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CAPÍTULO 3: GEOGRAFIA DO TURISMO, TERRITÓRIO E DESENVOLVIMENTO

3.1 A relevância da abordagem geográfica do turismo

Castro (2006), ao fazer um levantamento do histórico sobre o estado da arte da produção do conhecimento acadêmico a respeito das abordagens geográficas do turismo no âmbito brasileiro, verificou que, somente a partir as décadas de 1970 e 1980, principiaram-se os estudos nessa perspectiva, diferentemente da realidade europeia que vivenciava seu auge de produção nesse período, iniciado desde a década de 1950. Nessa circunstância, Rodrigues (2001) declara que esse fato é compreendido devido

 a forma equivocada de entender o turismo como um tema supérfluo para abordagens geográficas é muito presente ainda no seio da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), que manifesta acentuada preferência pelos assuntos comprometidos com a militância política [...]. Há uma tendência manifesta de ignorar nos congressos da AGB eixos temáticos que contemplam o fenômeno do turismo, mesmo percebendo-se que o interesse por esse tema é crescente. (RODRIGUES, 2001, p. 96)

Desse modo, a autora (2006) ressalta que houve de fato resistência por parte da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB) no tocante à abordagem geográfica do turismo, porém cogita que há também outras causas do desinteresse dos geógrafos brasileiros para essa temática, como a “historicidade do peso do turismo como prática social e atividade econômica na vida nacional, que por sua vez relacionam-se às

políticas nacionais e setoriais”. (CASTRO, 2006, p.168). Por conseguinte, Castro

(2006), ao prosseguir em suas averiguações, constatou que mais determinante foi o reflexo da ineficiência das políticas públicas no período que abrange a pré-história até meados da década de 1966. Assim, apenas no terceiro período da história das políticas nacionais de turismo do País5, em meados da década de 1990, é que se intensificaram as

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Para oentendimento da evolução das políticas publicas do turismo brasileiro, Cruz (1999 apud CASTRO, 2006) propôs a divisão em três períodos: o primeiro compreende a pré-história jurídico

institucional, prolongando até 1966. Desse modo, se caracterizava “pela emissão de “diplomas

legaisdesconexos e restritos a aspectos parciais da atividade”, como regular as agencias de viagens”.

(CRUZ, 1999 apud CASTRO, 2006, p. 169). O segundo período teve como balizador o decreto-lei 55 de 18 de novembro de 1966 ao qual delimita a primeira Política Nacional do Turismo (PNT) e cria os organismos para oficializá-los, como o Conselho Nacional de Turismo (CONTur) e a Empresa Brasileira

produções acadêmicas na dimensão geográfica do turismo (CRUZ, 1999 apud CASTRO, 2006). Consequentemente, o fim da década de 1990 pode ser tomado como marco referencial no aumento do número de produções na abordagem geográfica do turismo, com contiguidade no tempo (CASTRO, 2006).

Nesse cenário, no quesito de produções na intersecção

Geografia/Turismo/Educação, a autora (2006) verificou em suas pesquisas que, no universo de 163 produções, entre 1975 a 2005, apenas 3% tinham essa perspectiva,

apontando que “o dado não causa estranhamento uma vez que a educação, em qualquer

de seus segmentos, não é atendida por políticas que façam dela uma prioridade

nacional”. (CASTRO, 2006, p.232).

Nessa linha de avaliação, Fernandes (2007) evidencia que mesmo com o

entendimento do turismo como área do conhecimento “é possível questionar se o peso dessa discussão enquanto área do conhecimento acompanha a evolução do setor”

(FERNANDES, 2007, p.12). Assim, a autora (2007) analisa que o desenvolvimento teórico do turismo não tem seguido paralelo ao seu crescimento enquanto prática, mostrando que há deficiência na compreensão de sua base teórica, e que “sua fragilidade é caracterizada não só pela ausência de uma linguagem própria, mas também pela utilização, muitas vezes inadequada, de termos tomados de várias disciplinas, entre as quais a geografia”. (FERNANDES, 2007, p.12-13).

Dessa maneira, tomando por base as constatações de Fernandes (2007), mesmo com as indubitáveis contribuições da geografia como ciência social na apreensão da realidade social, devem-se superar barreiras ideológicas e outros enfoques (econômicos, etc.) que muitas vezes se sobressaem em detrimento da análise espacial.

Todavia, mesmo considerando o breve histórico e a escassez de estudos acerca desse enfoque (geografia/turismo/educação) é evidente sua relevância, pois possibilita desenvolver a abordagem interdisciplinar entre outras dimensões que envolvem o turismo, como a ambiental, a conscientização, a elaboração de plano de gestão, patrimônio, etc., possibilitando quebrar paradigmas e avançar na produção do conhecimento. O Ministério do Turismo (BRASIL, 2006) corroborapara a relevância do papel das instituições educativas na formação turística em todos os níveis da educação

de Turismo (EMBRATUR). O terceiro período se inicia em 1991, e dura até 1999, marcado por

mudanças empreendidas pela EMBRATUR, que passou a formular, coordenar, e executar a PNT. Cruz (1999 apud CASTRO, 2006) elucida ainda que, entre 2003-2006, o turismo brasileiro erigiu o quarto período, reestruturando a Embatur, criando o Ministério do Turismo, além de dispor um novo Plano Nacional de Turismo (2002- 2006). Esse Plano teve como fundamento as parcerias e a gestão descentralizada das políticas públicas desse setor (CRUZ, 1999 apud CASTRO, 2006).

para o desenvolvimento da atividade com êxito e harmonia, em especial pelo seu grau de significância na contemporaneidade.

A crescente expansão do turismo é notável e tem contribuído por mobilizar um vasto contingente de pessoas e de recursos que, simultaneamente, em seu desenvolvimento, produzem, consomem e (des)estruturam os espaços. Desse modo, sua relevância se configura como uma atividade complexa que transcende a dimensão econômica, constituindo-se em um fenômeno social que se conforma materialmente no espaço (PERETTI, 2002).

Dessa forma, assim como outros setores da economia (agrário, extrativo, industrial e manufatureiro) teve e tem seu papel de destaque no desenvolvimento da economia brasileira, o setor terciário (comércio e serviços) também passou a ter sua relevância regida pelas influências da globalização na contemporaneidade (RODRIGUES, 2003). Acrescenta-se a esse processo de mudanças a evolução da ciência, da técnica e da informação, direcionando alterações nas estruturas socioprofissionais e na expectativa de vida da população, possibilitando esse contingente usufruir do lazer (RODRIGUES, 2003).

Assim, segue, nesse cenário, a crença de que é com o desfrutar do lazer, do contato com a natureza que o homem poderá restaurar suas energias consumidas pelo estresse da vida urbana. Consequentemente, os lugares são redefinidos pois há

 uma acentuada tendência na valorização do lugar, da cultura local, do sentido de “pertencimento”. Antigos espaços degradados de grandes cidades, principalmente áreas portuárias, estão sendo reabilitados e revividos como lócus de lazer [...]. (RODRIGUES, 2003, p. 92).

Nessa lógica, Peretti (2002) reafirma que, “tendo em vista as incidências

espaciais do turismo, o tratamento geográfico do fenômeno vem tornando-se cada vez

mais destacado” (PERETTI, 2002, p.9). Portanto, é nesse espaço revalorizado e

redefinido que a ciência geográfica deve, não desprezando as contribuições das outras ciências, assumir o compromisso de desvelar seus rebatimentos na dimensão socioespacial.

O contínuo crescimento de estudos e os dados fornecidos pela Organização Mundial do Turismo (OMT, ANO) vêm reforçar que esse setor atualmente tem uma contribuição considerável para a economia brasileira, colocando o Brasil em 6° lugar

entre as economias do turismo do mundo. Nesse âmbito, diante de seu prestígio econômico, social, cultural e natural, cogitamos que o turismo carece cada vez mais da análise geográfica para sua apreensão.

É sabido que, com o capitalismo, há uma tendência do espaço se organizar para a instalação das atividades econômicas diversas; da mesma forma, o turismo, juntamente com outros empreendimentos do setor (polos industriais, aquicultura etc.), procura adequar o espaço aos seus interesses (COSTA, 2011). Conforme complementa o autor,

 o turismo figura como prática ligada a esse processo de consumo do espaço. A medida que esta atividade e as demais atividades ligadas ao lazer consomem paisagens e lugares, elas têm o próprio espaço como elemento de consumo direto. (COSTA, 2011, p.9).

Então, nesse processo em que turismo e produção do espaço interagem, é que a geografia como ciência deve assumir o papel de balizadora no entendimento real dos corolários dessas dinâmicas e, assim, traçar os encaminhamentos necessários a cada contexto. No que concerne a esse entendimento, Andrade (2004 ) expõe que seja qual for a análise referente ao turismo, deve ter como concepção que “o homem, o espaço, o tempo constituem os três pré-requisitos para qualquer reflexão equilibrada a respeito do

fenômeno”. (ANDRADE, 2004 apud COSTA, 2011, p. 11).

Assim, a evolução da geografia como ciência contribuiu por expandir seu campo de análise, perpassando assim de estudo descritivo da superfície terrestre para tentar desvendar o espaço construído pelo homem na contemporaneidade (ANDRADE, 1989). Nesse âmbito, salienta o autor que, levando em consideração a dinamicidade na produção do espaço, cabe à geografia estudar as formas e indicar as direções que as transformações futuras podem tomar. À vista disso, considerando sua relevância na compreensão desses elementos, necessita estar em constante reconstrução de seus objetivos, métodos, e, sobretudo, estar acessível à compreensão de fenômenos contemporâneos de diversas áreas, bem como o turismo.

Nesse contexto, afirma Rodrigues (1999) que

 o turismo é, incontestavelmente, um fenômeno econômico, político, social e cultural dos mais expressivos das sociedades ditas pós-industriais. Movimenta, em nível mundial, um enorme volume de

pessoas e capital, inscrevendo-se materialmente de forma cada vez mais significativa ao criar e recriar espaços diversificados (RODRIGUES, 1999, p. 17)

Destarte, Peretti (2002) reitera que, considerando a notoriedade do turismo, a ciência geográfica não poderia omitir-se de empreender a análise e a leitura “das mudanças espaciais causadas pela atividade turística, buscando a compreensão da estrutura e dos processos que deram causas a essas transformações”. (PERETTI, 2002, p.6). Acrescenta a autora que cabe à geografia, como ciência e disciplina escolar que se apresenta a refletir o mundo além de suas formas, se esforçar para superar fragmentações entre as diversas dimensões (homem/meio; trabalho manual e intelectual; teoria/prática; todo/parte) na busca de apreender as relações entre sociedade e espaço para a prática da transformação social.Nesse sentido, elucida Silva (2012) que

 o interesse da geografia em estudar o turismo reflete sua relevância social, política, cultural e econômica que esta atividade ganhou nos últimos tempos. Além de ser um grande elemento que pode permitir o desenvolvimento de regiões [...]”.(SILVA, 2012, p.48).

Peretti (2002) assevera que “o estudo do turismo no enfoque geográfico é de fundamental importância, pois a geografia, por tradição, lida com as relações

sociedade/natureza” (PERETII, 2002, p. 6). Assim, é inegável seu aporte para o

entendimento das implicações dessa atividade no espaço em que se realiza por parte dos diversos sujeitos que ali estão incluídos.

Sales e Assis (2006) ratificam a relevância da abordagem geográfica do turismo diante de sua expressividade atualmente como instrumento viável na avaliação de sua expansão no território onde se realiza e, conjuntamente, elaborar ações cabíveis para o desenvolvimento dessa atividade de maneira equilibrada. Entretanto, os autores citados ponderam que os estudos voltados à abordagem geográfica do turismo tem, majoritariamente, se restringido à academia, sendo pouco debatido nos níveis elementares da educação.Nesse sentido, Sales e Assis (2006) acrescentam que

 por ser a escola um dos principais meios da produção e da disseminação do conhecimento, faz-se necessário que o turismo também integre os seus conteúdos e atividades. Nesse sentido, não defendemos que o turismo seja um tema restrito a discussão geográfica,

pois a sua amplitude requer um trabalho transversal e interdisciplinar. (SALES; ASSIS, 2006, p.108).

Emconcordância com o descrito, Castro (2006) valida que

 os fios que se entrelaçam e se entretecem na área de intersecção da geografia com o turismo podem e devem ser tecidos na perspectiva da formação humana. Desse esforço educativo podem resultar consciências em processo para o exercício respeitoso do uso e consumo de espaços turísticos.

Nessa perspectiva, em consonância com o descrito, cogitamos a pertinência de fomentar debates e reflexões acerca da necessidade e a possibilidade da inserção dessa temática na educação básica, especialmente em áreas já em que desenvolvem a atividade em seu território.