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Entre os vários aspectos que demandam pesquisa no tema da gestão de recursos hídricos está a avaliação do nível de compreensão da população concernente à questão da água, particularmente no que se diz respeito sobre os instrumentos de gestão previstos na Lei nº 9.433/97. Neste contexto, a sociedade possui um papel fundamental na decisão a respeito dos instrumentos de gestão, podendo até no caso do instrumento de cobrança, aprovar ou reprovar metodologias adotadas para definição dos valores a serem cobrados pelo uso da água nas suas parcelas "retirada de água" e "lançamento de efluentes".

De acordo com MARTINEZ & BRAGA (1997), a aplicação de instrumentos econômicos associados a instrumentos de regulamentação é utilizada em muitos casos ao redor do mundo pois aumenta a flexibilidade, a eficiência e a relação custo/eficácia da política ambiental. São citadas ainda, como vantagens da integração entre cobrança e outorga: a facilidade de controle, a colaboração dos usuários na fiscalização e a facilidade de aceitação da cobrança pelos usuários (KELMAN, 2000).

A importância da transparência na cobrança pelo uso da água bruta é essencial para o sucesso do próprio modelo de gestão de recursos hídricos, ora em implementação em nosso país (VANNI, 2006).

Segundo MAGALHÃES et al. (2003), para que um modelo de cobrança seja aprovado

pela sociedade, necessita atender às seguintes condições: (i) aceitabilidade pública e política; (ii) simplicidade conceitual e transparência; (iii) facilidade de implantação e operação; (iv) compatibilidade com os demais instrumentos de gestão. A aceitação por parte dos usuários da bacia é de fundamental importância para a legitimação da cobrança.

No entanto, tamanha simplificação nas fórmulas de cobrança traz problemas, na medida em que diversos aspectos notoriamente relevantes deixam de ser considerados. Sendo assim, conforme o sistema ganhe credibilidade e aceitação pública, espera-se que as fórmulas sejam aperfeiçoadas de maneira a refletir, da melhor maneira possível, a real influência de cada usuário na disponibilidade hídrica da bacia (MOCZYDLOWER, 2006).

Podem ser citados alguns estudos referentes ao conhecimento e aceitabilidade social sobre o recurso natural água:

VARGAS et al. (2002) apresentaram um estudo sobre a percepção da sociedade dos

problemas de quantidade, qualidade e custo dos recursos hídricos nas cidades de São Carlos inserida na Bacia Hidrográfica do Rio Tietê - Jacaré e na cidade de Piracicaba, que se insere nas Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Neste estudo realizou-se um survey amostral, baseado na aplicação de um questionário padrão, tendo por objetivo conhecer a percepção que os usuários domésticos têm sobre diferentes aspectos da água, bem como sua disposição em pagá-la e economizá-la. Com relação ao problema da cobrança pelo uso da água, a pesquisa indica que a medida não tem o apoio da maior parte da população em ambas as cidades, no entanto, a população de Piracicaba está mais sensibilizada para os problemas de poluição hídrica que a de São Carlos, tendendo a prestar maior apoio a iniciativas de uso racional da água. Entretanto, a pesquisa indica também que a falta de conhecimento e percepção destes problemas é ainda muito grande em ambas as cidades e bacias.

PAULA & PEREIRA (2004) avaliaram a percepção do consumidor doméstico da Região Metropolitana de Campinas sobre o recurso natural água e a maneira como ela interfere na qualidade do envolvimento e do comprometimento com sua conservação. Neste estudo realizou-se entrevista pessoal com 318 habitantes da Região Metropolitana de Campinas visando conhecer o nível de compreensão do consumidor concernente à questão da água, particularmente no que diz respeito à escassez e ao abastecimento. A pesquisa mostra que as pessoas da região reconhecem na água a qualidade de finita e de não perene, porém não apresentam consciência da escassez, suficientes para a mudança de seu comportamento em relação ao uso da água. Além disso, a mudança de hábitos mostrou-se intimamente relacionada ao fator econômico. A pesquisa aponta também uma demanda muito grande de informações sobre as questões relacionadas à água, que a população desconhece.

FORGIARINI (2006) avaliou a aceitabilidade da cobrança pelo uso da água na Bacia do Rio Santa Maria no Rio Grande do Sul. Neste estudo, a aceitabilidade foi analisada por

meio de um questionário aplicado à população objetivando avaliar o conhecimento do uso e consumo da água e o conhecimento do Comitê de Bacia sobre a cobrança. A pesquisa constata que a população desconhece o sistema de gerenciamento dos recursos hídricos. No entanto, de um modo geral, a população é favorável à cobrança com os objetivos estabelecidos na legislação brasileira.

Na fase inicial de implementação da cobrança, para que a mesma tenha um alto grau de aceitabilidade por parte dos usuários-pagadores e da sociedade civil, faz-se necessário, na maioria dos casos, que a metodologia de cobrança seja a mais simples possível e de fácil compreensão, baseada em parâmetros facilmente quantificáveis. Sendo assim, ter-se-ia uma primeira aproximação, através dos membros do comitê, objetivando dar início ao processo que talvez seja o mais difícil na implementação do novo sistema de gestão: a operacionalização da cobrança pelo uso da água bruta.

Um aspecto da aceitabilidade é enfatizar os benefícios. O desenvolvimento aceitável requer um balanço que leve em consideração às opções de desenvolvimento, bem como seus benefícios e malefícios. Devem incluir os efeitos econômicos completos bem como considerações sobre a sustentabilidade e o meio ambiente (GIMENES, 2000).

A questão da aceitabilidade e minimização de impactos econômicos estão em oposição à função sinalizadora da cobrança. Se o valor da cobrança for alto, privilegiando o princípio sinalizador e servindo como instrumento de indução de investimentos em controle de poluição, o impacto no custo do usuário pode ser significativo o bastante para ameaçar a aceitabilidade da cobrança. Por outro lado, baixos valores podem facilitar a aceitação da cobrança, mas ao mesmo tempo não incentivar à adoção de práticas de uso racional da água (PERH-SP, 2004).

Dentro deste enfoque, faz-se necessário que a cobrança pelo uso da água bruta seja bem aceita pelos atores envolvidos para que a implementação deste instrumento de gestão seja bem sucedida. Desta maneira, cria-se uma tensão entre as metas ambientais versus a aceitabilidade da cobrança, à qual o gestor de recursos hídricos deve fazer face. Sendo assim, mesmo que um dos objetivos da cobrança seja incentivar o uso racional da água, faz-se necessário verificar os impactos sobre os diversos setores usuários, de forma que este instrumento não cause efeitos indesejáveis, dificultando, assim, sua aceitação (PERH-SP, 2004).

A aceitabilidade da cobrança, por exemplo, por parte dos usuários na Bacia do Paraíba

do Sul é um requisito fundamental para a legitimação da cobrança. O caráter participativo do

CEIVAP permitiu a intervenção dos usuários no debate sobre a metodologia da cobrança, facilitando assim a aceitação da cobrança pelas partes interessadas (PERH-SP, 2004).

A questão da aceitabilidade mostra-se bastante crítica no caso do setor agropecuário. A análise da experiência internacional evidencia que há uma grande dificuldade de implementação da cobrança neste setor, ainda que o setor agrícola seja um dos principais usuários de recursos hídricos. Em praticamente todos os países em que a cobrança vigora, o setor agropecuário mostra-se hostil ao instrumento e apresenta uma importante capacidade de mobilização para evitar que o uso agrícola da água seja cobrado. Na maioria dos casos,

argumenta-se que a cobrança acarretará em importantes custos adicionais aos usuários agrícolas (PERH-SP, 2004).

Neste enfoque, aponta-se a necessidade da participação dos comitês de bacia hidrográficas em conjunto com as prefeituras, as universidades e as escolas a fim de investirem em programas formais e informais de educação ambiental mais voltados para o uso racional dos recursos hídricos nos aspectos de quantidade e qualidade (captação, consumo e lançamento de efluentes). Nestes programas, deve ser enfatizado que a cobrança deve contribuir na racionalização do uso da água, consequentemente visando a sustentabilidade, harmonizando os aspectos sociais, econômicos e ambientais.

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