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Alguma contribuição portuguesa para a difusão

6. AÇÃO EXTERNA – ESTUDOS DE CASO

6.2. A ÇÃO EXTERNA E AÇÃO INTERNA

6.2.1. Alguma contribuição portuguesa para a difusão

Em países como Portugal, a «preparação» para a receção ao inglês no seu quotidiano, foi involuntariamente facilitada pelo cinema, pela televisão, pela edição fonográfica e pela sua veiculação através do éter radiofónico. Em vagas de decénios sucessivos, ao ritmo da introdução das então novas formas de cultura de massas, o cidadão

comum português, que foi conseguindo acesso aos novos media, foi- -se habituando a ouvir, na língua original, a cinematografia americana e genericamente anglófona, primeiro no cinema, depois na televisão.

Outras línguas nos chegavam, como o francês, língua tradicionalmente mais ensinada nas escolas até aos anos setenta, ou o italiano, no período áureo do seu cinema, mas o ruído de fundo, o mais persistente, e o que veio a impor-se quase até a ponto de se tornar esmagadoramente dominador, foi o som da língua inglesa. A representatividade das outras línguas, na indústria da cultura de massas, foi sendo tecida pela «natural», cada vez mais intensa, ligação dos agentes nacionais às grandes companhias internacionais de distribuição, naturalmente, também sediadas em países de língua inglesa.

Em Portugal a opção de, ao contrário de outros países como a Espanha a França ou a Alemanha, legendar, em vez de dobrar os filmes que eram exibidos, fez com que, quase involuntariamente, por motivos de economia de meios e custos – e não por uma definição estratégica de promoção do inglês num país de grande analfabetismo –, a língua mais ouvida nos media passasse, subtilmente, a ser a língua estrangeira mais familiar.

Com o advento da denominada música pop (no Portugal de Salazar era o “yé-yé”), que, desde os finais dos anos sessenta, passou a dominar nas rádios portuguesas, onde ainda hoje, suplanta a difusão musical radiofónica em língua portuguesa, isto apesar de toda a legislação produzida, cimentou-se, nas gerações mais jovens, a ideia de uma relação de sinonímia entre modernidade e língua inglesa. O francês, involuntariamente, passou a ser uma das componentes da diferenciação entre gerações, passou a ser a língua estrangeira dos

mais velhos, e assim, algo a evitar, sendo vista também, muitas vezes, como a versão mais enfadonha de difusão de cultura, palavra já de si muito depreciada, entre os falantes portugueses, devido à carga elitista que os media, a classe política e a classe abastada que sustentaram o regime de Salazar e Caetano e, após breve interlúdio de adaptação, o atual, lhe associaram, e assim foi assimilada pelos demais cidadãos.

Todo este conjunto de fatores levou à perceção comummente apreendida e propagada sobre a validade e importância de saber inglês. A língua inglesa passou a constituir uma janela para o mundo e, para os seus fervorosos adeptos, é mais do que isso, é a janela. Também no mundo académico esta perceção ganhou adeptos, muito por necessidade de manter o contacto com as publicações de investigação científica mais prestigiadas e dinâmicas na divulgação de novos estudos e novas descobertas que se iam alcançando no mundo anglo-saxónico e à sua volta (com maior intensidade e de modo mais enérgico do que na Europa continental e na esfera das publicações científicas francesas), mas com resultados semelhantes. O número crescente de publicações científicas, ou de artigos sobre avanços tecnológicos, passaram a ter origem e provêem, hoje mais que nunca (cf. bib.), maioritariamente, de autores e autoridades científicas de países de língua inglesa ou que escrevem nesta língua.

O crescimento económico que permitiu o desenvolvimento científico e tecnológico desse espaço linguístico, entre muitos outros aspetos, favoreceu fortemente a expansão de uma atividade artística e cultural fervilhante, particularmente, em áreas de impacto popular de massas como as artes do espetáculo (cinema, televisão, música), mas também nas artes que “cativam” as elites (literatura, pintura, escultura, teatro).

Neste ambiente de imersão constante, Portugal não se diferenciou do resto do mundo, nem se «atrasou», como é uso dizer-se, relativamente a tantas outras áreas do desenvolvimento humano, tendo contribuído apenas, com a adoção do fenómeno, como um fio de cobre serve de condutor à eletricidade.

6.2.2. Breve relance sobre a situação da língua francesa no sistema de ensino em Portugal

Fora das instâncias internacionais, a pouca influência da língua francesa, junto da massa dos falantes europeus mais jovens, e em idade escolar, não voltará a trazer esta língua para primeira língua estrangeira de aprendizagem. Também não esse será, hoje, o objetivo dos países europeus não francófonos, mas, – no caso de Portugal, onde a oferta de línguas estrangeiras79 no sistema de

ensino secundário não é suficientemente abrangente (apenas contempla o inglês, o francês o alemão e o castelhano80, sob a denominação espanhol), a língua francesa mantém, apesar de tudo, um predomínio que claramente a distância das outras duas línguas que o sistema de ensino básico e secundário português vai permitindo.

No caso português, se claramente é beneficiado o ensino da língua inglesa, como antes se beneficiou quase em exclusividade o francês – é uma realidade que acompanha a vaga de difusão do inglês e é talvez das poucas matérias onde os alunos vêm alguma utilidade imediata – também acaba por beneficiar ou, se preferirmos, segurar a língua francesa que, ainda assim, e segundo os dados atrás

79

Fonte: Recenseamento Escolar Anual 2001/2002 - Gabinete de Informação e Avaliação do Sistema Educativo, ME.

80

Castelhano é o nome pelo qual o estado espanhol designa a sua língua nacional na sua Constituição. MAR-MOLINERO,CLARE. 2000. The Politics of Language in the Spanish-Speaking

referidos do Ministério da Educação referentes a 2002, é aprendida por pouco mais de 29% dos alunos que estão no sistema, seja como primeira ou como segunda língua estrangeira.

Gráfico 4 LE no Ensino Básico e Secundário em Portugal

Os dados relativos a 2004/200581 mostram que globalmente houve um ligeiro retrocesso no inglês, menos 2,7%, e alguma recuperação do francês, mais 3,9%, um recuo do alemão e algum avanço do castelhano face a 2001/2002. Certo é que os quase 395 mil alunos que hoje aprendem francês em Portugal, no ensino público, o fazem como segunda escolha, num leque de opções já de si pouco diversificado e muito condicionado nas próprias escolas, e, globalmente, têm, em virtude de se tratar de uma opção, muito menos horas de ensino dessa língua estrangeira, no fim do ensino secundário.

81

Gráficos 5 e 6, página 114.

Matrículas em 2001/2002 numa 1ª ou 2ª Língua Estrangeira - Ensino Publico Básico e Secundário

Alemão 1,9% Espanhol 0,3% Francês 29,2% Inglês 68,6%

Gráfico 5 LE como Segunda língua

O que os dados82 nos permitem compreender é que a grande maioria dos alunos tem vindo a optar83 pelo francês, como segunda língua

estrangeira, particularmente no 3º Ciclo do Ensino Básico.

Gráfico 6

82

Fonte: Recenseamento Escolar Anual 2004/2005 – Gabinete de Informação e Avaliação do Sistema Educativo, Ministério da Educação.

83

A opção é relativamente limitada por razões relacionadas com a oferta dessas opções pelas escolas.

Matrículas no continente em 2004/2005 numa 2ª Língua Estrangeira Francês 82,0% Inglês 14,3% Espanhol 1,6% Alemão 2,2%

Inglês Francês Espanhol Alemão

Matrículas no Continente em 2004/2005 numa 1ª ou 2ª Língua Estrangeira - Ensino Público Básico

e Secundário Inglês 65,9% Francês 32,7% Espanhol 0,6% Alemão 0,8%

A escolha, pelo que atrás ficou dito, não é uma preferência fruto de uma verdadeira opção, mas não deixa de ser verdade que, perdida já há algumas décadas a hegemonia de outrora, a língua francesa é ainda estudada por quase um terço dos alunos do ensino secundário em Portugal.

Esta situação, pode não deixar otimistas os francófonos e, ainda mais grave, pelas consequências sociais, deixar muito preocupados os professores que se encontram sob o espetro do desemprego por falta de matéria-prima, mas os números mostram, sobretudo, a grande disparidade para as duas línguas que o sistema de ensino continua a não incentivar de forma suficiente, tendo em conta o seu valor económico atual na economia portuguesa.

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