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4.1. Enquadramento Teórico

Para algumas pessoas, as lentes de contato solucionam a qualidade visual do dia-a-dia. Atualmente existem inúmeras lentes de contato (LC) à venda no mercado com os mais diversificados materiais, estruturas, potências e regimes de utilização. Assim, quando é feita a escolha da lente de contato deve ter-se em conta vários fatores: o valor da ametropia, o estado da saúde ocular, os fatores externos e as características fisiológicas oculares do paciente. As LC são complexas por todos estes fatores que se devem ter em conta. Entre outras, as lentes de contacto hidrófilas tóricas são habitualmente direcionadas para indivíduos com necessidade de compensação astigmática. As mesmas podem ser classificadas pelo seu sistema de estabilização. Podemos encontrar lentes tóricas com toricidade anterior (frontal) ou posterior (interna ou ocular), com prisma de balastro, truncamento entre outros. (16) A toricidade representa o alinhamento da lente segundo um específico eixo que permite neutralizar o erro refrativo astigmático do olho. De modo a garantir uma boa adaptação de lentes de contato tóricas, além de outros exames é importante avaliar a qualidade e a quantidade do sistema lacrimal do indivíduo. (17) A sua função de lubrificação e hidratação ocular deve, com lentes de contato, também deve ser capaz de manter a lubrificação e hidratação da lente. A obtenção do mapa topográfico da córnea através do exame de Pentacam possibilita uma adaptação mais adequada pela informação que é obtida.

4.2. Caso Clínico

Paciente de 37 anos com histórico de uma ambliopia anisometrópica significativa. A paciente submeteu-se a um tratamento ótico e a um período de terapia visual, assim recuperou da ambliopia conseguindo atingir boa acuidade visual em ambos os olhos com a melhor correção ótica. Dada à sua elevada anisometropia, a paciente usava correção ótica através de lentes de contacto Biofinity Tóricas mensais (Lente A). (18)

Após a recuperação da ambliopia foi efetuada uma avaliação de contatologia minuciosa, pois a paciente continuou a apresentar queixas sugestivas de intolerância às suas lentes de contacto habituais. Foram mencionados vários sintomas, nomeadamente picadas e comichão ocular logo após a colocação da lente. Foi proposto à paciente a adaptação de outro tipo de LC com parâmetros que geralmente facilitam a adaptação em casos onde se verificam estes sintomas típicos de intolerância às lentes.

Assim, a paciente experimentou as lentes de contato Acuavue Oasys for Astigmatism quinzenais (Lente B) conhecidas por proporcionarem uma sensação de conforto para as pessoas que sofrem de olhos secos e cansados quando usam LC. (19)

4.2.1. Resultados

Os resultados dos testes optométricos e dos exames de saúde ocular que constam na tabela 10, indicam que a graduação habitual da paciente permite atingir uma acuidade visual de unidade ou superior.

Tabela 10: Resultados obtidos no exame optométrico.

Exame Optométrico Resultados

RX habitual (LC) OD: -9,00/-1,25x90 OE: -1,50/-0,75x180 AO: AV: 1,0-1/5 AV: 1,2-2/5 AV: 1,2-1/5 BOZR:8,70mm TD:14,50mm Autorefractómetro e Queratometria (campo aberto) OD: -10,50/-1,50x99 OE: -1,50/-0,50x65 8,22 - 8,09 x 32 8,23 – 8,12 x 140 Km: 8,14 Km: 8,18 Sobre Rx OD: -0,25x90 OE: _______ AO: AV: 1,0-1/5 AV: 1,2-2/5 AV: 1,2-1/5 _______

Primeiramente à adaptação da lente e de modo a verificar se eram preenchidos os requisitos aconselhados para o uso de LC, foram realizados exames complementares. Nomeadamente, de maneira a perceber o fator que desencadeava as queixas da paciente, foi classificada a qualidade e a quantidade da lágrima sem LC e, posteriormente com as lente de contato A que habitualmente usava. (ver tabela 11) A Microscopia Endotelial que permite avaliar diversos parâmetros do endotélio da córnea, apresentou-se com um valor de densidade celular inferior ao que é recomendado, como se encontra registado na tabela 11. O valor obtido para a densidade celular da córnea, que deveria ser aproximadamente de 3000, encontrava-se diminuído tanto para o olho direito como para o olho esquerdo. Este fator foi transmitido e explicado à paciente no sentido de realizar um controlo periódico deste valor. (ver figura 10)

Tabela 11: Resultados dos exames complementares.

Exames

Complementares Resultados

Biomicroscopia sem LC

OD: Padrão Amorfo; TRL 7segundos; Hiperemia Conjuntival. OE: Padrão Amorfo; TRL 7segundos; Hiperemia Conjuntival. Biomicroscopia com

LC (lente A)

OD: Depósitos na lente; Centrada; Plana. OE: Depósitos na lente; Centrada; Plana. Microscopia

Endotelial

OD: CD= 2238 OE: CD= 2063 Pressão Intra Ocular

Hora: 17h15m

OD: 17 mmHg OE: 16 mmHg

Os resultados revelaram haver condições ideais para o uso de lentes de contato. A paciente apresentava um padrão lacrimal amorfo, um tempo de rotura lacrimal de aproximadamente de 7 segundos e a frequência de pestanejo encontrava-se dentro da normalidade em ambos os olhos.

Verificou-se que as lentes de contato A tinham uma boa centragem e mobilidade. (ver figura 9)

Figura 9: Biomicroscopia sem LC padrão lacrimal Amorfo e Biomicroscopia com LC A revela boa centragem da lente.

Como consta na tabela 12, a Tomografia de Coerência Ótica (OCT) com centragem na zona papilar da retina revelou alterações nos dois olhos, isto poderá ser uma consequência da diferença estrutural entre o olho mais potente e o olho menos potente da anisometropia apresentada pela paciente.

Tabela 12: Resultados obtidos nos exames complementares entre olho direito e olho esquerdo.

Exames Complementares

Resultados

OD OE

Retinografia Sem alterações Sem alterações OCT macular Sem alterações Sem alterações

OCT papilar

Diminuição da camada das fibras nervosas temporal superior. (fora do limite)

Diminuição da camada das fibras nervosas temporal. (borderline)

Pentacam Córnea astigmatismo em forma de irregular com laço simétrico

Córnea irregular com astigmatismo em forma de laço assimétrico

O mapa da Topografia da Córnea dos dois olhos revelou uma córnea irregular, com astigmatismo em forma de laço simétrico no olho direito e em forma de laço assimétrico no olho esquerdo. (ver figura 11)

Figura 11: Topografia Corneana do olho direito e do olho esquerdo.

Para a adaptação de uma nova lente que proporcione maior conforto à paciente, foi necessário calcular o valor do raio de curvatura segundo o valor do diâmetro ocular indicado pelo exame de Pentacam (ver figura 11), assim como o valor da graduação necessária.

A lente de contato A tem 8,70mm de raio de curvatura (BOZR) e 14,50mm de diâmetro total (TD), assim os seguintes cálculos permitem a obtenção desses dados para a adaptação da nova lente:

TD da Lente

Olho Direito- Olho Esquerdo-

DHV = 11,9 (TD) + 2,0 (mm) = 14 mm DHV = 11,9 (TD) + 2,0 (mm) = 14 mm BOZR 0,50 TD - 0,20 BOZR 2,00 TD – x BOZR x = 0,8 mm BOZR Olho Direito: BOZR = 8,15 + 0,80 BOZR = 8,95 mm ≈ 8,90 mm Olho Esquerdo: BOZR = 8,18 + 0,80 BOZR = 8,98 mm ≈ 8,90 mm BOZR com TD de 14,50 mm 0,50 TD - 0,20 BOZR 2,50 TD – y BOZR y = 1,0 mm BOZR BOZROD = 8,15 + 1,0 BOZROE = 8,18 + 1,0 BOZROD = 9,15 mm BOZROE = 9,18 mm

Valor obtido com a Pentacam

(2)

Potência da Lente de Contato (Plc)

RxOD: -10,50 /-1,50 x 90

-12,00 /+1,50 x 180 Para o eixo de 90

Para o eixo de 180

-> Plc para o olho direito: -9,25 /-1,25 x 90

RxOE: -1,50 /-0,75 x 90

-2,25 /+0,75 x 180 Para o eixo de 90

Para o eixo de 180

-> Plc para o olho esquerdo: -1,50 /-0,75 x 90

A lente de contato adaptada deve ser tórica para que seja compensado a componente astigmática da graduação.

A Biomicroscopia feita sobre a lente de contato A revelou uma adaptação do tipo plana. Os cálculos efetuados indicaram que a lente B deveria ter como parâmetros 9,00mm BOZR e 14,50 TD, no entanto para que a lente B tivesse uma adaptação do tipo fechada, que é mais confortável para a paciente, foi mantido o valor do TD e diminuído o BOZR, foi deste modo experimentada uma lente com 8,60 de BOZR e 14,50 de TD.

De salientar que os raios de curvatura K1 e K2, obtidos pela Topografia Corneana, serem representados por uma média de raios de curvatura de todos os meridianos da córnea, que a córnea apresentada é irregular, que a espessura e o tipo de material constituindo a lente de contato interage com todo o procedimento de adaptação, os cálculos efetuados fornecem apenas uma orientação para a escolha das lentes.

Para o olho direito não foi possível adaptar a graduação com potência esférica de -9,25D, pois a partir de -6,00D as lentes encontram-se disponíveis no mercado em intervalos de 0,50 D. Deste modo optou-se por hipo-corrigir a paciente com -9,00D de potência esférica. Neste caso a hipo-correção não penalizou a qualidade da visão da paciente que atingiu, mesmo assim, a acuidade visual de unidade monocularmente. A lente A não revelava problemas de centragem nem de mobilidade, como podemos observar nas figuras 12 e 13. No entanto a paciente apresentava os sintomas de secura ocular anteriormente referidos. Com a adaptação da lente B podemos ver que a lente encontra-se devidamente centrada e com mobilidade normal, além de terem sido eliminados os sintomas de secura ocular.

 Observação lente A BOZR = 8,70 e TD = 14,50:

Ao ser efetuada a adaptação da lente A para a lente B, verificou-se uma melhoria quase instantânea a nível de sintomas de intolerância às lentes de contato. Foi marcada uma consulta de reavaliação para a semana seguinte, na qual se pôde confirmar que os sintomas e sinais de secura ocular deixaram de ser sentidos. (ver figura 14 e 15)

 Observação da Lente B BOZR = 8,60 e TD = 14,50:

Figura 14: Biomicroscopia com lente B no olho direito.

4.2.2. Discussão

Os parâmetros apresentados pela lente de contato A e pela lente de contato B diversificam-se em alguns aspetos. Ambas as lentes são tóricas, no entanto provêm de laboratórios distintos, cada uma com a sua específica marca e com um material diferente.

A lente B poderá ser mais vantajosa do que a lente A em diferentes aspetos. Primeiramente, a lente B tem um regime de substituição quinzenal, enquanto a outra lente tem um regime de substituição mensal. Um regime de substituição com um período de tempo mais curto pode ser mais preventivo a nível da higiene e da esterilização da lente.

A percentagem do conteúdo em água apresentada pela lente B é inferior ao teor apresentado pela lente A. Devido a esta característica, a lente B não requer tanta hidratação como a lente A e não levará tão facilmente à sensação de secura ocular que era sentida pela paciente.

O diâmetro e o raio de curvatura da lente A permitem uma adaptação do tipo plana na paciente, enquanto a lente B permite uma adaptação do tipo fechada que é mais confortável para a mesma.

Outra diferença verifica-se no sistema de estabilização correspondente a cada lente. O sistema de balastro da lente A permite uma estabilização através de uma espessura mais importante na zona inferior da lente que, com a força do pestanejo, acaba por ficar estável. Na lente B o sistema de estabilização apresenta uma maior espessura em quatro zonas da periferia da lente e uma zona mais fina situada na parte inferior e na parte superior da mesma. Este sistema é dinâmico no sentido em que a sua conceção permite que a lente seja ativamente rodada para a posição correta sempre que, com o pestanejo, fique mal orientada. Com ambos os sistemas de estabilização verificou-se um alinhamento correto da lente de contato, assim este último parâmetro poderá não ser uma causa para a intolerância sentida ao usar a lente A.

Tabela 13: Parâmetros das lentes de contacto A e B. (18) (19)

Parâmetro Lente A Lente B

Laboratório Coopervision Johnson & Johnson

Marca Biofinity Acuvue

Categoria Tórica Tórica

Material Comfilcon A Senofilcon A

Conteúdo da

Embalagem Pack de 3 ou 6 lentes 12 Lentes

Proteção UV Sim Sim

Tempo de uso Uso diário mensal Uso diário quinzenal

Conteúdo em H20 48% 38% Raio 8.70mm 8.60mm Diâmetro 14,50mm 14.50mm Dk/t 116 129.3 X 10-9 Dk 116*0.11=12.76x10-9 (para -3.00 D) 129.3*0.08=10.34 (para -3.00D) Sistema

Estabilização Balastro Dinâmico

Manutenção Solução Única ou Peróxido Solução única

A Topografia Corneana mostra um mapa de uma córnea irregular com astigmatismo assimétrico tanto no olho direito como no olho esquerdo (ver figura 11). Esta característica da córnea poderia causar distorção dos objetos por descentramento do ápex da lente de contato. Este facto não se verificou, sendo a acuidade visual da paciente de unidade.

Na Microscopia Endotelial verificou-se uma possível diminuição na densidade das células do endotélio. Diversos fatores podem ser responsáveis por esta diminuição tais como o próprio fato de usar LC há muitos anos, ultrapassar o período das 8h de utilização e pela presença de fumo e poeiras no ambiente onde trabalha. Deve ser igualmente colocada a hipótese da medição ser feita automaticamente e se verificar que após várias medições a contagem celular, bem como o parâmetro da densidade celular, tende a não mostrar o mesmo resultado. Assim, não significa de forma conclusiva que a paciente não reúna as condições ideais para o uso de lentes de contacto, pois o equipamento elabora uma medição automática dos valores. (ver figura 10).

Devido à grande abertura palpebral e à presença de sintomas de secura ocular com as lentes de contato, foi proposto à paciente o uso de lentes semirrígidas, visto que não requerem tanta hidratação como as lentes hidrófilas. Além disso, tendo em consideração os resultados dos exames complementares, estas seriam menos prejudiciais a nível da sua saúde ocular. No entanto, a paciente preferiu continuar a usar a lente B e referiu sentir-se bem com a mesma. Como consta na tabela 13, a lente B tem a vantagem de conter uma menor percentagem de água do que a lente A. Esta caraterística faz com que não haja tanta necessidade de hidratação e proporcione uma melhor tolerância às lentes. Neste caso, e para responder favoravelmente ao pedido da paciente que afastou a proposta de lentes semirígidas, foram adaptadas lentes hidrófilas que reúnem boas condições e parâmetros no sentido de solucionar as dificuldades da paciente.

Recentemente, a paciente fez uma adaptação gradual às lentes oftálmicas iseicónicas. A adaptação foi bem sucedida e atualmente já usa óculos com lentes iseicónicas com a graduação total necessária. A adaptação de lentes de contato foi uma etapa importante que possibilitou a adaptação da paciente às lentes oftálmicas, proporcionando-lhe deste modo o conforto ocular que não sentia com a lente A.

Capítulo 5:

Biometria Ocular e Tomografia de

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