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5 COMPREENDENDO A EXPERIÊNCIA DE INTERVENÇÃO PARA

5.4 ACOLHIDA E HOSPITALIDADE PARA ALÉM DO ENSINAR E

ACOLHIDA INCONDICIONAL DE UMA SABEDORIA PARA ALÉM DO SER

A acolhida do Outrem pelo rosto é abertura a razão não ontológica, desejo e vontade que me atrai na responsabilidade insubstituível diante de sua presença. É relação com o Outro vulnerável, “palavra ou acolhimento do rosto do Outro, hospitalidade e não tematização” (LÉVINAS, 1988, p. 196-279). Esta decisão do acolhimento do Outro é responsabilidade primeira da sua presença, que não posso negá-la. Somente pela exterioridade da presença do rosto será possível surgir um “acontecimento ético da sociedade” (1988, p. 185), saída de si, abandono do discurso esvaziado de sentido, regido unicamente pela razão interior cognoscente. Novamente Lévinas propõe: “A humanidade da consciência não está absolutamente nos seus poderes, mas na sua responsabilidade. Na passividade, no acolhimento, na obrigação a respeito de Outrem: é o Outro que é primeiro” (LÉVINAS, 2015, p. 153).

Conforme Derrida, é preciso fazer o caminho de volta “[...] em direção ao Outro”, é uma tomada de posição pelo acolher do Outro. Na possibilidade do acolhimento do rosto, a filosofia primeira, sendo o significado da alteridade, que “determina o receber,

a receptividade do receber com relação ética”. O acolhimento: a porta para receptividade da ética, receber o outro para além do eu, a razão define um receber “aberto ou oferecido ao outro” A porta do acolher é um receber da razão do ensinamento que vem do rosto do Outro, “a porta aberta, maneira de falar, designa a abertura de uma exterioridade”. Pois o que acolhe também é acolhido em sua singularidade, em sua hospitalidade, tornando-se casa sua, terra sua. Aquele que convida é convidado. “Aquele que recebe é recebido, ele recebe a hospitalidade naquilo que considera como sua própria casa” (DERRIDA, 2015, p. 43-44, 58).

Está tomada de posição é intenção, intencionalidade de abertura para o rosto do Outro, é hospitalidade como acolhimento responsável ao Outro que me faz sujeito na relação frente a frente do rosto. Portanto, é eticidade da hospitalidade no acolher do Outro, é ensinamento, é aprender no ensinar para além de todo conceito. É sabedoria Outramente que ser, pois é aprendizagem da relação, é ética no fazer filosofar do rosto do mestre. “Não há intencionalidade antes de e sem este acolhimento do rosto que se chama hospitalidade. E não há acolhimento do rosto sem este discurso que é justiça” (DERRIDA, 2015, p. 67-68).

A ética da alteridade em Emmanuel Lévinas parece revelar a chave do maior segredo dos homens, que poucos sabem usá-la em nossos dias. A chave do poder do ser humano para a humanidade contemporânea: a doação de si como responsabilidade primeira.

A chave desta porta, nos faz enxergar a fraqueza e a miséria do Outro não como oportunidade de dominação, mas com o olhar da Graça. Abre a porta da doação de si, do humano, plenamente humano, torna o rosto do Outro em mestre, pois o vê também, “numa dimensão de altura”, de alteridade como humano: “A nudez do rosto é penúria. Reconhecer outrem é reconhecer uma fome. Reconhecer Outrem – é dar. Mas é dar ao mestre, ao senhor, àquele que aborda como ‘senhor’ numa dimensão de altura” (LÉVINAS, 1988, p. 62).

De fato, a presença do Outro só pode acontecer na dimensão das experiências do mundo, no mundo afetado e possuído pelas totalidades do mesmo. Mas é justamente aí, neste aparecer simultâneo do dom de ser humano, serviço e doação de si, que Lévinas revela esta abertura do poder da eticidade humana. Onde “[...] pelo dom, a comunidade e a universalidade. A linguagem é universal porque é a própria passagem do individual ao geral, porque oferece coisas minhas a Outrem” (LÉVINAS, 1988, p. 63).

Onde encontrar esta chave na ética da alteridade que abre a porta para o humano, plenamente humano? Só encontramos esta chave na ética da alteridade a partir da responsabilidade, tornar-se responsabilidade por Outrem, essência do humano, completamente humano. É ser doação como responsabilidade por Outrem (cf. LÉVINAS, 2011, p. 135).

Esta chave da transformação contemporânea da totalidade é radical alteração ética na humanidade. Nisto o lituano Lévinas é filosofia radical. “O reconhecimento do Outro se torna o motor da alteração. Referindo-se precisamente a Lévinas” (BRIANÇON, p. 02)31.

O importante, enfim, é perceber esta tensão trazida na ética da alteridade, onde a singularidade e a universalidade precisam conviver juntas no face a face do rosto. As diferenças de Outrem em suas singularidades não significa aniquilar valores universais que nos fazem sujeito, não é auto - assujeitar- se. Como bem disse Abdallah – Pretceille, “a ética da alteridade reside numa tensão entre a singularidade das situações e a universalidade dos valores” (1997, p. 129)32.

A partir deste entendimento levinasiano, é preciso ser resistência a toda educação que possui uma proposta de aprendizagem que lança no esquecimento o existir da presença do Outro, desprovido da oportunidade de ser sujeito ético, humanizado no acolhimento do aparecer da presença do rosto do Outro. Ou seja, ensinar como acolhida incondicional de uma sabedoria para além do ser, só é possível na hospitalidade intencional do acolher vulnerável da presença do rosto do Outro. Uma proposta do ensinar que vai além dos conceitos, alteridade ética do ensinar que resiste a qualquer proposta totalizante e dominadora da presença do Outro. É ética da alteridade na interface do Outro na experiência do ensinar uma filosofia do rosto (cf. SILVA, 2015, p. 47).

31 « La reconnaissance de l’autre devient le moteur de l’altération. Faisant référence justement à

Lévinas » (BRIAÇON, p. 02 - tradução nossa).

32 “La reconnaissance des différences ne doit pas conduire à l'abandon du principe d'universalité, d'où

la recherche permanente d'un équilibre entre ces deux pôles. L'éthique de l'altérité se situe dans une tension entre la singularité des situations et l'universalité des valeurs” (ABDALLAH – PRETCEILLE,

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS - DESAFIOS QUE A ÉTICA DA ALTERIDADE