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5. Mecanismos de transporte no betão:

2.1. M ECANISMOS DE DETERIORAÇÃO DO BETÃO

2.1.1. Mecanismos extrínsecos de deterioração

2.1.1.4. Acções químicas

A deterioração de natureza química, proveniente do exterior está associada à acção do dióxido de carbono e gases industriais, iões agressivos, como, por exemplo, cloretos, sulfatos e magnésio, ácidos e águas puras (Costa, et al., 1999).

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Acções dos ácidos

O betão, pelo facto de ser um material altamente alcalino, não se mostra muito resistente ao ataque por ácidos. A sua deterioração provocada por esta acção ocorre da reacção entre os compostos do cimento e a solução atacante, levando ao desenvolvimento de compostos que são lixiviados do betão, podendo também permanecer numa forma não aderente ao betão, originando a perda progressiva de resistência (Gomes, 2008). Na maioria dos casos, destas reacções resulta a formação de compostos de cálcio solúveis em água que são depois libertados (Moreira, 2006) .

Devido à alcalinidade do betão, o ácido não consegue penetrar no betão denso, sem ser neutralizado à medida que vai avançando em profundidade. Assim, não se pode dar uma deterioração no interior do betão, sem que a pasta de cimento na superfície seja totalmente destruída, sendo a velocidade de penetração proporcional à quantidade de material capaz de neutralizar o betão, nomeadamente o hidróxido de cálcio, o gel C-S-H e os agregados. Na prática, o grau do ataque aumenta com o aumento da acidez, ocorrendo para valores do pH abaixo de 6.5 sendo o ataque severo para valores inferiores a 4.5.

Se o ácido chegar até ao aço através da fissuração ou da porosidade do betão a corrosão irá ocorrer, o que provocará um nível de degradação ainda maior no betão (Moreira, 2006).

No tabela 2.3, são apresentados alguns dos ácidos que podem degradar quimicamente o betão (Gomes, 2008).

Tabela 2.3 - Ácidos que causam ataque químico no betão (Gomes, 2008)

De referir ainda a acção das chuvas ácidas, que apresentando na sua composição CO2, pode atacar o betão. Na Figura 2.18, seguinte apresenta-se esquematicamente este ataque.

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Figura 2.17 - Ataque de ácidos no betão (CEB, 1992)

O contacto do betão com soluções ácidas pode ocasionar uma redução da resistência à compressão até 65%, dependendo do tipo de cimento, agente agressivo, consumo de cimento e razão a/c. Na Figura 2.19 é possível observar o ataque do betão pelo ácido sulfúrico produzido por bactérias (Ferreira, 2000).

Figura 2.18 - As bactérias no sistema de esgoto produzem ácido sulfúrico que ataca o betão (Ferreira, 2000)

Por último, há que realçar a diferença entre o ataque por ácidos e o ataque por sulfatos ou álcalis. No primeiro caso, o sistema de poros é destruído como um todo, uma vez que os ácidos reagem com todos os componentes do cimento, enquanto no segundo caso apenas certos componentes são atacados, sendo a permeabilidade do betão de extrema importância.

29 Em casos de ataque leve por ácidos, um nível aceitável de protecção pode ser alcançado mediante a adopção de medidas preventivas, nomeadamente, a redução da permeabilidade do betão, promover a secagem do betão antes de este ser exposto aos ácidos e, através de tratamentos artificiais das superfícies expostas do betão utilizando, como por exemplo alcatrão de carvão, pinturas de borracha e betuminosas, resinas epóxidas e outros agentes. É no entanto importante que o revestimento seja aderente ao betão, e também, resistente ao desgaste por acções mecânicas (Brandão, 1998).

Acções das águas puras

Águas puras são definidas como sendo águas que não contêm sais dissolvidos e, portanto, possuem uma grande capacidade de dissolução, podendo desta maneira danificar seriamente a pasta de cimento, a partir da lixiviação dos seus constituintes, degradando assim a estrutura porosa do betão. Consideram-se águas quimicamente puras, entre outras, a água destilada, a água dos poços em regiões siliciosas, águas provenientes da condensação ou degelo e algumas águas provenientes de montanhas. No entanto, águas que já contenham sais dissolvidos têm a sua capacidade de dissolução bastante reduzida (Brandão, 1998).

A acção das águas puras decompõe determinados compostos do cimento através da dissolução do hidróxido de cálcio, e, até determinado ponto, os compostos de alumina. A lixiviação contínua apenas deixa um resíduo amorfo de sílica hidratada, óxido de ferro e alumina.

Este tipo de ataque revela-se, no entanto, geralmente muito lento, (Moreira, 2006), sendo que, para que os danos sejam significativos, o ataque deverá ocorrer durante um longo período de tempo.

De modo a poder minimizar os danos provocados por estes ataques, poderá recorrer-se a algumas precauções, nomeadamente minimizar a permeabilidade do betão, utilizar cimentos pozolânicos ou de alto-forno para prevenir a dissolução do hidróxido de cálcio e promover tratamentos superficiais de modo a impedir o acesso da água no betão (Brandão, 1998).

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Ataque sulfático externo

O ataque por sulfatos pode ser distinguido tendo em conta a origem dos sulfatos, podendo ser provenientes do exterior, reacção sulfática externa, ou dos componentes usados no fabrico do betão, reacção sulfática de origem interna (Soares, et al., 2008). Neste ponto, será abordado o ataque por sulfatos provenientes do ambiente exterior.

Os sulfatos no estado sólido não atacam o betão; no entanto, quando presentes em solução, reagem com a pasta de cimento hidratada (Costa, et al., 1999).

Figura 2.20 - Superfícies degradadas por acção de reacções sulfáticas de origem externa (Costa, et al., 1999)

O ião sulfato ataca essencialmente os aluminatos hidratados do cimento endurecido formando-se etringite que é, em presença de água em quantidade suficiente, um composto expansivo. Esta reacção pode ser de tal modo expansiva que o volume final pode atingir duas vezes e meia o inicial. Como consequências, regista-se a formação de tensões internas que originam fissuração irregular no betão, facilitando a penetração posterior de mais substâncias agressivas e a consequente progressão da deterioração.

Os sulfatos podem ser encontrados em solos, dissolvidos em águas dos lençóis freáticos, em aterros contendo resíduos industriais e também na água do mar (Brandão, 1998).

Para que o ataque sulfático externo ocorra, é necessário que se verifiquem em simultâneo as três condições seguintes (Soares, et al., 2008)

 Elevada permeabilidade do betão;

 Ambiente rico em sulfatos;

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Figura 2.21 - Representação da formação da etringite relacionada com a RSE (Adaptado de (Soares, et al., 2008))

Devido ao facto de o assunto das reacções sulfáticas de origem interna ser abordado em profundidade, num capítulo posterior, não será aprofundado aqui.

Ataque dos cloretos

O ataque de cloretos distingue-se dos outros tipos de ataques químicos que degradam o betão, uma vez que o resultado principal é a corrosão do aço, sendo apenas uma consequência desta corrosão a deterioração do betão vizinho. É do conhecimento geral que a corrosão da armadura de aço no betão armado, uma das principais causas de deterioração das estruturas de betão, é facilmente induzido pela presença de iões cloro. Importa saber no entanto, quanto tempo demoram os iões cloro a passar do ambiente para o betão e alcançar uma concentração suficiente para iniciar a corrosão da armadura (Ferreira, 2000).

O mecanismo de transporte dos cloretos no betão é complexo, podendo dar-se por difusão de iões ou por sucção capilar, estando envolvidas reacções químicas e físicas na fixação dos cloretos. Parte dos iões podem assim ser incorporada nos produtos de hidratação do cimento, ou seja, fixada quimicamente, sendo outra parte fixada fisicamente e absorvida na superfície dos microporos. Apenas uma terceira parte de cloretos, designados por livres, que se deslocam de um local para o outro, é que é capaz de destruir a camada passiva na superfície da armadura de aço, iniciando-se assim o processo de corrosão das armaduras. No entanto, é de realçar o facto de a distribuição dos cloretos por cada uma das três partes não ser constante (Ferreira, 2000). A penetração de cloretos a partir do ambiente exterior devida aos vários mecanismos de transporte provoca um aumento da concentração de cloretos nas camadas superfíciais do betão, que vai diminuindo sucessivamente para o interior. A Figura 2.23, representa essa concentração de cloretos relativamente à distância à superfície de um betão exposto ao ambiente marítimo, designando-se por perfil de concentração de

 Poros capilares (elevada A/C e baixa cura);

 Micro-vazios (baixa A/C e inapropriada compactação do betão fresco relacionada com a inadequada trabalhabilidade;

 Micro fissuras (peso e ciclos de aquecimento/arrefecimento e gelo/degelo)

 Água

 Solo

32 cloretos. Um perfil de cloretos vai variando ao longo do tempo à medida que uma maior quantidade de cloretos vai penetrando do exterior e os cloretos já presentes no betão tendem a penetrar mais para o interior (Costa, et al., 1999).

Figura 2.22 - Evolução do perfil de cloretos no tempo (Costa, et al., 1999)

Quando as condições ambientais são variáveis, como por exemplo na zona atmosférica e na zona de rebentação do ambiente marítimo, a humidade da zona superficial do betão varia ao longo do tempo. O mecanismo de penetração das camadas superficiais processa-se de acordo com o exposto na Figura 2.24.

33 A concentração de cloretos nas camadas superficiais do betão vai variando ao longo do tempo atingindo um valor máximo no interior do betão. Os mecanismos de transporte referidos anteriormente processam-se sequencialmente, sendo que na zona superficial o transporte se dá por convecção devido à sucção capilar e no interior do betão este faz-se essencialmente por difusão (Costa, et al., 1999).

Na prática, a prevenção da corrosão está na verificação da penetração dos cloretos pela camada de recobrimento do betão. Pode assim reduzir-se o início da corrosão através do uso de determinados materiais cimentícios, que promovem uma redução da permeabilidade do betão, ampliando assim a sua resistência (Gomes, 2008).

Ataque por dióxido de carbono

Os ataques por dióxido de carbono, em conjunto com a penetração de cloretos, referida no ponto anterior, revelam-se como os principais condicionantes da corrosão das armaduras. Este fenómeno ocorre naturalmente, sempre que uma estrutura de betão está exposta a dióxido de carbono (CO2), tendo como

principal consequência a redução da alcalinidade da pasta de cimento, responsável, juntamente com outros factores, pela protecção das armaduras contra a corrosão.

Praticamente todos os constituintes do cimento hidratado são susceptíveis ao ataque por CO2, sendo que os

factores que mais contribuem para a intensidade do ataque são as condições ambientais e, principalmente, a quantidade de CO2 agressivo (Brandão, 1998).

Este processo começa, com a penetração do CO2 no betão através da sua estrutura porosa e do processo de

difusão, dissolvendo-se posteriormente na água presente nos poros, reagindo assim com o hidróxido de cálcio. Desta reacção resulta o carbonato de cálcio (CaCO3), praticamente insolúvel em água, contribuindo assim para

a obstrução da estrutura porosa do betão, aumentando assim a sua resistência e densidade. Esta reacção vai ocorrer enquanto houver hidróxido de cálcio disponível.

O CO2 pode ser encontrado na atmosfera (variando entre os 0,03% e 1,2%), existindo em maior abundância em

centros urbanos e áreas industrializadas, existindo também dissolvido em água, como por exemplo na água do mar, ou da chuva ácida que penetra no solo, onde a concentração do CO2 livre pode ser elevada devido à

decomposição vegetal (Brandão, 1998).

Tendo em vista a minimização deste ataque, poderão ser tomadas algumas medidas, nomeadamente a minimização da permeabilidade, evitar o uso de cimentos pozolânicos, pois são menos resistentes à acção do CO2. No caso do betão armado, há que adoptar recobrimentos adequados, recorrendo à protecção do betão

mediante a cristalização dos poros nas superfícies expostas ao meio agressivo. Deve ainda existir a preocupação em evitar o contacto do betão com o CO2 durante o processo de endurecimento, visto que

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Ataque pela água do mar

Apesar de expor este ponto nas acções de origem química, o ataque da água do mar é caracterizado não só por acções de origem química como também de origem física. Assim, a acção física das ondas sujeita o betão a cargas de impacto, provocando a erosão da superfície por desgaste e cavitação. A origem química destes ataques está relacionada com os constituintes agressivos da água do mar, nomeadamente sais como os cloretos de sódio, magnésio e potássio, sulfatos de magnésio, cálcio e potássio, sendo o teor de cloretos muito superior à de sulfatos (Brandão, 1998).

O mecanismo do ataque químico envolve dois aspectos principais: a penetração das substâncias agressivas e a subsequente reacção com os produtos hidratados da pasta de cimento susceptíveis de ser atacados. (Costa, et al., 1999) O ataque do ambiente marítimo pode, então, ser dividido em três zonas distintas em função do posicionamento do elemento de betão armado em relação ao nível do mar.

Figura 2.24 - Mecanismo do ataque químico pela água do mar (Appleton, et al., 2010)

Como é possível identificar na Figura 2.25, distingue-se zona atmosférica, zona de maré e zona submersa. Assim, (Ferreira, 2000):

 Zona atmosférica: situa-se acima da zona de maré alta, não estando directamente em contacto com a água do mar, estando no entanto, exposta ao ar atmosférico, acção de geadas e de sais transportados pelo vento. A fendilhação devida à corrosão das armaduras ou aos ciclos de gelo/degelo é o fenómeno mais deteriorante e frequente nesta zona;

 Zona de maré: encontra-se situada entre marés, estando sujeita a ciclos alternativos de molhagem/secagem, gelo/degelo, impacto das ondas e de gelo flutuante, abrasão de areias e corrosão das armaduras. É por isso uma zona extremamente fustigada pela acção da água do mar;

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 Zona submersa: revela-se relativamente estável, onde a acção do gelo/degelo e corrosão das armaduras não ocorrem. A acção de deterioração predominante é o ataque químico que provoca perda de resistência.

É importante realçar que, em geral, não existem limites bem definidos entre zonas e que, como foi visto, cada zona corre riscos específicos de deterioração.

A densidade do betão, o tipo e a dosagem de cimento desempenham um papel essencial na resistência do betão à água do mar. Betões produzidos com aluminatos de cálcio, cimentos supersulfatados e aqueles que contêm materiais cimentícios adicionais, apresentam um melhor comportamento nesta situação (Ferreira, 2000).

Figura 2.25 - Deterioração de estacas pelo ataque químico da água do mar (Appleton, et al., 2009/2010)

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