• Nenhum resultado encontrado

Os agressores e suas motivações O conflito com a sociedade, as normas e valores vigentes, o desafio à autoridade, as

DIRECTO INDIRECTO

Esquema 2 Diferentes tipos de bullying e suas formas de agressão e humilhação

5. Os agressores e suas motivações O conflito com a sociedade, as normas e valores vigentes, o desafio à autoridade, as

contendas com outras gerações e a necessidade de afirmação pela diferença são comummente evocados na descrição da adolescência. São fases de um processo de conquista de autonomia, exploração e questionamento do mundo e de si mesmo. Frequentemente conduzem a uma ruptura ou afastamento, geralmente temporários, imprescindíveis para a construção da identidade de cada indivíduo.

O grupo dos pares assume uma importância extrema, constituindo uma referência para o jovem adolescente em termos da sua identidade, numa altura em que alguma incerteza se instala na sua mente. Desta forma, a necessidade de identificação com o grupo, o receio de ser excluído e/ou criticado, ou o risco de ver a sua auto-estima fortemente atingida, promovem o conformismo em relação aos seus pares, que por pressão (directa ou indirecta) incitam muitas vezes a atitudes perturbadoras. Muitas dessas condutas do jovem são explicadas por uma necessidade de aprovação ou de ganhar estatuto nesse mesmo grupo. Associada aos factores de desenvolvimento sociocognitivo, condicionam as estratégias que o jovem usa na resolução de conflitos, e que neste período se baseiam sobretudo na força física em detrimento da capacidade de negociação.

Porque o comportamento agressivo é também socialmente aprendido, a violência difundida pela televisão tem efeitos nocivos sobre os espectadores, que são ainda mais notórios se estes forem crianças. Por outro lado, “a agressividade e hostilidade por parte dos jovens pode ser o resultado da exposição a certas atitudes e comportamentos em casa, nomeadamente, o uso habitual da punição física, que ensina que a agressividade é um modo aceitável de resolução de conflitos.” (Costa e Vale, 1998; 29) A agressividade intrafamiliar, conjugal, entre pais e filhos e entre irmãos, bem como a falta de afecto e envolvimento parental, a indiferença ou mesmo uma atitude demasiado permissiva e tolerante em relação a episódios de violência, podem também estar na génese do desenvolvimento da agressividade.

“(...)Children and teens that come from homes where parents provide little emotional support for their children, fail to monitor their activities, or have little involvement in their lives, are at greater risk for engaging in bullying behavior. Parents' discipline styles are also related to bullying behavior: an extremely permissive or excessively harsh approach to discipline can increase the risk of teenage bullying. (...)” (Olweus, 1993; pp. 39-43)

Educar um jovem no século XXI tem-se tornado um desafio difícil de concretizar de forma plena, devido à fluidez de modelos e de referenciais educacionais. Os pais de ontem mostram-se perdidos na educação das crianças de hoje. Estão cada vez mais ocupados com o

trabalho e dispõem de pouco tempo para dedicarem à educação dos filhos, que vai sendo delegada a outros, ou no caso das famílias com menor poder aquisitivo, os filhos são muitas vezes entregues à própria sorte.

As famílias não conseguem educar seus filhos emocionalmente, nem se encontram habilitadas para resolver conflitos por meio do diálogo e da negociação de regras. Acabam por optar muitas vezes pela arbitrariedade do não ou pela permissividade do sim, não oferecendo um referencial de convivência baseado no afecto e pautado pelo diálogo, pela compreensão e pela tolerância.

Para além da influência familiar e do grupo de pares, dos factores associados ao desenvolvimento sociocognitivo e da personalidade, também a herança genética, as práticas educativas, o meio onde se insere, o estatuto social, o contexto imediato e a percepção das consequências de uma situação são factores apontados como estando intimamente relacionados com a predisposição e o desenvolvimento de violência. Contudo, é necessário não fixar generalizações, pois um indivíduo pode viver numa área degradada, ser proveniente de uma família desestruturada, demasiado permissiva ou hostil, com dificuldades económicas, ter amigos iníquos e conviver com alguma agressividade, e ainda assim não desenvolver ele mesmo essa agressividade. O oposto é também possível: pode um jovem estar integrado num contexto social favorável, pertencer a um estatuto elevado, socializar e frequentar ambientes selectos e, no entanto, devido a algum fracasso ou adversidade, passar a exercer quaisquer formas de violência sobre outrem. (Costa e Vale, 1998)

Frequentemente, um aluno que é considerado agressivo ou violento surge-nos estereotipado como é impopular e cobarde, alguém que agride porque é inseguro. No entanto, características reconhecidas aos agressores e vulgarmente apresentadas pelos professores são reduzidos auto-controlo e capacidade de concentração. Os agressores são de igual forma usualmente descritos como fisicamente fortes e com tendências agressivas, quer em relação aos seus pares, quer aos adultos, não revelando qualquer afinidade pelas vítimas e reduzidos sentimentos de culpa face aos seus actos: “Bullies are generally physically aggressive, with pro-violence attitudes, and are typically hot-tempered, easily angered, and impulsive, with a low tolerance for frustration. Bullies have a strong need to dominate others and usually have little empathy for their targets. Male bullies are often physically bigger and stronger than their peers. (…)”(Olweus, 1993; pp. 34-43)

Podem ser uma ou várias pessoas ou vários grupos de pessoas em momentos diferentes. No entanto, tendencialmente são jovens adolescentes do género masculino e de perfis socioeconómicos diversificados, pelo que se torna mais difícil padronizar as características do agressor, correndo-se o risco de incluir ou excluir características presentes noutros tipos de agressor. De qualquer forma, há alguns elementos que parecem ser comuns e que permitem traçar um perfil psicológico do agressor.

Frequentemente, as formas de agressão utilizadas estão intimamente associadas ao género. As raparigas estão mais ligadas às agressões indirectas, como a revelação de segredos e o disseminar de rumores, ao passo que os rapazes preferem envolver-se em confrontos

directos, normalmente físicos: “While male youth target both boys and girls, female youth most often bully other girls, using more subtle and indirect forms of aggression than boys. For example, instead of physically harming others, they are more likely to spread gossip or encourage others to reject or exclude another girl.” (Olweus, 1993; 19)

The most common perpetrators of bullying behaviour are individual boys or groups of several boys. Girls tend to bully in groups, often using indirect bullying which can be more difficult for teachers to detect. Boys are more likely to use more direct, physical forms of bullying. It is usual for pupils involved in bullying to be in the same class or year group as the pupil they are bullying. (…) When there is an age difference, the bullying pupils tend to be older than their victims. (…) (Sharp e Smith, 1994; 4)

O factor idade tem também um papel condicionante na escolha da forma de violência. Na infância e adolescência os casos de bullying têm maior prevalência e são mais expressivos e contundentes. As crianças mais novas recorrem particularmente à agressão directa; porém, com o aumento da idade e consequente desenvolvimento global e a aquisição de competências, os casos de agressão tendem a diminuir. Os que se verificam adquirem contornos mais rebuscados e graves. A idade e o desenvolvimento da criança está intimamente ligado aos mecanismos que ela utiliza para atingir os seus fins, sejam eles positivos ou negativos, e nos casos mais graves e em que não haja uma intervenção com vista à alteração das atitudes, os comportamentos desviantes e perturbações de conduta vão permanecer e agravar-se ao longo dos anos.

Os bullies actuam tendo por base e como influência diversas motivações que vão desde os estilos de vida e comportamento parental, à violência que diariamente irrompe em suas casas através da televisão, da Internet ou dos videojogos. De uma forma geral, as crianças ou jovens agressores não apresentam remorsos pelas suas condutas porque sentem que elas são justificadas. A impulsividade, a revolta e a energia características destas idades surgem aliadas a uma raiva interior, à frustração, à baixa auto-estima, ou mesmo ao medo, já que muitas vezes são eles próprios (bullies) violentados em casa ou marginalizados em diversos círculos sociais, circunstâncias que justificam na sua perspectiva todos os comportamentos.

Essa inversão de papéis fora da escola contribui para que o bully procure desempenhar um papel de domínio no interior da escola, nem que para isso tenha de exercer violência para com os seus colegas. A exposição contínua a essa violência, seja ela familiar ou veiculada pelas novas tecnologias ou pelos meios de comunicação social, cria no bully uma habituação que transforma a agressividade num elemento natural e constantemente presente na sua vida. É o modo que ele conhece para resolver os problemas e que utiliza para chamar à atenção para si e para o seu mundo. Pelo facto de muitas vezes não se sentir valorizado no círculo familiar, social e até escolar, o bully sente necessidade de fazer os outros sentir-se

amesquinhados, para que ele próprio se possa evidenciar: “The crucial thing to understand is that bullies are intrinsically weak and vulnerable people who need to ridicule, intimidate and belittle their victims to make the world around them aware of their existence.” (The

Teacher‟s Magazine, nº 57) Trata-se de um ser vulnerável, muitas vezes com carências afectivas, subvalorizado, que acaba por partilhar com as vítimas algumas características. Muitos efeitos são semelhantes para quem ataca e é atacado. Tanto a vítima como o vitimizador apresentam frequentemente défice de atenção, falta de concentração e desmotivação para os estudos, embora para a vítima estes factores possam surgir apenas como consequência do acto de bullying.

O insucesso escolar e as retenções surgem frequentemente associadas ao contexto de

bullying, e tradicionalmente ao ponto de vista da agressão. O estereótipo indica que quantos

mais os anos de reprovação, maior a probabilidade de se ser agressor. Contudo, por vezes é a situação contrária que sucede. Os alunos retidos são muitas vezes as vítimas de agressão e não os perpetradores dessa violência. Muitas vezes o bully age porque quer ser mais popular, sentir-se poderoso e obter uma boa imagem de si mesmo. É habitualmente alguém que não aprendeu a transformar a sua fúria em diálogo, e para quem o sofrimento do outro não é motivo para deixar de agir. Pelo contrário, o bully manifesta satisfação e regozijo com a reacção do agredido e por estar a conseguir atingir os seus objectivos. Esta sublimação pessoal cria-lhe uma maior auto-estima, o que o leva a manter esse comportamento por longos períodos. Muitas vezes, já adulto, continua a desvalorizar os outros para chamar a atenção. Tal como o agressor, também a vítima tem dificuldade em sair do seu papel e retomar valores esquecidos ou formar novos.

Usualmente, os bullies actuam durante os intervalos ou actividades livres, quase sempre em áreas não vigiadas, por não se atreverem a mostrar-se abertamente. Frequentemente, fazem-se representar pelos seus amigos íntimos e cúmplices, que executam o “trabalho sujo” por eles, pois apesar de serem crianças impulsivas e agressivas, são mais populares do que as vítimas, que revelam uma atitude oposta. O bully é rebelde, insolente, desafiador, mas, ao mesmo tempo, extremamente popular pelo medo que inspira nas suas vítimas.

Muitos alunos que têm conhecimento de situações de bullying optam por não as denunciar, não interferir e por adoptar uma atitude de espectadores passivos, ou então acabam mesmo por ser coniventes, reforçando a agressão, rindo ou balbuciando palavras de incentivo, acabando regularmente como co-autores das agressões, com o receio de se tornarem eles próprios vítimas de bullying: “ (…) Ao lado da vítima e do agressor, ficam os outros alunos. Nunca são testemunhas inocentes: ou fazem de conta, porque receiam passar a vítimas, ou disfarçam o medo com alianças pontuais com os mais fortes. (…)” (Sampaio, 2009) É esta atitude de passividade ou de conivência tanto por parte de alunos, como de qualquer outro elemento da comunidade escolar ou do âmbito familiar que é necessário alterar. “(…) Numa escola sensibilizada para o problema, em que o clima é adequado, a vítima pode receber apoio dos adultos e dos pares, em vez de ser ridicularizada. Nesta

escola, a larga maioria das crianças, observadores passivos de práticas agressivas, poderá ter uma atitude mais positiva e de alguma forma ajudar as crianças que estão a sofrer agressões em vez de tomarem uma atitude de indiferença de „não é nada comigo‟ ”. (Pereira, 1997; 3)

É importante que toda a comunidade escolar se consciencialize de que é responsável pelo bem-estar de todos alunos e pela denúncia de situações que possam causar dano e comprometer esse bem-estar. Todos podemos contribuir para que as vítimas superem os seus traumas, e os agressores tenham a percepção dos malefícios que estão a causar ao outro.