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1. O PAPEL DA LITERATURA

1.3 Algumas funções do ensino

Mãos Dadas

Não serei o poeta de um mundo caduco. Também não cantarei o mundo futuro. Estou preso à vida e olho meus companheiros. Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças. Entre eles, considero a enorme realidade. O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Carlos Drummond de Andrade (Sentimento do Mundo, 1998)

As funções do professor no século XIX delineiam um roteiro para o novo ofício que necessita de

prática reflexiva, profissionalização, trabalho em equipe e por projetos, autonomia e responsabilidade crescentes, pedagogias diferenciadas, centralização sobre os dispositivos e sobre as situações de aprendizagem, sensibilidade à relação com o saber e com a lei delineiam um roteiro para um novo ofício. (COMPAGON Apud MEIRIEU, 1989).

As novas competências profissionais para ensinar surgem a partir da relação com a contemporaneidade, os professores buscam compreender as práticas educacionais que se mostram válidas. Philippe Perrenoud (2000) menciona que o

problema educacional do fracasso escolar é uma das preocupações latentes do educador e, por isso, compõem um dos maiores desafios na atualidade.

A fórmula para uma atitude em defesa ao ensino é, segundo Huberman (Apud Perrenoud, 2000), “não morrer de pé, como o giz na mão, no quadro-negro”. Quando os professores contornam as escassas finanças públicas e o desamparado social dos seus alunos, realizam mudanças nas suas próprias funções.

Barthes (2004), na aula inaugural da cadeira de Semiologia Literária do Colégio de França, em 1977, finalizou a sua fala manifestando o início de uma “vita nuova”. Iria começar a lecionar em um colégio em que, dentre suas qualidades preferidas, estava a de deixá-lo renovar. Mencionou que é tão importante a renovação da escola como a da prática educativa do professor. Assim sendo, é importante compreender que é através do tempo que o professor desenvolve o seu método de ensino e o transforma. Menciona ainda que

há uma idade em que se ensina o que se sabe; mas vem em seguida outra, em que se ensina o que não se sabe: isso se chama pesquisar. Vem talvez agora a idade de uma outra experiência, a de desaprender, de deixar trabalhar o remanejamento imprevisível que o esquecimento impõe à sedimentação dos saberes, das culturas, das crenças que atravessamos. (BARTHES, 2004:47)

As novas competências dos professores, citadas tanto por Barthes (2004) como por Perrenoud (2000), evidenciam a necessidade do professor de modificar a sua maneira de ensinar, conforme as mudanças que ocorrem com ele e com o mundo.

A transformação das funções da literatura desafiou os professores se posicionar de maneira diferente diante das necessidades da escola. Esses profissionais de educação compuseram novas atitudes em sala de aula, priorizaram

um comportamento de facilitador, incentivador e motivador, condizente com a proposta de uma aprendizagem ativa e que, dessa forma, colaboraria para que o aluno alcançasseos seus objetivos.

A idéia de professor mediador surgiu com o desenvolvimento, a partir da década de 70, da “pedagogia progressista”, caracterizada por uma nova relação professor-aluno e pela formação de cidadãos participativos e preocupados com a transformação e o aperfeiçoamento da sociedade. Dessa forma, a função do professor deixa de ser o de difundir conhecimento para exercer o papel de provocar o estudante a aprender a aprender. Esse conceito também está presente na perspectiva da escola cidadã, idealizada por Paulo Freire, na qual o professor deixa de ter um caráter estático e passa a ter um caráter significativo para o aluno. (Dicionário Interativo da Educação Brasileira)13

A escola sempre foi a principal responsável por socializar o sistema da escrita, a alfabetização e de possibilitar a difusão de novos leitores. A leitura esteve sempre indelevelmente vinculada com a escola e se desenvolveu mais rapidamente como prática social durante a Revolução Industrial. Nesse período um número maior de leitores tornava-se apto ao consumo de textos e a escola institucionalizada fornecia leitores para o mercado. Assim, a leitura

assumiu sentidos variados, embora nem todos visíveis. Enquanto fator de elevação social, foi julgada positiva e necessária; mas, enquanto virtual instrumento de acesso a um material indesejado – como as chamadas "más leituras" –, foi criticada, censurada, proibida. Não foram poucos os textos que, ainda no século XVIII, se viram na condição de perseguidos e discriminados. A Enciclopédia consiste no exemplo mais renomado; essa condição, porém, se transferiu a produtos menos prestigiados, impedidos de circular ou reduzidos à clandestinidade em nome da moral e dos bons costumes. (ZILBERMAN, 2004:16)

Barthes menciona que, a partir da movimentação estudantil ocorrida em Paris, em maio de 1968, a crise no ensino foi deflagrada: “os valores antigos não se

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transmitem mais, não circulam mais, não impressionam mais; a literatura desde então está dessacralizada, as instituições estão impotentes para protegê-la e impô-la como o modelo implícito do humano” (2004: 42).

Uma das funções do ensino da literatura está no reconhecimento da importância do leitor. Segundo Wolfgang Iser (1996) o aluno, ao ter contato com o mundo, em sua dia-a-dia, forma o seu código sócio-cultural e constitui uma “consciência receptora”. Na escola, o aluno aprimora e amplia esse conhecimento e, assim, vai fazendo a “seleção daquilo que constitui (...) a base da consciência” (ISER; 1996:13).

Transformar o aluno em “leitor ideal” não deve ser o objetivo do professor, pois essa forma de leitura é irrealizável, porque “representa uma impossibilidade estrutural da comunicação. Pois um leitor ideal deveria ter o mesmo código que o autor” (ISER, 1996: 65). O próprio autor possui idéias diferentes quando assume a condição de leitor de sua obra. Então, ao mudar o código, o autor se torna o “leitor” de seus próprios textos.

Portanto, o leitor deve ter consciência de que não poderá compreender, na maioria das vezes, todo o potencial de sentido do texto ficcional, além de que a interpretação total da obra ficcional a esgotaria. O importante, para a compreensão do que se está lendo, é ter consciência da leitura diante dos fatos que ocorrem no mundo e de todas as outras obras já lidas.

1.4 A SOCIALIZAÇÃO DO ALUNO POR MEIO DA LEITURA