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Concordância Negativa em Português e em Afrikaans

3. Concordância Negativa em Português e em Afrikaans 1 Dupla Negação vs Concordância Negativa algumas reflexões

3.2. Tratamentos da Concordância Negativa 1 A Proposta de Ladusaw (1996)

3.2.4. A Proposta de Matos (1999/2000/ no prelo)

No quadro do Programa Minimalista, Matos faz mais um tratamento do ponto de vista sintáctico da Concordância Negativa do que propriamente uma explicação do fenómeno do ponto de vista semântico. Contra a criação de mais projecções categoriais, a autora defende que a presença de um marcador negativo frásico não significa a existência de uma projecção funcional própria para albergar esta categoria. Pelo contrário, diz que, naquilo que respeita à negação, as frases não diferem radicalmente de outras projecções sintagmáticas.

De facto, segundo a autora, a negação, seja frásica seja de constituintes, é conseguida desde que os núcleos desses constituintes estejam sob o escopo local dos marcadores negativos não e sem, não pressupondo, portanto, a projecção nem de SPol (segundo Zanuttini 1994/1997), nem de SE (na perspectiva de Laka 1990) nem mesmo de SNeg (em Gonçalves 1994).

Para além disso, e segundo Chomsky (1995), defende que entre em funcionamento uma operação de compor, ("merge" em Inglês), que estará envolvida na construção de sintagmas negados. Segundo a autora, existem dois processos possíveis desta função: compor por selecção ("Set-Merge"), no qual o objecto resultante leva a etiqueta do selector; ou compor por adjunção ("Pair- Merge"), onde o elemento adjunto não altera a categoria do objecto ao qual se adjunge. Em (36 a) opera "Set-Merge", uma vez que a preposição negativa sem selecciona o SDet e projecta um SPrep sem a ajuda da Ana. Nos outros exemplos,em especial (35), aparentemente, estamos perante "Pair-Merge" uma vez que o marcador negativo não não parece seleccionar um tipo específico de sintagma categorial, podendo co-ocorrer com SFlex/ST, SA, SN, etc.

(35) a. Ele falou de um assunto não especialmente agradável para a Maria, b. A não conclusão desse capítulo preocupa a Maria.

(36) a. Ela fez o trabalho sem a ajuda da Ana.

b. Eles partiram para férias sem que se despedissem da Ana.

Assim, na sua perspectiva, não existe nenhuma relação de concordância entre o marcador negativo e o núcleo de uma frase negada .

No que diz respeito à co-ocorrência obrigatória do marcador frásico com palavras negativas pós-verbais, Matos sugere que a generalização feita anteriormente sobre a noção de escopo para se obter negação frásica constitui apenas uma parte de um requisito da negação e reformula-o:

(37) "For a phrase (including IP) to be interpreted as negative, the lexical item that heads it must be in the scope of a negative element."

De acordo com a autora, este requisito de escopo pode ser conseguido ou através de compor ("merge") um marcador negativo nuclear com este núcleo lexical ou na presença de um sintagma negativo que o c-comande localmente. No que diz respeito à impossibilidade da co-ocorrência do marcador negativo

frásico com palavras negativas pré-verbais, Matos considera que, nas línguas com marcadores negativos nucleares pré-verbais, são estes que, tipicamente, definem o escopo da negação, podendo, no entanto, o domínio da frase negativa estender-se quando o marcador negativo ocupa Comp°, como no exemplo (38)49, ou quando uma palavra negativa aparece em posição pré-verbal

como em (39)50. Não obstante, o marcador frásico negativo não licencia

interpretações negativas das expressões de polaridade subespecificada quando estas ocorrem em posição pré-verbal. Assim, enquanto em (40) temos como

47 É a esta e a outras ideias que Matos recorre para rebater a proposta de Haegeman (1995) de analisar a

Concordância Negativa à luz do Critério-NEG.

48 In Matos:23

49 Exemplo retirado de Matos:25.

leitura só um rapaz não sabia nadar, em (41) as leituras possíveis serão ninguém sabia nadar ou não havia um rapaz que soubesse nadar.

(38) [CP a quem [não tem ninguém ultimamente oferecido livros]]? (39) [Nunca nós dissemos isso!]

(40) Um único rapaz não sabia nadar. (41) Não sabia nadar um único rapaz.

De acordo com a análise realizada por Matos, a agramaticalidade de frases como (42), onde o marcador negativo co-ocorre com uma palavra negativa pré- verbal, está relacionada com uma questão de escopo. Isto é, tanto o marcador como a palavra negativa concorrem para o mesmo escopo na estrutura, pelo facto de ambas terem escopo sobre o verbo flexionado que constitui o núcleo da frase.

(42) a. *Ninguém não comeu o gelado, b. * Jamais tu não pensaste em mim.

No entanto, estabelecem dois domínios negativos diferentes: o elemento negativo pré-verbal estende o domínio negativo a toda a projecção que ocupa, enquanto o marcador negativo restringe-o ao predicado. Assim, em (43) existem dois domínios negativos, SX e SZ, onde SX inclui o marcador negativo núcleo, juntamente com o verbo e os constituintes que c-comanda localmente, isto é SZ. Em (44) esses constituintes são SY e SZ.

(43) a. *Ninguém não comeu o gelado.

b. [SX Ninguém [SZ não disse tal coisa]]. (44) a. * Jamais tu não pensaste em mim.

No caso do Francês, e assumindo a teoria dos traços fracos e fortes, pode-se dizer que se trata de uma língua em que o marcador ne, tendo traços fracos, não pode por si só negar a frase, logo, a questão de conflito de escopo não se coloca. Nesta língua, o marcador negativo, sendo mais fraco, não delimita estritamente o domínio da negação frásica.

No que diz respeito ao Português, frases como (45) e (46) mostram que a agramaticalidade de (45) reside no facto de sem que e não terem ambos escopo sobre o verbo que constitui o núcleo da frase, definido redundantemente o mesmo constituinte como negativo, violando, por isso, princípios de economia. Em (46), a ocorrência dos marcadores negativos em diferentes domínios frásicos produz bons resultados, uma vez que definem como negativos dois constituintes diferentes.

(45) * Eles comeram o bolo sem que a mãe não o provasse. (46) Eles não comeram o bolo sem que a mãe o provasse.

Matos defende que este contraste será resultado das condições na aplicação da Absorção-NEG, isto é, a Absorção-NEG só se aplica a um único domínio sintáctico, estando impedido de operar através de diferentes domínios negativos. Se apesar de actuarem sobre o mesmo verbo, os constituintes negativos delimitarem dois domínios frásicos distintos, então a Absorção-NEG não se pode aplicar. Segundo a autora, este facto pode ser provado se tivermos em conta a gramaticalidade de frases como (47),51 onde todas as palavras

negativas partilham o mesmo domínio sintáctico. Em (47a) e em (47b), não existe um marcador negativo forte que delimite estritamente o verbo e os seus complementos como domínio negativo frásico. Para além disso, é a palavra negativa mais à esquerda que fixa o início do domínio negativo, c-comandando tanto as outras palavras negativas como o núcleo verbal da frase. Em (47c) não

constitui o único elemento que pode fixar o domínio negativo na frase, uma vez que só ele está em posição pré-verbal.

(47) a. Nunca ninguém disse isso. b. Ele nunca deu nada a ninguém. c. Ele não deu nada a ninguém.

Em resumo, podemos concluir que, através de operações de "compor" e de "mover" Matos tenta provar que é desnecessária a projecção de mais uma categoria sintáctica [SNeg] para albergar um constituinte negativo. Isto é, à luz do Programa Minimalista, a autora tenta reduzir ao máximo o número de categorias e regras sintácticas que expliquem, neste caso, o que se passa nas línguas que manifestam Concordância Negativa. Propõe ainda um mecanismo de Absorção-NEG para explicar o facto de os vários elementos negativos poderem ocorrer na mesma frase sem que o seu valor negativo se cancele, formando uma única instância da negação.

Da proposta de Matos, que é uma das mais atraentes e que melhor se enquadra no Programa Minimalista, parece-nos de grande importância a ideia de que não pode haver domínios negativos em colisão e a ideia de que o marcador negativo por excelência, não, em princípio marca o predicado como negativo. Usaremos também o conceito de Absorção, para explicar a possibilidade da ocorrência múltipla de elementos negativos numa mesma frase, contribuindo para a formação de uma única instância da negação.

3.3. Algumas propostas para o tratamento sintáctico da Concordância