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3. SEGURANÇA ALIMENTAR DE FRUTOS SECOS

3.2 Perigos associados ao consumo de castanha do Brasil

3.2.2 Aflatoxinas e contaminação fecal

A contaminação por aflatoxinas representa uma grande preocupação, não somente do ponto de vista da saúde pública, devido aos efeitos carcinogénicos e genotóxicos das aflatoxinas no ser humano, mas igualmente considerando-se as perdas do ponto de vista económico (Sitio do projeto Safenut, 2010).

Na contaminação por aflatoxinas na castanha do Brasil, importa considerar tanto os seus tipos B como G, estando por isso ultrapassada a premissa de se considerar a espécie

Aspergillus flavus (só produtor do tipo B) como a principal responsável. As espécies Aspergillus parasiticus e Aspergillus nomius são frequentemente encontradas no produto,

sendo esta última já considerada como responsável por grande quantidade da aflatoxina produzida na castanha do Brasil (tanto B como G) (Johnsson et al, 2008; Olsen et al, 2008).

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Johnsson et al (2008) refere mesmo que o Aspergillus nomius é o principal responsável pela presença de aflatoxinas na castanha do Brasil.

No que se refere à localização da contaminação na castanha do Brasil, o principal foco de contaminação situa-se entre a casca dura e a pele castanha (testae) (Freitas-Silva e Venâncio, 2010a). Contrastando com outros frutos secos, a esterilização da superfície da castanha do Brasil não reduz consideravelmente a contaminação fúngica, indicando que o microrganismo estará presente igualmente no interior da amêndoa, com uma elevada taxa de colonização interna (Freitas-Silva e Venâncio, 2010a; Freitas-Silva et al, 2011b; Marklinder et al, 2005). Como a castanha do Brasil é colhida em ambiente selvagem natural e é armazenada e transportada em condições que favorecem o crescimento de fungos, estes terão mais facilidade para colonizar os tecidos internos do que noutros frutos secos (Freitas-Silva e Venâncio, 2010a). Para níveis de humidade relativa superior a 75%, os fungos produtores de aflatoxina têm capacidade de penetrar a casca, contaminando a amêndoa (Arrus et al, 2005).

O risco de contaminação por aflatoxinas é menor em castanhas descascadas e selecionadas, provavelmente devido a falta de aplicação das boas práticas na atividade extractivista, transporte e condições de armazenamento local na Amazónia (Martins et al, 2008; Vargas et al, 2011). Vargas et al (2011) referem que todas as partes da castanha são suscetíveis a contaminação com micotoxinas, no entanto, o risco aumenta nas frações defeituosas contribuindo estas para cerca de 92% da massa de aflatoxina: removendo a casca e todas as unidades podres de um lote, reduziu-se a contaminação de 16,8μg/kg para 2,8μg/kg.

Apesar da contaminação por aflatoxinas ser um fenómeno largamente investigado, as etapas críticas da infeção com o fungo e consequente produção da micotoxina ainda permanecem pouco claras (Baquião et al, 2012; Olsen et al, 2008). Estudos referem como

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críticas a etapa da colheita no solo (em que a probabilidade de contaminação com espécies de Aspergillus aumenta 43% por dia, existindo correlação positiva entre a presença na amêndoa e na casca), armazenamento ainda nas instalações do extractivista e transporte (Baquião et al, 2012; Olsen et al, 2008).

De referir ainda que caso não ocorra a etapa de secagem para níveis de aw e humidade

seguros, o nível de aflatoxinas aumenta rapidamente entre 40 a 90 dias após a colheita, demonstrando-se que grande parte de formação de aflatoxina acontece ainda nas instalações do extractivista (Johnsson et al, 2008).

Mello-Robert e Scussel (2006) referem que o risco de contaminação com aflatoxina pode ocorrer quer na floresta quer no armazenamento, estando diretamente relacionada com as condições climatéricas na floresta amazónica, tempo de permanência dos ouriços em contacto com o solo, condições de armazenamento ainda nas instalações do extractivista, transporte muitas vezes em condições precárias e demoradas.

Baquião et al (2012), Johnsson et al (2008) e Vargas et al (2011) referem que o solo é provavelmente a principal causa da contaminação do produto com Aspergillus, que associado às condições climáticas favoráveis e, muito especialmente, ao frequente elevado aw (> 0,70) da castanha, potencia o seu desenvolvimento.

A necessidade urgente de boas práticas na monitorização da aflatoxina na castanha do Brasil foi uma das conclusões apontadas por Baquião et al (2012). Vargas et al (2011) aponta a necessidade de promover estratégias de redução da contaminação por aflatoxinas, que passa em parte pela segregação de todas as unidades defeituosas e podres, no sentido de promover tanto o consumo interno como as exportações do produto.

Pacheco et al (2010) referem que a aflatoxina está presente na castanha do Brasil, com relação positiva entre o conteúdo de humidade e a quantidade de toxina produzida. Este facto mostra a necessidade de controlar os fatores ambientais (humidade

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relativa, temperatura) e o uso de boas práticas tanto nas etapas de colheita como no processo de beneficiamento.

A contaminação fecal provoca alterações químicas indesejáveis, com consequente alteração de cor, odor, sabor, textura e aspeto geral (Martins et al, 2008). Num estudo de Litlle et al (2010), que teve como objetivo identificar os níveis de contaminação em frutos secos, a Salmonela foi identificada em 0,1% das 2.886 amostras analisadas, apesar dos níveis de contaminação terem sido considerados baixos. No que se refere à castanha do Brasil, neste mesmo estudo, foram analisadas 469 amostras, duas das quais contaminadas com Salmonela (0,4%) e dez (2,1%) com Escherichia coli, revelando consideráveis índices de contaminação fecal, e inadequação ao consumo humano com potencial perigo para a saúde. Dos diversos frutos secos analisados, no que se refere a Escherichia coli, a castanha do Brasil foi o fruto com maior número de amostras contaminadas. Segundo o autor, dever- se-á às precárias condições tanto na base da colheita, como nas próprias indústrias de beneficiamento.

No seu estudo, Pacheco e Scussel (2006) referem que na fase da receção na indústria de beneficiamento os lotes que chegam apresentam níveis elevados de humidade (média de 22,4%) bem como contaminação por fungos (11,5 x 102 ufc/g). A contaminação por aflatoxinas foi identificada em 25% das amostras, com valor médio de 11,13 μg/kg (acima do limite legal). Esta constatação evidencia a falta de boas práticas por parte do extractivista e no transporte. Já na fase de beneficiamento, a secagem em secadores rotativos (70-102°c, 48 horas), reduz o teor de humidade para 4,7% e contagem fúngica para 0,28 x 102 ufc/g, sem qualquer efeito no teor de aflatoxinas (resistentes a temperaturas de 250°c). Como conclusão, importa pois melhorar as condições ainda na floresta, para serem garantidos níveis mais baixos de aflatoxinas.

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No seu estudo, Arrus et al (2005) demonstram que não foi detetado desenvolvimento de aflatoxina quando armazenada 60 dias nas condições ambientais 75% H.R / 30°c ou 10°c /97% H.R. A produção da toxina, a 30°c é afetada significativamente pela humidade (nota-se uma evolução bastante acentuada dos 80% aos 85%). A temperatura afeta significativamente a produção da aflatoxina, sendo que mantendo fixa a H.R. a 97%, a concentração da toxina aumenta com o aumento da temperatura. A produção máxima regista-se nas condições 97% H.R e 25-30°c, as quais são características da época da colheita na floresta amazónica. Este estudo refere ainda que a aflatoxina B1 representa cerca

de 76-79% da aflatoxina total produzida, sendo os fungos das espécies Aspergillus spp. os dominantes.

Algumas características da castanha do Brasil, que inclusivamente podem ser notadas pelo consumidor, como formação de bolores visível, consistência branda e macia, descoloração, forma irregular, ou no caso de castanha com casca se a amêndoa sacode no interior, pode ajudar a identificar possíveis unidades contaminadas com aflatoxinas. Estes parâmetros, se bem definidos podem igualmente ser usados para desenvolver métodos de seleção mecânica ou cromática (Mello-Robert e Scussel, 2006). O estudo realizado por Marklinder et al (2005), através da realização de questionários e teste a teores de aflatoxina, mostra que o consumidor é capaz de selecionar e rejeitar de forma eficaz castanhas do Brasil contaminadas com aflatoxinas através de exame visual, protegendo-se a si próprio de consumir elevadas quantidades da toxina. Esta prática deverá ser encorajada e os consumidores elucidados das vantagens associados à rejeição de frutos secos que visualmente apresentem defeitos. Pacheco et al (2010) corroboram da ideia de que para evitar o consumo de produto contaminado com aflatoxina, o consumidor deverá ter a capacidade, e ser informado nesse sentido, de descartar todas as unidades aparentemente danificadas.

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