• Nenhum resultado encontrado

Para Christofoletti (1981, p.81), as investigações científicas que adotam a bacia hidrográfica como unidade espacial de análise são relevantes por uma razão nuclear: “os cursos de água constituem processo morfogenético dos mais ativos na esculturação da paisagem”, por esse motivo retratam diversos fenômenos geomorfológicos que ocorreram ao longo da escala do tempo da natureza.

A partir da década de 60 o conceito de bacia hidrográfica foi compreendido por professores-pesquisadores como unidade espacial de análise para a área de conhecimento da Geografia Física (BOTELHO; SILVA, 2007). O caráter integrador da unidade espacial reflete uma estrutura que interliga os elementos do sistema físico ambiental.

A bacia hidrográfica, também intitulada de bacia de drenagem ou bacia fluvial, corresponde a uma área da superfície terrestre delimitada por divisores topográficos, que ao longo de seu curso perpassam uma rede de drenagem composta por um rio principal e seus tributários que “confluem até resultar um leito único no exutório” (NOVO, 2008; MACHADO; TORRES, 2012; SILVEIRA, 1993).

De acordo com Christofoletti (1981, p.81),

A drenagem fluvial é composta por um conjunto de canais de escoamento inter-relacionados que formam a bacia de drenagem, definida como a área drenada por um determinado rio ou por um sistema fluvial. A quantidade de água que atinge os cursos fluviais está na dependência do tamanho da área ocupada pela bacia, da precipitação total e de seu regime, e das perdas devidas à evapotranspiração e à infiltração.

A delimitação da bacia hidrográfica ocorre mediante a definição do ponto de saída, o exutório, logo em seguida, é identificado o limite da bacia fluvial a partir dos divisores de água ou divisores de drenagem que são evidenciados na carta topográfica. O ponto de saída do rio poderá ser “outro rio de hierarquia igual ou superior, lago, reservatório, ou oceano”, portanto, o exutório depende da hierarquia da bacia de drenagem (CUNHA; GUERRA, 2006; NOVO, 2008).

Para Novo (2008), Coelho Netto (2012) e Machado e Torres (2012), a bacia hidrográfica corresponde a uma área de captação natural da precipitação pluviométrica, desse modo, há fornecimento de energia e matéria para as redes de drenagem que mobilizaram volumes de água, sedimentos e materiais dissolvidos para um ponto de saída comum. De acordo com Chorley (1962) e Coelho Netto (2012), a bacia de drenagem

constitui um exemplo típico de sistema aberto na medida em que recebe impulsos energéticos das forças climáticas atuantes sobre sua área e das forças tectônicas subjacentes, e perde energia por meio da água, dos sedimentos e dos solúveis exportados pela bacia no seu ponto de saída.

Cunha e Guerra (2006) também apontam a bacia hidrográfica como um sistema aberto, pois consideram que há entrada e saída de matéria e energia do sistema. A entrada de energia ocorre por meio dos subsistemas clima (fornecimento/escassez de precipitação pluviométrica) e geologia (tectonismo), e a saída de matéria (água, sedimentos e materiais solúveis), assim a saída de matéria do sistema ocorre mediante fluxos energéticos que encaminham para o exutório.

A introdução de uma nova dinâmica gerada por inputs energéticos ligados as intervenções extrínsecas (pulsações climáticas e/ou tectonismo) alteram os processos e as formas do sistema fluvial. Por se tratar de um sistema aberto, o sistema fluvial se reajustará ao novo input de controle, ou seja, as novas condições do ambiente que modificou o volume, o tamanho e o escoamento de matéria (CUNHA; GUERRA, 2006; STEVAUX; LATRUBESSE, 2017; COUNTS et al., 2015).

As formas resultantes de intervenções extrínsecas no sistema fluvial influenciaram o processo de morfogênese fluvial, de maneira que as formas materializadas na bacia de drenagem, por exemplo, serão classificadas em: terraços fluviais, terraços aluviais, terraços rochosos, e, terraços estruturais (CHRISTOFOLETTI, 1981; SUGUIO; BIGARELLA, 1979).

Os terraços são formas que respondem os processos desencadeados por controle alogênicos (clima, tectônica, nível do mar) ou autogênico (comportamento intrínseco e resposta complexa) que atuaram na bacia hidrográfica. Portanto, constitui-se num registro de como o sistema fluvial respondeu aos inputs energéticos de um ou mais controles que variaram ao longo da escala do tempo da natureza (LITCHFIELD; CLARK, 2015).

A presente investigação discutirá o conceito de terraços fluviais e aluviões recentes após a identificação mediante observação sistemática da paisagem em pesquisa de campo.

Os terraços fluviais são concebidos como evidências geomorfológicas que foram elaboradas a partir de inputs energéticos gerados pelo subsistema clima (pulsações climáticas e/ou neotectônica) no período Quaternário (últimos 2,5 Ma). A instabilidade do subsistema clima em episódios de pulsações climáticas, em particular, durante os períodos glaciários (secos) e interglaciários (chuvosos), reestruturaram a paisagem, consequentemente resultaram na elaboração de modelados de acumulação, no caso em específico, terraços fluviais (STEVAUX; LATRUBESSE, 2017).

Para Barros et al. (2011, p. 372), “precipitação e temperatura controlam uma série de reações químicas e físicas [...], determinando o comportamento de sistemas geomorfogenéticos de diferentes escalas”. Portanto, as características paleoclimáticas forneceram inputs energéticos que auxiliaram na formação de sequências de terraços fluviais (BRIDGLAND, 2000).

Ferreira (2002) aponta que as alternâncias entre fases secas e úmidas influenciaram nos processos erosivos a montante e, por consequência na elaboração de novas formas de acumulação a jusante em virtude das pulsações climáticas. Sendo assim, pode-se concluir que os processos e as formas geomorfológicas em sistema fluviais estão diretamente relacionados a variabilidade climática, mesmo em uma escala temporal curta na escala do tempo da natureza,

portanto, influenciam diretamente na evolução das formas de relevo, no caso em específico, terraços fluviais.

De acordo com Suguio e Bigarella (1979, p. 73), os terraços constituem- se em "chaves de interpretação da história geológica de uma região", dessa forma, mudanças nas características do regime hidrológico resultaram em períodos de agradação e degradação das antigas planícies de inundação. Para Couts et al. (2015), os terraços fluviais representam formas indispensáveis para o estudo da mudança paleoambiental e da evolução da paisagem.

Segundo Christofoletti (1981, p.81), “os terraços fluviais representam antigas planícies de inundação que foram abandonadas. Morfologicamente, surgem como patamares aplainados, de largura variada, limitados por uma escarpa em direção ao curso de água”. Portanto, os terraços fluviais são concebidos como planícies de inundação pretéritas, logo, encontram-se inativas; essas feições fluviais são identificadas na paisagem como patamares com superfície horizontal ou levemente inclinada próximo ao curso hídrico (Figura 3).

Os terraços fluviais estão altimetricamente distantes do atual nível de base da rede de drenagem; salienta-se também que mesmo ocorrendo eventos extremos de precipitação pluviométrica não haverá recobrimento ou reativação dessa antiga planície de inundação (GUERRA, 1993; IBGE, 2009; TORRES; MARQUES NETO; MENEZES, 2012).

Figura 3: Típica configuração de terraços fluviais.

Bigarella, Mousinho e Silva (1965) correlacionaram a formação de terraço fluvial às pulsações climáticas ocorridas no quaternário continental. Para Bridgland e Westaway (2008), os terraços se formaram em resposta às pulsações climáticas. Esta perspectiva foi corroborada por Goudie (2010), ao afirmar que a ocorrência geográfica de terraços foram/são observadas ao longo de bacias de drenagem devido as alterações no volume de águas e no curso preferencial dos rios em virtude das pulsações climáticas do Quaternário, especificamente, no Holoceno. Diante desse cenário, a variabilidade climática implicou diretamente na quantidade de precipitação pluviométrica que entrou no sistema fluvial, bem como na disponibilidade de sedimentos, portanto, houve uma modificação no regime hidrológico que ocasionou a gênese de terraços fluviais na bacia de drenagem (STARKEL, 2003).

Bridgland (2000) também reconhece que as pulsações climáticas do Quaternário interferiram no sistema fluvial e impulsionaram a formação de terraços fluviais, pois houve modificações no padrão de entrada de duas variáveis do subsistema clima: temperatura e precipitação.

De acordo com Bridgland e Westaway (2008), os terraços registraram as características das pulsações climáticas, que na realidade, correspondem as alternâncias entre as fases de incisão e sedimentação no sistema fluvial. Bridgland (2000) desenvolveu um modelo para ilustrar a formação de terraços em resposta ao controle gerado pelas pulsações climáticas. Torres, Marques Neto e Menezes (2012) complementaram a assertiva supracitada ao enfatizarem que nas "fases de clima úmido redundariam em entalhamento fluvial, enquanto nas fases secas promoveriam, por causa da maior quantidade de detritos oriundos das vertentes, aplainamento lateral".

O segundo objeto de análise referem-se aos aluviões recentes que estão situados no leito maior do canal de drenagem. Os aluviões são constituídos de coberturas superficiais com distintos tamanhos, a exemplo de: areia, silte, argila e seixos de diferentes dimensões a depender da competência e da declividade do rio. Essas coberturas superficiais são provenientes de processos erosivos a montante que ocorrem nas vertentes e nas margens do rio e são transportados pelo sistema de drenagem (GUERRA, 1993), Figura 4.

Figura 4: Abandono de sucessivas planícies de inundação estabelecendo terraços parelhos (A) ou terraços isolados (B).

Fonte: Christofoletti (1980); Torres, Marques Neto, Menezes (2012).

Diante do exposto, conclui-se que as coberturas superficiais dos terraços fluviais e aluviões recentes são feições geomorfológicas indicadoras de deposição de sedimentos ocorridas no Quaternário, especificamente, no Holoceno Superior, em resposta as pulsações climáticas.

Entende-se por pulsações climáticas os eventos desencadeados pelo subsistema clima que ocorreram nos últimos 10.000 anos A.P. na escala do tempo da natureza que corresponde ao Holoceno, essas pulsações apresentaram fases secas e úmidas e os ciclos de atuação não ultrapassaram 2000 anos (PEREZ FILHO; RUBIRA, 2019).

Na busca de compreender a evolução da paisagem em sistemas fluviais de forma precisa, novas investigações científicas introduziram modernas técnicas de datações absolutas para relacionar as características e a cronologia dos processos deposicionais das coberturas superficiais com as pulsações climáticas. Atualmente, para identificar a idade de coberturas superficiais de terraços fluviais e aluviões recentes utiliza-se a técnica de datação por Luminescência Opticamente Estimulada (LOE).

2.1.3 Geocronologia de coberturas superficiais por meio da Luminescência