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Alterações de uso e adopção a novos requisitos de conforto

2. ESTADO DO CONHECIMENTO

2.1. Edifícios de Habitação com Valor Histórico – Património Habitacional

2.1.4. Alterações de uso e adopção a novos requisitos de conforto

Na reabilitação deste tipo de edifícios antigos com valor histórico, há que ter em atenção a pormenores técnicos de conforto e gasto energético para os habitantes, que aquando da sua concepção não eram equacionados. Dessa forma, quando se processa uma reabilitação de um edifício deste tipo, é necessário adaptar as necessidades de hoje em dia à construção antiga de modo a que estes tenham as condições mínimas necessárias de habitabilidade. Entre os quais:

a) Alteração da compartimentação interior

Antigamente, os edifícios de habitação eram conhecidos por apresentarem reduzidas dimensões e com divisões pouco espaçosas devido ao facto da madeira conseguir vencer vãos reduzidos. Muitos destes edifícios eram desprovidos de instalações sanitárias e com insuficientes aberturas para o exterior. No entanto, hoje em dia tais condições são consideradas insalubres e não regulamentares, não se enquadrando na vontade e necessidades actuais.

Por essa razão, é fundamental ter em conta estas necessidades quando se procede a uma reabilitação de edifícios, sendo necessário a adopção de medidas que proporcionem o aumento das dimensões da habitação.

Porém, estas alterações só são possíveis com a eliminação de elementos verticais, importantes na malha estrutural do edifício. Dessa forma, quando se tratam de edifícios antigos com valor histórico, há que ter em conta que alterações deste género podem por em causa a valia patrimonial dos mesmos, sendo inviável a sua realização.

b) Alteração dos padrões de conforto

A alteração do conforto nas habitações tem vindo a ser uma preocupação cada vez mais assídua na reabilitação de edifícios, não se limitando apenas às alterações de espaço. Esta preocupação deve-se em parte, ao facto da população passar cada vez mais horas nas habitações, obrigando a que haja condições mais favoráveis ao conforto pessoal.

Porém, hoje em dia o conforto dos habitantes não se cinge apenas ao conforto da moradia mas também à área envolvente do próprio edifício que, como é de conhecimento geral, pode apresentar inúmeras anomalias, como fissuração, manchas de escorrências de águas, entre outros. Consequentemente pode criar um ambiente de insatisfação ou rejeição por parte dos usuários e da

11 população em geral. Estes problemas, podem esconder outros problemas que passam despercebidos ao utilizador comum (Lopes, 2010). Dessa forma, há que ter em conta aspectos técnicos como:

b.1. Conforto térmico

A temperatura constitui um dos factores que mais influencia o nível de conforto térmico, para colmatar a variação de temperatura na habitação, recorre-se a utilização de aparelhos eléctricos, o que invariavelmente se traduz no aumento no consumo de energia.

Actualmente, as pessoas passam em média, cerca de 90% do seu tempo em espaços interiores, o que não acontecia até há poucas décadas atrás, por essa razão é essencial garantir condições de bem- estar aos seus ocupantes. A principal medida para que tal aconteça, é através de uma boa qualidade de construção, com a colocação de isolamento térmico (Lopes, 2010).

A sua eficácia encontra-se dependente de um correcto projecto de térmica, consonante com os restantes projectos.

Assim, no Regulamento das Características de Comportamento Térmico dos Edifícios (RCCTE), que encontram-se regulamentados todos os tipos de parâmetros a respeitar. Porém, muitos profissionais experientes na área da reabilitação de edifícios, afirmam que em intervenções deste género os parâmetros deveriam ser revistos pois condicionam a intervenção, os custos finais e o valor cultural do objecto, caso se trate de um edifício com importância histórica (Mateus & Bragança, 2006).

Para além do RCCTE, existe ainda um documento mais direccionado para a componente energética e climatização de edifícios – Regulamento de Sistemas Energéticos de Climatização em Edifícios (RSECE).

Particularizando os casos de estudo a desenvolver, localizados na Baixa Pombalina, não existem muitas vantagens em proceder a alterações térmicas, tendo em conta a forte inércia térmica proporcionada pelas paredes exteriores. Por outro lado, na cobertura as vantagens são significativas mas apenas quando o isolamento é colocado pelo interior, Figura 2.2.

12 b.2. Conforto acústico

A par do conforto térmico, este é outro aspecto que em muito contribui para o desconforto pessoal, mas a nível psicológico, devido aos ruídos exteriores que têm principal incidência nos centros urbanos.

Segundo um estudo realizado em 2008 pela Federação Europeia para os Transportes e Ambiente, estimou-se que pelo menos 50 mil pessoas morrem anualmente na União Europeia devido a ataques cardíacos causados pelo excesso de ruído rodoviário e ferroviário (Ferreira, 2012).

Este estudo veio apenas confirmar que a poluição sonora nos centros urbanos prejudica gravemente a saúde dos seus utilizadores, por essa mesma razão torna-se importante garantir que a população tenha condições francamente melhores nas suas habitações.

A preocupação de conforto acústico foi durante muito tempo deixada para segundo plano, mas este plano tem vindo a ser progressivamente alterado, nomeadamente com a publicação do Regulamento dos Requisitos Acústicos dos Edifícios (RRAE) (Lopes, 2010). Este documento permitiu estabelecer algumas regras que apontavam para a melhoria das condições acústicas das habitações, tanto a nível de ruídos aéreos, causado por exemplo pelo tráfego rodoviário; como a nível de ruídos de percussão, causado por exemplo pelos restantes habitantes.

Contudo, ainda são detectadas falhas nas habitações, cenário que se deve ao não cumprimento das normas regulamentares por parte dos donos de obra e construtores.

Por conseguinte, os edifícios antigos foram construídos sem qualquer preocupação neste aspecto, pelo que aquando de uma reabilitação, devem ser obrigatoriamente equacionadas medidas que salvaguardem o conforto acústico das respectivas habitações, tanto pela colocação de isolamento na fachada para evitar ruídos aéreos, como nos próprios pavimentos e divisões entre apartamentos diferentes para evitar ruídos de percussão.

Estas medidas passam não só pela conciliação entre isolamento acústico e térmico na envolvente da fachada, como também na colocação de envidraçados adequados às características do local e da própria habitação.

b.3. Qualidade do ar interior

De acordo com o relatório “Towards Healthy Air in Dwellings in Europe” da European Federation of Allergy and Airways Diseases Patients' Associations (EFA), com o aumento do tempo de permanência das pessoas dentro das habitações, a concentração de ar poluído pode atingir níveis de poluição, 2 a 5 vezes superior ao ar do exterior (Franchi et al, 2006).

Por consequência, torna-se necessário investir mais na ventilação dos espaços do parque habitacional, de modo a poderem ser asseguradas as condições mínimas de renovação do ar interior, promovendo a substituição de ar poluído por ar “novo”.

Tradicionalmente, a população portuguesa tem o hábito de abrir as janelas esporadicamente para “arejar a casa”, e talvez por essa razão os valores apresentados neste estudo não são tão graves, pois a

13 renovação do ar é realizada manualmente. Mas não é admissível que a responsabilidade de renovar o ar esteja apenas a cargo dos ocupantes dos espaços, fazendo com que se opte pela colocação, cada vez mais frequente, de dispositivos de ventilação automáticos.

Relativamente aos edifícios antigos, apesar de terem uma exaustão eficiente que minimize os efeitos, como no caso da humidade, estes apresentam problemas intrínsecos às suas características, tais como(Paiva, Pinho & Aguiar, 2006):

 Compartimentos interiores pequenos e que raramente possuem sistemas de ventilação;

 Janelas com dimensões inferiores às mínimas impostas pelo Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU);

 Existência de uma só fachada com aberturas para o exterior, existindo compartimentos interiores sem qualquer tipo de abertura, impossibilitando a ventilação transversal;

 Cozinhas com renovação de ar apenas pela frestas, não existindo sistema de exaustão.

No entanto, em edifícios pombalinos esta realidade é um pouco diferente, com a existência dos saguões no centro dos quarteirões. Verifica-se pela Figura 2.3 que estes viabilizam o efeito da ventilação, na medida em que permite não só a exaustão de ar pelas janelas da fachada principal, mas também pelas traseiras.

Figura 2.3 - Ventilação natural possível nos edifícios pombalinos (Evangelista, 2008).

b.4. Redução dos consumos de água

Nas últimas décadas as notícias constantes relativas às alterações climáticas no nosso planeta motivadas em parte pelo aquecimento global, levou muitos cientistas a questionar-se sobre a possível escassez de recursos ambientais, incluindo principalmente a água.

Segundo o website “Portal da água”: estima-se que actualmente sejam gastos em todo o território nacional de cerca de 7.500.000.000 m3/ano, no conjunto dos sectores agrícola, industrial e urbano. Segundo a mesma fonte, o sector agrícola é o responsável pela maior porção de volume de água utilizado, mas é o sector urbano que mais custo acarreta, Figura 2.4.

14 87% 5% 8% Volume Agricula Urbano 28% 46% 26% Custo

Figura 2.4 – Percentagem de volume e percentagem de custo nacional de água nos diferentes sectores (adaptado de Barroso & Amado, 2010).

De acordo com Barroso & Amado (2010), um eficiente uso da água nas habitações passa pelo aproveitamento das águas das chuvas, redução dos desperdícios nos usos domésticos (cerca de 42% de toda a água do sector urbano), utilização de dispositivos com caudais mais reduzidos e controlados, ou mesmo promover campanhas de sensibilização dos utilizadores.

Como é espectável, os edifícios pombalinos não foram providos de canalizações aquando da sua construção. Porém quando começou a ser usual a sua utilização, foram instalados ainda que violando a infra- estrutura, nomeadamente zonas da importante gaiola pombalina. Estas tubagens em muitos casos nunca foram substituídas, levando a um apodrecimento dos elementos de madeira, consequente da infiltração das águas. Ao realizar uma intervenção, torna-se crucial a substituição de todas as tubagens.

b.5. Iluminação Natural

A iluminação é actualmente um factor de extrema relevância, tanto em habitações como em edifícios de serviço, que tem influência directa no bem-estar dos seus ocupantes. Para além disso, uma correcta iluminação implica benefícios a nível ocular e permite a poupança energética com aparelhos de iluminação artificial e consequentemente poupança do meio ambiente.

A iluminação artificial deve ser considerada apenas como um complemento à iluminação natural. No entanto, é ainda vista como um elemento dominante nas casas portuguesas.

Na última década, tem-se observado uma crescente preocupação neste aspecto, optando-se por medidas que visam o aproveitamento solar, através de lanternins, clarabóias ou envidraçados de maior dimensão.

Outro problema que se verifica, é por vezes a aplicação de tintas de tonalidades escuras na envolvente exterior do edifício, que não favorecem a reflectância da radiação solar, sendo que o mesmo exemplo deveria ser seguido nos paramentos interiores das habitações, de modo a promover a propagação de luz no seu interior (Lopes, 2010).

15 No caso dos edifícios antigos, nomeadamente nos casos de estudo adiante apresentados, não é viável aumentar os vãos envidraçados devido à sua componente histórica, Figura 2.5.

Figura 2.5 - Edifício reabilitado mantem traço original da fachada.

b.6. Segurança contra incêndios

Um dos problemas dos edifícios antigos é precisamente o elevado risco de incêndios, em parte devido aos materiais utilizados na sua construção, com forte carga térmica, que facilitam a propagação do fogo.

Como é espectável, aquando da concepção destes edifícios antigos não obrigavam a qualquer cumprimento de normas em relação à segurança contra incêndios, sendo os edifícios pombalinos os primeiros a ter algum cuidado nesse aspecto. Esta era feita através das paredes meeiras (Figura 2.6) colocadas entre edifícios, garantindo assim algum atraso na propagação do fogo entre eles, contudo não garantiam uma total estanquidade. A título de exemplo veja-se o caso do incêndio no Chiado em 1988. Desta forma, em centros históricos como a Baixa Pombalina seria espectável que a segurança contra incêndios se fizesse não no edifício, mas sim ao nível do quarteirão.

Figura 2.6 - Paredes meeiras nos edifícios pombalinos.

No Quadro 2.2 é apresentado um resumo do que foi referido nestes subcapítulos, salientando as alterações nas exigências que podem ou não ser aplicadas; condicionantes a ter conta; bem como os principais regulamentos e documentos normativos em vigor em cada uma das áreas de estudo (Freitas, 2012). Este quadro será enunciado tendo como base os casos de estudo, mas pode ser aplicado a qualquer edifício que reúna as exigências históricas tratadas ao longo deste texto.

16 Quadro 2.2 - Novas exigências de uso habitacional e requisitos de conforto.

Alterações

exigencionais Vantagens Aplicação

Condicionantes/ Dificuldades Documentos relativos Compartimen- tação interior Edifícios antigos têm em geral divisões pouco

espaçosas, quando comparado com a actualidade, devendo ser

ampliadas em caso de intervenção

Não aplicável

Edifícios confinados ao espaço existente que

não poderão ser alterados pelas exigências patrimoniais inerentes - Conforto térmico A única vantagem é a colocação no paramento interior da cobertura. Nas

paredes é irrelevante tendo em conta a inércia

térmica elevada destes edifícios

Aplicável (pelo interior)

A colocação de isolamento pelo interior

pode limitar o espaço útil do edifício. Não pode ser aplicado pelo exterior porque se estaria a modificar o traço exterior do edifício histórico RCCTE RSECE Conforto acústico Colocação de isolamento acústico é crucial nos

elementos divisórios entre divisões e fogos, devido aos elementos de

materiais leves, principalmente madeira

Aplicável (nas janelas, paredes

divisórias e tectos/pavimentos)

Colocação de isolamento nos elementos verticais pode reduzir a área útil da habitação, o mesmo não é relevante caso se coloque isolamento nos elementos horizontais RGE RREA Qualidade do ar interior Promover a substituição de ar poluído por ar novo

Aplicável (aproveitamento do saguão) - NP-1037-1 Redução dos consumos de água

Redução dos custos para o utilizador e promover a defesa do meio ambiente

Aplicável

Consciencialização do utilizador. Condições espaciais não

favorecem a colocação de dispositivos que promovam a poupança de água - Iluminação natural Existência de iluminação natural nas habitações promove uma melhor

qualidade de vida Aplicável (apenas na zona da cobertura com a inserção de clarabóias)

Tamanhos dos vãos envidraçados não podem ser alterados por

não se poder alterar a composição da envolvente exterior do edifício histórico - Segurança contra incêndios Maximiza padrões de segurança das habitações,

principalmente nos edifícios cuja construção

envolve madeira Aplicável (aconselhável que se efectue ao nível do quarteirão e não só de um edifício) - RJ-SCIE

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2.2. Enquadramento Histórico – A cidade de Lisboa