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São 270 associações de trabalhadores rurais distribuídas desigualmente entre 82 municípios do estado. Vale ressaltar que esse número pode ser exponencialmente maior, uma vez que um grande número de associações comunitárias, não possuem CNPJ e não são, portanto, quantificadas pelos órgãos que regulam e fiscalizam a atividade. Por outro lado, nem todas as associações cadastradas participam necessariamente dos programas de microcrédito. A pesquisa de Silva (2014), mostrou por exemplo que, das quinze associações de trabalhadores rurais existentes no município de Traipu, no referido estado, apenas oito trabalham com empréstimos do Banco do Nordeste.

O estudo realizado por Abramovay (2008) junto a 1.600 agricultores familiares, calculou a porcentagem de indivíduos que consideram os líderes de associações importantes para o acesso ao Agroamigo. Verificou-se que, entre os clientes do Agroamigo com duas ou mais operações, 38,3% consideram-nos úteis para ter acesso ao crédito. Entre os ingressantes, o percentual de clientes sobe para 46,6%. Dos clientes em atraso, 49,6% consideram os líderes de associações comunitárias importantes para a obtenção do crédito.

Ademais, o trabalho que aqui chamamos de “agente de microcrédito” também é desempenhado por técnicos da EMATER que possuem unidades em 99% dos municípios do estado, sendo coordenada por oito gerências regionais. Há também os funcionários das secretarias de agricultura dos municípios. Neste caso, o BNB conta com pelo menos um agente em cada município cuja prefeitura firmou parceria com a instituição. Trabalho semelhante também é desempenhado por presidentes de sindicatos de trabalhadores rurais. Ao todo são 100 sindicatos distribuídos entre os municípios alagoanos. A produtividade desses agentes, isto é, o número de pessoas que através deles, foram submetidas à intermediação financeira não é a mesma, assim como sua forma de atuação, conforme será demonstrado na próxima subseção.

4.2 A creditização do território a partir dos agentes de microcrédito

Os eventos até aqui destacados, mostram que a oferta do microcrédito em todos os municípios do Nordeste, se assenta sobre a distribuição dos sistemas técnicos no território, dos quais se sobressaem as redes de telecomunicação e de transporte, que dão suporte à topologia dos fixos bancários (Agências, PAB’s, PAM’s e ATM’s). Mas, conforme salienta Santos, “essa opulência de ações não se precipita de forma cega sobre qualquer ponto da Terra” (SANTOS, [1996], p. 132-133). Segundo esclarece Antas Jr (2005), existem densidades técnicas e normativas que acabam por “tornar determinadas dinâmicas territoriais mais passíveis de serem controladas à distância”, isto é, pelos centros de gestão do território. Por outro lado, nos lugares onde o peso dessas duas variáveis é minimizado, as racionalidades locais é que são fortalecidas, bem como seu poder de destoar processos pensados a partir de lugares longínquos.

Decerto, o sistema bancário, está entre os que, de maneira mais vantajosa conseguiram se beneficiar dessa unicidade técnica. Sua distribuição entre os lugares, contudo, segue uma busca sequiosa por produtividade, privilegiando os centros urbanos onde a intensidade das relações de troca suscita uma maior quantidade de capitais adiantados e de poupança. Nessa perspectiva, o ramo do microcrédito, sobretudo o microcrédito rural passa a depender, sobremandeira, da formação de novos arranjos com agentes não bancários, chamados a integrar o sistema financeiro na condição de intermediários.

Através deles, é possível levar serviços financeiros a lugares mais distantes, com menores densidades técnicas. A participação desses agentes é uma resposta a um segmento do sistema financeiro, que cria as bases institucionais que garantem o acesso ao crédito por uma espessa camada de pobres, mas não dispõe de um sistema de objetos e ações, no setor bancário, materialmente capaz de assegurar sua oferta e devolução, segundo as diretrizes do PNMPO.

Para o Banco do Nordeste, mesmo com o trabalho que é desempenhado pelos assessores de microcrédito do Instituto Nordeste Cidadania, as organizações locais desempenham um papel importante, pelo grande número de agentes envolvidos na articulação dos assessores de microcrédito com o seu público-alvo, nos lugares compreendidos pelo seu raio de ação. Na verdade, os nexos existentes

nessa relação do Banco com presidentes de associações, cooperativas, secretarias e sindicatos vai muito além do que é institucionalizado. Esse papel desempenhado por lideranças locais, ora inseridos na divisão do trabalho como agentes de microcrédito, frequentemente escapa às entidades que regulam a atividade bancária, tanto por eles não se enquadrarem institucionalmente no sistema bancário, como pela ausência de relações contratuais diretas com esses setores. Sua dinâmica, portanto, torna-se mais difícil de ser compreendida a partir de dados estatísticos, fazendo-se necessária, a coleta de dados primários a partir de uma pesquisa de campo.

Com efeito, “explicar a realidade em que se vive pressupõe necessariamente considerar o papel dos outros atores e penetrar nas suas explicações” (MATUS, 2005, p. 185). Assim, em nossa pesquisa, buscamos compreender o trabalho exercido pelas lideranças locais, na operacionalização dos Programas Crediamigo e Agroamigo do Banco do Nordeste. Para tanto, foram realizadas entrevistas com dois (2) assessores de microcrédito, sendo um do Crediamigo e outro do Agroamigo. Além destes, também foram aplicados questionários a doze (15) representantes locais que trabalham como agentes de microcrédito. E, por fim, foram aplicados outros sessenta (60) questionários a clientes dos dois programas de microfinanças. Dessa forma, foi possível confrontar informações dos diferentes agentes encadeados em um mesmo processo creditício (assessores-agentes-clientes) e evidenciar nexos e contradições que não aparecem à primeira vista na divisão normatizada do trabalho. No Quadro 2 pode-se observar o papel de cada agente pesquisado no contexto geral da pesquisa.

Quadro 2 – Relação da população investigada

Público Qt. Objetivo

Assessor de microcrédito 2

Compreender as estratégias de atuação dos assessores de microcrédito, sua abrangência territorial, relações com as lideranças locais e com os clientes.

Agentes de microcrédito 15

Montar um perfil da figura do agente de microcrédito, compreender a gênese e o funcionamento da atividade, a partir de sua relação com o assessor de microcrédito e com o cliente.

Clientes 60

Identificar os mecanismos de acesso ao microcrédito utilizados pelos clientes e os resultados possibilitados por sua inserção nos programas de microfinanças do BNB.

Como recorte territorial da pesquisa de campo, foram selecionados doze (12) municípios jurisdicionados pela agência regional do BNB com sede na cidade de Arapiraca. A escolha dos municípios pautou-se, entre outras coisas, pelo fato de estarem integrados em um mesmo circuito financeiro, controlado pela agência que operacionaliza a maior carteira de microcrédito do estado e o maior número de clientes ativos. As cidades elencadas para a realização da pesquisa de campo são: Arapiraca, Campo Grande, Coité do Nóia, Craíbas, Feira Grande, Girau do Ponciano, Junqueiro, Lagoa da Canoa, Limoeiro de Anadia, São Sebastião, Taquarana e Traipu. Conforme demonstrado na Tabela 6 os indicadores de produtividade dos Programas de microcrédito apresentam sensíveis variações entre os municípios pesquisados, decorrentes de vários fatores, alguns já discutidos, mas também em função do trabalho que é desempenhado por agentes locais.

Tabela 6 – Indicadores socioeconômicos dos municípios pesquisados (2011) Município Pop. (mil) milhões) PIB (R$

Área (mil km²)

Indicadores Crediamigo Indicadores Agroamigo Clientes Potenciais* Contratos % Clientes Potenciais** Contratos % Arapiraca 214 2.172 352 23.372 8.454 38 4.461 453 10 Campo Grande 9 35,5 169 585 72 12 1.301 710 54 Coité do Nóia 10.9 37,7 88 1.062 213 20 2.320 180 7,7 Craíbas 22.6 83,1 272 2.273 1.542 69 4.378 515 12 Feira grande 21.3 80 178 1.906 578 30 3.733 357 10 Girau do Ponciano 36.6 127,2 514 2.905 1.259 42 5.485 768 14 Junqueiro 23.8 121,8 247 2.327 2.073 93 1.503 584 39 Lagoa da Canoa 18.2 67,6 84 2.317 987 42 2.465 309 13 L. de Anadia 26.9 99,2 308 1.905 479 25 2.798 175 6 São Sebastião 32 165,7 315 3.009 2.155 72 3.574 1148 32 Taquarana 19 78,9 153 1.645 622 38 2.777 111 4 Traipu 25.7 78,8 685 1.440 267 19 3.563 335 10 Total 460 3.148 3.370 39.571 18.801 47 38.358 5.645 15

Fonte: IBGE, 2011; BNB/Ambiente de microfinanças, 2011. Elaboração: SILVA. D. R.

* Os dados representam o número de microempreendedores autônomos de cada município. ** As informações se referem ao número agricultores familiares enquadrados no PRONAF/B.

Na tabela acima foram elencadas algumas informações socioeconômicas dos municípios situados no recorte espacial da pesquisa. Fatores como a população, o PIB e a área da unidade territorial formam uma condição preliminar à existência do

público-alvo dos dois programas. Quando considerado o conjunto dos municípios, os dois Programas de microfinanças apresentam o número de clientes potenciais muito semelhantes, mas individualmente, com exceção do município de Arapiraca, em todos os demais municípios o número de clientes potenciais do Agroamigo é superior ao do Crediamigo. Mas, o número de contratos do Programa Crediamigo é consideravelmente maior que o Programa de microcrédito rural. Deve-se ressaltar, porém, que no microcrédito urbano os empréstimos podem ser renovados semestralmente, enquanto no microcrédito rural isso geralmente ocorre de forma bianual. Assim, um cliente do Crediamigo tem a possibilidade de realizar até quatro empréstimos durante a vigência do contrato de um cliente do Agroamigo.

A importância de cada um dos Programas na economia dos municípios dar- se-á, antes de tudo, pelas características da economia local, mais precisamente pelo enquadramento de suas atividades econômicas às linhas de microcrédito do BNB. Mas ela resulta, outrossim, das possibilidades de acesso a esses recursos e, não obstante, dos arranjos que são firmados localmente. O Mapa 21 ilustra o recorte espacial da pesquisa de campo, assim como, a percentagem que cada um dos programas de microfinanças tem, comparativamente ao outro em cada município.