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A Problemática da Adoção Internacional e o Tráfico de Crianças

3. ADOÇÃO INTERNACIONAL E O TRAFICO DE MENORES

3.1. A Problemática da Adoção Internacional e o Tráfico de Crianças

A adoção internacional, entendida como processo legal onde a conduta ética e o aspecto social devem desempenhar papel principal, é um processo legal envolto de riscos porquanto, interesses particulares - e não mais a preponderância do interesse do menor - muitas vezes, convertem-na em mecanismo de lucro.

A adoção internacional, ou seja, a procura de crianças brasileiras por estrangeiros vem crescendo muito nos últimos anos. Daí surgirem, ao lado dos interessados diretos, várias intermediações, quer individuais quer até de pessoas jurídicas, através de agências de intermediação; como, especialmente por parte dos adotantes, há os bens intencionados nos que fazem a intermediação; em regra, muitos não só são mal intencionados (visando lucro e vantagens pessoais com a adoção), mas até formando verdadeiras quadrilhas para o cometimento de crimes – já que os lucros são grandes e em moeda estrangeira – como seqüestro de recém-nascidos na maioria das vezes, nas próprias maternidades, ou, então, em locais públicos; outros crimes ainda não são praticados como estelionatos enganando as mães com possíveis internações ou, ainda, quando adoções escondendo que as crianças são destinadas ao exterior;

falsificação de documentos, especialmente do menor (SZNICK, 1993, p. 443-444)

Essa matéria é composta, no contexto brasileiro, de questões ainda mais sensíveis; visto que ainda se nota o elevado grau de pobreza da população, sem condições de subsistência e crianças, pessoas com princípios prioritariamente protegidos, muito vulneráveis a demanda por adoção. Assim, os contextos sociais contribuem, inegavelmente, para esse tipo de conduta de interesses criminosos.

Nesse aspecto, Damásio Evangelista de Jesus (2003, p.52) afirma que o perfil político, econômico e social brasileiro torna o mesmo em “uma fonte do tráfico internacional de pessoas”. Pais acabam por comerciantes de seus próprios filhos; adotantes de má-fé e servidores públicos, encarregados de agir sob a probidade, moralidade e proteção dos interesses públicos – indubitavelmente, a criança e adolescentes – terminam como criminosos; fraudadores do sistema que deveriam resguardar.

No caso das crianças, muitas são forçadas, vendidas à escravidão sexual por famílias pobres, ou até raptadas para o tráfico e exploração. A questão de gênero tem um forte componente nesse crime. Mas não é o único. Como um todo, questões sociais, econômicas, falta de oportunidades também são ingredientes do tráfico internacional de pessoas, um crime que põe em risco os direitos humanos fundamentais. (GUAGLIA, 2008, p. 38)

Na década de 90, a cada dois mil processos de adoção internacional, 1.900 eram processos fraudulentos (FONSECA, 2006, p.4). Essas fraudes se davam através de motivações para adotar inexistentes, falsificação de documentos, funcionários públicos que não se atentavam ao princípio da excepcionalidade, ao cadastro de estrangeiros junto aos CEJAI’s e outros requisitos essenciais para o deferimento da adoção por estrangeiros. São inúmeros os casos de crianças retiradas de seus lares e entregues a adoções internacionais sem o devido processo legal.

Processos no Tribunal de Justiça e investigação da PF mostram como juiz e promotora têm transformado Jundiaí em pólo exportador de crianças. Na França, meninas brasileiras são estupradas por pai adotivo. Terça-feira 17, no subsolo do fórum de Jundiaí, a 58 quilômetros de São

Paulo, o juiz Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, em uma discreta cerimônia, promoveu a adoção internacional de um garoto. O evento pode muito bem ter sido apenas a celebração do final de um longo processo. Em Jundiaí, porém, solenidades como essa adquirem ares nebulosos. Documentos que estão no Tribunal de Justiça de São Paulo mostram que, sob o manto da adoção internacional, a cidade se transformou em pólo exportador de crianças, principalmente para a Europa. Uma realidade que coloca tanto o juiz como a promotora Inês Marowski Bicudo na mira da Polícia Federal e divide as opiniões dos moradores da cidade.Os registros da Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional (CEJAI) indicam que de 1992 até maio deste ano, sob a rubrica de Beethoven, foram adotadas 484 crianças em Jundiaí. Desse total, 204 foram para outros países. É um número elevadíssimo. Campinas, que tem o dobro da população de Jundiaí, no mesmo período promoveu apenas 40 adoções internacionais. Analisado sob os preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o número de crianças que saíram de Jundiaí para o Exterior passa a ser bastante estranho. O ECA define que as adoções devem seguir uma rígida linha de prioridades. Para permitir a adoção o juiz deve ter todas as provas de que não existem condições de a criança ser mantida na companhia dos pais biológicos. Nesse caso, o magistrado deve tentar a adoção por alguém da própria família, em seguida por alguém da cidade e só em último caso a adoção internacional. Na segunda-feira 16, tanto o juiz Beethoven como a promotora Inês se recusaram a receber os repórteres de ISTOÉ. O juiz, no entanto, em outras ocasiões já manifestou que o elevado número de adoções internacionais em Jundiaí se deve à rapidez com que desempenha suas funções. De fato, Beethoven costuma tirar o poder de mães pobres sobre seus filhos na mesma velocidade com que homologa um divórcio amigável. O problema é que seis processos que tramitam no Tribunal de Justiça, aos quais ISTOÉ teve acesso, indicam que a pressa de Beethoven não raramente ignora os preceitos do ECA. Por isso, as corregedorias da Justiça e do Ministério Público, a comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa, a Procuradoria do Estado e o Ministério da Justiça estão empenhados em avaliar o que está ocorrendo. “Há uma indústria de exportação de crianças”, diz o advogado Marco Antônio Colagrossi, membro do Conselho Municipal da Criança e do Adolescente de Jundiaí. “Eles tomam as crianças de mães pobres, fazem um arremedo de processo para tirar o pátrio poder e encaminham a garotada para a Europa.” (FLITPARALISANTE, 2009, p.1)

O que mais impressiona, contudo, é que além da pobreza evidente das famílias que vendem ou entregam seus filhos para essa adoção fraudulenta, existe, quase sempre, um funcionário público que facilita, ou ainda, promove o tráfico de crianças através do instituto da adoção internacional. Conforme notícia relatada por Mário Grangeia, da Assessoria de Comunicação Social Procuradoria da República, no Rio de Janeiro, do dia seis de setembro de 2006, “essa problemática torna-se ainda mais séria quando os

próprios funcionários públicos, conhecedores das normas atuam como colaboradores nessa conduta criminosa”.

DENUNCIADOS SÃO ACUSADOS DE ENVIAR MENORES DE IDADE AO EXTERIOR PARA OBTER LUCRO. O Ministério Público Federal no Rio de Janeiro ofereceu denúncia à Justiça contra duas pessoas envolvidas em tráfico internacional de crianças. Os denunciados Anderson Alves da Silva e Maria Fernanda Travalloni y Bongianni vão responder por infringir o Estatuto da Criança e do Adolescente, enviando menor de idade ao exterior para obter lucro. A pena prevista para o crime é de reclusão de quatro a seis anos e multa. A denúncia, feita pelos procuradores da República Marcus Vinícius de Viveiros Dias e Neide Cardoso de Oliveira, foi recebida na 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, onde agora tramita a ação penal. Anderson e Maria Fernanda, que é advogada, foram remunerados por atuar em vários casos de envio de crianças ao exterior. Em apreensão feita pela Polícia Federal na residência de Anderson, foram encontradas várias fotos de crianças e casais estrangeiros. As crianças adotadas foram negociadas por Maria Fernanda e outra advogada ainda não identificada que trabalha com ela. "Eles se uniram para enviar para o exterior crianças cujas mães, hipossuficientes, são seduzidas por Anderson a entregar seus filhos para adoção, sendo certo que os casais interessados são contatados pela segunda denunciada, que faz uso da facilidade que detém para tanto pelo fato de ser estrangeira", afirma o procurador Marcus Vinícius de Viveiros Dias. Motivada por uma denúncia anônima, a investigação apurou que uma gestante sem condições financeiras de educar a criança foi apresentada a Anderson da Silva, que se prontificou a encontrar um casal no exterior para adotar o filho indesejado. Durante a gestação, os denunciados deram abrigo à mãe, sem que sua família soubesse da gravidez. Quando o menino nasceu, ele e a mãe, por iniciativa dos denunciados, viajaram até a Alemanha, onde um casal ficou com a criança. (GRANGEIA, 2006, p.1)

Desta maneira, a colocação de uma criança ou adolescente em uma família substituta estrangeira com finalidade para o trafico internacional, se apóia, muitas vezes, na aparente cegueira com que muitos governos lidam com o problema da migração internacional de um lado, e da exploração de crianças, de outro; conforme suscita Bassiouni (2001, apud CÁPUA, 2007, p. 92).

Contudo, é importante estabelecer uma distinção entre adoção e tráfico de crianças. A adoção é revestida de todas as exigências e formalidades previstas pela lei, especificamente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e Convenções afins; e exige ainda, a intervenção da autoridade judiciária, à qual incumbe apreciar, decidir, controlar e fiscalizar todos os atos para a realização da adoção. Por outro lado, o tráfico de crianças

realiza-se através da fraude às leis, o que impede a intervenção e o controle pela autoridade judiciária. Entretanto, esse processo legal encontra maiores dificuldades na sua esfera internacional vez que não se pode garantir ou ter a efetiva proteção e o acompanhamento, diante do caso concreto, da criança no país estrangeiro.

adoção internacional e tráfico internacional de crianças são, portanto, formas de agir inteiramente distintas e situadas em pólos opostos, embora destinados ambos à colocação de crianças em lares substitutos no exterior. Investigações estão sendo realizadas acerca da ação de grupos de tráfico de crianças, especialmente de uma quadrilha que age na Paraíba, com ramificações em Brasília, Paraná e Fortaleza. O relatório da Polícia Federal apresenta estimativas de que perto de três mil crianças deixam clandestinamente o País por ano, contra outras mil e quinhentas que partem com documentação em ordem. (WELTER, 2011, p.1)

A existência do crime hediondo de tráfico de crianças, independentemente para qual finalidade (prostituição, exploração sexual, venda de órgãos, mão de obra barata, e outras atividades ilícitas), acarretou a perda de credibilidade da adoção internacional. Aquela que deveria ser um meio de garantir a proteção dos direitos da criança e adolescente se tornou um mercado lucrativo de exploração infantil.

3.2.

Convenções Internacionais em combate ao tráfico de menores

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