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A origem e expansão territorial da cadeia da soja

CAPÍTULO 1 A DINÂMICA GEOECONÔMICA DA CADEIA PRODUTIVA DE SOJA NO MUNDO E NO BRASIL

1.2 A DIMENSÃO GEOGRÁFICA DA CADEIA PRODUTIVA DA SOJA NO BRASIL

1.2.1 A origem e expansão territorial da cadeia da soja

Originária do oriente, a soja, era consumida como alimento a cerca de cinco mil anos. Depois se espalhou para outras partes do mundo. A China era a maior produtora de soja há 70 anos, hoje aparece apenas como quarta colocada. Em 1949, após a Revolução promovida por Mao Tse-Tung, a China saiu do mercado mundial de soja, e os Estados Unidos ocupou o lugar de maior exportador, em que continua hoje.

Campos (2010) assinala que a cultura de soja foi introduzida no Brasil em 1882, na Bahia pelo pesquisador Gustavo Dutra, que trouxe dos Estados Unidos algumas sementes. Em 1892, o Instituto Agronômico de Campinas/SP, realizou experimentos de adaptação dessas sementes. A melhor adaptação ocorreu no Rio Grande do Sul, tendo iniciado o cultivo nesse estado a partir de 1914. Em 1908 foram realizados plantios de soja no estado de São Paulo, com a finalidade de utilizar o grão para alimentação. Nas estatísticas mundiais, o Brasil começou a aparecer como produtor de soja em 1949, com a produção de 25.000 toneladas. Em 1940, a soja passa a ter importância econômica no Rio Grande do Sul; nas duas décadas posteriores, a soja avança para Santa Catarina e Paraná, em 1969, três estados são responsáveis por produzir 98% de toda a produção brasileira. Nessa época, a área plantada era menos de sete milhões de hectares (CONAB, 2014a). No Box 1, segundo Dall´Agnol (2008), a melhor adaptação ao Sul do Brasil ocorreu:

Box 1 - Adaptação da soja ao Sul do Brasil

Semelhança do ecossistema do Sul do Brasil com o sul dos Estados Unidos, o que favoreceu a transferência de tecnologias de produção e de cultivares; Calagem e fertilização dos solos ácidos e inférteis no Rio Grande do Sul, em meados da década de 1960;

Incentivos fiscais disponibilizados aos agricultores de trigo, que utiliza no verão as mesmas áreas, mão de obra e máquinas agrícolas;

Substituição da gordura animal por óleo vegetal, em especial, o oriundo da soja;

Criação de agroindústria para processar a soja; estabelecimento de um importante parque industrial de desenvolvimento e produção de máquinas e implementos, assim como de produção de insumos nos anos de 1970 e 1980;

Melhoria no sistema viário para escoamento da produção, portos e comunicações, facilitando as exportações;

Aparecimento de um sistema de cooperativa (dinâmica e eficiente) que apoiou a produção, industrialização e comercialização da soja;

Facilidade de mecanização total da cultura;

Instalação de vários órgãos de pesquisa públicos em esfera estadual e federal, inclusive a Embrapa/Soja unidade Londrina etc.

Fonte: adaptado de Dall´Agnol (2008).

A partir do sul do Brasil, a cadeia produtiva da soja ganha importância, ultrapassando os limites das porteiras das fazendas para influir nas discussões sobre pesquisa tecnológica, cadeias produtivas, competitividade e até infraestrutura. Percebe-se a expansão das fronteiras estaduais dos estados sulinos para o ácido cerrado do Centro Oeste, a partir dos anos 1980 (Mato Grosso) e, sobretudo, na década de 1990, para áreas do sertão nordestino (Bahia e Maranhão) e para planície da amazônica (Roraima, Rondônia). Em 1990, a área plantada no país passava de 11,5 milhões de hectares.

As características do centro-norte do país (Box 2) contribuem para uma rápida expansão e uma crescente incorporação do cerrado no mercado nacional e internacional, o que o torna uma fronteira agrícola competitiva. Além das questões naturais, a soja avança no centro-oeste e no nordeste por combinações econômicas e políticas, segundo Dall'Agnol (2008) e Campos (2010), as principais são:

Box 2 – Combinações econômicas, políticas e naturais para expansão da soja

Incentivos fiscais para a abertura de novas áreas para a produção agrícola, no caso da expansão da soja no cerrado, ela está relacionada com os incentivos do PRODECER (Programa Nipo-Brasileiro de Cooperação para o Desenvolvimento do Cerrado);

Estabelecimento firmas produtoras e processadoras de grãos e de carne na região Centro-Oeste e Nordeste;

Baixo valor da terra, se comparados aos preços então praticados na região Sul durante a década de 1970 e 1980;

Topografia muito favorável à mecanização, o que propicia a economia de mão de obra;

Boas condições pedológicas com a descoberta da técnica de calagem, que consiste na adição de calcário para reduzir a acidez do solo do cerrado, tornando-o produtivo;

Bom nível econômico e tecnológico dos produtores que ocuparam a região oriunda do Sul, onde cultivaram soja com sucesso;

Regime pluviométrico altamente favorável ao cultivo de verão;

O desenvolvimento de um bem sucedido conjunto de tecnologias para produção de soja nas áreas tropicais, transformando o bioma do Cerrado, mais de 200 milhões de hectares improdutivos, em áreas com potencial para o cultivo da soja.

Fonte: adaptado de Dall'Agnol (2008) e Campos (2010).

Essas combinações foram fundamentais para a expansão geográfica da área plantada da soja no Brasil, proporcionando uma evolução exponencial. Com referência à Tabela 3, no ano safra de 1983/1984 eram cultivados no Brasil cerca de 9,1 milhões de hectares, o que em 10 anos passou para 11,5 milhões. No entanto, no ano safra de 2003/2004, a área cultivada foi de 21,3 milhões de hectares. Em 2013/2014, essa área chegou a 30,2 milhões de hectares (ver figura 2 e 3). Um avanço, em 10 anos, de quase nove milhões de hectares em números absolutos. Isso representa 53% da área da área cultivada de grãos no país. E o crescimento anual foi sistemático no período, chegando 4,5% ao ano.

Figura 2 – Evolução da área plantada 1980 e 1990

Figura 3 – evolução da área plantada 2000 e 2014.

Tabela 3 - Evolução da área plantada da soja (em mil ha) Região UF Safra 1983/84 1993/94 2003/04 2013/14 Norte - 28,7 352,4 1.134,4 RO - 4,5 41b,0 167,7 PA - - 15,5 172,2 TO - 15,5 148,1 549,5 Nordeste 28,0 503,6 1.323,3 2.651,8 MA 42,7 274,0 686,0 PI - - 116,3 546,4 BA 5,0 380,0 850,4 1.281,9 Centro-Oeste 2.141,9 4.244,3 9.659,3 13.878,1 MT 317,0 1.713,4 4.419,6 7.818,2 MS 940,0 1.066,5 1.415,1 2.017,0 GO 370,0 984,0 2.170,5 2.888,0 Sudeste 790,0 1.175,1 1.826,9 1.996,2 MG 258,0 551,8 873,6 1.121,2 SP 470,0 532,5 615,3 637,0 Sul 6.203,0 5.550,0 8.213,9 10.445,8 PR 2.050,0 2.000,0 3.637,6 4.752,8 SC 415,0 281,4 255,8 512,5 RS 3.567,0 3.100,0 3.593,7 4.618,6 Brasil 9.162,9 11.501,7 21.375,8 30.206,3

Fonte: Conab (2014a).

Com isso, segundo o relatório Projeções do Agronegócio (BRASIL, 2014b), de 2013/2014 a 2023/2024, a área total da cultura no Brasil aumentará 34,1%, chegando a 40,4 milhões de hectares em 2024, conforme pode-se ver nos dados do Gráfico 1.

Gráfico 1 - Projeção da área plantada de soja - 2013/2014 a 2023/2024 (em mil ha)

Fonte: Brasil (2014b).

A soja deve expandir-se devido a algumas combinações: expansão de fronteira em regiões onde ainda há terras disponíveis e terras baratas; ocupação de terras de pastagens naturais; e pela substituição de lavouras onde não há terras disponíveis para serem incorporadas. Esse avanço deverá ocorrer, principalmente, em terras de pastagens naturais, no estado do Mato Grosso, e deverá ter o maior aumento no patamar de 41,6%, saindo de 7,8 milhões de hectares para 12,2 milhões, mesmo com os preços de terras nesse estado, que são mais que o duas vezes que os preços de terras nos estados da região do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia)9. O Paraná, segundo lugar em área, aumentará sua área de soja em 30%, saindo de 4,7 milhões para 6,5 milhões de hectares, tomando espaço de outras culturas. O Rio Grande do Sul aumentaria sua área plantada em 13%, passando dos atuais 4,6 para 5,6 milhões de hectares. Nesse estado onde, tradicionalmente, em sua parte sul a agricultura é baseada no cultivo do

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A região do Matopiba é uma delimitação geográfica proposta pelo Grupo de Inteligência Territorial Estratégica - GITE da Embrapa, que abrange 10 mesorregiões e 31 microrregiões homogêneas do IBGE, reunindo um total de 337 municípios nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Para uma caracterização e uma delimitação precisa dessa área ver Miranda et al. (2014).

arroz e na pecuária bovina, nos últimos anos houve significativo avanço em área de plantio de soja, que hoje representa 20% da área plantada no estado. Em Cachoeira do Sul, o arroz caiu de 45 mil/ha para 35 mil, e a área plantada de soja aumentou de 38 mil para 150 mil/ha.

A área de soja do Matopiba terá crescimento de área plantada em 16,3%, passando dos atuais 7,2 milhões de hectares para 8,4 milhões de hectares. Em municípios como Balsas (MA), Campos Lindos (TO), Formosa do Rio Preto (BA) e Uruçuí (PI) o avanço em área será na média de 45% (ver a Gráfico 2). As áreas que vêm sendo ocupadas nesses estados para cultivo de soja têm algumas características essenciais para a agricultura moderna: são planas, extensas e altas; solos potencialmente produtivos e clima propício, com dias longos e com elevada intensidade de sol; forte disponibilidade de água. A limitação maior, no entanto, são as precárias condições de transporte terrestre. Gráfico 2 - Projeção da área plantada de soja dos municípios do Matopiba - 2013/2014 a 2023/2024 (em mil ha)

Fonte: Brasil (2014b).