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Adição de Michael do 1,2,4-triazol ao intermediário 54b

1.4.3. Ensaios biológicos

Os ensaios biológicos para os compostos sintetizados foram realizados no laboratório de microbiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp em colaboração com a professora Dra Angélica Zaninelli Schreiber e sob supervisão e execução da funcionária Luzia Lyra.

Os ensaios de atividade antifúngica foram realizados de acordo com as normas padronizadas dispostas nos documentos do CLSI (Clinical and Laboratory Standards Institute),

sendo estes: a) testes de difusão em disco63 e b) microdiluição em caldo.64

O teste de difusão em disco é um método qualitativo, para avaliar a susceptibilidade de microrganismos frente ao composto ou fármaco em questão. O teste consiste em colocar discos

de papel filtro com 20 L da solução do composto em DMSO (1280 g.mL-1) na superfície de

placas ágar contendo o meio de cultura, imediatamente após a inoculação. Após incubação por 24 h horas, a susceptibilidade dos microrganismos é determinada pela formação de halos ao

redor do disco quando não se observa crescimento.65 Após 48 h uma segunda leitura também é

realizada para confirmação do resultado observado. As cepas empregadas nesse momento foram Candida albicans ATCC 90028, Candida krusei ATCC 6258 (espécie resistente a fluconazol) e Candida parapsilosis ATCC 22019 (Tabela 12).

Tabela 12. Teste de susceptibilidade microbiana pelo método de difusão em discoa – halo em mm. Compostos C. albicans ATCC90028 C. krusei ATCC6258 C. parapsilosis ATCC22019 24 NAb NAb NAb 55a 31 15 22 55b 21 13 18 62 17 12 11 Fluconazol 28-39 --- 22-33

Todos os compostos testados exibiram alguma atividade contra as cepas avaliadas, mostrando ter atividade contra os microrganismos testados. O composto 24 inibiu o crescimento em toda a placa, não houve formação de halo, e sim apenas crescimento de algumas colônias ao redor do disco. A fins comparativos placas dos mesmos inóculos na presença de discos contendo fluconazol e voriconazol (medicamentos azólicos de referência) são exibidas (Figura 20).

Figura 20. Avaliação do composto 24 e comparação em relação aos antifúngicos fluconazol e

voriconazol.

a) Composto 24 em placa de Candida parapsilosis ATCC 22019. b) Composto 24 em placa de

Candida albicans ATCC 90028. c) Composto 24 em placa de Candida krusei ATCC 6258. d)

Halos de inibição referentes a fluconazol e voriconazol em placas de Candida parapsilosis ATCC 22019. e) Halos de inibição referentes a fluconazol e voriconazol em placas de Candida

albicans ATCC 90028. f) Halos de inibição referentes a fluconazol e voriconazol em placas de Candida krusei ATCC 6258.

Os compostos 55a e 55b mostraram ser promissores, exibindo halos de inibição semelhantes ao do padrão fluconazol (Tabela 12, entradas 2 e 3). Já o composto 62, demonstrou ter um halo de inibição muito menor que o do fluconazol, não sendo considerado promissor para maiores investigações.

Frente aos resultados positivos obtidos no teste de difusão em disco, a próxima etapa foi a realização do teste de microdiluição em caldo, método quantitativo que permite a determinação da concentração inibitória mínima (CIM). Os testes são realizados em placas de microtitulação contendo 96 poços, nas quais o composto a ser testado é colocado em diluições seriadas na presença do microrganismo. Os resultados foram compilados na tabela 13.

O composto 24 não reproduziu o que foi observado na placa de difusão em disco,

mostrando não ter atividade contra as cepas testadas (CIM =80 µg.mL-1). Uma possível

explicação para esse resultado é a ocorrência do efeito paradoxal (Eagle effect) na qual o microrganismo tem seu crescimento diminuído frente a baixas concentrações do composto, no entanto em altas concentrações retomam a capacidade de crescimento. Isso explicaria o crescimento de colônias isoladas próximo ao disco onde a droga foi aplicada, região em que a concentração seria maior. O efeito Eagle foi descrito pela primeira vez em 1948 por Harry Eagle

e A. D. Musselman durante estudos com penicilina.66 Os autores descreveram três

concentrações efetivas para o antibiótico, no entanto observaram que sob concentrações 2 a 20 vezes maiores, que a concentração bactericida encontrada, não foram capazes de inibir o crescimento bacteriano. Embora o efeito paradoxal tenha sido primariamente reportado para

agentes antibacterianos, há relatos na literatura do efeito para agentes antifúngicos.67 A

observação desse efeito associado a um valor de CIM alto (80 µg.mL-1) revelou que o híbrido

baseado no modelo de La Regina 24 não apresentou atividade antifúngica relevante.

Entretanto, os compostos 55a e 55b exibiram valores de CIM próximos ao do padrão

fluconazol para C. albicans ATCC 90028 e C. parapsilosis ATCC 22019. Ao analisar o

crescimento de C. krusei, espécie naturalmente resistente ao fluconazol, na presença dos

compostos testados observou-se valores de CIM de 2,0 µg.mL-1 (55a) e 2,6 µg.mL-1 (55b).

Algumas cepas isoladas de pacientes do hospital das clínicas da Unicamp de Candida

albicans (LIF-E10 e LIF12560)68 e resistentes ao fluconazol, foram avaliadas frente aos compostos 55a e 55b. Os testes demonstraram que ambos compostos foram ativos contra as cepas testadas exibindo valores de CIM muito inferiores ao fluconazol.

Os compostos também foram testados frente a cepas de fungos filamentosos,

Aspergillus flavus e Fusarium verticillioides, contudo uma baixa atividade foi observada

quando comparada ao padrão voriconazol mostrando não serem promissores para esses microrganismos.

Ao fazer uma observação mais cuidadosa dos resultados, notou-se uma interrupção abrupta do crescimento das colônias uma concentração anterior à CIM. Esse comportamento é diferente daquele exibido pelo fluconazol, que causa uma diminuição gradual do crescimento até a inibição total, comportamento característico de um composto com ação fungistática. Portanto os resultados preliminares demonstram que os compostos avaliados apresentam comportamento fungicida.

Tabela 13. Concentração inibitória mínima (CIM) e concentração fungicida mínima (CFM) em µg.mL-1.a Compostos Leitura b,c das CIM C. albicans ATCC 90028 C. krusei ATCC 6258 C. parapsilosis ATCC 22019 C. albicans LIF-E10 C. albicans LIF12560 A. flavus ATCC204304 F. verticillioides LIF2588 24 CIM -50% 80 640 640 NA NA NA NA CIM -100% 1280 1280 1280 NA NA NA NA 55a CIM -50% 2,0 2,0 2,0 0,58 0,50 2,0 1,0 CIM -100% 4,0 16 8,0 3,6 3,6 32 32 CFM 4,0 16 8,0 3,6 3,6 - - 55b CIM -50% 2,0 2,6 2,0 0,75 1,0 4,0 2,0 CIM -100% 4,0 13,3 4,0 3,3 4,0 32 16 CFM 4,0 13,3 4,0 3,3 4,0 - - Fluconazol CIM -50% 0,25-1,0 8,0 - 64 0,5 - 4,0 64 8,0 - - Voriconazol CIM -100% - - - 0,5-4,0 8,0

a Os valores exibidos na tabela representam as médias de triplicatas realizadas em dias diferentes.

b CIM – 50%: Leituras realizadas quando ocorreu 50% de inibição do crescimento; CIM – 100%: Leituras realizadas quando ocorreu 100% de inibição do crescimento. c Valores comparáveis para CIM– 50% para o fluconazol e CIM– 100% para o voriconazol como preconizado pelo CLSI para os medicamentos azólicos.69

1.4.4. Estudos de docagem70

Considerando as atividades antifúngicas observadas para os compostos 24, 55a e 55b, estudos de docagem foram realizados para obtenção de informações sobre as interações mais prováveis. Neste sentido, a estrutura cristalográfica da lanosterol 14α-demetilase (CYP51) de

Candida glabrata foi selecionada, uma vez que este é o modelo filogeneticamente mais

próximo disponível das cepas utilizadas nos ensaios para avaliação de agentes antifúngicos.71

As interações do ligante cristalográfico (itraconazol), foram então comparadas com as poses correspondentes dos compostos sintetizados e do miconazol (Figura 21).

Figura 21. Estrutura dos compostos a serem avaliados nos estudos de docagem molecular.

O sítio de ligação de CYP51 contém um complexo de heme-porfirina e, por conseguinte, espera-se que o anel azólico nos fármacos antifúngicos interaja com este complexo através de

coordenação.72 A forma tridimensional do sítio ativo é conferida pelos resíduos de aminoácidos

que o compõem. Este arcabouço posiciona o anel azólico do itraconazol no centro de uma abertura maior, quase perpendicular ao complexo heme-porfirina. Enquanto isso, o anel benzênico dicloro-substituído é orientado para a parede do sítio de ligação e a "cauda longa" do itraconazol (1), composto pelos quatro anéis, se estende através do restante do canal (Figura 22, A e B).

Figura 22. A) Representação do sítio ligante da CYP51 de Candida glabrata; B-F) Poses dos

compostos sintetizados e fármacos: itraconazol (B), miconazol (C), composto 24 (D), composto

55a (E) e composto 55b (F).

Em relação à docagem do miconazol, observa-se que a orientação do imidazol é muito semelhante ao do triazol contido na estrutura itraconazol. O anel dicloro-substituído ligado diretamente ao carbono secundário posiciona-se de maneira semelhante ao anel benzênico clorado da estrutura do ligante, orientando, portanto, o anel remanescente para porção mais estreita do canal (Figura 22, C).

Uma pose semelhante foi observada para o composto 24, pois este assemelha-se mais ao miconazol, tendo apenas o anel monoclorado como característica estrutural mais próxima a do itraconazol. Para esta estrutura, a cadeia lateral N-metila é direcionada para a porção mais estreita do canal, enquanto que o anel dicloro-substituído é orientado em direção à parede do local de ligação, de uma forma quase paralela ao anel azólico (Figura 22, D).

F

D

C

B

A

E

Os compostos 55a e 55b apresentaram poses similares entre si e ao itraconazol. O sistema bifenílico na estrutura de ambos os compostos se assemelha à "cauda longa" do itraconazol e a cadeia lateral N-metila ocupa a posição correspondente ao anel dicloro- substituído do fármaco. Além disso, as interações entre o núcleo imidazólico dos compostos e o grupo heme também são observadas. Pequenas variações nas interações entre 55a e 55b foram encontradas, mesmo 55b apresentando um grupo metoxila ligado ao anel benzênico (Figura 22, E-F).

As análises das interações fornecidas pela docagem entre os compostos e a enzima realçam a predominância de interações hidrofóbicas para o composto 24.

Além das várias interações hidrofóbicas, também são observadas ligações de hidrogênio "clássicas" para todos os compostos projetados (Figura 23, B-D), que favorecem a interação com a CYP51, uma vez que interações mais fortes e /ou de longo alcance (por exemplo, ligações iônicas e de hidrogênio) são conhecidas por desempenhar um papel fundamental para o

reconhecimento inicial dos ligantes pelos seus alvos.73 Adicionalmente, foi demonstrado que

uma única ligação de hidrogênio adjacente a um local de interação hidrofóbica do ligante tende a reforçar mutuamente a força de ambas as interações. A explicação para este fenômeno baseia- se no fato que ligações de hidrogênio mantém o substituinte hidrofóbico mais fortemente ligado no bolsão hidrofóbico do alvo, enquanto que as interacções hidrofóbicas também aumentarão a

força da ligação de hidrogênio por estabilização da geometria.74 Logo, as análises de docagem

dos compostos 24, 55a e 55b indicam que as poses e as interações mostradas sugerem a possibilidade de atuarem como inibidores da CYP51 fúngica.

Figura 23. Interações do miconazol e dos compostos 24, 55a e 55b com o grupo heme-porfirina

e com resíduos de aminoácidos no sítio de ligação da CYP51 de Candida glabrata.

A) Miconazol: Gly315/azol (ligação carbono hidrogênio, 2.68Å); ferro/azol (eletrostática/hidrofóbica,

4.50Å); Thr319/azol (hidrofóbica, 3.90Å); porfirina/azol (hidrofóbica, 5.10Å); Leu381/azol (hidrofóbica,

3.91Å); Leu381/cloro (hidrofóbica, 4.03Å); Leu384/cloro (hidrofóbica, 4.02Å); Tyr127/cloro (hidrofóbica,

4.73Å); Tyr127/anel aromático (π-π stacking, 5.15Å); Phe242/cloro (hidrofóbica, 4.42Å); Met512/ cloro

(hidrofóbica, 5.21Å); Met512/anel aromático (hidrofóbica, 5.22Å); Phe237/ cloro (hidrofóbica, 4.18Å);

Phe135/cloro (hidrofóbica, 5.17Å); Met134/cloro (hidrofóbica, 4.65Å). B) Composto 24: porfirina/azol

(hidrofóbica, 4.15Å); ferro/azol (eletrostática/hidrofóbica, 3.67Å); porfirina/azol (hidrofóbica, 4.18Å);

Thr319/cloro (ligação de hidrogênio, 2.93Å); His318/ cloro (interação de halogênio, 3.21Å); Leu381/ anel

aromático (hidrofóbica, 5.50Å); Leu381/cloro (hidrofóbica, 4.29Å); His382/ anel aromático (hidrofóbica,

5.84Å); Phe385/ anel aromático (π-π stacking, 5.70Å); Met512/cloro (hidrofóbica, 4.02Å); Phe237/ anel

aromático (π-π stacking, 4.94Å); Phe135/cloro (ligação de hidrogênio, 4.88Å); Ile140/cloro (interação de

halogênio, 3.34Å); porfirina/cloro (hidrofóbica, 4.48Å). C) Composto 55a: Gly315/azol (ligação de

hidrogênio, 2.98Å); ferro/azol (eletrostática/ hidrofóbica, 4.55Å); porfirina/azol (ligação carbono

hidrogênio, 3.71Å); porfirina/azol (hidrofóbica, 4.94Å); Leu381/azol (hidrofóbica, 3.64Å); Leu381/anel

aromático (hidrofóbica, 4.84Å); Pro239/anel aromático (hidrofóbica, 5.25Å); Ile140/anel aromático

(hidrofóbica, 5.23Å); His382/anel aromático (hidrofóbica, 5.84Å); porfirina/anel aromático (hidrofóbica,

4.84Å); porfirina/ anel aromático (hidrofóbica, 4.60Å). D) Composto 55b: ferro/azol

(eletrostática/hidrofóbica, 4.72Å); porfirina/azol (hidrofóbica, 4.37Å); Leu381/azol (hidrofóbica, 3.64Å);

Leu381/ anel aromático (hidrofóbica, 5.42Å); Pro239/ anel aromático (hidrofóbica, 4.97Å); Phe242/ anel

aromático (π-π stacking, 5.92Å); Tyr127/carbonila (ligação de hidrogênio, 2.70Å); Tyr127/N-metil

(hidrofóbica, 3.06Å); Thr131/anel aromático (hidrofóbica, 3.94Å).

D

C

B

A

1.5. CONCLUSÃO

Os modelos teóricos fundamentados na estrutura dos medicamentos azólicos e no sítio

ativo da enzima lanosterol 14α-demetilase (P45014DM, CYP51) foram utilizados como base para

a criação de duas propostas de moléculas com potencial atividade antifúngica. As moléculas corresponderam a um híbrido dos modelos, embasadas principalmente na estrutura dos compostos desenvolvidos por La Regina e Zampieri e empregando como substrato inicial os adutos de Morita-Baylis-Hillman.

O híbrido baseado no modelo de La Regina 24 foi sintetizado em 10 etapas a partir dos adutos de MBH em rendimento global de 5%, utilizando uma sequência de fácil reprodução. Embora longa, a sequência é robusta e pode ser utilizada para a síntese de outros híbridos.

A experiência adquirida na síntese híbridos baseados no modelo de La Regina foi utilizada parcialmente para o desenvolvimento de uma rota sintética para os híbridos baseados no modelo de Zampieri em 7 etapas e em rendimentos globais de 18% para o composto 54a e 22% para o composto 55b.

A atividade antifúngica desses compostos foi avaliada e as estruturas planejadas exibiram atividade, corroborando a proposta do trabalho.

Os compostos 55a e 55b exibiram atividades semelhantes ao do padrão fluconazol para cepas de Candida parapsilosis e melhores que o mesmo, para cepas de Candida krusei.

Com relação as duas cepas de Candida albicans (LIF-E10 e LIF12560) naturalmente resistentes ao fluconazol, os compostos se mostraram ativos, o que qualifica as estruturas como altamente promissoras.

Apesar dos resultados animadores para fungos leveduriformes, os compostos não foram capazes de inibir o crescimento dos fungos filamentosos.

Observações a respeito do comportamento dos microrganismos frente as diferentes concentrações dos compostos fornecem indícios de que as moléculas apresentam atividade fungicida e não fungistática como a do fluconazol.

Estudos voltados para a descoberta de possíveis interações com o sítio ativo da enzima

P45014DM, CYP51 (docagem) foram realizados demonstrando que os compostos apresentam

interações com o sítio ligante da enzima semelhante ao itraconazol. Esses resultados sugerem que 24, 55a e 55b podem funcionar como inibidores da enzima em questão.

CAPÍTULO 2: Obtenção de derivados imidazólicos N-

substituídos a partir de adutos de Morita-Baylis-

Hillman mediada por 1,1’-carbonildiimidazol

2.1. INTRODUÇÃO

2.1.1. O núcleo imidazólico

O imidazol é um heterociclo aromático de cinco membros que contém dois átomos de nitrogênio nas posições 1 e 3 (Esquema 41). O primeiro relato do núcleo imidazólico ocorreu em 1858, embora alguns derivados tenham sido descobertos nos anos de 1840. Foi Heinrich

Debus75 que reportou a primeira síntese para obtenção do heterociclo via reação do glioxal e

amônia. O produto da reação foi chamado de glioxalina e mais tarde passou a ser conhecido como imidazol.

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