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Adaptabilidade por Regulamentação Colectiva e Adaptabilidade Grupal

CAPÍTULO 3 – LIMITES AO TEMPO DE TRABALHO

6.1 Adaptabilidade – Breve Enquadramento

6.1.1 Adaptabilidade por Regulamentação Colectiva e Adaptabilidade Grupal

A adaptabilidade por regulamentação colectiva está prevista no artigo 204.º do CT 2009, o qual dispõe que o PNT pode ser definido em termos médios através de IRCT, a partir de um determinado período de referência238.

Nesse caso, o limite do PNT diário estabelecido em oito (8) horas diárias239 pode ser aumentado até quatro (4) horas e o PNT semanal estabelecido em quarenta (40) horas pode atingir o limite das sessenta (60) horas, sem se contabilizar, para o efeito, o trabalho suplementar prestado por motivo de força maior. Todavia, o PNT definido nestes termos não poderá exceder cinquenta (50) horas em média num período de dois (2) meses240.

A concretização do artigo 204.º do CT 2009 tem vindo a operar por via das CCT aplicáveis aos diferentes sectores de actividade e profissões, embora de forma ainda muito limitada, senão vejamos:

237 Barroso, Helena Tapp (2009), “Notas sobre o efeito das férias e ausências na contagem do período normal de

trabalho em regime de adaptabilidade”…ob.cit, pág. 55.

238 Artigo 207.º do CT 2009. Note-se que “(a soma dos períodos normais de trabalho registados em cada semana,

terá de ser dividida pelo número total de semanas que integram o intervalo de tempo pré-determinado, assim se apurando qual foi o período normal de trabalho semanal que foi praticado, em média, nessas semanas” – Barroso, Helena Tapp (2009), “Notas sobre o efeito das férias e ausências na contagem do período normal de trabalho em regime de adaptabilidade”…ob.cit, pág. 42.

239

Artigo 203.º, n.º 1 do CT 2009.

240

A violação desta disposição legal constitui contra-ordenação grave, nos termos do n.º 3 do artigo 204.º e do n.º 3 do artigo 554.º ambos do CT 2009, punível através de coima cujo valor poderá variar entre €612,00 e €9.690,00, consoante o volume de negócios e gravidade da conduta do empregador.

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Das 72 CCTs supra aludidas e escolhidas para amostra, no âmbito do estudo realizado em 2011 com vista à negociação de um “Pacto para o Emprego” 241

, apenas 46 (63,9% do total) instituem o regime da adaptabilidade do tempo de trabalho e uma permite a adaptabilidade individual, ou seja, o acordo escrito com o trabalhador242. As remanescentes 26 não prevêem a possibilidade de recurso a esta modalidade de organização do tempo de trabalho, pelo que existe, efectivamente, um número significativo de CCTs que não prevêem esta modalidade flexível de organização do tempo de trabalho.

Figura 6.3 - Distribuição das CCT segundo os limites diário e semanal e o período de referência da adaptabilidade (Fonte: MTSS-DGERT)

Período Normal de Trabalho Diário Período Normal de Trabalho Semanal Período de Referência

2 horas ou menos Até 10 horas Outras durações 50 horas ou menos Mais de 50 a 60 horas Outras durações Até 3 meses De 4 a 6 meses De 7 a 12 meses 21243 11244 9245 27246 7247 2248 13249 18250 12251

241

Dornelas, António, Antonieta Ministro, Fernando Ribeiro Lopes, José Luís Albuquerque, Maria Manuela Paixão e Nuno Costa Santos, Emprego, Contratação Colectiva de Trabalho e de Protecção da Mobilidade Profissional em Portugal, …ob.cit, págs. 52 e ss.

242

A CCT da hotelaria e restauração do centro/FESAHT (BTE 32/2006) para além do acordo escrito do trabalhador exige ainda a necessidade imperiosa da empresa. Verificados estes requisitos, o PNT diário pode ser aumentado até 2 horas, não podendo o trabalho semanal exceder 48 horas. Note-se, ainda, que nas semanas em que a duração do trabalho seja inferior a 40 horas, a redução diária não deverá ser superior a 4 horas sem prejuízo do direito à alimentação.

243

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Transportes e Armazenagem; Actividades de Informação e Comunicação; Actividades de Saúde Humana e Apoio Social; Actividades Financeiras e de Seguros; Alojamento, Restauração e Similares, Indústrias Transformadoras e Agricultura, Produção Animal, Caça, Floresta e Pesca.

244

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Actividades de Informação e Comunicação, Indústrias Transformadoras e Agricultura, Produção Animal, Caça, Floresta e Pesca.

245

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Indústrias Transformadoras, Transportes e Armazenagem.

246

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Actividades de Informação e Comunicação, Indústrias Transformadoras, Actividades de Saúde Humana e Apoio Social e Agricultura, Produção Animal, Caça, Floresta.

247

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Actividades de Saúde Humana e Apoio Social e Indústrias Transformadoras.

248

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Transportes e Armazenagem.

249

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Transportes e Armazenagem, Agricultura, Produção Animal, Caça, Floresta e Pesca e Actividades Financeiras e Seguros.

250

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Indústria Transformadora, Actividades Financeiras e Seguros e Alojamento e Restauração e Similares, Agricultura, Produção Animal, Caça, Floresta e Pesca e Actividades.

251

Sectores com maior enfoque (exemplificativamente): Transportes e Armazenagem, Actividades de Informação e Comunicação, Indústrias Transformadoras e Construção.

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Da análise das referidas CCTs, verifica-se que algumas prevêem para situações distintas, mais de um limite do PNT diário e do período de referência.

A título ilustrativo, a CCT indústrias eléctricas e electrónicas/FETESE prevê um PNT diário de “mais 2 horas, ou 4 com acordo da maioria dos trabalhadores”. Por outro lado, o ACT do Banco Comercial Português e outros/SBN prevê um período de referência entre os “2 meses, ou 6 meses” em determinadas situações.

Acresce que cinco das referidas CCTs prevêem formas de compensação pelo trabalho prestado sob o regime da adaptabilidade.

Neste âmbito, as CCT ANIVEC/APIV (vestuário e confecção)/FESETE/SINDEQ determinam que: “as horas de trabalho efectuadas para além de 8 horas diárias e 40 horas semanais são compensadas com reduções em igual número de horas acrescidas de 10% de tempo, ou pelo pagamento da importância correspondente a 10% da retribuição de base por cada uma daquelas horas”.

As CCT ATP (têxtil e vestuário)/SINDEQ/FESETE prevêem que: “em horários de 2 ou 3 turnos, acréscimo de 15% da retribuição base por cada hora de serviço, ou acréscimo de 15% no período de descanso compensatório; em horário normal, acréscimo de 10% da retribuição base por cada hora de serviço, ou acréscimo de 10% do período de descanso compensatório”.

O AE REFER/Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Sector Ferroviário estabelece: “subsidio correspondente a 17,75% da retribuição indiciária”.

Importa ainda, a título exemplificativo, fazer-se uma alusão mais pormenorizada à CCT da indústria do Calçado celebrado entre a APICCAPS e a FETESE, publicado no BTE, n.º 19, de 22.05.2006252, prescreve na cláusula 50.ª o seguinte:

1. Durante seis meses seguidos ou interpolados, ao longo de um período de doze meses, o período semanal de trabalho pode ser ampliado até ao limite de cinquenta horas por semana, de segunda-feira a sexta-feira. 2. A redução do horário pode fazer-se por diminuição do período normal de trabalho diário, até ao limite de duas horas, em dias complementares ou por dias de férias com pagamento do subsídio de alimentação. 3. A redução horária prevista no número anterior obriga a entidade patronal nos seis meses após a primeira utilização a informar os trabalhadores abrangidos do prazo em que vai ocorrer a compensação respectiva, e que deverá ser concluída nos seis meses seguintes. 4. No caso de os prazos previstos nos números anteriores não serem cumpridos, a compensação não se efectuará sem que daí resulte qualquer prejuízo para os trabalhadores. 5. Na ampliação de horário não pode trabalhar-se em cada dia mais de dez horas. 6. Quando o regime de adaptabilidade for iniciado com o acréscimo de horário a entidade patronal é obrigada a definir, no período de seis meses, qual a data em que se realiza a compensação horária e, se não fizer a compensação na data prevista pagará o tempo trabalhado a mais com acréscimo de 75%. 7. Período de referência de doze ou seis meses conta a partir da primeira utilização (…).

A referida cláusula foi objecto de interpretação por parte do TRP, uma vez que suscitou divergências quanto à sua aplicação253. De facto, nem sempre o regime da adaptabilidade tem vindo a ser correctamente aplicado.

252

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No caso concreto, o empregador, com alegado recurso ao regime da adaptabilidade, determinou que os trabalhadores ficassem sem trabalhar por 23 dias completos e por períodos de 3.30 horas em dois outros dias. Por conseguinte, as horas não trabalhadas seriam compensadas em “período a definir oportunamente”.

A argumentação apresentada, em síntese, pelo empregador foi de que a cláusula 50.ª, n.º 2, do CCT na parte da redução da prestação de trabalho admitia efectuar-se por diminuição do período normal de trabalho diário, até ao limite de duas horas, mas também admitia operar em dias completos ou por dias de férias com pagamento do subsidio de alimentação, pelo que foi cumprido o determinado nessa cláusula.

Face a tal argumentação, o TRP esclareceu que “do n.º 2 da cl.ª 50.ª decorre que a redução do horário pode fazer-se por diminuição do período normal de trabalho diário, até ao limite de duas horas. Ou seja, num horário de 8 horas o trabalhador pode trabalhar apenas 6 horas diárias”. Neste caso, “ A «redução» ocorreu por dias completos e também em meio dias, a significar que a mesma não obedeceu ao disposto no n.º 2 da cl.ª 50.ª”.

De forma conclusiva, o TRP referiu que:

A redução do horário previsto na cl.ª 50.ª, n.º 2, do CCT só faz sentido se entendido como necessária para repor o valor médio do tempo de trabalho num período pré-determinado. Tal conclusão determina que se rejeite a faculdade da empregadora proceder pura e simplesmente à redução do horário de trabalho para depois, em regime de compensação, exigir ao trabalhador a ampliação desse mesmo horário.

Esta modalidade do regime da adaptabilidade254 para além de nem sempre ser correctamente aplicada, contém claras limitações, estando vedada às empresas não abrangidas por CCT que estabeleça a sua admissibilidade255. Note-se que a aplicação desta modalidade de adaptabilidade encontra-se sujeita ao princípio da filiação contemplado no artigo 496.º do CT 2009.

Para fazer face às restrições de aplicabilidade verificadas, o CT 2009 instituiu a novidade da adaptabilidade grupal256, ou seja, veio estender a aplicação da modalidade adaptabilidade por regulamentação colectiva a trabalhadores que, à partida, estariam excluídos do seu âmbito257.

253

Ac. do TRP, processo n.º 98/10.3TTOAZ.P1, de 21/03/2011, disponível em www.dgsi.pt.

254

Artigo 204.º do CT 2009.

255

As PME são as mais afectadas devido sobretudo à sua subrepresentação colectiva.

256 Consagra-se, deste modo, um desvio ao princípio da filiação previsto no artigo 496.º do CT 2009, “susceptível de

afectar a liberdade sindical”. Os trabalhadores poderão ver-se submetidos às cláusulas menos favoráveis das CCTs sem beneficiarem das contrapartidas negociadas, potenciando-se a violação do princípio da igualdade - Carvalho, Catarina de Oliveira e Júlio Vieira Gomes (2011), Direito do Trabalho + Crise =Crise do Direito do Trabalho? Actas do Congresso de Direito do Trabalho, …ob.cit, pág. 387 e 389. Fernandes, Francisco Liberal, “Privatização e desmembramento das empresas públicas: alguns problemas juslaborais”, RDE, 1990-1993 (16 a 19).

257 Trata-se do “(…) reconhecimento, ainda que parcial, da eficácia erga omnes daquela” – Martinez, Pedro Romano,

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O CT 2009 prevê expressamente que o IRCT que institua o regime de adaptabilidade por regulamentação colectiva pode prever também um regime de adaptabilidade grupal, ou seja, que258:

a) O empregador possa aplicar o regime ao conjunto dos trabalhadores de uma equipa, secção ou unidade económica caso, pelo menos, 60% dos trabalhadores dessa estrutura259 sejam por ele abrangidos, mediante filiação em associação sindical celebrante da convenção260 e por escolha dessa convenção como aplicável261;

b) O disposto na alínea anterior se aplique enquanto os trabalhadores da equipa, secção ou unidade económica em causa, abrangidos pelo regime de acordo com a parte final da alínea anterior forem em número igual ou superior ao correspondente à percentagem nele indicada. Todavia, ocorrendo alteração por entrada ou saída de trabalhadores na composição da equipa, secção ou unidade económica, o regime da adaptabilidade grupal aplica-se enquanto dessa alteração não resultar percentagem inferior à supra indicada262.

A título de excepção, o legislador determinou que o regime de adaptabilidade grupal,263 instituído nos termos acima referidos, não se aplica a trabalhador abrangido por CCT que disponha de modo contrário a esse regime264 ou relativamente a trabalhador representado por associação sindical que tenha deduzido oposição a portaria de extensão da convenção colectiva em causa.

Ocorre que a redacção escolhida pelo legislador não parece ser a melhor, pois ressaltam dúvidas de interpretação, ou seja, qual deverá ser o entendimento a perfilhar relativamente à expressão “convenção colectiva que disponha de modo contrário a esse regime”.

258

Artigo 206.º, n.º 1, alínea a) do CT 2009.

259

Tudo indica que cabe ao empregador a escolha entre estas três opções (secção, equipa ou unidade económica). A definição do conceito de unidade económica encontra-se no n.º 5 do artigo 285.º do CT 2009. Quanto aos conceitos de secção e equipa estes não estão legalmente previstos. Veja-se Gomes, Júlio Manuel Vieira (2010), O Código do Trabalho de 2009 e a promoção da desfiliação sindical, Novos Estudos de Direito do Trabalho, Coimbra, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, pág. 161 a 197. Refira-se também Carvalho, Catarina de Oliveira e Júlio Vieira Gomes (2011), Direito do Trabalho + Crise =Crise do Direito do Trabalho? Actas do Congresso de Direito do Trabalho, …ob.cit, págs. 384 a 395.

260 A letra da Lei implica que só se aplica a IRCT negociais, “pois se a adaptabilidade for prevista em instrumento não

negocial, a sua aplicação respeita à totalidade dos trabalhadores por ele abrangidos, não se suscitando o problema que a norma pretende resolver” - Martinez, Pedro Romano, Luís Miguel Monteiro, Joana Vasconcelos e Pedro Madeira de Brito, Código do Trabalho anotado…ob.cit, pág. 522.

261

Esta escolha reporta-se ao previsto no artigo 497.º do CT 2009.

262

Artigo 206.º, n.º 3 do CT 2009.

263

A violação desta disposição legal constitui contra-ordenação grave, nos termos do n.º 5 do artigo 206.º e do n.º 3 do artigo 554.º ambos do CT 2009, punível através de coima cujo valor poderá variar entre €612,00 e €9.690,00, consoante o volume de negócios e gravidade da conduta do empregador.

264

66

Defende-se que, atenta a letra da lei, a aplicação aos trabalhadores da adaptabilidade grupal não é impedida pela simples ausência de previsão de um regime de adaptabilidade265.

Porém, tal entendimento não é isento de críticas, se se considerar que quando uma CCT não prevê expressamente o regime da adaptabilidade, tal significa que não foi possível as partes alcançarem um acordo sobre esta matéria, logo também nestes casos não deverá ser admitida a aplicação da adaptabilidade grupal. Caso contrário estar-se-ia a violar a autonomia colectiva, o que não parece ter sido essa a pretensão do legislador266.

Ao excepcionar, igualmente, a aplicabilidade do regime da adaptabilidade a “trabalhador representado por associação sindical que tenha deduzido oposição a portaria de extensão da convenção colectiva” a lei origina novas dúvidas de interpretação.

Defende-se que tal excepção pressupõe que a portaria de extensão da CCT não tenha chegado a ser emitida. “Caso contrário, o regime da adaptabilidade será aplicado a todos quantos se encontrem por ela abrangidos, mesmo que se tenham oposto ou sejam filiados em sindicato oponente à respectiva emissão (n.º 3 do artigo 516.º) 267.

Outro entendimento tem sido o de que:

(…) se for emitida uma portaria de extensão que alargue o âmbito de aplicação de um CCT que contém um regime de adaptabilidade, este último não será aplicável a trabalhadores filiados noutros sindicatos que deduzirem oposição à mesma, nos termos permitidos pelo art. 516.º, n.º 3. Esta solução já resultaria da primeira parte do n.º 4 do art. 206.º, nos termos referidos, no caso de tal sindicato ter negociado uma outra CCT que não prevê qualquer regime de adaptabilidade, assim como da supletividade da portaria de extensão relativamente à CCT268

Seguindo-se este entendimento, a parte final do n.º 4 do artigo 206.º do CT 2009 visa possibilitar que o sindicato que não tenha negociado qualquer CCT impeça que o regime da adaptabilidade previsto noutra CCT seja aplicado aos seus filiados, bastando para o efeito deduzir oposição ao alargamento do âmbito subjectivo da mesma por portaria de extensão, quer esta venha ou não a entrar em vigor269.

265

Martinez, Pedro Romano, Luís Miguel Monteiro, Joana Vasconcelos e Pedro Madeira de Brito, Código do Trabalho anotado…ob.cit, pág. 522.

266

Carvalho, Catarina de Oliveira e Júlio Vieira Gomes (2011), Direito do Trabalho + Crise =Crise do Direito do Trabalho? Actas do Congresso de Direito do Trabalho, …ob.cit, págs. 389.

267

Martinez, Pedro Romano, Luís Miguel Monteiro, Joana Vasconcelos e Pedro Madeira de Brito, Código do Trabalho anotado…ob.cit, pág. 522.

268

Carvalho, Catarina de Oliveira e Júlio Vieira Gomes (2011), Direito do Trabalho + Crise =Crise do Direito do Trabalho? Actas do Congresso de Direito do Trabalho, …ob.cit, pág. 391. Vejam-se, ainda, os artigos 515.º e 484.º do CT 2009 referentes ao princípio da supletividade dos IRCT não negociais. Acresce que o n.º 3 do artigo 516.º do CT 2009 prevê que “qualquer pessoa singular ou colectiva que possa ser, ainda que indirectamente, afectada pela extensão, pode deduzir oposição fundamentada, por escrito, nos 15 dias seguintes à publicação do projecto”.

269

Carvalho, Catarina de Oliveira e Júlio Vieira Gomes (2011), Direito do Trabalho + Crise =Crise do Direito do Trabalho? Actas do Congresso de Direito do Trabalho, …ob.cit, págs. 391e 392. Veja-se Gomes, Júlio Manuel Vieira

67

Ora, independentemente da interpretação adoptada das exclusões previstas no n.º 4 do artigo 206.º, estas têm vindo a ser consideradas exíguas para evitar a violação sobretudo da vertente negativa do princípio da liberdade sindical.

Neste âmbito, a compatibilidade do artigo 206.º com a CRP foi submetida à apreciação do TC por um grupo de Deputados com fundamento, em síntese, de que se trata270271:

(…) de uma adaptabilidade forçada, não resultante de acordo, colectivo ou individual, que é imposta por lei mesmo até contra a vontade manifestada pelos trabalhadores. Em matéria de flexibilidade do tempo de trabalho e de alteração de horários de trabalho, só o princípio da aceitação de cada trabalhador, sem imposições legais escudadas em decisões de maiorias, pode garantir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar, na medida em que só desta forma os interesses e razões pessoais e familiares dos trabalhadores podem ser tidos em consideração. A norma impõe que a disponibilidade de uma maioria de trabalhadores para aceitar um regime de adaptabilidade de tempo de trabalho se sobreponha às situações especificas de cada trabalhador individualmente considerado e que poderiam motivar a sua não aceitação, violando assim os seus direitos, nomeadamente o direito previsto no artigo 59.º n.º 1, alínea b), da Constituição.

Em contraposição, o TC defendeu a constitucionalidade da adaptabilidade grupal, ou seja, a possibilidade de extensão do regime das CCT em vigor a trabalhadores sindicalmente não filiados, com base sobretudo no princípio da igualdade, afirmando que “Os trabalhadores que operam no quadro de uma mesma empresa ou de um mesmo sector devem estar sujeitos a um mesmo conjunto de condições de trabalho, a menos que haja uma razão válida para assim não suceder”272

.

(2010), O Código do Trabalho de 2009 e a promoção da desfiliação sindical, Novos Estudos de Direito do Trabalho, Coimbra, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, pág. 161 a 197.

270

Ac. do TC de n.º 338/2010, publicado no DRE, 1.ª série, n.º 216, de 8 de Novembro de 2010. Disponível em http://dre.pt/pdf1sdip/2010/11/21600/0499405031.pdf

271 No Ac. em apreço, o Conselheiro, Joaquim de Sousa Ribeiro, sintetizando a problemática afirma que : (…) a

questão fundamental que aqui se suscita é a da extensão do regime a trabalhadores não filiados [alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 206.º] e da sua aplicação que prescinde de qualquer manifestação da autonomia colectiva operando por extensão da adaptabilidade individual (n.º 2 do mesmo artigo).Quanto à primeira, ela representa «uma nova e grave violação à liberdade sindical negativa» (…). Na verdade, a liberdade sindical negativa não tem um significado apenas formal, como direito à não inscrição e à não assunção dos deveres, perante o sindicato, que desta resultam (pagamento de quota, etc.). A liberdade de não integrar o substrato pessoal colectivo da associação sindical engloba também, como dimensão substancial do seu conteúdo, e sob pena de se transformar num invólucro quase vazio, o direito a «não ser directamente abrangido pelo domínio de eficácia de actuação de associações sindicais» em que não se está inscrito (…) no caso, «o direito de não ser prejudicado pelos resultados negociais em sede de contratação colectiva, a que cheguem as associações sindicais a que não se pertence» (…). E convém não esquecer que na área da autonomia privada (seja ela individual ou colectiva) a liberdade negativa como liberdade de não ficar vinculado por efeitos que não se querem é expressão mais básica de autodeterminação (constitucionalmente consagrada no artigo 26.º, n.º 1, da CRP), a primeira e mais digna de tutela manifestação da liberdade negocial”.

272

No Ac. referido na nota anterior, o Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro, em sentido contrário ao TC, refere que “Não se contesta a conveniência da uniformidade das condições laborais, do ponto de vista da racionalidade de

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