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CAPÍTULO III CLASSIFICAR PARA CONSERVAR

3.2. Algumas notas sobre o conceito conservação

A conservação, segundo concepções contemporâneas, é uma prática que visa adotar uma série de medidas para que um determinado bem sofra o mínimo de alterações durante o maior tempo possível (VIÑAS, 2003, p. 19). A conservação é um termo amplo que vai além da aplicação de práticas não invasivas, ela abarca em seu conceito as práticas de conservação preventiva, conservação curativa e a restauração. Segundo a resolução adotada pelos membros do ICOM-CC durante a XVª Conferência Trianual de Nova Delhi, em 2008, e traduzida pela ABRACOR – Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores, pode-se definir que a conservação corresponde a:

Todas aquelas medidas ou ações que tenham como objetivo a salvaguarda do patrimônio cultural tangível, assegurando a sua acessibilidade às gerações atuais e futuras. A conservação compreende a conservação preventiva, a conservação curativa e a restauração. Todas estas medidas e ações deverão respeitar o significado e as propriedades físicas do bem cultural em questão (ABRACOR, 2010, p. 2).

Ainda neste sentido, é importante também definir os termos conservação preventiva, conservação curativa e restauração, respectivamente, visando clarificar questões obvias aos profissionais da área da Conservação-restauração, mas que por vezes não são entendidas pelo público de outras áreas:

[Conservação Preventiva] Todas aquelas medidas e ações que tenham como objetivo evitar ou minimizar futuras deteriorações ou perdas. Elas são realizadas no contexto ou na área circundante ao bem, ou mais frequentemente em um grupo de bens, seja qual for sua época ou condições. Estas medidas e ações são indiretas – não interferem nos materiais nas estruturas dos bens. Não modificam a sua aparência.

[Conservação Curativa] Todas as ações aferidas sobre o objeto, buscando estancar processos de degradação, reforçar a sua estrutura, reparar danos acidentais, entre outros. Este processo de conservação pode ser invasivo, mas tem como objetivo evitar de modo emergencial que os bens culturais sejam perdidos.

[Restauração] Todas as ações aplicadas de maneira direta a um bem individual e estável, que tenham como objetivo facilitar a sua apreciação, compreensão e uso. Estas ações somente se realizam quando um bem perdeu parte do seu significado ou função através das alterações passadas (ABRACOR, 2010, p. 3).

As ações de conservação preventiva, conservação curativa e restauração, muitas vezes são indissociadas, já que constituem procedimentos que em conjunto garantem a integridade dos bens culturais tangíveis. Salvador Munhoz Viñas sugere alguns exemplos dessa dificuldade de aplicar isoladamente os procedimentos de conservação como um todo, indicando que quando se enverniza uma pintura sobre tela “se contribuirá para proteger a película pictórica de certos agentes atmosféricos nocivos (operação de conservação), mas também se aumentará a vivacidade de suas cores (operação de restauração)” (VIÑAS, 2003, p.21). Os apontamentos de Viñas são pertinentes e geralmente associados ao exercício diário do conservador- restaurador, já que muitas vezes um planejamento de conservação é elaborado, mas intercorrências que surgem no meio deste processo direcionam o profissional para tratamentos mais invasivos.

De maneira geral e simplificada, se distinguem os campos que integram a conservação indicando práticas exclusivas dentro de cada conceito. Sendo assim,

caracteriza-se a conservação preventiva (ABRACOR, 2010, p.3) como um exercício de preservação ligado ao controle das condições ambientais (luz, temperatura e umidade relativa), as operações de manuseio, documentação, segurança, etc. A conservação curativa corresponde à ações invasivas mas que são realizadas sobretudo para garantir a estabilização de uma obra, como a “desinfestação de têxteis, a dessalinização de cerâmicas, a desacidificação do papel, a desidratação de materiais arqueológicos úmidos, a estabilização de metais corroídos”, entre outros. No que concerne a restauração, incluem-se a reconstituição de esculturas danificadas ou quebradas, ao retoque em pinturas, remoção de verniz oxidado, preenchimento de lacunas em molduras, obturação de papel, dentre outros.

Por serem conceitos complexos e que envolvem a permanência, ou não, às gerações vindouras do patrimônio material como um todo, necessitam ser discutidas e implementadas com cuidado, sobretudo nas Casas-Museu, que por vezes não possuem profissionais especializados nesta área.

Um exemplar interessante de bibliografia sobre práticas de conservação específica para Casas-Museu diz respeito ao livro escrito pelo então diretor da American Association of Museums (Associação Americana de Museus), Laurence Coleman, é o livro Historic House Museums. Lançado em 1933, o livro investiga as origens históricas de Casas-Museu Norte-Americanas que eram destruídas por não possuírem, por vezes, um valor monumental como alguns castelos e edifícios históricos da época. Coleman dedicou-se ao valor histórico associado a estas edificações, tecendo algumas considerações que inclui um capítulo dedicado à discussão sobre a conservação e a restauração destes locais (COLEMAN, 1933).

Coleman baseia as suas orientações em teorias da conservação e restauração em pauta na época, indicando uma análise detalhada do edifício para fundamentar o restauro, além de se levar em consideração o estado original do edifício e a história associada a ele após anos de utilização. Alerta para que se encontre um equilíbrio entre a necessidade de restauração e a possibilidade de conservação, admitindo a adequação de salas para fins práticos dentro da instituição (COLEMAN, 1933, p. 57-58).

O texto de Coleman é significativo para área, pois demonstra já naquela época um interesse pela conservação dentro das Casas-Museu. Faz apontamentos como a utilização de peças originais para substituições de restauro, mas alerta para que as intervenções não afetem o “espírito da local” (COLEMAN, 1933, p.58),

mostrando uma preocupação com a inserção de práticas de conservação e restauro como objeto de manutenção da memória da instituição.

Diversas instituições em nível mundial trabalham no auxílio de práticas de Conservação destes espaços, como é o caso do The Getty Institute Conservation (GCI), do American Institute for Conservation of Historic and Artistic Works (AIC) e do The Heritage Conservation Trust (HTC), que é uma fundação criada por proprietários de Casas Históricas, em 1990, para prestar suporte a esse tipo de instituição. Diversas outras entidades ligadas ao campo da conservação do patrimônio tangível em geral, também participam de projetos de conservação e restauro, ligados às Casas-Museu. Estes centros de pesquisa geralmente são procurados pela gestão da Casa-Museu, ou equipe de Conservação e restauro, que procura aliados no desenvolvimento de pesquisas e saídas tecnológicas que satisfaçam às necessidades específicas da instituição.