O grupo das classes de um corpo de n´umeros, desempenha papel central na Teoria dos Corpos de Classes, atrav´es das suas liga¸c˜oes com o grupo das unidades, extens˜oes n˜ao ramificadas e outros t´opicos da Teoria dos N´umeros. A determina¸c˜ao da estrutura do grupo das classes H(F ) de um corpo de n´umeros F pode ser uma grande tarefa nesse que ´e um dos problemas importantes na Teoria dos N´umeros Computacional.
A p-parte, ou o subgrupo p-Sylow, de H(F ) ´e importante por exemplo na Teoria de Iwasawa, curvas el´ıticas e tamb´em por muito tempo foi de grande interˆesse para o ´Ultimo Teorema de Fermat, visto o famoso crit´erio de Kummer que diz: se p ∤|H(Q(ζp))| ent˜ao
xp+ yp = zp n˜ao tem solu¸c˜ao inteira n˜ao trivial, conforme (WASHINGTON, Teorema 1.1,
p.1).
Nesta Se¸c˜ao focaremos o grupo das classes H(L) de uma p-EG. Podemos es- crever, H(L) = H(L)p⊕H(L)6=p, onde H(L)p ´e a p-parte de H(L) e H(L)6=p a parte prima
com p de H(L). A cardinalidade de H(L), isto ´e, o n´umero de classes de L, ´e denotado por h(L). Aqui nos propomos a apresentar um m´etodo aritm´etico para caracterizar H(L)p.
Conhecemos por (LEOPOLDT) que p ∤ h(L), se e somente se, exatamente um n´umero primo se ramifica em L. Conner e Hurrelbrink (CONNER and HURRELBRINK) provaram que se p || h(L), ent˜ao exatamente dois n´umeros primos se ramificam em L. Reciprocamente, por (CONNER and HURRELBRINK, Teorema 2.69) se exatamente dois primos p1 e p2 se ramificam e p6= p1, p2 ent˜ao p|| H(L), se e somente se, ou p1 n˜ao ´e uma
p-´esima potˆencia m´odulo p2 ou p2 n˜ao ´e uma p-´esima potˆencia m´odulo p1. Recordamos
que um n´umero inteiro a ´e um p-´esimo res´ıdo m´odulo um n´umero primo q, se a n˜ao ´e divis´ıvel por q e a congruˆencia xp ≡ a (mod q) possui solu¸c˜ao (GAUSS ). Pelo crit´erio
de Euler, (USPENSKY and HEASLET) a ´e um p-´esimo res´ıduo m´odulo q, se e somente se, a(q−1)p ≡ 1 (mod q). Denotamos (a|q)
p = 1, se a ´e um p-´esimo res´ıduo m´odulo q, caso
contr´ario denotamos (a|q)p =−1. Se a ´e um ideal fracion´ario de OL, [a] denota a classe
de equivalˆencia de a em OL. Recordamos que L ´e uma p-EG de condutor n = p1. . . ps,
onde p1, . . . , ps s˜ao primos distintos, pi ≡ 1 (mod p), i = 1, . . . , s.
Observamos que, com o conceito de p-´esimo res´ıduo m´odulo q, a Proposi¸c˜ao 4.2 da Se¸c˜ao 4.2 pode ser reescrita da seguinte forma:
Sejam L uma p-EG de condutor n = p1 · . . . · ps, onde p1, . . . , ps s˜ao primos
distintos e pi o ideal primo de OL tal que piOL = ppi, i ∈ {1, . . . , s}. Se pi ´e principal,
ent˜ao pi ´e um p-´esimo res´ıduo m´odulo pj, para j ∈ {1, . . . , s}, j 6= i.
Corol´ario 4.5 Com a nota¸c˜ao acima, se (pi|pj)p =−1 para i, j ∈ {1, . . . , s} com i 6= j,
ent˜ao h[pi]i ∼= (Z/pZ) e consequentemente, H(L)p ´e n˜ao trivial.
Exemplo 4.7 Sejam p = 3, p1 = 7, p2 = 13, e L uma p-EG de condutor n = 91.
Por (CONNER and HURRELBRINK, Teorema 2.69) citado no in´ıcio desta Se¸c˜ao, como
3||h(L) ent˜ao |H(L)3| = 3. Do Corol´ario 4.5, p7 ´e n˜ao principal pois (7|13)3 = −1.
Assim, H(L)3 =h[p7]i.
A Tabela 1 lista H(L)3, onde L ´e uma p-EG de condutor n = p1p2, p1, p2 ∈
n p1 p2 (p1|p2)3 (p2|p1)3 H(L)3 91 7 13 −1 1 h[p7]i 133 7 19 1 −1 h[p19]i 217 7 31 −1 −1 h[p7]i 259 7 37 −1 −1 h[p7]i 301 7 43 −1 1 h[p7]i 247 13 19 −1 −1 h[p13]i 403 13 31 −1 1 h[p13]i 481 13 37 −1 −1 h[p13]i 559 13 43 −1 −1 h[p13]i 589 19 31 −1 1 h[p19]i 703 19 37 −1 1 h[p19]i 817 19 43 −1 −1 h[p19]i 1147 31 37 1 −1 h[p37]i 1333 31 43 −1 −1 h[p31]i 1591 37 43 −1 1 h[p37]i
Tabela 1: H(L)p Para certos corpos c´ubicos de condutor p1p2
Exemplo 4.8 Sejam p = 3, p1 = 7, p2 = 13, p3 = 19, n = p1p2p3 = 1729 e L uma p-EG
de condutor n. Como (7|13)3 = (13|19)3 = (19|7)3 =−1, ent˜ao p7, p13 e p19, s˜ao todos
n˜ao principais. Assim 3 divide h(L).
No Exemplo 4.8, se n´os pudermos provar que h[p7]i 6= h[p13]i, poderemos con-
cluir que H(L)3 tem um subgrupo isomorfo a (Z/3Z)2 e ent˜ao que h(L) ´e um m´ultiplo de
32. Isto ser´a dado depois da prova do Corol´ario 4.6.
Teorema 4.7 (WAERDEN, p.184) Sejam I um ideal fracion´ario principal de OL e
q1, . . . , qr ideais primos de OL. Ent˜ao I pode ser escrito como o quociente
(α)
(β) de dois
ideais inteiros principais, tais que nenhum dos ideais qi, i = 1, . . . , r divide (α) e divide
(β).
Corol´ario 4.6 Sejam a = pa1
i1, . . . , p au iu e b = p b1 j1, . . . , p bv jv, onde 1≤ r < i1 < . . . < iu ≤ s e 1≤ r < j1 < . . . < jv ≤ s. Se [a] = [b] ent˜ao Qu ℓ=1p aℓ iℓ Qv ℓ=1p bℓ jℓ pk ! p = 1 for k = 1, . . . , r.
Demonstra¸c˜ao: Considere o ideal I = Qu
ℓ=1p aℓ iℓ Qv ℓ=1p bℓ jℓ −1
. Como [a] = [b] ent˜ao I ´e principal e I = ((a)/(b)), onde a, b ∈ OL e b 6= 0. Pelo Teorema 4.7 podemos
aplicando a norma a ambos os lados de u Y ℓ=1 paℓ iℓ = ((a)/(b))· v Y ℓ=1 pbℓ jℓ, obtemos u Y ℓ=1 paℓ iℓ = NL/Q(a/b)· v Y ℓ=1 pbℓ jℓ,
Para cada 1 ≤ k ≤ r, existe ck ∈ {1, . . . , pk − 1} tal que a/b ≡ ck (mod pk) e assim
θj(a/b)≡ c
k (mod pk) para j = 1, . . . , p− 1. Como NL/Q(a/b) = NL/Q(a/b), segue que
NL/Q(a/b) = p−1 Y j=1 θj(a/b)≡ cpk (mod p), isto ´e, u Y ℓ=1 paℓ iℓ ≡ c p k· v Y ℓ=1 pbℓ jℓ (mod pk). Com isso, o corol´ario est´a provado.
Exemplo 4.9 (continua¸c˜ao do Exemplo 4.8) Vimos no Exemplo 4.8 que p7, p13 e p19,
n˜ao s˜ao principais, ent˜ao (i) 13
7
19
3 = (10| 19)3 = −1, assim pelo Corol´ario 4.6, conclu´ımos que
[p7]6= [p13]. (ii) 132 7 19
3 = (16| 19)3 = −1, assim pelo Corol´ario 4.6, conclu´ımos que
[p7]6= [p13]2.
Usando (i) e (ii) conclu´ımos que 32 | h(L). Ademais, h[p
7]i × h[p13]i ´e um
subgrupo de H(L)p isomorfo `a (Z/3Z)2.
O pr´oximo teorema ´e o principal resultado desta se¸c˜ao. Satisfeitas as hip´oteses, ele nos d´a um m´etodo para determinar subgrupos de H(L)p.
Teorema 4.8 Com a nota¸c˜ao acima, sejam p1, . . . , pr, r≤ s, tais que
(pi|pk)p = 1 e (pk−1|pk)p =−1
para k = 2, . . . , r e i = 1, . . . , k− 2. Ent˜ao
Demonstra¸c˜ao: Usaremos indu¸c˜ao sobre r. O caso r = 2 est´a no Corol´ario 4.5, assim consideraremos agora 2 < r < s. Supondo que
(pi | pk)p = 1 e (pk−1 | pk)p =−1 para k = 2, . . . , r + 1, i = 1, . . . , k− 2
mostraremos que
h[p1], . . . , [pr−1], [pr]i ∼= (Z/pZ)r.
Para justificar esse isomorfismo, basta mostrar que [pr] ∈/ h[p1], . . . , [pr−1]i,
uma vez que pelo Corol´ario 4.5, h[pr]i ∼= (Z/pZ). Supondo, por contradi¸c˜ao,
que [pr] = [p1]e1 · . . . · [pr−1]er−1, para alguma escolha de inteiros e1, . . . , er−1, isto ´e,
[pr] = [pe11 · . . . · p er−1 r−1]. Pelo Corol´ario 4.6, N p e1 1 · . . . · p er−1 r−1 pr ≡ cpr+1 (mod pr+1), isto ´e, r−1 Y i=1 pei i ≡ c p r+1· pk−1 (mod pr+1),
para algum cr+1 ∈ {1, . . . , pr+1 − 1}. Como (pi | pk)3 = 1 para i = 1, . . . , r + 1, essa
´
ultima congruˆencia implica que (pr | pr+1)p = 1, o que ´e uma contradi¸c˜ao. Assim,
[pr] /∈ h[p1], . . . , [pr−1]i, como quer´ıamos.
Exemplo 4.10 Sejam p = 3, p1 = 7, p2 = 13, p3 = 19, p4 = 223, p5 = 373,
n = p1 · . . . · p5 = 143816491 e L uma p-EG de condutor n. Temos o seguinte:
(i) (p1 | p2)3 =−1;
(ii) (p1 | p3)3 = 1, (p2 | p3)3 =−1;
(iii) (p1 | p4)3 = (p2 | p4)3 = 1, (p3 | p4)3 =−1;
(iv) (p1 | p5)3 = (p2 | p5)3 = (p3 | p5)3 = 1, (p4 | p5)3 =−1
Pelo Teorema 4.8, H(L)3 possui um subgrupo gerado por [p7], [p13], [p19] e [p223]. Assim,
h(L) ´e um m´ultiplo de 34.
Exemplo 4.11 Sejam p = 5, p1 = 11, p2 = 31, p3 = 61, p4 = 191, p5 = 541,
n = p1 · . . . · p5 = 2149388131 e L uma p-EG de condutor n. Temos o seguinte:
(i) (p1 | p2)5 =−1;
(iii) (p1 | p4)5 = (p2 | p4)5 = 1, (p3 | p4)5 =−1;
(iv) (p1 | p5)5 = (p2 | p5)5 = (p3 | p5)5 = 1, (p4 | p5)5 =−1
Pelo Teorema 4.8, H(L)5 possui um subgrupo gerado por [p11], [p31], [p61] e [p191]. Assim,
h(L) ´e um m´ultiplo de 54.
Conclu´ımos dizendo que apresentamos nesta Se¸c˜ao, um m´etodo para determi- nar subgrupos da p-parte do grupo das classes de uma p-EG de condutor n = p1· . . . · ps,
pi primo, pi ≡ 1 (mod p), i = 1, . . . , s. Sua efic´acia depende da suposi¸c˜ao de pi ser
um p-´esimo res´ıduo m´odulo pj para j = 1, . . . , i− 2, mas n˜ao ser um p-´esimo res´ıduo
m´odulo pi−1 para i = 2, . . . , r. Apesar desta limita¸c˜ao o m´etodo nos permitiu resolver v´arios casos, que de outra forma, poderia ser computacionalmente trabalhoso. Portanto a t´ecnica aqui apresentada poderia ser aplicada antes desses algor´ıtmos, reduzindo assim seus ‘custos’ operacionais. As limita¸c˜oes da t´ecnica apresentada nos ´e desconhecida e ser´a assunto para futuras pesquisas. Finalmente, no caso em que dois primos se ramificam, nenhum dos quais igual `a p, o (CONNER and HURRELBRINK, Teorema 2.69), ao qual n´os nos referimos no in´ıcio desta Se¸c˜ao, estabelece que p || h(L), contanto que um dos dois, (p1 | p2)p ou (p2 | p1)p, n˜ao seja 1. Nossos exemplos mostraram que quando r ≥ 3,
ou seja, quando trˆes ou mais primos se ramificam, e certas condi¸c˜oes de ‘residualidade’ se verificam, ent˜ao uma potˆencia de p, maior do que 1, divide h(L). Determinar exatamente essa potˆencia ´e um assunto a ser estudado.