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1 FORMAÇÃO DOCENTE: A INTERCULTURALIDADE E A

1.2 AS POSSIBILIDADES DA INTERCULTURALIDADE E DA

1.2.2 A amorosidade como possibilidade de emancipação

1.2.2.1 Amorosidade na prática docente

Segundo Maturana (2009), é um equívoco pensarmos que o homem é um ser racional. Para ele, tal conceito desvaloriza o ser emocional que somos biologicamente, isto é, somos antes de tudo movidos por emoções.

As emoções não são o que corretamente chamamos de sentimentos. Do ponto de vista biológico, o que conotamos quando falamos de emoções são

disposições corporais dinâmicas que definem os diferentes domínios de ação em que nos movemos. Quando mudamos de emoção, mudamos de domínio de ação. Na verdade, todos sabemos isso na práxis da vida cotidiana, mas o negamos porque insistimos que o que define nossas condutas como humanas é elas serem racionais. Ao mesmo tempo todos sabemos que, quando estamos sob determinada emoção, há coisas que podemos fazer e coisas que não podemos fazer, e que aceitamos como válidos certos argumentos que não aceitaríamos sobre outra emoção (MATURANA, 1999, p. 15).

Um exemplo da práxis cotidiana sobre as ações sobre domínio da emoção é a situação onde o aluno está sobre o domínio da raiva e dificulta o trabalho em sala de aula. O professor, ao pensar em cobrar dele mais empenho, irá refletir sobre sua ação, visto que a possibilidade de cooperação do aluno sob tal domínio tende a ser negativa.

Na teoria de Maturana (1999), o sujeito sob o domínio da raiva não dá indícios absolutos de que nesse estado torna-se irrestrito a outra emoção, porém, há de se entender que ele está num domínio no qual só são possíveis certas emoções e não outras. Por isso, é importante que o professor haja de toda sutileza e compreensão diante das emoções em sala de aula.

Um dos maiores conflitos entre os sujeitos está na negação do outro. Quando refletimos sobre a prática docente e a relação professor aluno em sala de aula, logo pensamos no respeito mútuo para se chegar a um estado de harmonia e progresso. Nesse sentido, o conceito de amorosidade na prática docente se define pela ação reflexiva e de reconhecimento do outro, valorizando as culturas e as vivências.

O reconhecimento do professor enquanto profissional cuidadoso, amoroso, íntegro, responsável está, justamente, em sua práxis. Da mesma forma, o reconhecimento do aluno enquanto sujeito aprendente, responsável, crítico, humano, amoroso está, necessariamente, na sua postura comprometida, respeitosa e amorosa. Essa relação utópica vai acontecer a partir do equilíbrio do domínio das emoções entre os sujeitos em constante convívio na vida, seja no cotidiano familiar, trabalho, escolar e no social.

Tudo o que é dito sob o domínio de forte emoção tem certo peso de influenciar decisões e encaminhar situações para conflitos maiores e/ou resolvê-los.

Assim dizemos também que as coisas ditas com raiva têm um poder, um valor ou uma responsabilidade diferente daquelas ditas na serenidade e no equilíbrio. Por quê? Não porque uma coisa dita na raiva seja menos racional que uma dita na serenidade, mas porque sua racionalidade se funda em premissas básicas distintas, aceitas a priori, fundada numa perspectiva de preferências que a raiva define (MATURANA, 1999, p. 15-16).

Segundo Maturana (1999), os sujeitos não brigam quando o desacordo for de ordem lógica, tipo um equívoco na equação de uma conta, por exemplo, pois o resultado da equação é uma premissa lógica comumente aceita por todos. Mas, há sérios conflitos quando as discussões forem de ordens ideológicas. “Isso acontece quando a diferença está nas premissas fundamentais que cada um tem. Esses desacordos sempre trazem consigo uma explosão emocional, porque os participantes vivem seu desacordo como ameaças existenciais recíprocas” (p. 17).

Tal compreensão aponta para o entendimento de que a razão está, compreensivamente, constituída pela influência de uma emoção. Quando agimos com emoção, é porque estamos no limite de uma razão, da mesma forma que sentimo-nos com a razão pelo fato de sermos guiados por uma emoção. Diante disso, o ser humano não poderia ser definido como um ser racional, mas, sim, dotado de emoção e razão. “O humano se constitui no entrelaçamento do emocional com o racional” (MATURANA, 1999, p. 18).

Maturana (1999) aponta que determinados conflitos jamais serão resolvidos no plano em que foram propostas. A Guerra religiosa entre Palestinos e Judeus, por exemplo, não tem solução. Na teoria do autor, “a menos que um decreto tire ambos os grupos do espaço religioso, onde dentro dos fundamentos de uma crença um negue os fundamentos do outro, e os levem para um domínio de respeito mútuo” (p. 17).

Para o autor, não basta que os dois grupos oponentes se reúnam para falar de tolerância ao erro do outro, visto que ambos estão defendendo sistemas que, embora coerentes em si, têm premissas fundamentais diferentes, que se excluem mutuamente. Fato que os levariam novamente ao conflito, não pela razão, mas pela emoção. Assim, compreendemos que as “premissas fundamentais de uma ideologia ou de uma religião são aceitas a priori e, portanto, não tem fundamento racional” (p. 18).

Nesse contexto de discussão, refletimos sobre a possibilidade do homem, no decorrer dos tempos, ter negado o amor em detrimento de uma racionalidade instrumental. Por isso, apontamos a importância do professor resgatar a amorosidade em sua prática docente.

Rejeição e amor, no entanto, são opostos em suas consequências no âmbito da convivência: a rejeição a nega e o amor a constitui. A rejeição constitui um espaço de interações recorrentes que culmina com a separação. O amor constitui um espaço de interações recorrentes que se

amplia e pode estabilizar-se como tal. É por isso que o amor constitui um espaço de interações recorrentes, no qual se abre um espaço de convivência onde podem dar-se coordenações de conduta de cooperações consensuais de conduta que constitui a linguagem, que funda o humano. [...] O amor é a emoção que constitui as ações de aceitar o outro como um legítimo outro na convivência. Portanto, amar é abrir um espaço de interações recorrentes com o outro, no qual sua presença é legítima, sem exigências (MATURANA, 1999, p. 66-67).

Para Maturana (1999), o amor é um fenômeno biológico tão básico e fundamental do cotidiano que, frequentemente, o homem o nega culturalmente. Essa negação se dá no momento que se criam limites na legitimidade de convivência, em detrimento de outras emoções.

Essas compreensões fundamentais perpassam pela vida docente, visto que, nas relações cotidianas professor-aluno, a amorosidade é um dos elementos básicos para a criação de vínculos afetivos que darão sentido e significado ao processo de aprendizagem e construção de conhecimentos.

1.3 BIOLOGIA DO AMAR: QUAL A IMPORTÂNCIA DAS EMOÇÕES NA