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A ADESÃO AO REGIME TERAPÊUTICO

2. GESTÃO DA DIABETES MELLITUS TIPO 2 ENQUANTO DOENÇA CRÓNICA E O PAPEL DO ENFERMEIRO

2.2. A ADESÃO AO REGIME TERAPÊUTICO

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A adesão é definida como a medida em que o comportamento de uma pessoa – tomar medicamentos, seguir o plano alimentar ou adotar mudanças no estilo de vida corresponde às recomendações preconizadas por um profissional de saúde. No tratamento da diabetes, a falta de adesão é um desafio quase diário na prática clínica de enfermagem, tornando-se fundamental a procura constante por estratégias e intervenções que visem minimizar esta situação (Faria, Santos, Arrelias, Rodrigues, Gonela, Teixeira & Zanetti, 2014).

A não adesão ao regime terapêutico leva a uma diminuição do controle efetivo das doenças, aumento do risco de hospitalizações e aumento da mortalidade (Remondi, Cabrera & Souza, 2014).

Segundo a OMS (2003), existem cinco dimensões que influenciam a adesão ao regime terapêutico (ADR): fatores relacionados com a doença, doente, tratamento, equipa de saúde e fatores socioeconómicos.

Existem vários fatores que podem influenciar na adesão ao tratamento, relacionados ao paciente (sexo, idade, etnia, estado civil, escolaridade e nível socioeconómico); à doença (cronicidade, ausência de sintomas e consequências tardias); às crenças de saúde, hábitos de vida e culturais (perceção da seriedade do problema, desconhecimento, experiência com a doença no contexto familiar e autoestima); ao tratamento dentro do qual se engloba a qualidade de vida (custo, efeitos indesejáveis, esquemas terapêuticos complexos), à instituição (política de saúde, acesso ao serviço de saúde, tempo de espera versus tempo de atendimento); e, finalmente, ao relacionamento com a equipa de saúde (Gusmão, 2006).

Quanto aos motivos extrínsecos relativos à não adesão ao regime terapêutico, nomeadamente ao regime medicamentoso, verificou-se que cerca de metade dos portugueses acredita que o esquecimento é o principal, seguindo-se a falta de recursos económicos. O terço restante refere a «preguiça» como fator para não aderir à terapêutica, bem como a falta de instrução; não querer ou não gostar de tomar medicamentos; e adormecer antes da hora a que devia tomar a medicação. Entre os motivos de segunda ordem, a falta de recursos económicos assume a maior importância, seguindo-se o esquecimento e a falta de instrução. Como motivo de terceira ordem, a

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relutância em tomar medicamentos e as dificuldades económicas são os mais apontados (Cabral & Silva 2010).

No que diz respeito às características dos medicamentos e à evolução dos tratamentos que podem condicionar a adesão à terapêutica, verificou-se que, para cerca de metade dos portugueses, a falta de adesão se deveria a dois fatores principais: os doentes sentirem-se melhor ou queixarem-se dos efeitos secundários dos medicamentos. Ainda com alguma expressão, surge o facto de não quererem misturar medicamentos com álcool ou outras substâncias; sentirem-se pior quando tomam os medicamentos; não sentirem melhoras ou considerarem que o tratamento não está a fazer efeito; duvidarem da eficácia do tratamento; a duração demasiado longa do tratamento; a toma de demasiados medicamentos; dificuldade em tomar os medicamentos de acordo com a prescrição. Como motivos de segunda ordem, os mais importantes são o facto de os doentes se sentirem melhor e a duração do tratamento. Por fim, como terceiro motivo mais importante, está o número elevado de medicamentos a tomar (Cabral & Silva 2010).

No que diz respeito ao tratamento não farmacológico, verifica-se que a não adesão aos comportamentos de autocuidado está relacionada com a perceção que as pessoas com diabetes têm em relação à necessidade de mudança de hábitos alimentares e às dificuldades enfrentadas para aderir ao novo estilo de vida. A ausência de sintomas é um dos aspetos que dificultam a realização de dieta, pois os diabéticos não apresentam manifestações de mal-estar após se alimentarem. Algumas pessoas parecem precisar de algo concreto, palpável e visível para facilitar e estimular o autocuidado. O conceito de realizar a dieta recomendada reveste-se de vários significados, tais como a perda do prazer de comer e de beber, a restrição da autonomia e da liberdade para se alimentar como e quando desejar (Espírito Santo, Souza, Souza, Ferreira & Taitson, 2012).

Existem também pessoas com diabetes que relatam ter vergonha de assumir a sua doença em público, o que depois se reflete em níveis glicémicos mais elevados (Espírito Santo, et al., 2012). Sintomas psíquicos também têm influência no controle metabólico, uma vez que a doença crónica pode gerar sentimentos diversos, como angústia, tremor e incertezas (Espírito Santo, et al., 2012).

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É também fundamental que os profissionais de saúde verifiquem o grau de compreensão que o utente teve das recomendações feitas, por forma a detetar possíveis distorções das recomendações feitas (Espírito Santo, et al., 2012).

Outros aspetos importantes na adesão ao tratamento estão relacionados com a motivação, quer do utente quer do profissional, a falta de conhecimentos, dificuldades económicas, falta de envolvimento dos familiares e a baixa escolaridade (Espírito Santo, et al., 2012).

A organização mundial de saúde diz-nos que as políticas públicas no que se referem às doenças crónicas têm falhado. Uma das causas apontadas para tal é o facto de não se reconhecer adequadamente os determinantes sociais e cultuais que envolvem a pessoa. De uma forma geral, as políticas de saúde tem considerado o doente como uma entidade isolada e ignora as relações sociais, a forma como estas estão interligadas. Têm culpado o doente pelo seu estilo de vida, ocultando o impacto socioeconómico (Juárez-Ramírez, Théodore, Villalobos, Jiménez-Corona, Lerin, Nigenda & Lewis, 2015).

Borba, Marques, Leal, Ramos, Guerra e Caldas (2013) referem ainda outros fatores que influenciam a ART: a duração do tratamento e as mudanças frequentes que levam a erros na continuidade do tratamento. A deficiência cognitiva e visual, comum nos idosos, pode dificultar o reconhecimento das prescrições. Além disso, o esquecimento decorrente do próprio processo de envelhecimento é outro dos fatores que podem influenciar para que exista uma baixa ART.

Para desenvolver o autocuidado relativo a esta doença, é fundamental que a pessoa tenha as habilidades necessárias. No entanto, estas habilidades parecem ser influenciadas por fatores pessoais, tais como sexo, idade, autoestima, fatores psicológicos, fatores interpessoais e fatores ambientais (nível socioeconómico, condições de vida e condições habitacionais), além do conhecimento sobre a doença, do tratamento, duração da doença, acesso aos serviços de saúde, entre outros (Coelho, Boas, Gomides, Foss-Freitas & Pace, 2015).

O conhecimento das características pessoais é importante e estas podem interferir no plano de cuidados que, desta forma, pode ser ainda mais individualizado (Coelho et al., 2015).

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O impacto de uma doença crónica afeta permanentemente a vida quotidiana, afeta a estrutura construída antes deste evento. É essencial que as pessoas conheçam a rede de apoio de que dispõem e que proporciona ajuda mútua e reciprocidade (Juárez-Ramírez et al., 2015).

Os profissionais de saúde em geral, e profissionais de enfermagem em particular, têm o dever de promover uma melhor adesão do doente ao tratamento, estimulando mudanças comportamentais essenciais para o controlo eficaz da doença. Vários estudos mostram que as orientações recebidas acerca do autocuidado pelo doente, sobre as mudanças no seu estilo de vida e as habilidades para aplicá-lo estão relacionados com a prevenção e redução de complicações (Neta, Silva, & Silva, 2015).

Acredita-se que é de grande importância que o enfermeiro realize programas educativos voltados para o doente, juntamente com a família e a comunidade, pois, possivelmente, resultará no controle da doença, uma vez que as complicações estão ligadas ao conhecimento para o autocuidado diário adequado e mudanças no estilo de vida. O doente necessita de estímulo dos profissionais de enfermagem para empoderar-se, adaptando-se da melhor maneira às modificações pertinentes para o controlo metabólico (Silveira, Ramos, Freitas, Rodrigues, Martins, Brito & Bezerra, 2015).

Num estudo realizado por Cabral & Silva (2010) no que respeita ao papel da relação de confiança entre utente e profissional de saúde para o êxito da adesão terapêutica, observa-se que, segundo a generalidade dos inquiridos, o receio dos pacientes de fazerem perguntas e de pedirem esclarecimentos aos profissionais, bem como o facto de não prestarem atenção quando estes estão a explicar o tratamento, seriam as principais razões que contribuem para as pessoas não aderirem à terapêutica. A falta de compreensão das vantagens do tratamento, por parte do paciente, é a razão mais referida a seguir, surgindo, por último, a falta de confiança no profissional de saúde. O ónus da qualidade da relação parece, assim, recair sobre os doentes. Isto não significa que os profissionais de saúde não tenham um papel a desempenhar na forma de levar os doentes a cumprir as prescrições.

Para a generalidade da população, a relação com os profissionais de saúde é um fator determinante para levar os pacientes a cumprir as indicações terapêuticas. Sendo assim, os profissionais de saúde deveriam, segundo os inquiridos, dedicar mais tempo a cada

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paciente, a fim de explicarem os tratamentos que prescrevem e fornecerem um plano detalhado do tratamento; por seu turno, os pacientes deveriam poder contactar o profissional de saúde para tirar dúvidas (Cabral & Silva 2010).

A conduta dos profissionais de saúde é considerada um determinante de ART. No processo de ART estão enraizados o processo de formação do profissional de saúde, os aspetos técnicos de cuidados e a relação interpessoal (Prado & Soares, 2015).

A vinculação ao profissional de saúde é fundamental no processo de aprendizagem e a forma como as pessoas são ajudadas tem impacto no autocuidado. A confiança do doente no prestador de cuidados é um fator de influência predominante sobre o controlo glicémico.

São apontadas três variáveis para a não adesão ao regime terapêutico: falta de acompanhamento dos profissionais de saúde, descontinuidade no acesso a medicamentos e a elevada complexidade do número de doses diárias (Remondi et al., 2014).

Uma melhor adesão está relacionada com a segurança do doente; traduz-se em melhores resultados de saúde e diminui os custos com os cuidados de saúde. A boa adesão melhora a efetividade das intervenções, promove a saúde e melhora a qualidade e a esperança de vida dos doentes. A boa adesão também tem benefícios económicos para o sistema de cuidados de saúde e para o doente. Não há uma forma única de promover a adesão aos regimes de tratamento. Para melhorar a adesão, têm de combinar-se várias estratégias educativas e comportamentais. As estratégias comportamentais incluem os lembretes e o reforço do comportamento do doente. Além disso, os prestadores de cuidados de saúde (profissionais de saúde) podem investigar as preferências dos doentes, simplificando os regimes de dosagem, etc. As estratégias educativas, que melhoram a adesão entre as pessoas com doenças crónicas, incluem a redução do número de medicamentos e da frequência das doses, o facultar de informação acerca dos efeitos secundários esperados e a motivação das pessoas para as alterações no estilo de vida causadas pela terapêutica (OE, 2009).

É muito importante educar os doentes acerca das suas doenças crónicas, benefícios do tratamento e complicações associadas à não-adesão. A educação é necessária para a

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autogestão, uma vez que a maioria dos cuidados prestados para doenças crónicas exigem que os doentes estejam envolvidos no seu próprio autocuidado (OE, 2009).

A educação é uma estratégia importante para melhorar a adesão, mas os doentes não precisam só de ser informados como também de ser motivados e encorajados a aderir ao tratamento e aos objetivos relacionados com o estilo de vida (OE, 2009).

É necessária uma abordagem multidisciplinar para tratar as doenças crónicas e melhorar a adesão. A família, a comunidade e as organizações de doentes são parceiros-chave na promoção da adesão. Precisam de ser envolvidos de forma ativa no plano de cuidados e nos resultados esperados dos cuidados (OE, 2009).

A melhoria da adesão irá exigir a cooperação contínua entre os profissionais de saúde, investigadores, responsáveis pelas políticas, famílias e, mais importante que tudo, o doente (OE, 2009).

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