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ALGUMAS IMPLICAÇÕES DAS TESES EXTERNALISTAS

CAPÍTULO 4 – AS DISPOSIÇÕES COMO BASES DA MENTE APRESENTAÇÃO

4.1 ALGUMAS IMPLICAÇÕES DAS TESES EXTERNALISTAS

Passemos agora para a análise de algumas idéias de Putnam (1997) no seu livro Reason,

Truth and History publicado primeiramente em 1981. Neste texto, Putnam discute temas latentes

na Filosofia contemporânea dentre eles a questão das representações mentais e suas conexões com seus referentes. Para Putnam, podemos pensar conceitos e estes conceitos, no momento em que pensamos neles, não são referentes a um objeto: “no sentido de dizê-los em sua mente” (Putnam, 1997, p. 17).65 Ora, mas não há nada de inimaginável nisto, diz Putnam. Por exemplo, quando algum pintor reproduz na tela uma árvore, alguns filósofos podem afirmar que o ato da pintura está acompanhado por um conceito. Porém, para Putnam, isto não leva necessariamente a uma suposta ‘apresentação mental’ que seria uma entidade ou evento introspectivamente atribuído a um conceito.

Os conceitos não são algo que se apresenta intrinsecamente referindo-se a objetos externos. Neste ponto percebemos o quanto Putnam distancia-se do intelectualismo. Para ele, os conceitos são signos e estes: “... podem ser públicos ou privados, entidades mentais ou entidades físicas” (Putnam, 1997, p. 18).66

Para o pintor, quando ele apenas pensa na árvore em sua mente, o signo não é o conceito, pois é pré-conceitual. Os signos não se referem intrinsecamente, não se projetam do interior das pessoas para a exterioridade referindo-se a objetos. O exemplo dado das árvores em The Meaning

of ‘Meaning’ é retomado, pois a diferença extensional da palavra Faia para a pessoa Putnam é um

conceito igual ao conceito de Olmo. O conceito é, portanto, referente socialmente e não intrinsecamente, é dependente do contexto lingüístico da agente cognitivo.

Para Putnam: “(a) nenhum conjunto de eventos mentais – imagens ou mais ‘abstratamente’ acontecimentos e qualidades mentais – constituem o entendimento; e (b) nenhum conjunto de eventos mentais é necessário para o entendimento” (Putnam, 1997, p. 20).67 E assim como em Ryle, para Putnam a inteligência é manifesta, pois não temos uma ‘corrente de pensamento’ e sim desempenhamos ações inteligentes. Acaso perguntemos a uma pessoa o que ela está fazendo, diz Putnam, ela saberá responder corretamente o que ocorre no plano da ação.

65 OI - (in the sense of saying them in his mind).

66 OI - May be public or private, mental entities or physical entities.

67 OI - (a) no set of mental events – images or more ‘abstract’ mental happenings and qualities – constitutes understanding: and (b) no set of mental events is necessary for understanding.

Para Putnam, objetos mentais não se identificam com conceitos, objetos entendidos introspectivamente. Os conceitos advém da exterioridade e não da cabeça das pessoas. Para Putnam não existem os conceitos que são considerados objetos mentais e que se conectam logicamente com referentes. Na verdade os conceitos são: “habilidades e não ocorrências” (Putnam, 1997, p. 21),68 e ocorrências neste contexto devem ser entendidas como o projetar-se do conceito, vindo diretamente do interior da pessoa, de suas elucubrações introspectivas, com destino ao mundo que a cerca. Quando dizemos, ‘água significa H2O’, estamos falando daquilo

que sentimos em nossos lábios e lhe damos uma explicação mais palpável, uma fórmula química ao invés de apenas indicar ostensivamente: aquilo é água! O que há de introspectivo nesse processo?, pergunta Putnam.

Para Putnam, a representação enquanto estrutura formal da intencionalidade, da referência, não tem possibilidade de existir. Não representamos mentalmente, de modo a garantir ocorrências intencionais, pois o significado advém da exterioridade e é o exterior, aquilo que está fora de nossas cabeças que dota nossos conceitos de significação e nos fornece um arcabouço conceitual passível de entendimento em uma comunidade de pessoas hábeis a trabalhar com os dados da experiência. Experiência esta que nos fornece as informações necessárias ao bom desenvolvimento do conhecimento. E isto tudo acontece no plano da ação e não por via de representação, moldes de entendimento daquilo que se nos apresenta. Um objeto apresentado em nossa mente seria uma idéia inata que possibilitaria a representação e as idéias inatas, se as aceitarmos, nos conduzem aos problemas do cartesianismo, já discutidos anteriormente.

O externalismo recebe esta caracterização de apreensão das informações do meio- ambiente e, embora Putnam não nos apresente nos textos que até aqui analisamos o conceito de informação, entendemos que poderia muito bem ter apresentado, uma vez que o significado advém da exterioridade e os conceitos não estão na cabeça eles advém de alguma forma. Deve haver uma maneira de os dados contidos no meio-ambiente serem informados ao agente cognitivo e o agente cognitivo ser capaz de discriminá-los e dar uma resposta ou simplesmente considerar razoavelmente tais dados de forma a possibilitar a relação ente agente e meio- ambiente no plano da ação. O que de forma alguma se confunde com a velha noção de sujeito/objeto.

68 OI - Abilities and not occurrences.

Putnam diz o seguinte a respeito do Internalismo do qual se considera adepto. O Internalismo é a tese segundo a qual os signos não correspondem a objetos intrinsecamente, pois é necessária a utilização dos signos por comunidades lingüísticas de acordo com um esquema conceitual: “... objetos não existem independentemente de esquemas conceituais” (Putnam, 1997, p. 52).69 Pensamos que, ao se reconhecer enquanto internalista, Putnam rejeita uma tese que diz que os objetos ‘causam’ extensões, mas nós não temos na verdade uma conexão extensional causal: “quando nós usamos a palavra ‘cavalo’ nós nos referimos não somente a cavalos com os quais nós temos uma real conexão, mas também a todas as outras coisas do mesmo tipo” (Putnam, 1997, p. 53).70 Então, mesmo possibilitando as bases do Externalismo há um ponto no qual Putnam discorda desta tese. O que não invalida o texto The Meaning of ‘Meaning’ como o texto que possibilitou o advento da tese Externalismo da mente. O ataque ao introspeccionismo intencional talvez seja a chave para se entender a importância da Filosofia de Putnam. Mas Putnam não abre mão do sujeito do conhecimento, pois este afinal considera, não um cavalo, mas coisas do mesmo tipo. A vantagem deste posicionamento é que não se faz uma defesa de um sujeito, digamos, absoluto, mas de um sujeito relacional. Contudo, se considerarmos o conceito de informação, talvez tenhamos alguma maneira de encontrar uma conexão causal entre o objeto e o indivíduo não-representacionista, que seria o agente do sistema no meio-ambiente. Talvez o espaço conceptual seja o conceito adequado para dar conta da questão categorial (coisas do mesmo tipo).

Enfim, Putnam defende que a vontade dos externalistas de pensar que o mundo é constituído de objetos independentes de mentes não pode estar correta, porque objetos auto- identificados não são independentes de uma mente, pelo contrário é a mente que possibilita esta categorização, mesmo com os objetos sendo semelhantes entre si.

No caso das disposições elas são independentes de uma mente? É o que tentaremos analisar na próxima seção.

69 OI - ‘objects’ do not exist independently of conceptual schemes.

70 OI - When we use the Word ‘horse’ we refer not only to the horses we have a real connection to, but also to all other things of the same kind.