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2.3. Biologia molecular de micorrizas arbusculares

2.3.3. A transferência de nutrientes e a regulação da simbiose

O principal efeito observado em interações micorrizicas arbusculares é um incremento na absorção de fósforo pela planta hospedeira. Para esta, o beneficio está associado à um custo em carbono reduzido que é utilizado pelo

fungo. Assim, é esperado que a simbiose possua mecanismos "auto-regulatórios", onde o nível de infecção pode ser restringido conforme a disponibilidade de fósforo é aumentada, de maneira que o beneficio líquido da simbiose seja mantido. Ao mesmo tempo, em condições onde a disponibilidade de fósforo é extremamente baixa, a interação também deve ser bloqueada, uma vez que plantas micorrizadas não apresentariam qualquer vantagem sobre plantas não­ micorrizadas, e a interação poderia representar um dispêndio de fotossintetizados pela planta. Assim, os maiores níveis de colonização seriam observados em disponibilidades intermediárias de fósforo.

Partindo destes pressupostos, Koide & Li (1990) realizaram experimentos onde procuraram determinar parâmetros de colonização radicular

em doses crescentes de fósforo, em plantas de girassol infectadas por Glomus

etunicatum. Os autores observaram que os níveis de infecção aumentaram

gradativamente, conforme a maior disponibilidade de fósforo, até chegar a um limite onde o aumento desta disponibilidade representava diminuição dos níveis de colonização, confirmando a hipótese. Assim, conclui-se que a infecção é limitada em qualquer situação onde a mesma não propiciar crescimento vegetal.

Embora os mecanismos envolvidos nesta "auto-regulação" não sejam

conhecidos, são independentes do status nutricional da parte aérea (Koide & Li,

1990). Lambais & Mehdy (1995) sugerem uma hipótese para explicar o mecanismo de controle da simbiose, envolvendo o fósforo, fitohormônios e o sistema de defesa vegetal. Alterações no balanço hormonal causadas pela infecção do fungo, assim como por baixos níveis de fósforo (aumento de citocininas, diminuição de etileno) poderiam resultar na supressão do sistema de defesa vegetal, possibilitando o estabelecimento da interação. De maneira inversa, altos níveis de fósforo podem aumentar a síntese de etileno e, consequentemente, induzir a expressão de certas proteínas-RP ( que sabidamente são induzidas por

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etileno), além de outros mecamsmos de defesa, impossibilitando o estabelecimento da simbiose.

Poucos estudos têm sido realizados com a finalidade de verificar alterações na expressão gênica durante o estabelecimento de micorrizas e esclarecer os mecanismos que regulam o desenvolvimento da simbiose e a transferência de nutrientes entre os simbiontes.

O primeiro relato descrevendo alterações da expressão gênica foi obtido em ectomicorrizas, comparando, em géis bidimensionais, o padrão protéico de amostras de raízes de eucalipto infectadas ou não por Pisolithus tinctorius (Hilbert & Martin, 1988). Foi observado um acúmulo de pelo menos 10 tipos diferentes de polipeptídeos ectomicorriza-específicos. Por semelhança com o termo "nodulina", que se refere à proteínas específicas de nódulos de leguminosas, estes polipetídeos foram denominados "ectomicorrizinas". Guttenberger & Hampp (1992) sugerem que as alterações encontradas refletem apenas diferenças pré-existentes entre as plantas testadas e não verdadeiras ectomicorrizinas induzidas. Estes autores realizaram experimentos semelhantes e não puderam constatar nenhuma alteração significativa no padrão protéico. Contudo, estudos mais recentes, voltaram a confirmar a detecção de ectomicorrizinas, não apenas através de comparações do padrão protéico em géis bidimensionais (Burgess et al., 1995), como também por "screening" diferencial de cDNA, ou DNA complementar (Tagu et al., 1993).

Em MAs, o padrão protéico foi comparado pela primeira vez por Dumas et al. (1989), que verificaram um aumento no teor de proteínas solúveis em extratos de raízes micorrizadas, quando comparado com o teor em extratos provenientes de raízes não-micorrizadas. Novas proteínas, de origem vegetal e fúngica, foram detectadas e, embora não tenham sido determinadas a natureza e função destas proteínas, foram chamadas de "endomicorrizinas" por associação às ectomicorrizinas. Dois polipeptídeos de função desconhecida foram identificados

em géis bidimensionais contendo amostras de raízes de tomate micorrizadas, mas não foram identificados em amostras de raízes não-micorrizadas misturadas à hifas e vesículas fúngicas, indicando que os polipeptídeos são realmente induzidos pela micorrização (Simoneau et al., 1994).

Foi verificado aumento na atividade da enzima glicose 6-fosfato desidrogenase (Gd) em raízes de pepino infectadas por fungos micorrizicos arbusculares, comparado com controles não-micorrizados (Rosendahl, 1992). Esta é a primeira enzima do ciclo pentose-fosfato, via alternativa para obtenção de energia pelas plantas, principalmente em condições de estresse. Além disso, esta via fornece precursores para a síntese de ácido nucléico, a qual é realmente aumentada durante o estabelecimento da interação (Bonfante & Perotto, 1 995).

Aumento na atividade de fosfatases neutras e H+-ATPases também foi

verificado em MAs (Gianinazzi-Pearson & Gianinazzi, 1 989). A alta atividade destas enzimas na interface fungo-planta deve estar envolvida no transporte de nutrientes entre os simbiontes (Smith & Smith, 1990).

Todos estes dados sugerem a existência de genes diferencialmente expressos durante a formação de MAs e, entre estes, poderiam estar os genes que coordenam a transferência de nutrientes entre os simbiontes. Os primeiros genes envolvidos no processo de transferência de nutrientes isolados em MAs codificam um transportador de açúcar (Harrison, 1 996), um transportador de fosfato (Harrison & van Buuren, 1 995) e uma ATPase (Murphy et al., 1 997).

Sabe-se que as MAs são interações altamente exigentes em carboidratos e com a finalidade de estudar a expressão de genes que codificam transportadores de carboidratos, foi isolado, a partir de um banco de cDNA

preparado de raízes de Medicago truncatula colonizadas por Glomus versiforme,

o gene que codifica um transportador de hexose (Harrison, 1 996). Oligonucleotídeos foram elaborados com base em sequências altamente conservadas presentes em transportadores de açúcar isolados de outras espécies

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de plantas. Estes oligonucleotídeos foram utilizados para amplificar por PCR ("polymerase chain reaction" ou reação em cadeia da polimerase) o cDNA correspondente. Análise de "Southem blot" confirmou a origem vegetal do gene e análise de "northem blots" mostrou que o gene é preferencialmente induzido em raízes e, em menores níveis, nas folhas e no caule. O nível de transcritos aumentou duas a três vezes em raízes micorrizadas e este aumento foi observado igualmente em raízes de Medicago truncatula colonizadas por Glomus

intraradices, assim como em raízes de M sativa colonizadas por G. versiforme.

Além dos transcritos terem sido localizados, por hibridização in situ, no floema e nos ápices radiculares de raízes não-micorrizadas, foram localizados também nas células do córtex amplamente colonizadas pelo fungo, confirmando seu papel no suprimento de altos níveis de carbono demandados por ambos os participantes da simbiose.

O gene codificando o transportador de fosfato também foi isolado de um banco de cDNA preparado de raízes de Medicago truncatula colonizadas por

Glomus versiforme. Utilizou-se como sonda, um fragmento do gene que codifica

um transportador de fosfato de Saccharomyces cerevisiae. Através de "Southem blot" e posterior confirmação por PCR, determinou-se que se trata de um gene fúngico. Experimentos de hibridização in situ revelaram que a expressão deste gene se dá preferencialmente nas hifas extraradiculares, confirmando seu papel no processo de absorção do fósforo do solo (Harrison & van Buuren, 1995).

O gene codificando uma H+-ATPase foi isolado por "screening"

diferencial, a partir de um banco de cDNA preparado de regiões do sistema radicular de Hordeum vulgare extensamente colonizadas por Glomus intraradices (Murphy et al., 1997). Foi confirmada a sua origem vegetal por análise de "Southem blot" e sua expressão diferencial por análise de "northem blots".

A partir destas informações obtidas na literatura, observa-se um crescente interesse em isolar proteínas e/ou sequências gênicas que tenham uma

expressão diferencial (induzidos ou suprimidos) em micorrizas arbusculares, bem como genes simbiose-específicos.

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