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3. A Televisão brasileira e a televisão portuguesa

3.2. Surgimento e desenvolvimento da televisão portuguesa

3.2.2. Abertura às TV’s privadas

Como mencionámos no subtítulo anterior, a própria RTP sabia que em pouco tempo a abertura do mercado para os primeiros canais privados seria aprovado no país. Uma das causas para o início destes debates ocorreu devido à penetração de canais via satélite em território português.

Os canais estrangeiros começaram a sua implantação junto de espectadores privilegiados (pelo nível de vida, pelo conhecimento de línguas) e a RTP tinha agora de contar com eles, quando antes apenas se preocupara com os dois canais da TVE e da TV Galiza que, principalmente no norte do País e em quase toda a orla fronteiriça, mantinham audiências que um estudo realizado no início de 1986 considerava da ordem dos 800 mil portugueses. (Teves, s.d., p. 10)

A abertura para a concessão de canais privados na Europa, e também em Portugal, só aconteceu no fim da década de 1980 e início dos anos 1990. O surgimento da televisão privada em terras lusitanas teve forte oposição política, mas a legislação acabou por ser aprovada em 1989, com a abertura de um concurso público para a concessão de dois novos canais em sinal aberto. Em 1992, abriu o canal Sociedade Independente de Comunicação – SIC, e em 1993 foi a vez da Televisão Independente – TVI.

De acordo com Teves (s.d.) pelo menos um milhão de espectadores, no final da década de 1980, tinham acesso a outros canais de televisão por meio das antenas parabólicas. Isso sem mencionar as televisões piratas, que alcançavam a uma parcela grande da população do Norte do país. Por isto a própria comunidade já estava a espera das emissões dos novos canais privados.

No início dos anos 1990 devido ao grande investimento em publicidade, a RTP decidiu adotar uma mudança na comunicação visual do canal.

É por essa altura que a RTC, concessionária da publicidade na RTP, decide uma radical mudança de visual, numa perspectiva de modernização a que não faltaram ágeis toques de agressividade, entendidos como os mais necessários para consolidação de presença num mercado onde, em breve, já não reinaria sozinha. O logótipo abandonou o grafismo clássico, renovou-se em campo geométrico mais agradável e passou a fazer-se acompanhar de um “piscar de olho” estilizado em

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imagem (e intenção) e que, servido por movimento breve e sonoridade sublinhadora, iria, aliás, demarcar os blocos publicitários em todos os espaços de emissão da RTP. (Teves, s.d., p. 12)

Fato que viria a coincidir com uma revisão da Constituição portuguesa e a consequente abertura da televisão para os canais privados, colocando fim de vez ao monopólio televisivo em Portugal. A Lei nº 58/90, de 7 de setembro, Regime da Actividade de Televisão, desenhou o novo rumo para as emissões no país. Segundo o documento, a atividade de televisão poderia ser exercida por operadores públicos e privados, de acordo com a Constituição revista. Assim o Estado asseguraria a existência e o funcionamento do serviço público de televisão em regime de concessão e ao serviço privado seria necessário a apresentação num concurso público para obter uma licença. A Resolução do Conselho de Ministros 49/90, de 31 de dezembro de 1990, procedeu “à abertura do concurso público para o licenciamento dos 3.º e 4.º canais de televisão com cobertura de âmbito geral, nos termos do regulamento aprovado pelo presente diploma, do qual faz parte integrante”. O documento continha ainda as regras para as candidaturas, licenciamento, abertura das propostas, etc. De acordo com Teves (s.d., p. 18), o concurso público para a abertura das emissões para aos canais privados “agitou” a comunicação social em Portugal.

Na altura, segundo informações de Teves (s.d., p. 1) seis grupos empresariais tiveram interesse em concorrer para obter uma licença de um canal privado de televisão: SIC (Francisco Pinto Balsemão), Presslivre (Carlos Barbosa), Edipress (Proença de Carvalho), Sonae (Belmiro de Azevedo), PEI (Joe Berardo) e Telecine (Júlio Isidro). Uma declaração feita pelo então Primeiro- Ministro mencionava que a abertura para os canais privados iria beneficiar os portugueses, isentando-os das taxas anuais que garantiam o serviço público de televisão. Das propostas aprovadas, somente três foram consideradas aptas a concorrer: as sociedades TV 1 – Rede Independente, S.A.; SIC – Sociedade Independente de Comunicação, S.A., e TVI – Televisão Independente, S.A.. As empresas SIC e TVI foram as vencedoras e ganharam os direitos de emissão dos canais 3 e 4 por 15 anos. Segundo o pesquisador José Manuel Barata-Feyo (2002, p. 156) o Panorama Audiovisual Português (PAP) dinamizou todo o serviço de televisão em Portugal depois do aparecimento das emissoras privadas e da concorrência, acabando de vez com o tabu político da informação e aumentando a qualidade das emissões.

No início da década de 90, o então governo transformou a RTP em sociedade anônima de capitais exclusivamente públicos, devido à abertura dos novos canais para o serviço privado (Teves, s.d., p. 28), o que coincidiu com o aumento das dívidas, perda na qualidade das emissões e

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consequentemente a diminuição de espectadores à frente dos ecrãs. Em meados de 1991, o chamado “telelixo informativo” chegou a Portugal, com o conceito de “vende ou não vende”, uma informação boçal, sensacionalista, leviana e em inúmeras vezes repercutiu a desgraça e a humilhação dos portugueses em situações econômicas, sociais e até mesmo culturais, (Barata- Feyo, 2002, p. 157).

De acordo com Eduardo Cintra Torres (2011, p. 51) quando chegou ao fim do monopólio, a RTP era uma estação “triplamente inchada”, ou seja, apresentava uma soberba com relação às audiências; maior fatia no mercado, o que deixava menos opções para os concorrentes, e uma dimensão exagerada, que resultava no “caráter de função pública”, traduzido na saída e entrada de colaboradores em função das inúmeras mudanças de governo.

Mas em janeiro de 1993, o Estado Português e a Radiotelevisão Portuguesa – S.A. assinaram um contrato de Concessão do Serviço Público de Televisão, pelo prazo de 15 anos, do qual fazem parte os canais 1 e 2, em sinal aberto, e ainda a emissão do canal internacional, a RTP Internacional. No documento ainda constava o compromisso em promover a cultura nacional, assim como a língua portuguesa em países africanos e nas comunidades portuguesas no exterior:

o Contrato é um documento extenso, bem explícito no seu normativo, deixando saliente o facto de ao 1º Canal dever corresponder “um carácter eminentemente generalista, com opções diversificadas e destinado a servir a generalidade da população”; quanto ao 2º Canal, afirmado como “complementar do primeiro”, deverá “servir públicos potencialmente minoritários, integrando programas de carácter educativo” (em vários domínios). “Pelo menos um dos canais deverá abranger as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira” – lia-se, ainda, no documento que, de seguida, anunciava as obrigações de Serviço Público específicas da concessionária perante a sociedade política (sem esquecer o Governo e a administração pública), civil e religiosa; declarava de interesse público os Arquivos Audiovisuais da RTP; não esquecia a necessidade de permanente inovação tecnológica (designadamente no quadro de compromissos com a União Europeia de Radiodifusão); e acabava detendo-se em implicações financeiras (com relevo para a área das indemnizações compensatórias). (Teves, s.d, p. 1)

A Lei estabeleceu ainda que a RTP passasse a ser uma sociedade mista, ou seja, quando o capital da empresa passa a ser oriundo das verbas estatais e das adquiridas com a publicidade. Outra perda significativa de audiência foi quando o contrato entre a RTP e a Rede Globo foi rompido e as novelas brasileiras deixaram de ser exibidas no canal público português.

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Entre os anos 1990, até meados dos anos 2000, a dívida da RTP aumentou consideravelmente. Segundo Teves (s.d., p. 2) houve uma situação de falência técnica e a dívida, que em 1996 era de 359 milhões de euros, passou para 1.300 milhões em 2002. “A RTP 1 e a RTP 2 tinham entrado numa rota progressiva de perda de influência (as audiências, que eram de 44% em 1995, não passavam dos 26% em 2002” (Teves, s.d., p. 2). De acordo com Lopes (2007, p. 152) o serviço público de televisão atravessou em 2001, uma das maiores crises financeiras e políticas da história da televisão em Portugal.

Para transpor a grave crise financeira e política, em 2002, a RTP decidiu recriar a imagem do canal com nova comunicação visual, cenários, formatos e apresentadores (Lopes, 2007, p. 163). Tanto que em 2003, foi assinado um novo “Contrato de Concessão de Serviço Público de Televisão” para destinar melhor o dinheiro oriundo da publicidade para a quitação das dívidas, novos investimentos e encurtamento dos espaços publicitários. Segundo Lopes (2007, p. 168) este acordo serviu para preservar a RTP das guerras publicitárias com os canais privados portugueses, que se comprometeram a apoiar e a ceder programas para a RTP, a fim de promover a cultura e a inclusão local no país. O acordo, assinado em 22 de setembro de 2003, descreve os direitos e deveres que a RTP deve ter com o serviço público de televisão e com os portugueses:

traça-se o modelo de programação e o posicionamento editorial de um operador público: “ser uma fonte de programas alternativa à televisão comercial”; “satisfazer as múltiplas necessidades culturais, educativas e recreativas dos diversos públicos”; “desenvolver uma programação pluralista, inovadora e variada, que responda a elevadas normas éticas e de qualidade e que não sacrifique esses objetivos às forças do mercado”; “proporcionar uma informação imparcial, independente, esclarecedora e pluralista, que suscite o debate e que exclua a informação- espectáculo e o sensacionalismo” (Lopes, 2007, p. 168).

Após a assinatura do acordo, as dívidas da RTP que eram de aproximadamente 230 milhões de euros, passam para 30 milhões de euros em 2003, diminuindo para seis milhões de euros em 2004 (Lopes, 2007, p. 190). Ainda de acordo com a pesquisadora, em 2005, o serviço público de televisão “renasce” em Portugal, pois além de ter perdido a liderança dez anos antes, estava em reequilíbrio financeiro. O canal apresentou uma nova proposta de programação com alguns canais no cabo, e novos diretores e apresentadores foram contratados. A RTP voltou a ganhar a confiança dos portugueses e tornou-se novamente um dos canais mais vistos em Portugal. Atualmente, a Rádio Televisão de Portugal – RTP – disponibiliza dois canais generalistas com sinal

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aberto, RTP 1 e RTP 2 e mais sete canais por assinatura - RTP Internacional, RTP África, RTP Açores, RTP Madeira, RTP Informação e RTP Memória, além de rádios em território português e africano.

Atualmente a programação da RTP 1 é generalista, com programas informativos, de entretenimento, desporto, filmes séries, documentários, entre outros. Por semana são emitidas cerca de 100 horas de informação nos telejornais e programas de segunda a sexta-feira. Os principais telejornais da RTP são: Bom Dia Portugal, matinal, com 3h30 de duração e um dos telejornais mais assistidos pelas manhãs no país; o Jornal da Tarde, com cerca de 1h20 de duração, e o Telejornal, programa informativo noturno que apresenta as principais notícias do dia. Jornal este que permanece há mais tempo no ar na televisão portuguesa.

Já a RTP 2, também apresenta uma programação generalista. Os principais programas informativos são Jornal 2 e Euronews, exibidos todos os dias da semana. O restante da programação é preenchida com programas infantis, educativos, documentários, filmes, séries e desporto.

Atualmente o serviço de televisão pública é cobrado diretamente na fatura do serviço de eletricidade. Em cada conta os portugueses pagam uma “contribuição audiovisual” de 2,85€ + IVA (6%) por mês. A taxa é repassada ao Estado, que financia o serviço público de radiodifusão e televisão no país.

A televisão por cabo, ou por assinatura, começou a ser disponibilizada no país a partir de 1994. Com uma programação nacional e internacional, o produto passou a oferecer uma série de canais nacionais, regionais, e também dos continentes Europeu, Americano, Asiático e Africano. Segundo Teves (s.d., p. 24) no início o cabo dispunha de apenas 30 canais, mas o acesso a canais estrangeiros e generalistas e temáticos acabou por incentivar os telespectadores a contratarem o serviço. De acordo com a Marktest26, em dezembro de 2014, a TV paga já havia chegado a 73,8%

dos lares portugueses. Ou seja, três em cada quatro residências assinam a televisão paga. Em 2008 iniciaram as primeiras transmissões experimentais da Televisão Digital Terrestre – TDT27

– em Portugal. Em 26 de abril de 2012, o sinal analógico foi totalmente desligado, o que gerou resistência de parte da população que não teve recursos financeiros para obter o conversor do sinal digital. Na TDT os sons e imagens são digitalizados e difundidos por meio do ar até a residência dos portugueses que não possuem televisão por assinatura. A TDT também permite

26 Informação retirada de http://www.marktest.com/wap/clip.aspx?id=d6f7

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que o telespectador consulte a programação, pause, grave e reveja programas, ou seja, os telespectadores podem assistir aos programas quando quiserem, podem retornar na programação, passar intervalos para evitar publicidade e até mesmo gravar programas para assistirem a hora que julgarem necessário.

Após a implantação do sinal digital, os portugueses passaram a assistir seis canais com sinal aberto pela TDT. São eles: RTP 1, RTP 2, SIC, TVI, ARTV e RTP 3. Acrescem ainda, nos Açores, a RTP Açores, e na Madeira, a RTP Madeira.

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