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III. CONTEXTUALIZAÇÃO DIDÁCTICA

3. ACTIVIDADES OUTDOOR E OS DIFERENTES TIPOS DE ENSINO

As formas ou fontes de aprendizagem podem-se dividir ou agrupar em três tipos diferentes de educação ou situações educativas: formais, não formais e informais (Coombs Y Ahmed, 1974; Kassam, 1982; King, 1982; La Belle, 1982; Tourinan, 1983; Garcia Carrasco, 1988; Trilla, 1993; Rivas, 1993a/nYuste, 1995).

A aprendizagem que cada cidadão vai adquirindo ao longo da sua vida, seja ela de natureza científica ou não, passa, então, necessariamente por uma das situações educativas de ensino

formal, ensino não formal e ensino informal, ainda que as suas ocorrências não sejam

equivalentes ao longo de toda a vida do indivíduo (Martins, 1999).

De um modo geral, cada tipo de ensino pode ser caracterizado do seguinte modo: i) Ensino Formal

- é estruturado e administrado segundo um conjunto relativamente rígido de leis, normas e

procedimentos;

- apresenta estruturas verticais e horizontais (classes de idade homogénea e ciclo hierarquizado) (Hamadache, 1991);

- envolve necessariamente a escola, a presença do aluno e do professor (ensino presencial) (Hamadache, 1991; Dib, 1997);

- apresenta conteúdos mínimos e definidos a ser desenvolvidos pelo professor num determinado número de horas;

- antecede, normalmente, a actividade profissional do indivíduo.

São exemplos de situações de ensino formal as tradicionais aulas de Ciências Naturais, Matemática, Físico-Química, etc. Este tipo de ensino processa-se, geralmente, através das escolas, institutos e universidades.

ii) Ensino Não Fornial

- tal como o formal, também o ensino não formal é intencional e tem objectivos bem explícitos de aprendizagem;

- encontra-se excluído do sistema educativo curricular (Yuste, 1995; Araújo, 2001); - as actividades são organizadas e estruturadas;

- embora podendo ocorrer na escola, desenvolve-se principalmente fora dela; - apresenta um carácter não obrigatório (Araújo, 2001);

- é normalmente concebido de forma a tornar-se agradável ("desejado pelo emissor e receptor") (Hamadache, 1991);

- as condições de admissão são mais flexíveis do que as do formal; - procura atingir um público heterogéneo (Araújo, 2001);

- apresenta grande variedade de situações educativas.

São exemplos de situações de ensino não formal as actividades outdoor (do tipo "Geologia no Verão") e os clubes de fotografia, de ciência..., que muitas vezes existem nas escolas. Este tipo de ensino processa-se, geralmente, através de museus, revistas especializadas, centros de ciência, cursos livres, clubes, actividades de campo, exposições e conferências/palestras.

iii) Ensino Informal

- ocorre no quotidiano de forma espontânea (Martins, 1999);

- pode ser visto como um processo de osmose entre aquele que aprende e tudo aquilo que o rodeia (Hamadache, 1991);

- distingue-se do ensino formal e não formal na medida em que nestes dois, o processo educativo pode ser diferenciado dos outros processos sociais enquanto que no ensino informal isso não pode acontecer (pois ocorrem simultaneamente) (Yuste, 1995); - não corresponde a uma visão organizada e estruturada de educação.

É exemplo de uma situação de ensino informal um diálogo entre amigos. Este tipo de ensino processa-se, geralmente, através da família, vizinhos e amigos, Igrejas, meios de comunicação, museus e jogos. Contribui de forma significativa, por exemplo, na aquisição da língua, valores culturais, atitudes, crenças gerais, conhecimentos e competências da vida diária de um dado meio.

Segundo Martins (1999), há que ter consciência que a ciência escolar é diferente de ciência para

a cidadania. O erro está em supor que aqueles que alcançaram bons níveis de ciência escolar, e

por ventura serão muitos, terão alcançado um nível de alfabetização científica que lhes será útil quando adultos, o que não é, necessariamente, verdade. Alho (1991) refere que a educação, hoje, não pode ser apenas o "ir à escola". Os imperativos de formação de uma sociedade complexa e em permanente mudança, como a sociedade do Séc.XXI, justificam o recurso à aprendizagem quer no ensino formal, quer no ensino não formal (ou mesmo no informal).

Nos nossos dias o progresso da Ciência e Tecnologia é tal, que o ensino formal é claramente insuficiente para toda a vida, pelo que para estimular uma actualização contínua dos conhecimentos e da informação científica, é necessário incrementar novos meios para fomentar a educação em ciência. Deste modo o ensino não fonnal assume um papel importante na formação contínua dos cidadãos. Os museus, as oficinas, as exposições, actividades de campo não estando subordinados ao sistema educativo curricular assumem um papel fundamental na alfabetização científica. A par do exposto, as actividades outdoor, concebidas como elemento do ensino formal ou do não formal, são potencializadoras de um nível de alfabetização científica que vai além da ciência escolar e que caminha no sentido da ciência para a cidadania. Por outras palavras, o desenvolvimento de actividades outdoor, nomeadamente no ensino não formal, promove uma aprendizagem permanente e contínua dos cidadãos intervenientes.

Contextualização didáctica 4. O MODELO DE NIR ORION

Foi com base no modelo organizativo proposto por Orion (1993), elaborado para o trabalho de campo em Geologia, destinado a alunos do ensino básico e secundário, que a actividade de campo inserida neste estudo foi planificada. Este modelo de aprendizagem para actividades no campo apresenta-se como alternativa às tradicionais saídas de campo em que a estratégia de aprendizagem se centra no professor e na informação que este transmite com a finalidade de dotar o aluno da maior quantidade de informação possível, servindo o contexto natural apenas para ilustrar e confirmar os fenómenos geológicos.

No modelo de Orion (1993), o ciclo de aprendizagem ocorre segundo um desenvolvimento tridimensional em que a hierarquização dos conceitos se faz num movimento em espiral, do concreto para o abstracto, como ilustra a Fig.3.1. Partindo do seu conhecimento quotidiano, o aluno vai, através do tratamento e resolução de problemas, conseguindo um acerto progressivo do conhecimento científico (Garcia & Garcia, 1992 in Suárez, 1994).

PÓS-VIAGEM ABSTRACTO

A

VIAGEM AO CAMPO PREPARAÇÃO

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CONCRETO

FIGURA 3.1 - Estrutura da Unidade Viagem de Campo segundo o modelo organizacional desenvolvido por Orion (1993).

A saída ao campo desenvolve-se, assim, segundo três fases bem definidas, que embora independentes se interligam, ou seja, cada uma serve de ligação com a fase seguinte (Fig.3.1). Essas fases são:

Fase 1 - Preparação da actividade (pré-viagem);

104 José A. Barros - 2005

Fase 2 - Viagem ao campo; Fase 3 - Pós-viagem.

A fase de preparação da actividade tem como ambiente de aprendizagem a sala de aula e/ou laboratório, podendo apresentar uma duração variável. Durante esta fase deverão ser desenvolvidas tarefas com o principal objectivo de preparar os alunos para a actividade exterior. Orion (1993) realça nesta primeira fase a importância de reduzir ao mínimo o "Novelty space"

{espaço novidade ou espaço desconhecido), relacionado com o grau de familiaridade ou de

novidade do aluno relativamente ao meio a visitar. Se o ambiente é novo o aluno tem primeiro que o explorar e só depois deste se tomar familiar poderá concentrar-se no acto de aprender. Segundo o mesmo autor, os factores relacionados com o novelty space podem decompor-se em factores de ordem cognitiva, psicológica e geográfica.

A nível cognitivo, o aluno deve ser familiarizado com as ideias, conceitos e fenómenos que irão ser abordados, assim como com habilidades necessárias para as tarefas a realizar no campo. Poderão ser elaboradas actividades como, por exemplo, treinar destrezas utilizando instrumentos (mapas, bússola,...), praticar técnicas a usar no campo (identificação de minerais, rochas e fósseis,...), observar e analisar ilustrações ou maquetas cujos os processos e fenómenos venham a ser observados no campo.

Os factores de natureza psicológica estão relacionados com a componente emocional e afectiva da viagem e a motivação intrínseca dos alunos para a saída. Factores negativos como a tensão ou insegurança podem ser reduzidos através de uma apresentação algo detalhada sobre o modo como se prevê que a saída decorra. Elementos como a duração da viagem, o número de paragens, os momentos de descanso, a metodologia de trabalho a utilizar e os conhecimentos necessários para cada paragem, devem ser aqui fornecidos.

Os factores geográficos estão relacionados com o conhecimento e familiarização com o local em estudo. A exploração de mapas, filmes e diapositivos do local são boas opções para reduzir este factor.

Tendo em conta estes aspectos torna-se relevante reduzir ao mínimo o novelty space de forma a potenciar as actividades preparadas para o campo, fomentando a capacidade de concentração e participação nas actividades propostas.

Convém, no entanto, salientar que, para além das actividades relacionadas com a diminuição do grau de novidade, deverão ser, ainda, motivo de cuidada preparação os seguintes aspectos: - selecção da área de estudo e respectivas paragens, que devem possuir características

didácticas relevantes e de fácil acesso;

- organização e distribuição dos conceitos para cada paragem de forma articulada com as características do afloramento, assim como, articulada com os conteúdos curriculares;

Contextualização didáctica - planificação do roteiro, tendo o cuidado de assegurar a sua praticabilidade em termos de

distâncias entre as diversas paragens e uma adequada sequência entre elas;

- elaboração de tarefas e materiais inerentes às actividades de campo, com vista a serem usados durante a saída pelo professor e pelos alunos.

A segunda fase, viagem ao campo, apresenta-se como a unidade central do módulo, pois é sobre ela que se centra a atenção tanto da fase de preparação como da pós-viagem. Nesta fase há uma interacção constante entre os alunos e o meio a partir do qual vão construindo a informação, em vez de estarem passivamente a absorver as informações vindas do professor. O trabalho de grupo assume aqui particular realce não só pelas atitudes de partilha, de respeito pela diferença, co-responsabilização, etc., mas também porque os alunos têm, em geral, uma percepção positiva dos benefícios educacionais que derivam de trabalhar em grupo no campo (Kempa & Orion, 1996 in Moreira, 2001). Os materiais elaborados de apoio específico a usar pelos alunos e professores como, por exemplo, um guião da viagem, pósteres, modelos, elementos de orientação, etc. devem ser aqui aplicados.

A fase Pós-viagem ocorre, tal como a primeira fase, na sala de aula e/ou no laboratório. Nesta fase desenvolvem-se situações de discussão (com o levantamento de questões novas ou retomando as que ficaram pendentes no campo), de análise, reflexão e abordagem estruturada e articulada dos conhecimentos e informações obtidas. Os conhecimentos serão reutilizados ou reciclados e prontos para organizar novas (re)construções. Os aspectos relacionados com as atitudes dos alunos perante a actividade de campo serão avaliados nesta fase.

O desenvolvimento sequencial das actividades de campo (no antes, durante e pós-viagem) mostra-se como algo de grande eficácia (Garcia de la Torre, 1994).

Com o modelo adoptado, pretende-se a valorização de situações problemáticas que são colocadas aos estudantes, bem como o desenvolvimento de actividades orientadoras e incentivadoras para eles realizarem, inseridas numa linha de continuidade com o currículo. Procura-se partir das ideias prévias dos alunos para as ir reconstruindo progressivamente, fomentar atitudes de pesquisa, estimular a curiosidade e criatividade, desenvolver atitudes críticas e participativas sobre ciência e problemas ambientais. É intenção, não só desenvolver conteúdos, mas também destrezas e atitudes positivas. O professor deve ser encarado como o organizador de estratégias que estimulem a problematização e formulação de hipóteses, bem como a interacção e o conhecimento contextualizado da disciplina (Cachapuz et ai, 2000). A avaliação deve ter em atenção o trabalho e empenho manifestados pelos alunos no desenvolvimento das actividades e os seus comportamentos e atitudes para com os colegas.

Embora o modelo organizativo de Orion (1993) tenha aplicação directa no Trabalho de Campo, pensamos que, tal como refere Salvador (2002), é possível aplicá-lo noutras situações de aprendizagem. Assim sendo, embora a maioria dos estudos do autor do modelo se aplique ao ensino formal da Geologia, aplicamos, na presente dissertação, o modelo organizativo a um trabalho de campo no ambiente não formal.