• Nenhum resultado encontrado

A Teoria Histórico-Cultural e a Matemática

3 O ENSINO E A APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA: PRINCÍPIOS E

3.3 A Teoria Histórico-Cultural e a Matemática

Alguns pesquisadores como Damazio (2009; 2013); Rodrigues e Sforni (2010); Moura (1992); Moraes (2008; 2009); Cedro (2007; 2008); Moysés (2012) basearam-se na teoria histórico-cultural para pensar sobre o ensino da Matemática na atualidade e elaborar sugestões metodológicas. A partir das premissas dessa teoria, foi possível enquadrar a disciplina da Matemática, utilizando dos conceitos anteriormente discutidos, como a Teoria da Atividade e a Aprendizagem de Conceitos teóricos/abstratos. Entretanto, Peres e Freitas (2014) discutem como ainda tem sido difícil verificar a aplicação dessa teoria, para o ensino da Matemática nas escolas:

Como a apropriação de conceitos não ocorre de forma independente do desenvolvimento das capacidades psíquicas, consequentemente, ensinar conceitos científicos na escola significa a ensinar a pensa-los, formando as capacidades psíquicas a eles correspondentes. É o que se esperaria que ocorresse no ensino da Matemática: ensino de conceitos matemáticos com consequente desenvolvimento de ações mentais e capacidades psíquicas de realizar operações matemáticas. Todavia, ainda não se percebe, de forma expressiva, a presença desse tipo de preocupação em relação à qualidade de aprendizagem de conceitos matemáticos para a Educação dos estudantes na escola brasileira contemporânea (PERES; FREITAS, 2014, p. 18).

Para essas autoras, a sugestão seria basear o trabalho na teoria descrita por Davidov, sobre a apropriação de conceitos teóricos pelos alunos. “O ensino focado na formação de conceitos é, portanto, a forma de ensino pela qual os alunos conseguem compreender a origem dos objetos de conhecimento que estão aprendendo em uma matéria escolar” (PERES; FREITAS, 2014, p. 20). Além disso, a formação de conceitos teóricos retrata um conhecimento amplo, sistêmico, no qual expande o entendimento dos conteúdos vivenciados e aprendidos na escola.

Como relatam Catanante e Araújo (2014, p. 53), sobre a aprendizagem da Matemática nessa perspectiva teórica, consideram que essa deve ser encarada enquanto “conteúdo e processo de pensamento, pois a apropriação do saber escolar, mediante o acesso ao conhecimento sistematizado, está relacionada à formação de um pensamento complexo, que levará à compreensão de um saber além do cotidiano”. Dessa maneira, sugerem que o ensino

amplie suas vivências na busca de um conhecimento teórico, desprendendo das metodologias que visam o reducionismo do “concreto”, vinculado ao saber empírico.

Em conformidade com a teoria elaborada por Davidov, o ensino teórico não é a simples continuidade ou aprofundamento do conhecimento cotidiano. Dessa forma, Catanante e Araújo (2014, p. 55) sugerem que, “a escola deve começar o ensino da Matemática por operações não espontâneas da atividade de estudo, tais como levantar hipóteses, delimitar perguntas, estabelecer relações”. Assim, inicia-se pela aprendizagem de conhecimentos mais gerais, para depois passar para as particularidades. As autoras consideram que realizar o trabalho dessa forma “não é ignorar o conhecimento empírico, mas ir além, por meio do movimento de abstração de conceitos” (CATANANTE; ARAÚJO, 2014, p. 55).

No caso da aprendizagem de conceito de número, parte-se do conhecimento cultural que a criança possui sobre os números, do levantamento de suas hipóteses, da observação das relações que estabelecem entre esses conhecimentos cotidianos para, em seguida, aprofundar nos conceitos científicos acerca do número.

De acordo com a abordagem Histórico-Cultural, o processo de apropriação das significações do conceito de número pelas crianças se efetiva nas relações que elas estabelecem com o mundo, que são determinadas pelas condições produzidas social e historicamente. É nas vivências cotidianas, informais ou formais, que se desenvolvem e se manifestam as ideias que caracterizam os conceitos matemáticos (DAMAZIO; ALMEIDA, 2009, p. 66).

Os conceitos cotidianos e os conceitos científicos tornam-se parceiros na tentativa de se aproximarem mutuamente, sendo esse o papel da escola, já mencionado anteriormente: a apropriação de saberes científicos. Entretanto, para que isso se efetive, de acordo com Damazio e Almeida (2009, p. 66), é preciso “estudar os conceitos cotidianos das crianças, não para simples identificação, mas como forma de buscar os elementos neles contidos e para mediar o processo de apropriação dos conceitos científicos”.

Partindo dessa premissa, identificar o que a criança já sabe sobre conceitos matemáticos, seria apontar com detalhes esses conhecimentos, isto é:

Onde os reconhecem ou veem, para que servem, a manifestação de procedimentos de contagem, quantidade/limite de contagem, o estabelecimento de relação entre símbolo e quantidade, o uso de instrumentos de medida; enfim, identificar os “significados” atribuídos ao número (DAMAZIO; ALMEIDA, 2009, p. 68).

Além do resgate das hipóteses do conhecimento matemático provido do meio sociocultural trazido pelas crianças, os conteúdos matemáticos a serem estudados partem do contexto histórico e podem ser considerados “relevantes elementos científico-culturais a serem apropriados, mediante o processo educativo escolar” (PERES; FREITAS, 2014, p. 11). Sendo assim, contar, operar com números, é apropriação cultural direcionada ao conhecimento teórico.

Entretanto, como essa forma cultural não se desenvolve de forma espontânea na criança, entra o papel do professor de promover interações com a criança, mediadas por significações conceituais de números, como forma de superação dos processos primitivos de percepção natural de quantidades para formas mais complexas de desenvolvimento, envolvendo a abstração e a generalização. A criança começa a compreender o caráter limitado de sua aritmética quando recorre às mediações culturais do conceito. Na passagem da percepção direta da quantidade à mediada, a criança consegue igualar as quantidades fazendo uso de signos (algarismos). Substitui as operações com objetos por operações com sistema numérico. (DAMAZIO; ALMEIDA, 2009, p. 70).

A transposição da utilização de objetos para símbolos numéricos passa a ser um processo, mediado pelas proposições metodológicas do professor, levando elementos culturais da utilização do número/símbolo para o contexto da sala de aula. Entretanto, a apropriação do conceito abstrato de número vai além do simples reconhecimento. É preciso que os alunos observem, comparem, relacionem quantidades, de forma que a aprendizagem teórica do número aconteça.

Moraes e Moura (2009) explicam sobre esse processo:

A simples identificação e escrita dos numerais e a resolução automática das operações não significa a apropriação do conceito de número e das operações pelos escolares, isto é, que eles pensem numericamente. Para atingir esse pensamento, que é teórico, é preciso que as crianças tenham a oportunidade de realizar atividades que as mobilizem a pensar sobre os conceitos que envolvem o sistema de numeração (base, valor posicional, correspondência um-a-um, agrupamento, notação simbólica) em relação (MORAES; MOURA, 2009, p. 111).

Sendo assim, pensar numericamente consiste em colocar esse conteúdo acerca do número em relação com diversas situações práticas, sendo importante a inclusão do conhecimento dos signos numéricos à medida que a criança for se apropriando das primeiras abstrações.

Damazio e Rosa (2013, p. 43) relatam sobre a proposta de Davidov em iniciar o conhecimento teórico desde a primeira série escolar. Entretanto, sugere primeiramente a “comparação entre grandezas (comprimento, superfície, peso, volume e outros) e uso de materiais (tiras de papel, palitos, blocos)”. Em seguida, o registro das noções adquiridas por linhas desenhadas em papel, sem utilizar ainda os signos numéricos. Por último, a inserção de letras e símbolos, considerando as primeiras abstrações das crianças.

Sobre a necessidade de trabalhar os conceitos em relação, de modo a desvelar a essência dos mesmos, Moraes (2008) explica a maneira como Davidov sugere o trabalho:

Davidov (1982) trabalha essa questão da seguinte forma: para que as crianças se apropriem do objeto matemático é necessário que elas, no início da escolarização (crianças por volta dos sete anos), não trabalhem diretamente com os números formalizados. Durante os primeiros meses na escola (um semestre), é preciso que as crianças assimilem, com bastante detalhes, os conhecimentos sobre as grandezas/medidas destacadas nos objetos físicos e se familiarizem com suas propriedades fundamentais. Dessa forma, as crianças, operando com objetos reais e destacando neles os parâmetros das grandezas (peso, volume, superfície e longitude, etc.), aprendem a comparar as coisas por uma ou outra grandeza, determinando a igualdade e a desigualdade das mesmas. Em seguida, as crianças anotam essas relações utilizando-se de signos (MORAES, 2008, p. 77).

O conhecimento numérico para as crianças, também é sugerido na teoria histórico- cultural, partindo das situações que revelem a gênese desse conhecimento, sua essência. Uma forma para que isso aconteça metodologicamente em sala de aula, é partir de “situações- problema que revelem para a criança o modo de produção humana desse conceito sobre o controle de quantidades trabalhando-se esse conhecimento em relação com as grandezas” (MORAES, 2008, p. 75).

Primeiramente, compete ao professor conhecer a gênese do conceito dos conteúdos a serem trabalhados, com ênfase na origem histórica do conceito. Assim, será mais tranquilo elaborar situações de ensino-aprendizagem que provoquem esse conhecimento nas crianças, sem que seja, necessariamente, por meio de atividades apenas sensoriais, as quais se estabelecem no campo empírico.

Quando o conhecimento se dirige para a abstração de conceitos, partindo da gênese desse conhecimento, é possível fazer generalizações e transposições para outras vivências. Ao estabelecer esse objetivo, os professores “conseguem desenvolver atividades de ensino que envolvam as propriedades internas e suas interconexões, possibilitando, assim, a apropriação

do conceito científico e o desenvolvimento do pensamento teórico em Matemática” (MORAES; MOURA, 2009, p. 111).

Em consonância com esse entendimento, Moraes (2008, p. 82) reforça a ideia da apropriação de conceitos partindo da reprodução deles com sua origem, afirmando que “para isso, é importante que as atividades propostas às crianças partam de situações-problema semelhantes às vividas pelo homem no processo de criação do conceito”. Essa proposta reflete situações que buscam a essência do conceito, “isso implica que a história da Matemática que envolve o problema desencadeador não é a história factual, mas sim aquela que está impregnada no conceito ao se considerar que esse conceito objetiva uma necessidade humana colocada historicamente” (MORETTI, 2007, p. 98).

Tanto o desenvolvimento do trabalho nessa perspectiva pela busca da essência do conteúdo, inserida na história humana, quanto a aprendizagem do conhecimento teórico, sem desmerecer o conhecimento cotidiano, são ações sugeridas pela teoria histórico-cultural, mas que requerem pensar em mais um elemento que compõe todas essas ações: a Atividade, baseada na teoria desenvolvida por Leontiev.

Fazer a passagem, de conhecimento cotidiano para o conhecimento teórico e iniciar a utilização dos recursos com signos, sistema numérico, é um caminho pelo qual a criança precisa percorrer, sendo capaz de realizar abstrações mentais. De acordo com a Teoria da Atividade, para que a criança modifique a operação utilizada para uma ação mental, essa deve estar vinculada à solução de um problema, como o cerne da atividade para o momento, a qual tenha sentido para ela.

A soma, por exemplo, pode ser tanto uma ação como uma operação. A criança domina-a como uma operação precisa; os meios com os quais ela (a operação) começa são a contagem de um em um. Entretanto, mais tarde são- lhe dados problemas cujas condições exigem que números sejam acrescentados (para ela descobrir isso e aquilo será necessário acrescentar esse e aquele número). A ação mental da criança deve tornar-se então a solução de um problema e não uma simples soma; a soma torna-se operação e deve, por isso, adquirir a forma de hábito automático adequadamente desenvolvido (LEONTIEV, 2001, p. 76).

Para a adequação da teoria da atividade a um trabalho metodológico ao ensino da Matemática, Manoel Oriosvaldo de Moura (1992) propôs, baseado nessa teoria, a Atividade Orientadora de Estudo. Essa tem como objetivo, utilizar como base o conceito de Atividade para organizar ações que favoreçam o aprendizado.

No caso da escola, pode-se dizer que existe a atividade de ensino e a atividade de aprendizagem, vinculados, respectivamente, ao papel do professor e ao papel do aluno, sendo

que a atividade de ensino condiciona e cria bases para a aprendizagem. No caso da Atividade Orientadora de Ensino (AOE), podemos ver que, “as duas, em sua interdependência, promovem a formação e o desenvolvimento de ambos os sujeitos do processo de ensino- aprendizagem-desenvolvimento: professores e alunos” (PUENTES, LONGAREZI, 2013, p. 15).

Para Marco (2013),

É importante que as atividades orientadoras de ensino estejam carregadas de intencionalidade por parte do proponente; que haja um motivo que permita estabelecer metas e objetivos bem definidos para a criação de estratégias que irão compor o plano de ação daquele que a propõe, pois sua finalidade maior é o ensino (de Matemática, no nosso caso) (MARCO, 2013, p. 320).

A atividade orientadora de ensino contribui sobremaneira ao processo de aprendizagem, pois as metas e os objetivos são estabelecidos com base em motivos, relacionados aos alunos em questão. Os motivos são condições que sustentam tais ações, e que promovem a aprendizagem, consequência do ensino. A AOE se torna um elemento que faz a ligação entre aquele que tem a intenção de ensinar, e o sujeito que aprende.

De acordo com Cedro e Moura (2007, p. 39), a atividade orientadora de ensino, tem como objetivo “o papel de elemento organizador e formador da aprendizagem da criança, [...] dar forma ao modo teórico por meio do qual um problema pode ser solucionado em uma situação de aprendizagem”. Assim, a atividade estrutura o modo de interagir com o conteúdo, estabelecendo significados, em prol da resolução de uma situação-problema.

Nina Fiodorovna Talizina, psicóloga que trabalhou na Faculdade de Psicologia da Universidade de Moscou, aprofundou estudos com relação à elaboração e aplicação da concepção psicológica da Atividade, contribuindo com as implicações dessa teoria no processo pedagógico. Além disso, “suas investigações se dirigiram para questões específicas do processo de apropriação dos conceitos matemáticos, em situação de ensino aprendizagem” (DAMAZIO, ROSA, 2013, p. 43).

Talizina (2000, 2010) esclarece que é necessária a elaboração da base orientadora da ação pelo professor, para que a criança, no caso a pré-escolar, faça as generalizações pertinentes à ação proposta, sendo que no contrário, ela utilizará a que mais lhe chame a atenção.

Por exemplo, crianças generalizam as características de altura e tamanho dos objetos, se esses parâmetros estão incluídos no guia com base na ação. Mas,

se o professor não organizar a orientação da criança, a única coisa que resta é ver o que é visível e marcante em objetos, independentemente dos aspectos significativos da ação realizados com esses objetos (tradução nossa) (SOLOVIEVA E ROJAS, 2013, p. 360).

Além disso, Talizina (2010) sugere que as crianças possam generalizar e abstrair conteúdos, de forma que sejam mediatizados pela ação do professor e de outros elementos da atividade a ser proposta. A autora retoma e reforça o conceito desenvolvido por Vygotsky para basear seu pensamento, mostrando novos fatos psicológicos.

Talizina, de acordo com Solovieva e Rojas (2013, p. 361), assevera que, "O sucesso intelectual das crianças não depende inteiramente da idade e seu ambiente social, mas a forma de interação pedagógica que adulto que proporciona, dentro da „zona de desenvolvimento proximal”.

Outra ideia que Talizina destaca, é a aproximação do conhecimento com a ação, mediatizado pelo professor, e utiliza uma frase metafórica, relatada por Solovieva e Rojas (2013, p. 364) para representar essa ideia: “o conhecimento sem ação é vazio, enquanto a ação sem conhecimento é cega”.

É importante destacar que a ação se relaciona com a atividade principal do sujeito/criança que, como mencionada anteriormente, está relacionada à brincadeira. Quando a criança se insere no Ensino Fundamental, a atividade principal, de acordo com a teoria desenvolvida por Leontiev, é o estudo. Entretanto, ao reportar às crianças brasileiras e como está organizado o sistema de ensino no Brasil, quando a criança insere no primeiro ano do Ensino Fundamental, sua idade ainda se refere à idade pré-escolar, mencionada por Leontiev, seis anos.

Dessa maneira, pode-se considerar que a criança, ao ingressar no Ensino Fundamental, requer que sua atividade principal ainda seja permeada por situações lúdicas, mediadoras da aprendizagem dos conceitos científicos já relatados.

Rabinovich (2012, p. 5), em sua pesquisa sobre a transição das crianças da Educação Infantil para o Ensino Fundamental, considera que o lúdico deve permanecer nos primeiros anos desse segmento de ensino, afirmando: “o lúdico deve continuar presente nas séries iniciais do Ensino Fundamental, pois as crianças de seis, sete, oito anos também têm necessidade de brincar”. Essa autora baseia-se na teoria histórico-cultural, tomando como referência os estudos de Vygotsky e Leontiev e sugere que, “as habilidades conceituais das crianças são adquiridas e expandidas por meio dos jogos, das brincadeiras e dos brinquedos.

Nessas situações, a criança tem a capacidade de usar a imitação e a memória reproduzindo situações da vida real” (RABINOVICH, 2012, p. 69).

As crianças, entre cinco e sete anos de idade, mantêm-se nesse lugar de infância, independente da periodização que o sistema educacional as posiciona, seja na Educação Infantil ou Ensino Fundamental. Porém, com a entrada das crianças com seis anos no Ensino Fundamental, parece que as pessoas responsáveis pelo currículo escolar justificam uma necessidade de realizar uma ruptura do caráter lúdico, imaginativo e criativo, que a infância demanda, colocando no lugar a sistematização de conteúdos das áreas de ensino desvinculados da demanda infantil.

Nascimento (2003, p. 108) alerta que é manifestado entre as pessoas, “ter como objetivo preparar a criança para o futuro (a escola fundamental) e, em certa medida, até antecipá-lo, ao invés de permitir que ela viva o presente como etapa necessária para o que está por vir”. A preparação para o Ensino Fundamental se tornou condição prévia ao trabalho pedagógico, provocando uma antecipação da sistematização curricular, desde a Educação Infantil. Sendo assim, a preocupação com a atividade principal da criança, como condição real ao seu desenvolvimento, o brincar, fica deixado em segundo plano.

Para que não aconteça a preparação e nem uma ruptura entre os dois segmentos de ensino, é preciso que, tanto a Educação Infantil, quanto o Ensino Fundamental, coloquem a criança como ponto de partida para a organização curricular, de espaço e de tempo. O aprender para a criança está muito mais além do que conhecer os conteúdos curriculares, fechados e pré-determinados. Olhar para criança “exigiria compreender que, para ela, conhecer o mundo envolve o afeto, o prazer e o desprazer, a fantasia, o brincar e o movimento, a poesia, as ciências, as artes plásticas e dramáticas, a linguagem, a música e a matemática” (KUHLMANN JR., 2003, p. 65).

Ao considerar as demandas infantis da criança, que está imersa no primeiro ano de Ensino Fundamental, como ponto de partida, será possível compreender e vislumbrar ações que mantenham o brincar e o estudo como atividades que possam acontecer mutuamente, em prol de sua aprendizagem e desenvolvimento.

Ao se pensar na organização do ensino para as crianças dessa faixa etária, considerando esse momento de convergência e transição da atividade lúdica para a atividade de estudo, não se deve apenas somar duas atividades, reservando o tempo e o espaço para cada uma delas, unindo apenas formalmente duas atividades no contexto de sala de aula, mantendo-as incomunicáveis entre si. Faz-se necessária a condução pedagógica para permitir que essas duas atividades se interpenetrem e interajam entre si, num

movimento dialético, permeando a atividade de ensino e aprendizagem (MAREGA; SFORNI, 2011, p. 147).

Por outro lado, quando essa confluência de ações em torno das atividades de brincar e estudar não acontece, priorizando apenas o estudo e a sistematização do ensino, as ações se tornam desconexas com a realidade do comportamento e desenvolvimento infantil. Como consequência, o ensino poderá não promover aprendizagem.

Cedro e Moura (2007, p. 41), ao estudarem as atividades orientadoras de estudo para o ensino da Matemática, sugerem que, “para a criação das condições necessárias para a formação dos conceitos matemáticos, as atividades de ensino são desenvolvidas com base nas atividades lúdicas, mais especificamente por meio de jogos”.

Leontiev explica que a única atividade que é caracterizada por uma estrutura em que o motivo está no próprio processo, é a brincadeira, sendo que a satisfação da necessidade é o próprio conteúdo do processo real da atividade dada. (LEONTIEV, 2001, p. 119).

A situação de ensino e aprendizagem da Matemática, baseada na teoria histórico- cultural, dirigida às crianças da Educação Infantil e série inicial do Ensino Fundamental, precisa, necessariamente, estar voltada às atividades lúdicas, sendo essa, a atividade principal desse sujeito, bem como já mencionado anteriormente.

Vários outros pesquisadores da atualidade que utilizam dessa corrente teórica afirmam sobre essa questão. Moretti (2007) afirma:

Assim, por exemplo, estando diante da necessidade de ensinar a seus alunos o conceito de número, o professor pode definir que uma ação importante é colocar os alunos diante da necessidade de controlar variações quantitativas. Escolhido o instrumento que pode ser, por exemplo, um jogo ou uma situação-problema, ele define as operações necessárias para o encaminhamento da atividade (MORETTI, 2007, p. 87).

Conforme tal exemplo, ao selecionar conteúdos matemáticos, o professor pode eleger situações lúdicas que apropriem dos conceitos embutidos em tais situações, favorecendo a compreensão do aluno de tal forma, que incorpore a função social dos conceitos ensinados e

Documentos relacionados