivos, como, por exemplo, o jogador Ronaldo opinando sobre a construção de hospitais; (3) Controvérsias são “resistentes à redução”: Não um reducionismo a um problema e uma solução, eles são diversos. Entre os protestos diversas reinvindicações foram expostas, se revelando diversos problemas e pedidos de diversas soluções; (4) Controvérsias são debatidas: Entre as interações do twitter houveram diversas conversações, compartilhamentos, opiniões publicadas; e a última (5), Controvérsias são conflitos: Na rede formada, diversos conflitos de interesse e opinião foram encontrados. Um bom exemplo foram as hashtags culminadas, como #naovaitercopa X #vaitercopa.

A Cartografia das controvérsias se mostra com uma boa escolha de técnica nos processos metodológicos e empíricos, devido às diversas características encontradas e correlacionadas com o tema discutido. Pode-se perceber o enquadramento das características da técnica no tema/controvérsia abordado. A heterogeneidade dos protestos e o terreno de disputa que se criou nas redes sociais, formalizaram a Copa do Mundo como uma interessante controvérsia para ser cartografada e analisada. O locus cibercultural escolhido para essa análise foi o Twitter, ferramenta de microblogging, capaz de compartilhar mensagens de até 140 caracteres, além de mídias como fotos, vídeos e gifs. Esse terreno de disputa se estende às ruas, onde os protestos se fazem vivos e em tal terreno, a multidão expõe suas perspectivas e subjetividades fazendo um movimento de ida e vinda entre as redes e as ruas.

1.5 Cartografia das Controvérsias: uma revisão sobre conceitos e métodos