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3 ITINERÁRIO DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR NAS DÉCADAS DE 1980 E 1990: DA CRÍTICA SOCIAL ÀS CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS

3.2 ALGUMAS (BREVES) CONSIDERAÇÕES SOBRE AS CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Na década de 1980 e início dos anos 1990, conforme apresentei anteriormente, surgiram na Educação Física escolar brasileira a proposição de diferentes propostas metodológicas que ancoradas em concepções distintas da área, possuíam como ponto em comum o questionamento e oposição ao entendimento da escola como local de fomento do talento esportivo, em que a disciplina é respaldada sob o viés dos conhecimentos oriundos da biologia.

A partir desse momento, alguns autores27 passaram a elaborar classificações em relação às concepções de Educação Física que acontecem na escola brasileira. Entendo que uma das dificuldades a tais classificações é a falta de clareza que algumas definições apresentam em relação ao que seja uma concepção pedagógica de Educação Física escolar e do que seja uma proposta metodológica para seu ensino. Compreendo que uma concepção educacional deve envolver os três níveis observados por Saviani (2005, p.31), a saber,

[...] o nível da filosofia da educação que, sobre a base de uma reflexão radical, rigorosa e de conjunto sobre a problemática educativa, busca explicitar as finalidades, os valores que expressam uma visão geral de homem, mundo e sociedade, com vistas a orientar a compreensão do fenômeno educativo; o nível da teoria da educação, que procura sistematizar os conhecimentos disponíveis sobre os vários aspectos envolvidos na questão educacional que permitam compreender o lugar e o papel da educação na sociedade. Quando a teoria da educação é identificada com a pedagogia, além de compreender o lugar e o papel da educação na sociedade, a teoria da educação se empenha em sistematizar, também, os métodos, processos e procedimentos, visando a dar intencionalidade ao ato educativo de modo a garantir sua eficácia; finalmente, o terceiro nível é o da prática pedagógica, isto é, o modo como é organizado e realizado o ato educativo. Portanto, em termos concisos, podemos entender a expressão “concepções pedagógicas” como as diferentes maneiras pelas quais a educação é compreendida, teorizada e praticada.

Com isso, entendo que as concepções pedagógicas no âmbito da Educação Física devem considerar as formas como são compreendidas, quais teorias que lhes dão suporte e como é posta em prática na escola. Ao passo que uma proposta metodológica diz respeito, principalmente, à prática pedagógica, já que busca organizar e realizar a ação no plano do ensino.

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Assim, a partir deste entendimento, concordo e compreendo ser pertinente as observações de Bracht (1999) sobre a existência de três concepções de Educação Física escolar na cena brasileira.

A primeira, denominada pelo autor de biologizante, possui nos termos “atividade física” e “exercícios físicos” marcada a ideia de que o papel da área é contribuir para o desenvolvimento da aptidão física, se embasando nas ciências biológicas, em que

A definição clássica de EF [Educação Física], nessa perspectiva, é a que a considera como disciplina que, por meio das atividades físicas, promove a educação integral do ser humano – mas, a conotação, na prática, é a do desenvolvimento físico-motor ou da aptidão física, servindo a “educação integral do ser humano” para satisfazer/caracterizar o discurso pedagógico (BRACHT, 1999, p.43).

Como segunda concepção de Educação Física, conforme Bracht (1999), há a de conotação psicologizante, em que ocorre uma mudança de denominação do objeto da Educação Física, ainda que o paradigma ou concepção nem sempre seja alterado, e se concede centralidade aos termos “movimento humano”, “motricidade humana”. Essa perspectiva dá ao movimento importância para o desenvolvimento integral da criança, sendo esse o papel da área. Assim, a Educação Física é classicamente definida como educação pelo movimento e/ou do movimento. O autor explicitou que a base teórica dessa concepção é, principalmente, da psicologia da aprendizagem e da psicologia do desenvolvimento, dando a primeira atenção ao desenvolvimento motor e a segunda ao desenvolvimento cognitivo. Em suas considerações indicou que a psicologização da educação é problemática, já que traz a sua despolitização.

Desse modo, ao se posicionar sobre as concepções biologizante e piscologizante da Educação Física, Bracht (1999, p.44-45) as considerou limitadas, na medida em que

permitem ver o objeto [da Educação Física] não como construção social e histórica e, sim como elemento natural e universal, portanto, não histórico, neutro política e ideologicamente, características que marcam, também, a concepção de ciência onde vão sustentar suas propostas.

Por fim, em uma terceira concepção de Educação Física denominada de crítica ou progressista, que é fortemente embasada nos conhecimentos oriundos das ciências humanas e sociais e que possui como categoria importante fazer a crítica do papel da educação na sociedade capitalista, conforme Bracht (1999), tem centralidade as expressões “cultura corporal”, “cultura corporal de movimento” 28. ou “cultura de movimento”.

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O autor defende a tese/ideia de que o saber específico da Educação Física vem da “cultura corporal de movimento”.

Ainda vale destacar que no entendimento do pesquisador a definição do objeto da Educação Física, e desse modo de sua concepção, esta relacionado com o papel social a ela atribuído e que isso é definidor do tipo de conhecimento buscado para sua fundamentação. É importante observar que isso ocorre de modo interdependente, ou seja, o tipo de conhecimento e concepção também define o papel social à área atribuída.

Assim, feitas essas (breves) considerações sobre as concepções pedagógicas de Educação Física escolar, e na esteira do constatado por Taborda de Oliveira (2001) que ao estudar um impresso pedagógico29 verificou serem publicadas em suas páginas tendências antagônicas da Educação Física30 e, portanto, ser possível a partir do estudo de um periódico observar em seu interior a veiculação, ainda que em menor proporção, de concepções educacionais que não convergem com as orientações defendidas pelos seus produtores, entendo ser pertinente estudar a Revista Nova Escola nessa direção, ou seja, procurando analisar quais concepções do componente Educação Física, historicamente, foram veiculadas entre 1986 até o ano de 2010, o que será feito no próximo capítulo.

29 Trata-se da Revista Brasileira de Educação Física e Desportos 30 São as tendências pragmáticas e dogmáticas da Educação Física.

4 CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA REVISTA NOVA