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A seleção das jovens participantes do estudo

CAPÍTULO 1 – OS ESTUDOS CULTURAIS E DE RECEPÇÃO

1.4 P ERCURSO M ETODOLÓGICO

1.4.2 A seleção das jovens participantes do estudo

Considerando nosso intuito de desenvolver um estudo de recepção junto a jovens, optamos pela localização direta dos mesmos, a partir de visitas em escolas públicas e privadas da cidade de Santa Maria/RS. Realizamos um estudo piloto nestas escolas para verificar os hábitos e motivações da audiência de Malhação. Na época, estava no ar a 17ª temporada de Malhação, intitulada “Malhação ID”. Tendo em vista nosso intuito inicial de estudar diferentes classes e examinar o consumo de Malhação na internet, este estudo piloto foi realizado com jovens de classe popular e alta, e leva em conta questões referentes ao consumo na internet. Nosso objetivo se modificou devido à falta de tempo para a realização de toda a proposta e devido à dificuldade de encontrar jovens que tanto assistem Malhação na TV quanto acompanham seu conteúdo na internet, bem como jovens de classe alta que se dispusessem a participar do estudo. Mesmo assim, o pré-teste realizado foi importante para examinar a pertinência do projeto ao observar a frequência e os modos de relação dos jovens com o programa na TV e com seu conteúdo circulante na Internet.

O estudo piloto consistiu na aplicação de um questionário entre 44 estudantes de uma escola particular e 44 estudantes de uma escola pública (destes, 22 foram classificados como sendo de classe média e 22 de classe popular). O questionário foi estruturado a partir de 13 perguntas, fechadas e abertas, relacionadas diretamente à recepção de Malhação ID. A pesquisa foi feita com jovens entre 12 e 18 anos, sendo que a maioria deles (54% da classe alta, 68% da classe média e 50% da classe popular) afirmou assistir ao programa diariamente ou quase todos os dias. Os que afirmaram não assistir somam menos de 10% dos entrevistados, em cada classe.

A principal motivação dos jovens para assistir Malhação ID diz respeito à identificação com as temáticas juvenis, sendo a resposta mais citada entre os jovens de classe alta (35%) e os de classe popular (50%). Já entre os jovens de classe média, Malhação é principalmente uma opção de entretenimento (23%). Como era previsível, entre os estudantes de classe dominante e média todos têm computador em casa e a grande maioria (mais de 90%, nos dois grupos) acessa a Internet diariamente ou quase todos os dias. Quanto ao consumo de assuntos relacionados à Malhação na

web, os estudantes de classe dominante (57%) demonstram mais interesse ou têm mais acesso a

com o conteúdo de Malhação na web, apenas três foram citadas significativamente: os jovens leem textos, assistem a vídeos ou participam de enquetes.

Além da pesquisa quantitativa, também realizamos um estudo piloto da análise qualitativa dos dados a partir de uma entrevista com duas jovens, representantes da classe alta e da classe popular. Os dados coletados foram significativos para demonstrar em quais aspectos a construção da representação juvenil das entrevistadas apresentava similaridades com a representação de juventude apresentada por Malhação ID. Os temas abordados nas entrevistas relacionam-se às categorias de análise abordadas neste estudo. A aplicação das entrevistas foi relevante, pois possibilitou testar a abrangência e a formulação das questões, tornando perceptível futuros ajustes e aprofundamentos.

Após a aplicação dos questionários e da realização das entrevistas, obtivemos o contato de alguns jovens que pudessem participar da pesquisa. No entanto, com o final da temporada do programa, muitos destes jovens deixaram de assistir Malhação, o que exigiu que fizéssemos um novo contato com diferentes escolas, a fim de reunir outros jovens para o desenvolvimento da pesquisa de campo. O contato com as escolas particulares foi mais difícil e, quando ocorreu, dificilmente os jovens estavam dispostos a ajudar na pesquisa. Isso fez com que deixássemos de lado o estudo comparativo de classes e nos fixássemos apenas na classe popular. Assim, selecionamos 6 jovens desta classe para participarem da pesquisa de campo.

Considerando que no cruzamento dos dados da pesquisa quantitativa foi revelada uma predileção do programa por receptores do sexo feminino (os entrevistados do sexo masculino, em sua maioria, responderam que assistem Malhação raramente), e, ainda, que os métodos aplicados nesta pesquisa sugerem o acompanhamento de receptores que tenham uma assistência assídua ao programa, optamos por trabalhar com 6 jovens do sexo feminino. Apesar desta opção, ressaltamos que a questão do gênero não será tomada como base na formulação teórica e reflexiva dos dados coletados.

Como diz Duarte (2009, p. 69), “a seleção dos entrevistados em estudos qualitativos tende a não ser probabilística, ou seja, sua definição depende do julgamento do pesquisador e não de sorteio a partir do universo (...). Nesse caso, a seleção pode ser por conveniência, ou seja, “baseada na viabilidade. Ocorre quando as fontes são selecionadas por proximidade ou disponibilidade” ou de forma intencional, quer dizer, “quando o pesquisador faz a seleção por juízo particular, como conhecimento do tema ou representatividade subjetiva. Neste caso, ele pode selecionar conhecedores específicos do assunto (...)”. Entendemos que nossa seleção das 6 jovens foi feita de forma intencional, já que selecionamos a partir de um juízo particular, a partir de pessoas que conhecem Malhação e que de fato assistem ao programa.

Justificamos a escolha do número de jovens com as palavras de Gaskell (2002, p.71): “a fim de analisar um corpus de textos extraídos das entrevistas e ir além da seleção superficial de um número de citações ilustrativas, é essencial quase que viver e sonhar as entrevistas – ser capaz de relembrar cada ambiente (...)”. E, como diz Duarte (2009, p, 67), “nos estudos qualitativos, são preferíveis poucas fontes, mas de qualidade, a muitas, sem relevo”. Assim, buscamos resultados, interpretações e não apenas números; por isso, o número reduzido de entrevistas.

Em relação ao tempo necessário para a permanência no campo, Peruzzo (2009) afirma que não existe um período ideal e determinado, sendo que isso varia de acordo com o objeto, com o tempo que ele demora para se revelar ao pesquisador, com as condições em que ele se desenvolve e da capacidade do estudioso em captar as manifestações explícitas e implícitas do objeto estudado. Para evitar que a coleta de dados ficasse prejudicada por falta de tempo, iniciamo-la no mês de abril de 2011, a fim de manter contato com os jovens até o mês de fevereiro de 2012, totalizando de 10 a 11 meses de pesquisa de campo. Neste período, buscamos realizar três encontros com cada jovem. No primeiro, aplicamos uma entrevista em profundidade (apêndice A) a fim de analisar a relação do jovem com o programa Malhação e sua relação com as categorias elencadas. Em outro encontro, aplicamos a segunda entrevista em profundidade (apêndice B) para verificar o cotidiano do jovem, suas percepções sobre a juventude e sua interação com a sociedade e os meios de comunicação. No terceiro encontro, realizamos a observação participante através da assistência ao programa na TV. Estes procedimentos serão úteis para a compreensão das mediações da ritualidade e da socialidade. Concomitantemente com a etnografia, fizemos a análise das outras duas mediações (institucionalidade e tecnicidade), as quais dependem da assistência ao programa e da observação de suas lógicas de produção.

Em relação às jovens participantes deste estudo, salientamos que todas têm entre 12 e 16 anos, estudam em escolas públicas de Santa Maria e são consideradas de classe popular devido à profissão de seus pais. Todas assistem Malhação na TV praticamente todos os dias e, quando perdem um capítulo, assistem-no na internet ou informam-se sobre o programa com os amigos. Todas possuem televisor em casa, mas somente duas possuem acesso à internet, sendo que as demais frequentam lan houses ou a casa de amigos ou parentes. Seus nomes fictícios e suas idades são, respectivamente, Deise (16); Leila (15); Sabrina (13); Vanessa (13); Alice (12) e Yara (12).