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A Sociologia no Ensino Médio: contribuições e desafios

CAPÍTULO 2: O JOVEM NO CONTEXTO HISTÓRICO, POLÍTICO E

3. A Sociologia no Ensino Médio: contribuições e desafios

O jovem entre 15 e 17 anos, sujeito deste estudo, seja da escola pública ou privada corresponde a um universo bastante relevante, quando observamos o número de matrículas na série inicial do Ensino Médio no Estado de São Paulo, conforme os dados que serão apresentados a seguir. Os jovens que concluem a educação básica na idade prevista para essa conclusão se veem no dilema “o que fazer depois”.

Para os jovens de classe média, a continuidade dos estudos é quase sempre vista como uma sequência natural da vida escolar. Contudo, para os jovens das classes sociais mais baixas e que correspondem à quase totalidade do alunado da escola pública os desafios são outros: a necessidade ou o desejo de entrar no mercado de trabalho e dar continuidade aos estudos esbarram na formação precária, recebida ao longo da educação básica.

A formação precária neste caso está relacionada a um conjunto de fatores que estão presentes na escola pública. A política salarial, que para muitos não deveria ser o fator mais relevante no trabalho do professor, visto que ser professor é uma escolha, constitui-se num fator importante, na medida em que o professor é submetido a jornadas duplas ou triplas de trabalho, o que evidentemente interfere na qualidade. Contudo, o que temos observado é que a não valorização tem afastado o profissional da escola, perceptível no grande número de salas sem professor. Outros fatores como a formação do professor, estrutura física e de recursos da escola, vulnerabilidade social, cada um ao seu modo, também influenciam na qualidade do trabalho do professor e na expectativa de aprendizagem do aluno.

Para pensar a educação sob a perspectiva da disciplina de Sociologia no Ensino Médio, a partir dos conteúdos elencados pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, é necessário superar o ingênuo olhar em relação às atribuições creditadas à disciplina para formação do jovem aluno. No entanto, a Sociologia pode desempenhar um papel importante em sua formação, por meio de conceitos e temas, trazendo elementos para a compreensão da realidade na qual está inserido.

As relações conflitantes entre professores e alunos que hoje estão postas nas escolas, e que são mais perceptíveis nas escolas públicas, têm alimentado a falta de esperança em relação ao papel da escola. De um lado, temos os professores descontentes com a carreira docente e quanto ao seu real papel na formação do jovem. Por outro lado, os alunos não veem significado naquilo que lhes é passado.

Sobre esta situação de tensão e conflito na escola, Dayrell argumenta que Ao buscar compreender essa realidade, partimos da hipótese de que estas tensões e desafios existentes envolvendo a juventude são expressões de mutações profundas que vêm ocorrendo na sociedade ocidental, que afetam diretamente as instituições e os processos de socialização das

novas gerações, interferindo na produção social dos indivíduos, nos seus tempos e espaços. (DAYRELL, 2010, p. 66)

Diante dessa realidade, o autor enfatiza a importância da problematização da juventude atual, sua cultura e necessidades. Trazer para reflexão e compreensão esse novo modo de ser jovem, que se manifesta por meio de práticas e símbolos, colocando em evidência os novos processos de socialização e os conflitos com o sistema educacional na atualidade.

A superação dos conflitos no ambiente escolar requer principalmente o entendimento sobre as mudanças que vêm ocorrendo na sociedade e o quanto elas interferem no processo de socialização desses jovens. Os alunos desejam um modelo de escola que vá ao encontro das novas demandas sociais e geracionais.

Diante destes desafios, Dayrell acredita que o professor de Sociologia tem um importante papel a cumprir na escola:

Como sociólogo, ao buscar compreender quem são os jovens alunos que chegam ao Ensino Médio, contribuindo assim para que a comunidade escolar desnaturalize a visão que possui dos alunos, superando preconceitos e estereótipos, compreendendo-os como sujeitos sociais com demandas e necessidades próprias. Mas também como docente, ao fazer do jovem e sua realidade objeto de pesquisa e análise nas aulas de Sociologia (Dayrell, 2010, p. 66).

Procurar compreender os dilemas do jovem aluno na contemporaneidade implica, também, no entendimento das mudanças pelas quais a sociedade tem passado nos últimos anos. Na cidade de São Paulo, o grande número de jovens que chegam à escola pública, é oriundo de famílias que vieram de diversas localidades trazendo na bagagem cultural vivências e experiências diferentes. Esta realidade tão heterogênea se materializa na escola sob a forma de conflitos, percebidos pelas diferenças sociais, culturais e a exclusão social.

De acordo com Baciano (2011), as pesquisas realizadas entre os anos de 2007 a 2009 sobre Juventude e Escola evidenciam a distância entre as práticas escolares instituídas e a realidade sociocultural dos alunos. Os conflitos na escola muitas vezes estão relacionados à falta de interesse dos alunos ao que é proposto pela escola. Esta deixou de ser para os jovens um espaço de conhecimento e

aprendizagem, mas o percurso obrigatório para a obtenção do certificado, além de espaço de socialização, conforme já mencionado.

Os conteúdos apreendidos nas aulas de Sociologia contribuem para o aprimoramento do educando como pessoa, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico, preparando-o para o exercício da cidadania?

Os temas elencados pelos elaboradores do currículo de Sociologia trazem elementos conceituais e teóricos que possibilitam uma reflexão acerca da realidade social, problematização de situações do cotidiano dos alunos, assim como a propicia a aproximação dos alunos com temáticas que dizem respeito à realidade dos mesmos.

Crochik (2009) argumenta que o progresso da educação, assim como o progresso em geral não pode ser pensado linearmente. A escola desenvolve competências para o trabalho e para a vida, sem que se possa pensar o porquê de elas serem necessárias.

Nesta direção, Gohn pontua:

Há que se buscar as raízes culturais destes jovens e não apenas o modelo importado, com modismos que foram criados para incluir outras culturas, ou para modelar uma cultura global. Uma outra urgência: incluir na estrutura curricular das escolas disciplinas que trabalhem a formação e o desenvolvimento de valores, baseadas em princípios da solidariedade, ética, justiça social, cidadania, respeito ao outro, reconhecimento das diferenças socioculturais etc. (GOHN, 2010, p. 105)

É preciso fazer da escola um espaço de aprendizagens significativas, alinhadas com a contemporaneidade e com as tecnologias. De acordo com Gohn (2010, p. 105), “articular a escola com entidades que desenvolvem projetos e programas de educação não formal é outra grande saída para a educação básica no Brasil”.

3.1 – Um retrato do Ensino Médio no cenário educacional da rede pública do Estado São Paulo

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN 9394/96 considera que o Ensino Médio, dado seu caráter formativo e enquanto última etapa da educação básica deve proporcionar ao educando os elementos teóricos necessários para a conformação da cidadania e para o ingresso no mercado de trabalho.

De acordo com Oliveira (2010), a LDB define o Ensino Médio como a:

Conclusão de um período de escolarização de caráter geral, como parte de uma etapa de escolarização que tem por finalidade o desenvolvimento do indivíduo, assegurando-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania, fornecendo-lhe os meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores, como disposto em seu art. 22.

Para a autora, o Ensino Médio tem enfrentado o que se pode chamar de uma crise de identidade, tendo em vista a dificuldade de caracterização dessa etapa da educação básica. Ao mesmo tempo em que traz a noção de terminalidade (conclusão de uma formação completa), não se configura em um ensino que atribui aos concluintes uma profissão e vê-se diante da função de formação para estudos posteriores, com caráter mais geral e propedêutico.

As escolas de Ensino Médio, em especial da rede pública estadual e municipal enfrentam de forma mais contundente as dificuldades para oferecer de maneira eficaz o ensino técnico profissionalizante, o que tem fomentado o debate acerca do papel formador do Ensino Médio como capacitador para o trabalho.

A oferta de vagas no Ensino Médio aumentou de forma expressiva nas duas últimas décadas. No entanto, apesar das conquistas no acesso escolar, a não permanência do jovem na escola conforme os dados que serão apresentados adiante continua a ser um grave problema, carecendo de mudanças que transformem a escola em um espaço capaz de promover uma aprendizagem significativa para os jovens alunos.

Em relação às políticas públicas para o Ensino Médio, o Ministério da Educação – MEC propôs o Programa Ensino Médio Inovador que consiste na promoção de “inovações pedagógicas das escolas públicas de modo a fomentar mudanças necessárias na organização curricular desta etapa educacional e o reconhecimento da singularidade dos sujeitos que atende”. (BRASIL, 2009)

Sobre os problemas relativos ao Ensino Médio, Oliveira (2009) argumenta que o enfrentamento:

Passa necessariamente por políticas que promovam, nos Estados, condições mais equitativas de oferta que considerem as disparidades econômicas refletidas, sobretudo, na desigualdade regional e social que o País comporta. A ausência de políticas regulares que possibilitem diminuir as defasagens entre as condições oferecidas pela grande diversidade de redes públicas precisa ser superada. A obrigação constitucional dos Estados para com a oferta educativa no Ensino Médio deveria vir acompanhada de políticas estáveis que permitam tal oferta de forma digna a todos os cidadãos em condições de cursá-lo. (OLIVEIRA, 2009, p. 276)

No Estado de São Paulo o cenário do Ensino Médio não é diferente do observado no Brasil. Da mesma forma é possível inferir que houve um aumento significativo no número de matriculas na série inicial do Ensino Médio nos últimos três anos conforme demonstra o gráfico 01 abaixo. Entretanto, os dados dos gráficos apresentados a seguir indicam o quanto o Ensino Médio está distante de alcançar a universalização, ou seja, de atender a toda a população entre 15 e 17 anos.

Gráfico 01

Fonte: Fundação Seade – 2010

G r á f i c o 0 2 F o n t e : F u n d a ç ã o S e a d e – 2 0 1 0 G r á f i c o 0 3 F o n t e : F u n d a ç ã o S e a d e - 2 0 1 0

- São Paulo

- São Paulo

G r á f i c o 0 4

F o n t e : F u n d a ç ã o S e a d e - 2 0 1 0

Os gráficos 2, 3 e 4, respectivamente evasão, reprovação e aprovação permitem uma leitura preocupante em relação ao Ensino Médio paulista atual. O acesso é garantido a todos os jovens pela rede pública do Estado de São Paulo, contudo a permanência até a 3ª série e a conclusão tem sido o maior desafio para a Secretaria da Educação.

Com base nos dados do gráfico 2, podemos inferir que a taxa de evasão em 2010 sofreu um acréscimo em relação ao ano de 2009, passando de 4,7% para 5,3%, evidenciando que o Ensino Médio não tem atendido às expectativas dos jovens. A falta de perspectivas em relação ao que o Ensino Médio pode proporcionar para a inserção no mercado de trabalho, tem afastado o jovem da escola.

O crescente índice de evasão no Ensino Médio, conforme pesquisa coordenada por Neri (2009) com base nos dados do suplemento de educação da PNAD- 2006, trazem as seguintes motivações para a evasão: dificuldade de acesso à escola (10,9%); necessidade de trabalho e geração de renda (27,1%); falta de interesse (40,3%) e outros motivos (21,7%).

Gráfico 05

Fonte: Fundação Seade - 2010

É possível observar nos dados dos gráficos 01 e 05, quanto ao que se refere ao número de ingressantes e o número de concluintes no Ensino Médio, nos últimos três anos na rede pública estadual, que o número de jovens que entram na 1ª série e desistem ao longo do curso é extremamente elevado. Em 2008, das 1.483.839 matrículas inicias, somente 335.411(22,6%) estudantes concluíram, o que significa que 1.148.428 (77,4%) jovens não terminaram a educação básica no curso regular.

Além dos dados levantados por Neri (2009), de acordo com Giovinazzo Jr. (2003) o desinteresse demonstrado pelos jovens do Ensino Médio está diretamente relacionado à falta de perspectivas de construção de projetos para o futuro e pelo sentimento de impotência de superação dos problemas sociais. Percebe-se que a forma como vem ocorrendo a escolarização dos jovens no Ensino Médio carrega em si a relação dos jovens com a sociedade. O que permite pensar que a escola está associada às possibilidades de inserção e participação social dos jovens. (GIOVINAZZO, 2003 apud BACIANO, 2011, p. 71)

No próximo capítulo, traremos as contribuições dos alunos de uma escola pública e uma escola privada, sujeitos da investigação empírica, pela técnica de grupo focal e narrativas de história oral, a fim de verificar a contribuição da Sociologia na formação dos jovens.