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CAPÍTULO I A SOCIOLINGUÍSTICA E O ENSINO DE LÍNGUAS

1.2 A Sociolinguística: um caminho para o aperfeiçoamento do ensino de línguas

1.2.1 A questão do Bilinguismo

O bilinguismo é um problema que tem atraído o interesse dos sociolinguistas, sendo nesses tempos muitas vezes notável a existência de indivíduos com disposição para a aquisição bilingue e interessados a desenvolverem saberes e hábitos multiculturais na diversidade social e cultural que o mundo atual oferece. Deste modo, podemos considerar bilingue o indivíduo que domina dois códigos linguísticos de maneira alternada (Elia, 1987: 155). Dependendo do grau de conhecimento dos códigos, tal como aprecia o autor referido, há casos em que esse domínio pode ser muito bem assegurado e controlado em mais de uma língua, naquelas situações em que o bilingue consiga reconhecer as estruturas linguísticas dos códigos envolvidos sem dificuldades. Há, também, casos em que o bilingue domina simplesmente um dos códigos de forma prática, por necessidade comunicativa e fins relacionados com negócio ou operação comercial; na procura de certos serviços em aeroportos, lojas, hospedarias, etc.

O bilinguismo torna-se cada vez mais comum e a nossa tomada de consciência sobre o facto de que a habilidade de usar duas ou mais línguas, para além da nossa língua materna, parece-nos ser a regra e não a exceção. Contudo, acreditamos estarem envolvidos alguns fatores na formação deste fenómeno. Deste modo, gostaríamos de referir a aceleração ininterrupta do processo de globalização cultural e económica, a aproximação crescente de

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culturas e línguas, a explosão das TIC e suas facilidades nunca vistas antes. Estes e outros fatores fazem com que um indivíduo aprenda mais do que a sua língua materna.

Nesta senda, no sentido de percebermos o processo de transição de um falante monolingue a bilingue, temos de ter em conta a capacidade de conhecimento possuído pelo indivíduo na realização linguística da LNM ou LS a ser adquirida ou já adquirida. Assim sendo, as definições de bilinguismo refletem as hipóteses sobre o grau de proficiência que uma determinada pessoa deve atingir antes de ser considerada ou qualificada como bilingue. Isto se observa quando comparamos um falante nativo monolingue e a sua categoria de conhecimento mínimo numa segunda língua (Cristal, 1988: 39). Deste modo, o que queremos clarificar é que o ponto de domínio dos sistemas linguísticos por parte do falante é considerado como sendo relevante na determinação de um indivíduo bilingue.

Demais, o critério grau de domínio dos sistemas linguísticos referidos acima não representa um pressuposto taxativo. Atentando o raciocínio ressaltado pelo autor exposto acima, gostaríamos de realçar que é imprescindível tomarmos nota de que os estudos sobre o bilinguismo envolvem a análise de questões sociais, psicológicas e nacionais, tendo em consideração o status social das diversas línguas em presença e o seu papel de identificar os falantes de acordo com um determinado grupo étnico. No entanto, as questões apontadas e sua análise, nesta ordem de ideias, configuram-se como elementos subsidiários para a compreensão e definição do fenómeno bilinguismo.

Na realidade, torna-se cada vez mais necessário o domínio de diversas línguas, sendo que a mesma necessidade constitui nos tempos que correm um fenómeno generalizado no mundo todo. Ademais, o contacto com as outras culturas pode ampliar a nossa maneira de ver o mundo, oferecendo-nos experiência de vida, cultura geral e possivelmente um vasto saber académico.

Nos tempos hodiernos, com uma maior permeabilização das fronteiras culturais entre os países, constitui-se uma preocupação comum saber outras línguas além da nossa língua materna. Esse conhecimento, no entanto, pode ser desde o uso de algumas palavras bastante conhecidas, como o merci, do francês, ou o gracias, do castelhano, até um saber pleno e um alto nível de proficiência (Matheus et al., s/d: 1).

Efetivamente, o bilinguismo contribui para a aquisição de conhecimentos sobre o mundo, precisamente nos nossos dias, em que as culturas estão em permanente encontro. Segundo se observa em Grosjean, na sua reflexão sobre o crescimento da criança e o bilinguismo, percebemos que a realidade a nível do conhecimento exterior, para a criança, será adquirida através do uso da língua, principalmente. Acrescenta o autor referido que será na

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comunicação com os pais, familiares, outras crianças e adultos, que a mesma trocará e processará informação sobre o mundo que a rodeia (Grosjean, s/d: 1).

Sempre que se fala de ensino bilingue, pensamos ficar evidente a existência de situações de bilinguismo, tornando-se pertinente a sua abordagem quando se pretende falar de ensino da língua portuguesa como LS/L2 (Nhongo, 2009: 18). Assim, baseando-nos nesta autora, se entendermos o bilinguismo como a posse e uso de duas línguas em igualdade de situações, perceberemos que, quando este fenómeno é bem orientado, o mesmo funcionará como um fator positivo na integração social do indivíduo, contribuindo no desenvolvimento da sua vida, uma vez que promove uma consciência mais objetiva do funcionamento da linguagem.

Com efeito, serão os conhecimentos aprendidos em tenra idade que, normalmente, servirão de bases para a sustentabilidade das atividades que ocorrerão na escola, facilitando desta feita a compreensão da língua. Assim, procurando enquadrar o fenómeno no contexto angolano, fazemos sobressair a oficialização da língua portuguesa em Angola e a forte presença das línguas locais ou regionais que, na perspetiva do bilinguismo, representam e justificam a área linguística complexa que neste território se formou. Pois, é a diversidade de línguas aí existentes e o mosaico multicultural que fazem deste país um grande detentor de riqueza imaterial, enquanto património da Nação e até mesmo da humanidade (Garmadi, 1983: 41).

Relativamente ao processo de ensino-aprendizagem, o bilinguismo deve ser uma razão de discussão e de reflexão no conjunto da classe docente e, posteriormente, no seio da classe discente, visto que a sociedade e/ou os alunos, atualmente, revelam de maneira óbvia a necessidade de possuírem e dominarem mais do que uma língua face a crescente interação comunicativa que o mundo globalizado impõe. No contexto angolano, de facto, há condições para que os cidadãos, para além do português, aprendam mais línguas; condições essas facilitadas pelo facto de haver uma variedade linguística grande e porque o inglês e o francês são línguas estrangeiras com acolhimento nas escolas. Assim, um determinado indivíduo dominaria ou aprenderia a LP, as LMA (pelo menos algumas) e as LE.

Seguidamente, revela-se preponderante realçar que grande parte dos adolescentes e jovens, em Angola, convivem diariamente, em casa e no bairro (especificamente neste caso) com uma LMA e na escola com a língua portuguesa, sendo esta última a LO do país. Este contexto escolar faz com que seja notória uma resistência à manutenção das suas LMA16, quer

pela influência dos seus pais que as dominam como língua primeira, normalmente, quer pela força cultural que elas carregam na vida das famílias e dos povos.

16Cf. A situação apresentada, com as suas especificidades, é também uma preocupação linguística em

Cabo-verde, tal como aponta Rute Perdigão, num trabalho feito sobre “Contacto entre línguas, a cultura crioula/ cabo-verdiana na escrita em Português” (2009:2-3).

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