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Iniciamos pelo levantamento das ocorrências dos mecanismos de referenciação, uma vez que, para os PCNs (BRASIL, 1998), o aluno do Ensino Fundamental, ao final desse ciclo, deve ser capaz de escrever textos coesos que possibilitem a compreensão do leitor. Para tanto, buscamos identificar nos textos quais os fenômenos de referenciação mais usados e se esses favoreciam a progressão textual. Nossa análise fundamentou-se em trabalhos sobre coesão referencial, tendo como autores de base Adam (2008) Marcuschi (1983, 1992, 2004, 2005), Koch (1990, 2004, 2008), entre outros.

2.3 A abordagem etnográfica

Nosso trabalho se circunscreve na abordagem etnográfica. De acordo com André (1995, p. 36-37), a pesquisa etnográfica foi mais aplicada nas salas de aula a partir dos anos 1970. No início dessa década, “visava registrar comportamentos de professores e alunos numa situação de interação”. Esses trabalhos eram usados, em sua maioria, para estudar as interações, treinar professores ou verificar o sucesso de programas de ensino. As críticas dirigidas a essas pesquisas diziam respeito, sobretudo, ao fato de ignorarem, muitas vezes, o contexto espaço temporal.

Na década de 1980, as pesquisas etnográficas já eram bastante difundidas, principalmente na área da educação. Nesta direção, os trabalhos produzidos nessa época buscavam “descrever as atividades de sala de aula e as representações dos atores escolares” (ANDRÉ, 1995, p. 40).

A abordagem etnográfica caracteriza-se, fundamentalmente, pela presença do observador no espaço pesquisado. Para auxiliar no processo de coleta de dados, o etnógrafo pode dispor de ferramentas, tais como: diário ou notas de campo, gravações, entrevistas e fotografias. Em nossa pesquisa, as gravações não foram realizadas com sucesso devido ao barulho excessivo dos alunos e ventiladores. Dessa forma, nossa principal ferramenta se constitui de registros (descrições escritas) das situações vivenciadas no decorrer do período de observação.

Segundo Frank (1999, p. 86), podemos dividir o trabalho do etnógrafo em três etapas, sendo elas: (1) compreensão e descrição, (2) análise e interpretação e (3) construção do

conhecimento; que detalharemos a seguir dialogando também com outros autores, entre eles, Bogdan (1994) e André (1995).

1. Compreender e descrever: nessa etapa, produzimos o conhecimento êmico através das tomadas de nota e, em seguida, a elaboração. Vale ressaltar que “a observação não é passiva. Observadores olham, escutam, perguntam, registram e analisam” (FRANK, 1999, p. 86)12 .

2. Análise e interpretação: as interpretações devem ser baseadas em evidências coletadas na primeira etapa. A análise se dá de forma indutiva. Nela, “o processo de análise dos dados é como um funil.” (BOGDAN, 1994, p. 50); devemos, então, partir do macro para interpretar o micro, uma vez que o processo em si é o foco do estudo. A preocupação com o processo, segundo Merrian (1988 apud ANDRÉ, 1995, p.51), “envolve, por um lado, a descrição do contexto e da população em estudo e, por outro lado, a tentativa de verificar como evoluiu o evento”. No nosso caso, procuramos observar se, no decorrer do segundo semestre, os alunos progrediram no que concerne ao uso dos mecanismos de referenciação como fator de progressão textual.

3. Construções do conhecimento (epistêmico): por fim, os dados recolhidos e analisados serão elaborados, vislumbrando a construção do conhecimento e a colaboração acadêmica e social.

Uma das vantagens do etnógrafo é a possibilidade de observar um fenômeno social sob múltiplas perspectivas. Na sala de aula, por exemplo, temos vários pontos de vista: o do professor, o dos alunos, o dos pais e o da equipe pedagógica. Cada um desses segmentos tem uma forma de olhar diferente para o cotidiano escolar. O olhar do observador, por sua vez, deve entender o processo de ensino-aprendizagem sob múltiplas perspectivas, fazendo questionamentos críticos e refletindo acerca dos fenômenos identificados. De acordo com Frank (1999, p.4) 13:

Os estudantes verão as salas de aula de uma maneira, os professores de outra, e o etnógrafo de uma terceira maneira. Em justapondo essas visões, vemos o que é real a partir de uma variedade de perspectivas. Compreender que nunca há um objetivo completamente considerado é perceber múltiplas perspectivas. 12 Tradução nossa. 13 Tradução nossa.

Dessa forma, a etnografia favorece a reconstrução da prática social, revelando suas características e contradições. Por isso, mesmo a etnografia sendo uma ciência flexível, na qual o olhar do etnógrafo é guiado pela observação, antes de iniciarmos o estudo, devemos ter um foco, um objeto definido, um problema que buscaremos compreender.

André (1995, p.42) postula que, para explicar o cotidiano escolar, devemos estudá-lo com base em três dimensões: 1- institucional ou organizacional; 2 - instrucional ou pedagógica; 3 - sociopolítico-cultural.

O estudo dessas três dimensões revela a necessidade de conhecermos o contexto, ou seja, as relações de incorporação e interação, uma vez que estas são particulares de cada situação e de seus atores sociais. Assim sendo, o olhar do etnógrafo não deve estar voltado apenas para o fenômeno estudado, mas também para as variantes internas e externas do universo escolar. Vejamos o exemplo apresentado por Troike (2005, p.125)14:

Se o foco se encontra em estudantes em uma situação educativa, por exemplo, isso incluirá obviamente a própria escola, como também a área de jogo, o lugar e as imediações sociais mais frequentadas pelas crianças o que parece ter um impacto mais afetivo e linguístico sobre ela.

Em nossa pesquisa, optamos por apresentar os dados do contexto sociocultural dos alunos através de descrições e dados quantitativos. Para Troike (2005, p.121),15 “os procedimentos quantitativos podem, por sua vez, servir para determinar a confiabilidade da observação qualitativa”. O autor esclarece, portanto, que a presença dos dados quantitativos tem sua validade na pesquisa etnográfica, desde que estes sejam mediados pelos processos qualitativos e usados como uma forma de facilitar a apresentação dos dados. Concluímos, então, que o método quantitativo pode auxiliar no processo etnográfico, ajudando às pessoas que não conhecem a comunidade pesquisada e facilitando, assim, uma melhor compreensão de determinadas características através da visualização de gráficos e quadros.

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