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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.3 CONFIANÇA ORGANIZACIONAL

2.3.1. Abordagem e perspectiva

Confiança é um construto examinado vastamente pelas Ciências Humanas – englobando Antropologia, Ciência Política, História, Psicologia e Sociologia – e pelas Ciências Sociais Aplicadas, que inclui a Ciência da Informação, a Economia e, naturalmente a Administração, particularmente nas pesquisas sobre GC. Com todas essas disciplinas, cada uma aplicando sua própria perspectiva e abordagem (lentes), a pesquisa sobre confiança é bastante ampla e expansiva. Lewicki e Bunker (1996, p. 115) chamam a atenção que “pequeno esforço tem sido feito para integrar essas diferentes perspectivas [de confiança] ou articular o papel-chave que a confiança desempenha nos processos sociais críticos (cooperação, coordenação, desempenho)”.

Worchel (1979) argumenta que todas essas diferentes perspectivas sobre confiança podem ser categorizadas dentro de três grandes abordagens de pesquisa (individual, interpessoal e organizacional), categorias essas que foram expandidas mais tarde por Lewicki e Bunker (1995, 1996). A primeira abordagem proposta por Worchel (1979) é compatível com a visão das teorias da personalidade. Esse ponto de vista está enraizado no desenvolvimento psicológico anterior e foca nos “fatores contextuais desenvolvimentistas e sociais” que modelam a confiança (LEWICKI; BUNKER, 1996, p. 115). A segunda perspectiva proposta por Worchel (1979) é coerente com a abordagem dos psicólogos sociais que examinam os relacionamentos e transações interpessoais. Com essa perspectiva, os pesquisadores focam nas transações interpessoais (ou nível grupo) e nas expectativas e riscos associados a elas. De

específico interesse, estão os “fatores contextuais que servem tanto para melhorar ou inibir o desenvolvimento e a manutenção da confiança” (LEWICKI; BUNKER, 1996, p. 116). A terceira categoria foca a confiança como um fenômeno institucional e é compatível com as abordagens das pesquisas sociológicas e econômicas (LEWICKI; BUNKER, 1995, 1996). Com essa perspectiva, a confiança é estudada dentro das instituições, através das instituições ou como uma confiança individual em uma instituição, sendo esta a enfatizada e utilizada nesta pesquisa.

2.3.2 Definição

Como há diversas abordagens e disciplinas para o estudo da confiança, existem também muitas definições. Qualquer uma delas deve ser coerente e apropriada com a perspectiva de confiança que o pesquisador pretende na seleção.

Para muitos psicólogos sociais, confiança é baseada em um “conjunto de expectativas dentro de parâmetros e restrições contextuais particulares” (LEWICKI; BUNKER, 1996, p. 116).

Deutsch (1960) sugeriu que um indivíduo decide confiar em outra pessoa quando existem três parâmetros situacionais: um curso futuro incerto de ação; um resultado dependente do comportamento de outras pessoas; e a força do evento prejudicial é maior do que a força de um evento benéfico.

Usando parâmetros similares, Schlenker, Helm e Tedeschi (1973, p. 419) definiram confiança como “crédito nas informações recebidas de outra pessoa sobre estados ambientais incertos e suas consequências derivadas em uma situação de risco”. Johnson-George e Swap (1982, p. 1306) observaram que uma “disposição de correr riscos pode ser uma das poucas características comuns para todas as situações de confiança”. Na interpretação de Boon e Holmes (1991, p. 194), confiança está focada no risco, definindo confiança como “um estado envolvendo expectativas confiantes positivas sobre os motivos de outros a respeito a si próprio em situações vinculando risco”.

A definição de Schoorman, Mayer e Davis (1996b, p. 340) interpreta risco como “um importante componente em um modelo de confiança”, por causa da “vulnerabilidade”. De acordo com os autores, “tornar-se vulneráveis, é correr risco. A confiança não é correr risco

per se, mas uma disposição de correr risco” (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995, p. 712) ou uma “disposição para se engajar em um risco com a parte focal” (MAYER; DAVIS, 1999, p. 124). De acordo com os autores, sua definição e modelo correspondente “complementa a literatura sobre risco pela clarificação do papel da confiança interpessoal no correr risco” (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995, p. 711).

Mayer, Davis e Schoorman (1995, p. 712) definem confiança como “a disposição de uma parte em ser vulnerável nas ações de outra parte, baseada na expectativa de que o outro desempenhará uma ação particular importante para o confiante (trustor), sem consideração à capacidade de monitorar ou controlar aquela outra parte”.

Na opinião de Mayer, Davis e Schoorman (1995), pesquisas e modelos anteriores de confiança não são claros em diferenciar confiança de fatores que levam a confiar e de resultados da confiança. O modelo dos autores conceitua confiança de modo a distingui-lo de seus resultados e de seus antecedentes (MAYER; DAVIS, 1999). Esse modelo considera, também, os fatores de confiança de ambas as características do trustor (i.e. propensão) e as características coletivas percebidas do confiado (i.e. capacidade, benevolência, integridade), aspectos que os outros modelos negligenciam (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995; SCHOORMAN; DAVIS; MAYER, 1996b). “O fracasso em especificar claramente o trustor [a parte que confia] e o confiado [a parte em que se confia] encoraja a tendência às mudanças referentes e ao mesmo nível de análise, que ofuscam a natureza do relacionamento de confiança (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995, p. 711).

Mayer, Davis e Schoorman (1995) propuseram um modelo de confiança organizacional (Quadro 4) que separa o relacionamento entre o trustor e o confiado, no intuito de entender os fatores subjacentes do porquê uma pessoa confiaria na outra parte.

Quadro 4 – Modelo teórico de confiança.

Fonte: baseado em Mayer, Davis e Schoorman (1995, p. 715).

Mayer, Davis e Schoorman (1995) argumentam que são os traços ou as características individuais das partes que confiam que determinam o nível de confiança que pode ser obtido entre elas. No momento, no intuito do trustor exibir confiança ao confiado, ele precisa antes ter a propensão de confiar no confiado em particular ou a propensão em confiar de modo geral (especialmente quando o relacionamento é novo). Em troca, o confiado precisa ser percebido como tendo capacidade, benevolência e integridade que, juntas, ajudam ao trustor determinar a probidade do confiado. Qualquer medida de probidade do confiado é apenas baseada na percepção de probidade do trustor e não das atuais características ou traços do confiado. Em um artigo posterior, os autores (SCHOORMAN; MAYER; DAVIS, 1996b) justificam essa perspectiva, afirmando que ela explica o porquê de uma pessoa em particular ser considerada altamente confiável por uma pessoa, mas não por outra.

“Um trustor desejará ser vulnerável à outra parte baseado tanto na sua propensão em confiar na outra pessoa de forma geral quanto na sua percepção de que aquele confiado em particular é confiável”. (MAYER; DAVIS, 1999, p. 124).

Para melhor explicar, Mayer, Davis e Schoorman (1995) propuseram um modelo de confiança que é o melhor para separar as características que influenciam na confiança de um trustor daquelas de um confiado. O anterior considera os traços de personalidade do trustor e a abordagem de confiança a partir da perspectiva daquela pessoa “que geralmente deseja confiar nas outras” (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995, p. 714). Esse traço de personalidade relativamente estável afeta a probabilidade de que a pessoa confiará no geral e,

Resultados Fatores de Probidade Percebida Capacidade Benevolência Integridade

Confiança Correr risco no

relacionamento Risco percebido

Tendência da pessoa que confia

presumidamente, leva com a pessoa como elas interagem em diferentes situações (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995). “Nessa abordagem, confiança é vista como um traço que conduz à expectativa sobre a confiança de outros” (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995, p. 715). Os autores se referem a esse traço no modelo como a propensão em confiar. “A propensão pode ser pensada como um desejo genérico em confiar em outros. A propensão influenciará o quanto de confiança uma pessoa tem para um confiado anterior aos dados daquela parte em particular estarem disponíveis” (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995, p. 715).

Mesmo com a propensão em confiar, é possível para uma simples pessoa ter níveis variados de confiança em relação aos confiados, fazendo o estudo de propensão, por si só, insuficiente. Mayer, Davis e Schoorman (1995) sugerem um método para entender esses níveis variados de confiança, considerando atributos dos confiados que exprimem confiança ao trustor. “As características e ações dos confiados conduzirão aquela pessoa a ser mais ou menos confiável” (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995, p. 717). Com o propósito de localizar com precisão a característica mais influente, os autores conduziram uma revisão dos fatores que levam à confiança (MAYER; DAVIS; SCHOORMAN, 1995). Embora tenham sido identificados vários fatores antecedentes em sua pesquisa, os autores observaram que três características apareceram com maior freqüência. Mayer, Davis e Schoorman (1995) se referem a essas três (capacidade, benevolência e integridade) como os fatores da probidade. “Nossa decisão em tratar todos os três como contribuidores para a confiança foi baseada em nossa visão que eles têm um adicional de qualidade em determinar o nível de confiança. [...] [Contudo,] todas as três concepções são distintas teoricamente” (SCHOORMAN; MAYER; DAVIS, 1996b, p. 339).