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I. SEGURANÇA HUMANA: ENQUADRAMENTO TEÓRICO E CONCETUAL

I.1. Da segurança dos Estados à Segurança Humana

I.2.2. Ameaça à Segurança Humana Económica: Desemprego

[Q]uando os meios de subsistência das pessoas são profundamente comprometidos, quando as pessoas estão incertas se a sua próxima refeição virá, quando as suas poupanças de uma vida inteira baixam repentinamente de valor, quando as suas colheitas falham e não têm poupanças – a segurança humana é comprometida (CSH 2003, 73).36

Seguindo a linha de pensamento acima analisada, o corolário das crises económicas e financeiras não se manifesta apenas nas economias e mercados dos estados. Estas possuem um forte impacto nas vidas das pessoas, no seu quotidiano, padrões de vida e meios de subsistência. Trazem consigo ameaças imediatas à SH por meio da diminuição dos rendimentos e o aumento do desemprego, o que provoca um forte aumento da pobreza. A garantia que as pessoas detinham anteriormente sobre empregos seguros e meios de subsistência, espontaneamente deixa de existir. Inevitavelmente, as pessoas sentem-se inseguras e vulneráveis, intimidadas pelo risco de perderem os seus empregos e o seu rendimento. Os países em vias de desenvolvimentos (PVD) são mais vulneráveis a crises económicas e financeiras, o que, dado o elevado grau de pobreza, causa um maior impacto na vida das pessoas, que são ainda mais indefesas e vulneráveis nesses contextos, e como tal um passo certeiro em direção à insegurança humana (CSH 2003, 73-75).

Não obstante, o desemprego é atualmente a principal inquietação da economia global. Abalados pela forte crise financeira e económica sentida nos últimos anos, os países desenvolvidos (PV) vêm as suas economias fragilizadas. Esta instabilidade económica causada pelo crescente desemprego tem particular ênfase na Europa, e nos EM da UE, em especial nos países de sul, designados por PIIGS37. No seio da UE é percetível o temor das populações

afetadas pela insegurança económica que o desemprego veio causar nas suas vidas quotidianas. Esta ameaça evidencia uma das contestações em torno da definição de ameaças à SH. Daqui conclui-se que a existência de uma agenda padrão de ameaças (igual para todas as situações e países) contraria o propósito inicial da SH, ou seja, a SH não poderá ser operacionalizada da mesma forma em PVD e em países desenvolvidos. Mesmo sendo a ameaça idêntica, as inseguranças são vivenciadas de forma diferente pelos indivíduos devido à conjuntura em que

36 “When people’s livelihoods are deeply compromised—when people are uncertain where the next meal will come from, when their life savings

suddenly plummet in value, when their crops fail and they have no savings—human security contracts (CSH 2003, 73).”.

vivem. Neste sentido, a ameaça do desemprego é experienciada e percecionada de forma diferente em países desenvolvidos e em países em vias de desenvolvimento.

De forma a combater estas inseguranças humanas económicas, o relatório da CSH remete para medidas de proteção social e as “redes de segurança” como forma de colmatar as consequências que advêm das crises económicas e financeiras e assim garantir um nível económico e social mínimo às populações. Preconiza que a busca por respostas a problemas novos e persistentes deve passar, no caso dos PVD, pelo interesse em “redes de segurança” e de proteção social e, no caso dos PD, numa reforma dos sistemas de bem-estar e proteção social. Porém, reconhece que estabelecer medidas de proteção social pode parecer uma ação peculiarmente custosa e trabalhosa num ambiente de crise económica e social, e que cada situação exige um conjunto de políticas que respondam aos contextos específicos. Assim sendo, enumera três lições retiradas de crises anteriores como possíveis para conter os efeitos destas crises, sendo elas: colocar sistemas em vigor para garantir a segurança econômica básica antes que uma crise económica ou catastrófica aconteça; expandir os programas já existentes, caso a crise já tenha acontecido (reforçar os programas existentes é uma das formas mais rentáveis e eficaz para responder a uma crise financeira ou de emergência); criar de forma regular mecanismos de recolha de informação. As decisões sobre estas medidas devem partir de diálogos sociais com todos os atores, não só por parte dos governos, mas também de diálogos com o setor privado e com as organizações de trabalhadores (CSH 2003, 85-86).

A atual crise económica e financeira sentida nos EM da UE remete para uma situação um tanto ou quanto contraditória no que aos PD diz respeito. Se por um lado os direitos dos cidadãos bem como a segurança associada a um PD são (ou deveriam ser) garantidos e efetivos, por outro lado esta crise económica reflete ameaças à SHE características de um PVD, isto é, as elevadas taxas de desemprego38 e principalmente o trabalho precário39. Esta situação

torna-se pertinente na medida em que questiona o papel da UE enquanto ator externo de SH e a efetividade dos DHF no seio da UE. Este paradoxo despertou-nos um interesse peculiar, nomeadamente a ameaça que o desemprego representa na vida das pessoas, sendo que daí advém a justificação pelo estudo centrado na dimensão económica da SH.

38 Em 2013 a UE apresentava uma taxa de desemprego de 10,9%.

Fonte: http://www.pordata.pt/Europa/Taxa+de+desemprego++dos+15+aos+64+anos++por+grupo+etario-1798.

39 Esta situação deve-se essencialmente às medidas de austeridade impostas pelos EM da UE ao setor privado e público de emprego que se

Considerações finais

Após a análise do caminho trilhado pela SH, podemos verificar que estamos perante um conceito contestado, não só pela sua definição mas também pela sua operacionalização. Apesar de considerada contraproducente, elástica e sem uma definição consensual, a SH desbravou tais críticas e ganhou terreno graças aos esforços de operacionalização pelos Estados, tais como o Canadá e o Japão, e pelas OI´s (sendo exemplo a ONU).

A partir deste estudo, foi-nos permitido granjear uma circunscrição mais precisa de SH centrada na sua componente económica e no estudo singular de uma ameaça à SH, o desemprego. Este ensaio permitiu-nos indagar de que forma o desemprego afeta a segurança das pessoas.

De forma a tornar o estudo coerente, adotamos o conceito de SH apresentado pela ONU, bem como a abordagem ampla de SH. Entendemos que esta escolha é a que melhor se adequa à nossa investigação, tratando esta da ameaça que o desemprego representa para a segurança dos cidadãos europeus.

II. UNIÃO EUROPEIA: SEGURANÇA HUMANA, DIREITOS HUMANOS E