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“O Silêncio é a alma das Agressões Sexuais”

Anna Salter

“SÍNDROME DE SEGREDO”

…“Algumas crianças podem manter segredo para evitar o rompimento da família e/ou para proteger o perpetrador da prisão.”143

O Segredo, o silêncio e a consequente ocultação dos factos ocorridos e tipificados como abuso sexual de crianças é considerado o maior impedimento na intervenção das entidades competentes para protecção do menor. Sem conhecimento do crime não é possível auxiliar a vítima. Neste contexto, o segredo releva como seguimento do abuso, tendo TILMAM FURNISS estudado o motivo que leva o menor a ocultar a realidade do abuso e tendo intitulado como “síndrome do segredo”, incidindo em casos, na sua maioria, intra familiares. Esta teoria é desenvolvida assentando no pressuposto da ligação afectiva entre o abusador e a vítima, mormente a sua influência na criança. O silêncio, após uma situação de abuso sexual, é devido ao medo sentido pela criança e incutido pelo abusador, na desacreditação por parte dos outros adultos ou no seu sentimento de culpa pelo abuso.

O silêncio manifesta factores externos e internos, sendo os primeiros ligados a ameaças por parte do agressor, castigos ou receio destes, bem como a tentativa frustrada de denunciar. Os factores internos são respeitantes à própria vítima, encontrando-se manipulada e dominada pelo agressor, criando na sua mente mecanismos de defesa por forma a dissociar o agressor da figura familiar e tornando-o num estranho durante o momento da agressão. Esta distinção resulta, na mente do menor, em encontrar rituais de entrada e saída, em que o abusador durante o acto deixa

143 DATTÍLIO, F.M; FREEMAN, A. – Estratégias Cognitivo-Comportamentais para Intervenção em Crises (Volume II), Campinas: Editorial Psy, 1995, página 236.

77 de ser o membro da família querido e transforma-se no monstro que apenas aparece quando os actos sexuais se verificam. No final do acto, na mente do menor, o abusador torna-se novamente no familiar. Este síndrome resulta, assim, num sentimento de tristeza da vítima, bem como problemas na sua personalidade e confusão mental relativa às figuras parentais ou familiares.

“SÍNDROME DE ACOMODAÇÃO”

RONALD SUMMIT descreve em 1983 esta síndrome com o intento de compreensão dos comportamentos de uma criança abusada, tidos e revelados de forma inconsciente. Após estudadas as reacções dos menores relativamente aos abusos intra familiares144 concluiu que cinco predominavam, sendo estas: o segredo; o desamparo; a acomodação; a revelação; a retractação. Neste seguimento, o segredo resulta, inevitavelmente, da intimidação encoberta ou directa por parte do agressor, existindo sempre a consciência que, se a criança revelar, verificar-se-ão consequências negativas. Em regra, o agressor permanece em contacto com o menor o que permite o desenvolvimento de uma serie de condutas para a não revelação do abuso sexual. Segue ao segredo o desamparo. O menor, decorrente da sua imaturidade, inexperiência, ou dos laços afectivos com o abusador, não sabe o comportamento que deve assumir, com quem deveria confidenciar e se o deveria fazer, surgindo inevitavelmente uma solidão determinante para que não exista revelação por parte do menor a quaisquer pessoas em seu redor, afinal, o mesmo já nem sabe em quem deverá confiar. Esta reacção conduz a uma outra, o desenvolvimento da acomodação. Na verdade, nunca existiu relato dos acontecimentos por parte da criança que se, sentindo-se desamparada, mantem o segredo do abuso sexual com receio das eventuais repercussões tanto para si como para a sua família. Usualmente as crianças criam mecanismos de defesa para o ajuste ao abuso sexual provindo de uma figura que, na maior parte dos casos, lhe é querida. Verificando-se a revelação do segredo em altura tardia ou após um conflito familiar, a palavra do menor é mais desacreditada. Embora a revelação, é criado ambiente de instabilidade tal no contexto familiar que a criança, ao encarar essa conjuntura, retrai-se. Com esta reacção de

144 No contexto intra familiar pois, para além de ocorrerem com maior frequência, do laço entre a vítima e abusador resultam características de proximidade e afectividade diferenciadas das que se verificam nos abusos em que a vítima desconhecia o agressor e que, na maior parte dos casos, não volta a rever.

78 retracção da denúncia, a criança sente-se culpada afirmando, muitas vezes, que as suas alegações não eram verdade.

Todavia, nem todas as crianças passam por todas as fases, pois a própria natureza e personalidade de cada uma releva na aceitação ou não do abuso em si. Por vezes não existe segredo, mas na maior parte dos casos, quando o abusador é figura paternal ou com relevância familiar resulta na verificação dos factos descritos.

“SÍNDROME DA ADIÇÃO”

Esta síndrome é representado como adição145, no sentido de que os menores são utilizados como iteração de comportamento gratificante, tal como aquando da utilização de drogas ou álcool.

Neste caso, esta síndrome tem a particularidade do abuso consistir num alívio de tensão, sabendo o abusador que o seu acto é incorrecto, bem como que consiste em crime e que é prejudicial ao menor, não se coibindo, no entanto, de o levar a cabo. Este síndrome caracteriza-se igualmente pela compulsão à repetição, pela evasão da realidade, assente numa dependência psicológica que é negada ao abusador e que, caso não exista o acto de abuso, leva a uma situação de abstinência do agressor, podendo resultar em ansiedade, agitação ou irritabilidade. Desta forma o menor é visto como objecto do qual o abusador cria dependência psicológica, como iria criar com os exemplos dados anteriormente (drogas, álcool…).

“SÍNDROME DE ACESSÓRIO PARA O SEXO”

Esta síndrome surge na obra Sexual Assault of Children and Adolescent de Burgess, Groth, Sgroi e Holmstrom, sendo semelhante às síndromes da adição e do segredo. Desta forma, este recai no poder existente entre o menor e o abusador assente no poder de autoridade, pois o menor

79 não é capaz de dar o seu consentimento. Todavia, pode ser entendido por esta teoria que a vítima possibilite o desenrolar do abuso pela posição secundária que assume. O segredo nesta perspectiva assume níveis como o medo por parte dos menores de serem punidos, de não serem acreditados, de serem rejeitados, bem como pela dificuldade de comunicação com os adultos e por actuar como subordinado.

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