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4. O ESTATUTO DO EMBRIÃO HUMANO

4.3. A Protecção Jurídica do Embrião

No Relatório/Parecer sobre Reprodução Medicamente Assistida refere-se a controvérsia existente acerca do estatuto do embrião, acerca da dignidade que lhe deve ser atribuída e da

85 Serrão, D. (2003), p. 11.

86 Singer, P. (2002), pp. 192-193.

87 Melo, H. (1997). O Embrião gerado in vitro é sujeito de Direito? Ética da Vida, Vitalidade da Ética, Gabinete de Investigação de Bioética. Porto: Universidade Católica Portuguesa, p. 113.

43 protecção e respeito que deverá merecer, para concluir que "enquanto esta controvérsia não for resolvida e subsistir a dúvida, tem aplicação entretanto e sempre, o princípio ético que estabelece ser gravemente ilícito atentar contra uma entidade de que se duvida se, sim ou não, constitui um sujeito investido de plena dignidade humana"88.

O respeito pela vida humana pré-natal deve ser mantido devendo ser salvaguardada de qualquer acto lesivo ou desvantajoso89. Podemos admitir que pelo facto de um ser humano ter poucas semanas de gestação (até 10 semanas) a sua vida e dignidade humana sejam desvalorizadas e ignoradas?

Sabe-se que o embrião humano, durante os primeiros dias não se distingue dos outros embriões animais, e que é apenas o seu capital genético individual inserido dentro de todas as suas células e proveniente dos seus progenitores que testemunha a diferença90.

Um feto com menos de dez semanas encontra-se inegavelmente vivo e tem um genoma idêntico ao de um ser humano adulto. É inegavelmente um Homo Sapiens Sapiens. Se o produto da concepção é ao fim de alguns meses, um ser humano, como se pode decidir que só a partir de um certo momento é que o novo ser se torne humano ou pessoa91?

Somos humanos a partir do momento da concepção, no instante em que os nossos progenitores nos concebem e é nesse instante que se inicia a vida. Sim, porque até à data, não foi possível à natureza e à ciência criar a vida a partir de algo não vivo. A vida provém da vida, logo, o embrião humano é um ser vivo da espécie humana e subsequentemente tem dignidade humana que deve ser defendida e valorizada.

88 CNECV. (1997). “Relatório - Parecer de 19/CNECV/97 sobre: Projectos de Lei relativos à interrupção voluntária da gravidez,” em http://www.cnecv.gov.pt/NR/rdonlyres/3D733FE4-5BE0-4CCA-99E2-466211CE2D20/0/P019_IVG.pdf (acedido: Novembro de 2008)

89 Eusebi, L. (1989). Statuto Giuridico e Tutela Penale DellʋEmbrione Umano, 132: Diritti delle embrione, Aggiornamenti Sociali, 5, 339-355, p. 349.

90 Bochatey, A. (2001). Vida Humana y Sexualidad. San Agustin y la Persona. Instituto de Bioética, Vida y Ética, 2 Año 2, 17- 44, p. 22.

91 Milliez, J. (2002). A Eutanásia do Feto, medicina ou eugenismo?. Porto: Ambar, Porto, p. 136.

44 O valor da vida humana é algo que não pode ser conectado com ideologias políticas e nem sequer deve ser referendável, já que a nosso ver, a vida é um direito de todos, o primeiro dos direitos fundamentais constitucionalmente consagrado92 e não algo sujeito a decisões políticas.

Do ponto de vista legal, o embrião - feto goza de protecção oferecida pela lei, expressa nos Códigos Civil e Penal93 sendo a vida de quem está para nascer um interesse ou bem jurídico indisponível tal como se afirma na Informação - Parecer da Procuradoria-Geral da República nº 31/82 de 13.04.1982. Posição concordante foi a do Tribunal Constitucional, cujo Acórdão 25/84 de 19.03.198494, refere que o nascituro, enquanto já concebido é já um ser vivo humano, portanto, digno de protecção. No Acórdão 85/85, de 29.05.198595, o Tribunal Constitucional, afirma “que a vida intra-uterina não é constitucionalmente irrelevante ou indiferente, sendo antes um bem constitucionalmente protegido, compartilhando da protecção conferida em geral à vida humana enquanto bem constitucional objectivo”.

Também para Figueiredo Dias, não existem dúvidas de que à vida fetal pertencem atributos indispensáveis para a qualificar como bem jurídico penalmente relevante96.

De acordo com o nº 1 do artigo 24º da Constituição da República Portuguesa, em que se declara que “a vida humana é inviolável”, sendo o embrião/feto “sede de vida humana”, este beneficia da protecção constitucional97 conferida em geral à vida humana, mas não da protecção constitucional do direito à vida propriamente dito cabendo esse sim só às pessoas.

92 Melo, H. (2001). O Biodireito In D. Serrão, & R. Nunes (Eds.), pp 171-223 Ética em Cuidados de Saúde. Porto: Porto Editora, p. 173.

93 Do ponto de vista legal, o embrião - feto goza de protecção oferecida pela lei, expressa nos Códigos Civil e Penal sendo que “A vida de quem está para nascer é um interesse ou bem jurídico indisponível...” como já em 1982 se afirmava na Informação - Parecer da Procuradoria Geral da República (nº 31/82 de 13.04.1982). Posição concordante foi a do Tribunal Constitucional, de cujo Acórdão, 25/84 (de 19.03.1984) nos limitamos a citar os seguintes passos: “... o nascituro, enquanto já concebido, é já um ser vivo humano, portanto, digno de protecção..." e, citando Figueiredo Dias,“não temos dúvidas que à vida fetal pertencem atributos indispensáveis para a qualificar como bem jurídico penalmente relevante”. O mesmo Tribunal Constitucional, no seu Acórdão 85/85, de 29.05.1985, afirma “que a vida intra-uterina não é constitucionalmente irrelevante ou indiferente, sendo antes um bem constitucionalmente protegido, compartilhando da protecção conferida em geral à vida humana enquanto bem constitucional objectivo” (CRP, artº 24º, nº 1.).Cf: CNECV (1997).

94 Tribunal Constitucional, Acórdão nº 21/84 de 19 de Março de 1984, publ. no DR II Série, N.º 80, de 4 de Abril de 1984: 2982 e ss.

95 Tribunal Constitucional, Acórdão nº 85/85 de 29 de Maio de 1985, publ. no DR II Série, N.º 143, de 25 de Junho de 1985: 5844 e ss.

96 CNECV, (1997).

97 Melo, H., (1998). Aspectos Éticos e Jurídicos do Diagnóstico Pré-natal de Doenças de Manifestação Tardia, Poderes e Limites da Genética: Actas do IV seminário do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida – 1997. Lisboa: Presidência do Conselho de Ministros, p. 175.

45 Com efeito, vida humana e embrião, só são defendidos se for garantido o direito de nascer98. De acordo com o artigo 66º do Código Civil, o feto só adquire personalidade jurídica no momento do nascimento completo e com vida, sendo então reconhecido pelo Direito, como titular de direitos e obrigações.

Assim sendo, estará aqui a justificação para a cedência da vida intra-uterina, quando em conflito com outros direitos fundamentais ou com outros valores constitucionalmente protegidos99 tais como os direitos fundamentais da grávida à vida, à saúde, ao bom nome e reputação, à dignidade, e à maternidade consciente100.

É o princípio da autodeterminação da mulher, reconhecido em 18 de Abril de 1998 pelo Tribunal Constitucional Português, que permite à mulher optar pela interrupção da gravidez até às 10 semanas101.

Do ponto de vista jurídico, se o bem jurídico “vida intra-uterina” se encontra em conflito com outros bens ou direitos constitucionalmente protegidos, tais como a vida ou integridade física ou psíquica da mãe e o seu direito à maternidade consciente, o direito do embrião/feto pode ter de ceder com a destruição da sua própria vida.

A atribuição a um sujeito de um poder ilimitado de eliminar a vida embrionária significa poder retirar toda e qualquer protecção a tal vida102.

98 Cardoso, A. (2001). O Estatuto Jurídico do Embrião e o Abortamento. Cadernos de Bioética, 27, 5-22, p. 14.

99 Melo, H. (1998), p. 175.

100 Silva, S. (2001). O Direito e Vida Humana Intra-uterina: Eborensia, Revista do Instituto Superior de Teologia de Évora, 27 e 28, Ano XIV, 169-192, p. 172.

101 Casini, C. (2003). Os direitos do embrião. Acção Médica, 3, p. 10.

102 Casini, C. (2003), p. 10.

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