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2 HISTÓRIA DO CONCEITO DE ECOSSISTEMA: CONTEXTOS E

2.2 OS DIFERENTES SIGNIFICADOS ATRIBUÍDOS AO CONCEITO DE

2.2.2 A perspectiva determinística para o conceito de ecossistema

Segundo Stone, Dayan e Simberloff (1996), os estudos sobre ecossistema são determinísticos. Para esses autores, o conceito de ecossistema explica a distribuição das espécies em uma comunidade biológica pelas condições físico-químicas e relações complexas em que estão inseridas, independentemente umas das outras. Eles discordam da ideia de autorregulação do ecossistema, bem como da ideia de estado de equilíbrio dinâmico como meta inerente aos sistemas ecológicos, tal como o conceito de clímax de Clements. Em síntese, a complexidade das relações entre fatores bióticos e abióticos, que tendem ao equilíbrio, é um modelo que determina a comunidade e não o inverso.

Para Tansley (1935), o ecossistema é visto como um objeto físico complexo que, como um paradigma científico, pauta-se em uma perspectiva filosófica holística que supera dicotomias historicamente presentes nos estudos de ambientes aquáticos e terrestres. O conceito trouxe ainda a integração entre diferentes funções, as quais configuram, juntas, o ambiente, funcionando como uma grande máquina. Para Stone, Dayan e Simberloff (1996), essa metáfora evidencia que o sistema determina a distribuição de suas partes, em uma perspectiva determinística dos processos ecológicos.

Em discussões e estudos de diferentes ecólogos, percebe-se a perspectiva determinística presente nas proposições e metodologias de estudo. Apesar de não ser nosso intuito classificar um autor em uma única perspectiva aqui apresentada, as ideias debatidas em determinados momentos históricos sobre o conceito evidenciam a perspectiva determinística como apoio aos argumentos desenvolvidos por esses pesquisadores.

Na década de 1940, a perspectiva determinística influenciou os estudos no campo da Limnologia. George Evelyn Hutchinson (1903-1991) imprimiu as bases teóricas para os estudos sobre ecossistemas, utilizando modelos matemáticos e trabalhos empíricos em lagos, o que configurou sua grande contribuição não só ao aporte teórico para o desenvolvimento do conceito de ecossistema, mas também ao campo da Limnologia. Essas pesquisas consistiam em coletas de dados físico-químico e orgânicos sobre o ecossistema, bem como dados relativos à distribuição das espécies nesse sistema. Perspectiva que vai ao encontro das ideias determinísticas.

Hutchinson orientou o trabalho de pós-doutoramento de Raymond Lindeman, o que culminou com o artigo mais significativo e que representou um salto no desenvolvimento do conceito de ecossistema na comunidade científica. Lindeman, revendo os capítulos de sua tese, escreveu um artigo cujo título é "The trophic-dynamic aspect of ecology" em que postula a ideia sobre os níveis tróficos e o fluxo de energia como determinantes na configuração das comunidades. Assim, a cada organismo poderia ser atribuído uma quantidade de energia e as relações tróficas davam a dinâmica de fluxo entre os elementos vivos do ecossistema.

Lindeman (1942) quantificou as taxas de transferências de energia por meio de modelos matemáticos e equações, o que promoveu significativas mudanças na forma com que outros ecologistas passaram a coletar e analisar dados, utilizando a matemática como ferramenta para compreender processos ecológicos.

Além disso, outra contribuição desse trabalho é que ele sintetiza as ideias de Clements, Elton e Hutchinson, sendo o primeiro pesquisador a operacionalizar o conceito de ecossistema em uma pesquisa empírica. Lembrando que Tansley, apesar de cunhar o conceito ecossistema, não fez trabalhos empíricos, mas sim uma discussão teórica sobre o conceito (PETRY et al., 2010).

Já autores como Borman e Likens afirmavam que o ecossistema é indeterminístico, uma vez que apresenta comportamento, ao longo do tempo e do espaço, probabilístico e estocático. Defendem a importância das relações de competição

interespecíficas na composição de uma comunidade biológica. Esses autores fizeram estudos em uma bacia hidrográfica trazendo discussões sobre a influência da comunidade biótica nos aspectos físico-químicos do ambiente.

Lindeman defendia que a sucessão ecológica em lagos era dependente das taxas das relações biológicas dos organismos, ou seja, deveria dar enfoque às interações dos organismos e à taxa energética disposta no sistema. Assim, passou a estudar as relações tróficas em um pequeno lago chamado Cedar Creek Bog, em Minnesota, onde coletou incansavelmente, com auxílio de sua esposa, diversos dados da biota bentônica e planctônica e desenvolveu seus pressupostos sobre a dinâmica trófica desse ecossistema (PETRY et al., 2010).

A maior contribuição de Lindeman dá-se pelo fato de que os elementos bióticos e abióticos não poderiam mais ser encarados como elementos estáticos a serem classificados como parte permanente de um sistema biológico. Para esse autor, o ciclo de nutrientes entre os diferentes níveis tróficos configura-se de maneira dinâmica em um fluxo energético contínuo. Dessa forma, os elementos inorgânicos são assimilados pelos vegetais que compõem a matéria orgânica (durante o processo fotossintético) que será assimilada em toda cadeia trófica de relações a partir do qual os organismos se configuram em uma comunidade. A discriminação entre fatores vivos e não vivos com parte do ambiente era arbitrária, pois muitos dos elementos inorgânicos escoados para o fundo do lago eram rapidamente reincorporados como nutrientes (PETRY et al., 2010).

Esse debate entre a perspectiva determinística e indeterminística tornam a compreensão, bem como os estudos, sobre ecossistemas cada vez mais complexos e de difícil delimitação. É necessário estudar as partes isoladamente, como uma decomposição do todo e, então, retornar à complexidade do sistema, considerando suas propriedades peculiares. Dessa forma, ao longo do tempo houve uma mudança na forma de relacionar ecossistema e a biota associada. Primeiramente, o ecossistema era a causa das características das comunidades biológicas; posteriormente, pressupôs-se que a ação dos organismos é que criavam condições para o estabelecimento das propriedades de um ecossistema, ou seja, nesse caso o ecossistema estabelece-se com efeito da dinâmica da biodiversidade local (NUNES-NETO, CARMO; EL-HANNI, 2013).

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