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4.2 OS DOCUMENTOS CITADOS

4.2.2 A temática dos trabalhos citados

Como a Ciência da Informação é um campo interdisciplinar, acredita-se que ela se apóie em teorias e conceitos de diversas áreas do conhecimento. O que pode ser evidenciado a partir dos trabalhos citados, que são, assim, utilizados como bases teóricas da área. Na presente pesquisa, a identificação da temática dos trabalhos citados possibilitou verificar de quais áreas são os trabalhos citados e, conseqüentemente, de que áreas advêm as teorias que influenciam ou causam algum impacto na produção do conhecimento na Ciência da Informação brasileira.

Saracevic (1999) justifica a interdisciplinaridade também por uma razão interna, que está relacionada ao movimento epistemológico interno, oriundo de problemas da área que

não conseguem ser respondidos por construtos ou abordagens de uma única disciplina. Gomes (2001, p. 7) adverte que:

A Ciência da Informação padece do conflito entre a sua natureza interdisciplinar e a necessidade de delimitação de suas fronteiras. Frente a isso talvez fosse interessante refletir que sua característica interdisciplinar apenas lhe confere um estatuto mais aberto e flexível, capaz de assegurar reordenações mais constantes e um exercício científico mais próximo de um novo paradigma da construção do conhecimento, o que não reduz a necessidade de definição do seu núcleo disciplinar.

Diante disso, a temática dos trabalhos mais citados (citados no mínimo duas vezes) foi analisada e classificada. A classificação dos trabalhos citados pautou-se na Taxonomia para a Ciência da Informação desenvolvida por Oddone e Gomes (2004), e em categorias pré-definidas nos estudos desenvolvidos por Mikhailov, Chernyi e Gilyarevsky (1969), Pinheiro e Loureiro (1995), Saracevic (1996), Pinheiro (1999), Silva e Ribeiro (2002), Le Coadic (2004) e Targino (1995; 2006), que destacam a interdisciplinaridade na Ciência da Informação e indicam as áreas que com ela se relacionam.

Observou-se que a maioria dos trabalhos citados é da própria área de Ciência da Informação (28,8%), seguida por trabalhos de Biblioteconomia (21,46%), isto pode indicar a grande influência da Biblioteconomia na Ciência da Informação brasileira.

Dias (2002) entende a Ciência da Informação como um campo de encontro de várias especialidades, como a Biblioteconomia e a Documentação, e inclusive a Ciência da Informação propriamente dita. A citação de trabalhos da Ciência da Informação indica um fortalecimento da área e a consolidação dos seus estudos. Demonstra que ela possui um corpo de conhecimentos que é utilizado como base intelectual para outros estudos, como defende Le Coadic (2004). Para esse autor, gradativamente foram elaborados conceitos, métodos, leis e teorias próprios da Ciência da Informação. O autor coloca a freqüência de publicação de periódicos, o sistema de gerenciamento de bases de dados, a citação, o hipertexto, a obsolescência, o impacto, a classificação e a relevância como conceitos da área. Refere-se também a conceitos que foram desenvolvidos em outras disciplinas e que são usados nesse campo; como métodos, indica os de análise dos documentos e da informação, como a catalogação, e ainda métodos de análise de co-citações e a análise de termos associados; como leis, indica as leis bibliométricas: lei de Bradford, de Lotka e de Zipf; e, como teorias, refere-se à teoria matemática da informação, às teorias das mídias de massa e à teoria da comunicação interativa.

Ciência da Informação 28,8% Biblioteconomia 21,46% Administração e Gestão 12,8% Epistemologia e Filosofia da Ciência 5,24% Sociologia 6,6% Outros Psicologia 0,49% Semiótica 0,24% Ciência Cognitiva 0,49% Política 0,97% Economia 1,21% Educação 1,46% Estatística 1,7% Informática 3,53% Linguística 4,02% Documentação 4,51% Comunicação 4,9%

Gráfico 3 - Áreas dos trabalhos citados em Ciência da Informação, no Brasil Fonte: Dados da pesquisa.

O aparecimento da Biblioteconomia como predominante entre as áreas dos trabalhos citados pode estar relacionado à sua forte ligação com a Ciência da Informação, no Brasil, ligação já reconhecida por Saracevic (1996), devido à preocupação com a utilização dos registros gráficos; por Mostafa (1996), que defende que a Ciência da Informação surge no espaço deixado pela Biblioteconomia; por Pinheiro (2006), que afirma que essa relação tem origem nas escolas de Biblioteconomia; por Oliveira (2005), quando ressalta que, mesmo balizadas por paradigmas distintos, a Ciência da Informação desenvolveu-se ligada à Biblioteconomia. Pinheiro (2005, p. 4) complementa que

[...] enquanto a Biblioteconomia está concentrada no processamento de documentos e nas técnicas correspondentes, a Ciência da Informação cobre o fluxo da informação ou transferência da informação e abarca desde a sua origem, isto é, a geração, num processo que aproxima do conhecimento, ou como os cientistas produzem informação, o que inclui o ciclo da pesquisa e criação.

A grande relação entre a Ciência da Informação e a Biblioteconomia, no Brasil, também decorre da vinculação do ensino das duas áreas. Oliveira, Mota e Urbizagastegui Alvarado (2004) colocam que “o ensino na área se dá em dois níveis, sendo o primeiro em nível de graduação em Biblioteconomia [...] e o segundo em nível de pós-graduação em Ciência da Informação.”

Destacam-se também os trabalhos citados de Administração e Gestão (12,8%), de Sociologia (6,6%) e de Epistemologia e Filosofia da Ciência (5,24%). Os trabalhos dessas

áreas são usados em temas periféricos que, embora muito ligados à disciplina de origem estão firmemente ligados ao campo da Ciência da Informação (LE COADIC, 2004).

A relação com a Administração e a Gestão é vista por Pinheiro (2005) como cada vez mais forte. A citação de trabalhos desses campos pode relacionar-se ao fato de que estejam, recentemente, discutindo a questão do conhecimento (PAIM et al., 2001).

A citação de materiais de Sociologia pode estar relacionada ao fato que a Ciência da Informação recebe das Ciências Sociais o seu traço identificador, que serve de princípio articular das diversidades da área (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2000). As influências teóricas advindas da Sociologia são utilizadas nos estudos de co-laboratórios, de comunidades científicas e de produtividade científica (LE COADIC, 2004).

Entretanto, surpreende a posição pouco expressiva, nesta pesquisa, de campos já consagrados na literatura, como a Ciência da Computação ou Informática e as Ciências Cognitivas, que autores, como Pinheiro e Loureiro (1995) e Saracevic (1996), afirmam possuir as relações mais eminentes com a Ciência da Informação.

Com base nos resultados expostos, verifica-se que as influências teóricas na área advêm, principalmente, dos estudos realizados em Biblioteconomia, Administração e Gestão, e Sociologia. Mas como um campo interdisciplinar, a Ciência da Informação recorre a teorias de distintas áreas, o que é verificado através das citações feitas aos trabalhos de Psicologia, Educação, Estatística, Semiótica, entre outras.

Os resultados obtidos nesta análise demonstram que as relações que a Ciência da Informação estabelece com outras áreas dependem do enfoque e abrangência de cada pesquisa. Com esse ponto de vista corrobora Pinheiro (1999, p. 178) pois, para essa autora, existe “um conjunto intermediário de disciplinas que flutuam em níveis de intensidade que variam de acordo com a abordagem de cada pesquisa, e outras que parecem ter se tornado mais frágeis, no decorrer do tempo”. Tudo isso ocorre devido à Ciência da Informação estar envolvida com “o processo de comunicação e informação que se desenvolve em diferentes territórios científicos, tecnológicos, educacionais, sociais, artísticos e culturais, portanto, múltiplos contextos e condições experimentais.”

Dessa maneira, o perfil delineado para a Ciência da Informação, como campo científico, a coloca numa área de circulação que se poderia denominar de fronteiriça a outros ramos do conhecimento científico, principalmente devido aos problemas pesquisados, que se relacionam à informação e envolvem um nível elevado de complexidade (GOMES, 2001). Ao trabalhar nesses espaços fronteiriços, surge a busca da interdisciplinaridade. Entretanto, como destaca Oliveira (2005), é preciso cuidar para que a interdisciplinaridade não ocorra

sem muita reflexão, o que pode gerar vulnerabilidade, por não resolver o problema da fragmentação.