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É sabido que a formação do PCC teve como inspiração as ideologias adotadas pelo Comando Vermelho, pois, inclusive o estatuto da facção paulista foi elaborado com base no estatuto da facção carioca. As normas de respeito contidas no regulamento do Comando Vermelho são retratadas no estatuto do Primeiro Comando da Capital (AMORIM, 2011, p. 390-391).

Logo no início do segundo semestre do ano de 2002, um órgão de repressão ao crime organizado paulista já apurara uma possível união entre o Comando Vermelho e o PCC, que estaria sendo articulada por Willian da Silva Lima - um dos principais fundadores da facção do Rio de Janeiro, mais conhecido pelo apelido de “professor”.

O novo inquérito da Draco contra o Professor parte do princípio de que os informes que vêm do submundo dão conta de que ele está no comando das negociações com as quadrilhas do PCC paulista, tratando da unificação das organizações e da consolidação da Federação do Crime Organizado. Seu principal interlocutor seria Júlio César Guedes de Moraes, o Julinho Carambola, trancafiado no interior de São Paulo. As estreitas ligações entre CV e PCC não são mais surpresa para ninguém. Nas favelas do Rio e na periferia de São Paulo já existem pichações CV-PCC. O lema do Comando Vermelho – Paz, Justiça e Liberdade – se tornou o slogan (grifo do autor) comum dos dois grupos (AMORIM, 2011, p. 447).

Entretanto, foi, ainda, no mesmo ano, que houve fortes indícios da aliança entre as duas facções, já que órgãos de segurança pública de São Paulo realizaram apreensões de entorpecentes contendo a abreviatura dos nomes de ambas e um documento contendo o estatuto da facção carioca (AMORIM, 2011, p. 438).

Souza (2007, p. 124-126) relata que a união entre as facções se iniciou quando dois líderes da facção paulista foram transferidos para o sistema prisional do Rio de Janeiro, logo no início do século XXI - ocasião em que mantiveram contato com líderes do Comando Vermelho e selaram a união entre ambas, com a modificação dos seus estatutos, uma vez que em cada um dos regimentos o nome da outra organização foi adicionado.

Ainda sobre a aliança firmada entre ambas, a mesma autora apresenta relatos importantes e esclarecedores.

Para mostrar que havia boa vontade entre as partes, CV e PCC fizeram concessões e acordos entre si. O CV autorizou o PCC a instalar pontos de drogas, as boas, em alguns morros cariocas dominados pelo CV. Do seu lado, o PCC passou a negociar armas e explosivos para o CV. Cocaína era enviada daqui pra lá e de lá pra cá.

Negociatas que interessavam a ambas as organizações e que renderiam dinheiro para as duas, além de facilitar muito os ataques que pretendiam fazer. Em 24 de junho de 2002, as duas facções fizeram uma ação combinada e conjunta, explodindo bombas e metralhando prédios públicos em São Paulo e no Rio de Janeiro. Em novembro do mesmo ano, em mais uma demonstração de audácia, bandidos do CV e do PCC roubaram granadas de uma fábrica de explosivos em Lorena, no interior de São Paulo, que faz produtos para as forças armadas. Juntas as duas facções conseguiram 120 quilos de explosivos. Quarenta quilos foram enviados ao Rio de Janeiro, para o CV. Os 80 quilos restantes serviram para que o PCC montasse sua Central de Atentados. Em forma de gel, esse explosivo é muito potente e perigoso (SOUZA, 2007, p. 127).

3.4.1 O fim da aliança: CV x PCC

Como já descrito acima, desde a formação do PCC, as duas facções sempre foram aliadas, porém, no ano de 2016, ocorreu o rompimento dessa aliança, que perdurava por cerca de vinte anos.

Ribeiro, Corrêa e Fonseca (2016), noticiam que no décimo quinto dia do mês de junho do mesmo ano, em conjunto, integrantes do Primeiro Comando da Capital e do Comando Vermelho assassinaram Jorge Rafaat Toumani, considerado o maior traficante de drogas da fronteira entre Brasil e Paraguai e um dos maiores fornecedores de drogas para as duas facções, fato ocorrido em solo paraguaio, nas proximidades da fronteira entre os dois países, em uma verdadeira operação de guerra, com o uso de armamento extremamente pesado.

A intenção das facções, com a morte de Rafaat, seria a de se instalarem e dominarem o fornecimento de drogas naquela fronteira e não precisarem mais de um intermediário nesse negócio, entretanto, logo após esses fatos, o crime é apontado como sendo o motivo do rompimento da aliança entre as facções, pois o PCC teria tornado essa rota de tráfico como sendo exclusiva sua, traindo, assim, os interesses antes acordados (RIBEIRO; CORRÊA; FONSECA, 2016).

Além do mais, antes mesmo do episódio envolvendo o homicídio do referido traficante internacional, outro fator também teria sido preponderante no racha envolvendo as facções: o Comando Vermelho teria se aliado a facções inimigas do Primeiro Comando da Capital, como a Família do Norte, o Primeiro Grupo Catarinense, o Sindicato do Crime e uma facção maranhense. Essas alianças ficaram evidentes quando o Comando Vermelho passou a impedir que o PCC “batizasse” novos detentos em cadeias onde a facção carioca possuía mais força, com o intuito de combater o crescimento da facção paulista na busca por novas áreas de atuação (STOCHERO, 2017).

Todavia, Werneck (2017) apresenta a principal versão para o término da aliança entre as maiores facções criminosas do País.

Inicialmente, acreditou-se que o racha se deveu ao assassinato de um traficante transnacional brasileiro que atuava na área de fronteira chamado Jorge Rafaat, o que poderia ocasionar um prejuízo financeiro considerável ao Comando Vermelho no tocante ao controle das rotas das drogas que eram compartilhadas pelas duas facções. Tal assassinato se deu pouco antes do racha entre as facções. Contudo, posteriormente, o próprio PCC lançou um comunicado (um “salve”) explicando o motivo do racha. Neste “salve” fica claro que o racha se deu em razão das alianças que o Comando Vermelho firmou com facções de outros estados, que são inimigas do PCC e que tentam impedir que este se torne hegemônico no país. Isto representou um golpe na pretensão empresarial do PCC em expandir seus negócios e criar um monopólio do crime organizado.

Conforme o mesmo autor, aliado à tentativa de se expandir nacionalmente, o PCC estaria acusando Comando Vermelho de não cumprir com acordos financeiros firmados pelas duas facções, além de estreitar alianças com facções rivais à organização paulista (WERNECK, 2017).

Madeiro e Costa (2017) também contribuem com esclarecimentos sobre os motivos que culminaram com o fim da parceria entre as organizações criminosas mais poderosas do Brasil.

Após as primeiras rusgas e ataques contra seus integrantes em presídios do país, o comando do PCC chegou a tentar um acordo com líderes do Comando Vermelho detidos em prisões federais: Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, e Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP.

[...]

O PCC considerou essa resposta como uma declaração de guerra do CV e de seus aliados. São consequências dessa disputa no crime organizado os massacres registrados nos últimos meses em presídios, a exemplo do ocorrido em Manaus no mês de janeiro, quando a FDN (Família do Norte) matou 60 integrantes do PCC. Outro fator de disputa é o controle da rota de tráfico, conhecida como "Rota Caipira", que escoa a cocaína produzida na Bolívia por cidades do interior paulista e Triângulo Mineiro, aponta o procurador Christino. A briga se intensificou após o assassinato do traficante paraguaio Jorge Rafaat, em julho de 2016. "Não é de interesse do Comando Vermelho que a compra da pasta base boliviana seja intermediada pelo PCC", acrescenta.

Com a guerra declarada entre as duas facções, é relevante demonstrarmos a configuração geográfica referente ao conflito entre ambas.

Mapa 1 – Estados onde há a presença de conflitos

Fonte: Pagnan (2017).

Independente dos motivos que originaram o fim da união entre as facções, tema do nosso trabalho, é unânime o entendimento de pesquisadores e especialistas de que o

sistema prisional brasileiro está vivendo sob extrema tensão e poderá ter reflexos fora dos presídios.

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