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A restrição da concessão pela via legislativa

CAPÍTULO II A PRISÃO E OS SISTEMAS PROGRESSIVOS: CONFIGURAÇÃO

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS !

2.3.2 A restrição da concessão pela via legislativa

Para o que se pretende realizar, neste segundo aspecto será feita uma análise do dispositivo legal (art. 2Ô, § 1 - Lei n2 8.072/90)63, que veda a progressão de regime, face à afronta ao princípio da individualização da pena, aplicada pelo

63 Diz o artigo art. 2o, § 1o da Lei ne 8.072/90: “A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado.”

sistema penal64, e o conseqüente aumento da estigmatização do indivíduo condenado.

Costa Jr. (1999, p. 132) adverte que:

A lei dos crimes hediondos (Lei ne 8.072/90) estabeleceu nova exceção, em seu art. 2e, § 12, vedando a progressão no regime, determinando o cumprimento da pena, integralmente, no regime fechado. Entretanto, tem-se apontado, com acerto, a inconstitucionalidade desse dispositivo legal, por ferir o princípio da individualização da pena, agasalhado expressamente no artigo 5e, inciso XLVI, da Constituição Federal.

O relevo desta demonstração, ressalta-se pelo fato de que, além de inconstitucional, pois houve reforma do texto onde não havia a autorização do constituinte originário, a norma aplicada atenta contra o instituto da progressão de regime, ferindo os princípios da individualização da pena e da impossibilidade da existência de penas cruéis, mostrando-se como mais um mecanismo de restrição de benefícios e conseqüente de maior estigmatização do condenado, ainda que para isso seja necessário impor normas inconstitucionais.

Analisando sistematicamente, é de notar que a progressão de regime é conseqüência do princípio da individualização da pena, o qual está inserido em norma constitucional (art. 5-, inciso XLVI, da Constituição Federal brasileira), bem como do princípio da humanidade, que significa a necessidade da existência de uma equivalência entre o delito praticado e sua respectiva conseqüência jurídica, que também está deduzido na Constituição Federal de 1988, no artigo 5e, inciso XLVII e na Convenção Americana sobre Direitos humanos - “Pacto de San José de Costa Rica - 1969”, no artigo 5-, parágrafo 2-,

No exame do dispositivo, verifica-se que o constituinte originário determinou ao legislador ordinário (“Art. 5-, inciso XLIII da CF/88: “a lei considerará(...)”) apenas que regulamentasse tal dispositivo no sentido de dizer quais seriam os crimes considerados hediondos ou a eles 'equiparados (equiparou aos crimes

64 Por exemplo, é o que ocorre, na seguinte decisão do Supremo Tribunal Federal, no Habeas-corpus n2 69.603-1. Ementa:” Execução Penal. Habeas-corpus. Regime prisional. Crimes hediondos. Cumprimento da pena em regime fechado. Art. 2°, § 1e, da Lei 8.072/90. Alegação de ofensa ao art. 5-, XLVI, da Constituição. Inconstitucionalidade não caracterizada. Individualização da pena. Publicado no ementário n2 1700-4, publicado no Diário da Justiça de 23 de abril de 1993.

hediondos a prática da tortura, o tráfico de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo), pois todas as limitações já estavam contidas na norma constitucional.

Da mesma forma, a tentativa da Dogmática em dar tratamento equânime nas decisões judiciais também não é atingido e é revelado na aplicação da lei penal nos casos concretos. A desigualdade é mostrada tanto no amplo repertório de decisões dos diversos Tribunais Superiores, quanto na doutrina que aprecia a matéria. A questão da vedação legal da progressão de regime é debatida desde a edição da Lei dos Crimes Hediondos, mas tomou força com a edição da Lei n2 9.455, de 7 de abril de 1997, que definiu os crimes de tortura65.

Sobre o tema, Franco (1997, p. 2) adverte que:

A colisão entre as duas posições é flagrante, evidenciando uma desuniformidade de perspectivas que contraria o sentido emprestado ao texto constitucional. O ordenamento jurídico constitui um sistema racional de normas e, como tal, não suporta contradições internas. Não há razão lógica que justifique a aplicação do regime progressivo aos condenados por tortura e que negue, ao mesmo tempo, igual sistema prisional aos condenados por crimes hediondos ou de tráfico ilícito de entorpecentes. Nem sob o ponto de vista do princípio da lesividade, nem sob o ângulo político-criminal, há possibilidade de considerar-se a tortura um fato delituoso menos grave em confronto com os crimes já referidos.

É de notar também que, além de novas disposições legais (como exemplo, pode-se citar a Lei n- 9.455, de 7 de abril de 1997), a caracterização da desigualdade está nas decisões judiciais, quando permitem para uns a progressão de regime e vedam para outros. Como exemplo, pode-se citar o posicionamento dos Ministros Marco Aurélio Mello e Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal, que consideram inconstitucional a vedação legal, quanto à progressão de regime, para os crimes hediondos ou a eles equiparados. Entretanto, no mesmo tribunal,

65 A Lei ne 9.455, de 7 de abril de 1997, que definiu o crime de tortura (equiparado constitucionalmente ao crime hediondo), prevê em seu artigo 1e, § 72, a possibilidade da progressão de regime. Assim, há diversos julgados entendendo que houve uma derrogação tácita do disposto do artigo 2a, § 1e da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), que veda a progressão de regime, em virtude de que a Constituição Federal deu tratamento isonômico aos crimes equiparados aos hediondos como o tráfico ilícito de entorpecentes, terrorismo e a tortura. Neste sentido decidiu, recentemente a 10â Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, nos Embargos Infringentes ne 1174517-4, Rei. Des. Ary Casagrande, por votação unânime, em 16 de agosto de 2000.

outros Ministros indeferem os pedidos de progressão de regime, em recursos que iá chegam, argüindo a constitucionalidade do dispositivo legal que o veda.66

Vê-se, pois, que tanto do plano legal, quanto do plano técnico jurídico, a progressão de regime é atacada, demonstrando que, cada vez mais, para o instituto não há certeza de uniformidade das decisões. Em conseqüência, o que ocorre é um aumento do tempo de permanência do indivíduo na prisão, refletindo em uma maior estigmatização do condenado.

3. PROGRESSÃO DE REGIME. O ATENTADO ÀS TRANSFORMAÇÕES

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