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De início, as particularidades do telejornalismo nos impõem o reconhecimento do tipo de produto constituído pelas reportagens a serem analisadas. Conforme definição de Maciel (1995), a reportagem “é a mais complexa e completa forma de apresentação da notícia na televisão”63, com duração maior que os relatos noticiosos mais simples, além da presença do repórter no vídeo, de um ou mais entrevistados, imagens e narrativa emoff e um apresentador.

No caso da série de reportagens, o gênero tornou-se mais freqüente na tevê no início desta década, com o acirramento da concorrência entre os telejornais. É um produto que cumpre uma função inovadora ao possibilitar o aprofundamento da cobertura sobre determinado tema, afastando a crítica que define o telejornalismo pela sua característica de superficialidade e de ritmo excessivamente fragmentado.

Há, contudo, uma diferenciação do material produzido pela intencionalidade da mensagem, conforme nos relata Marques de Melo (1985). Nesse aspecto, considerando a “estrutura controlada” da mensagem pelo veículo, como é o caso das reportagens que são pensadas e planejadas no interior da instituição jornalística – o que se aplica a uma série de reportagens –, estaríamos diante de uma categoria

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de jornalismo distinta do caráter meramente informativo, já que essa se estrutura a partir de um referencial exterior à instituição. É quando podemos falar no jornalismo opinativo e seu formato interpretativo, o que se apresenta mais adequado ao interesse e intenção despertados quando a série de reportagens ocupa o centro do debate.

Também nos parece apropriada a classificação adotada por Temer (2002), segundo a qual o material jornalístico de TV pode ser reconhecido a partir dos seguintes critérios:

a) notícia – em que predomina a informação, o fato jornalístico de interesse imediato e grande impacto social; b) serviço – em que predomina o caráter orientador ou indicador, voltado principalmente para a formação de comportamentos; c) interesse humano, que engloba a história de interesse humano e a história colorida. São matérias aparentemente irrelevantes no contexto social geral, mas que ganham espaço a partir da curiosidade dos temas e/ou num possível impacto emocional no telespectador.64

Segundo as definições acima, a partir do modo de produção envolvido e da intencionalidade declarada pela TV Globo, no sentido de proporcionar a orientação do telespectador/eleitor, consideramos apropriada a denominação de “reportagem de serviço”para cada uma das matérias veiculadas no interior das séries exibidas no Jornal Nacional.

Sobre a metodologia interna adotada pela emissora, o livro-memória do Jornal Nacional (Jorge Zahar, 2004) também contribui para esclarecer a tomada de decisão da TV Globo em direção ao aprofundamento da cobertura de alguns problemas nacionais. A proposta era “colar” a discussão sobre os problemas com o conteúdo oferecido pelos candidatos nos programas do HGPE, que foram ao ar quando o noticiário já apresentava a terceira série de reportagens.

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TEMER, Ana Carolina Rocha Pessoa. Notícias e serviços nos telejornais da Rede Globo. Rio de Janeiro: Sotese, 2002, p. 115.

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O livro traz também uma curiosa revelação, ainda que não tenha sido explicitada junto aos telespectadores: como os temas das reportagens partiram das estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), era possível ao eleitor comparar a extensão dos problemas no início e no final dos governos do PSDB.

[...] as matérias foram feitas com base nos censos do IBGE de 1991 e 2000, comparando a situação do país num ano e no outro e mostrando o que havia melhorado e o que ainda precisava ser feito. Com aqueles dados, o objetivo era afastar ao máximo o subjetivismo na avaliação das políticas públicas, com uma vantagem: se fosse levado em conta o período em que Fernando Henrique Cardoso foi ministro da Fazenda de Itamar, as matérias abrangeriam praticamente os dez anos em que os tucanos estiveram no poder. Ao fim das reportagens, sempre o eleitor era estimulado a procurar saber – no horário eleitoral obrigatório, que entrava no ar logo após o Jornal Nacional – o que cada candidato pretendia fazer em cada área abordada: saneamento, saúde, educação, etc.65

Para o telespectador, o início da exibição das reportagens, em 05.08.2002, mereceu um recado especial:

Bonner:OJornal Nacional inicia, hoje, um trabalho especial para ajudá-lo nessas eleições. Ao longo das próximas nove semanas, os nossos repórteres vão trazer, todas as noites, retratos atualizados dos maiores problemas brasileiros. Com os dados oficiais do IBGE, você vai comparar o tamanho desses problemas no início e no fim da década de 90. E vai poder avaliar se as propostas que os candidatos vão apresentar no horário eleitoral obrigatório são capazes de resolvê-los. O Jornal Nacional abre mais um espaço para as eleições, que se soma à cobertura diária da movimentação dos candidatos, às entrevistas com eles aqui mesmo, nesta mesa, e ao debate que será realizado em outubro.

A tabela a seguir apresenta a relação das séries de reportagens exibidas no Jornal Nacional, seguindo definição temática adotada pela emissora.

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TABELA 1

SÉRIES DE REPORTAGENS VEICULADAS NO JORNAL NACIONAL

Séries Reportagens Período Repórter

1- O poder do cidadão (tempo médio: 4’35”)6 05/08 a 10/08 Edney Silvestre 2- As contas do governo

6

(tempo médio: 3’50”) 12/08 a 17/08 Tonico Ferreira 3- Concentração de renda

6

(tempo médio: 4’10”) 19/08 a 24/08 Marcelo Canellas 4– Educação e emprego

6

(tempo médio: 4’10”) 26/08 a 31/08 Sônia Bridi 5– Saúde e saneamento (tempo médio: 4’30”)6 02/09 a 07/09 Vinícius Dônola 6- Desigualdades Regionais (tempo médio: 3’20”)6 09/09 a 14/09 Marcelo Canellas 7– Meio ambiente e grandes

cidades

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(tempo médio: 3’25”) 16/09 a 20/09 William Waack

8- O valor do voto (tempo médio: 4’10”)5 30/09 a 04/10 Ernesto Paglia 9- O poder do presidente (tempo médio: 3’40”)5 21/10 a 25/10 Marcelo Canellas

4.5 AGENDA PÚBLICA, ENQUADRAMENTOS E CONTROVÉRSIAS