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4 METODOLOGIA DA PESQUISA

4.1 Análise crítica da narrativa jornalística

Um instrumento metodológico fundamental utilizado para análise das coberturas jornalísticas é a Análise Crítica da Narrativa, decorrente da Narratologia que inicialmente era

usada na literatura. Essa metodologia foi descrita por Motta (2013), que a define como um método de olhar a narrativa, sendo que a narrativa propriamente dita é uma forma de ver e contar sobre o mundo. Os estudos sobre a narrativa surgiram primeiramente ligados à análise literária, em 1960 com o autor russo Valdimir Propp que escreveu Morfologia do Conto Maravilhoso e a partir da década de 1990, pesquisadores do jornalismo começaram a ver que o jornalismo, apesar de estar sempre operando com a verdade dos fatos e a linguagem própria repassa muitos mitos, o que impulsionou o estudo do jornalismo enquanto narrativa.

O termo narratologia significa teoria da narrativa, que compreende os procedimentos e métodos adotados na avaliação das narrativas humanas. Assim sendo, representa um campo e método de análise das práticas culturais. A análise da narrativa, portanto, representa um campo de pesquisa considerado novo. Para Motta (2013, p.40), narrar é:

relatar eventos de interesse humano enunciados em um suceder temporal encaminhado a um desfecho. Implica, portanto, em narratividade, uma sucessão de estados de transformação responsável pelo sentido. A narratividade introduz a questão do prosseguimento-interrupção ou a dialética continuidade descontinuidade. Encadeia unidades narrativas em uma estrutura profunda (uma dinâmica funcional e seqüencial): uma complicação que solicita uma resolução. Narrar é, portanto, relatar processos de mudança, processos de alteração e de sucessão interrelacionados. Pressupõe a existência de uma lógica narrativa que nos leva a uma gramática narrativa universal” (MOTTA, 2013, p. 40).

Para análise de uma narrativa jornalística, o texto é apenas o ponto de partida para uma busca de contextualizações. Para proceder a análise de determinada narrativa, deve considerar os sujeitos envolvidos, que enunciam e interpretam as mensagens produzidas pelo texto, visto que eles são os atores sociais que dão significado à narrativa. A análise da narrativa caminha em busca do significado.

As relações culturais relacionadas à determinada narrativa, também devem ser observadas para sua análise. As narrativas são ordenadas como relações estabelecidas por meio da convivência entre as pessoas que estão relacionados principalmente a aspectos culturais. Neste caso a narrativa não pode ser aleatória e desprovida de intenções, mas é “uma atitude, quem narra quer produzir certos efeitos de sentido através da narração” (MOTTA, 2008. p. 5). Por isso a narrativa não pode ser aleatória e desprovida de intenções, mas é uma atitude de quem narra querer produzir certos efeitos de sentido através dela.

A decisão sobre que aspectos da análise o pesquisador pretende privilegiar, até onde pretende chegar, é subjetiva e depende da relação com o próprio objeto, porém Motta sugere três instâncias de análise que ele denomina de instâncias do discurso narrativo:

No Plano da expressão, a centralidade da análise se coloca em relação à linguagem e discursos utilizados nestas matérias. A linguagem aqui é vista como recurso cultural importante dos meios de comunicação, tendo em vista seu lugar privilegiado na circulação de informações. Sobretudo a análise de linguagem é importante no campo jornalístico, pois dele se espera “a verdade dos fatos”, o que lhe incumbe esta responsabilidade linguística.

No Plano da estória (ou conteúdo, enredo): As notícias foram analisadas tendo como ponto de partida a proibição da discussão de gênero na educação, e a narrativa jornalística desse acontecimento aqui denominada “estória” se configurou de maneira lúdica desenhando um enredo com início, meio e fim, apontando personagens, conflitos, e desfechos que nos apresentam o contexto social, cultural e político desta narrativa.

Na instância denominada Plano da metanarrativa (tema de fundo, compreensões de mundo): Foi o momento em que foi realizada a observação do contexto nacional em que se inserem essas discussões, quem são os atores envolvidos, que concepção de mundo estão disputando não apenas em Palmas, a partir do entendimento que o que aconteceu aqui é um recorte de uma realidade nacional e sua análise não se esgota nesta pesquisa.

Em relação aos movimentos de análise, Motta (2013) propõe as etapas abaixo que, a depender do pesquisador, podem ou não serem desenvolvidas, mas são propostas como forma de organizar metodologicamente o trabalho:

1 - O primeiro movimento é compreender a intriga como síntese do heterogêneo. Para isso, o analista deve ler e reler a narrativa quantas vezes for necessário, a fim de compreendê- la integralmente, pois uma análise só pode ser realizada quando se conhece muito bem a estória integral e o enredo no qual ela se estrutura. Isso permitirá a identificação do seu princípio, o meio e final, bem como sua inteligibilidade como totalidade.

2 - O segundo movimento consiste em compreender a lógica do paradigma narrativo. A lógica da narrativa corresponde à articulação interna das partes. Deve-se buscar compreendê-la no seu contexto comunicativo como um projeto dramático de construção da realidade. Um narrador, ao colocar-se na encenação narrativa, utiliza estratégica e astuciosamente os recursos de linguagem para construir um discurso argumentativo na relação com o seu interlocutor.

3 – O terceiro movimento é deixar surgirem novos episódios. Os episódios são unidades temáticas ou narrativas intermediárias, semanticamente coesas, que relatam ações ou conjunto de ações relativamente autônomas (motivos) e correspondem às transformações e progressões no transcorrer da estória, conectadas ao todo no qual significativa se inserem.

4 - O quarto movimento consiste em permitir ao conflito dramático se revelar. Para Motta, um dos principais aspectos a considerar no plano da estória é a identificação dos conflitos dramáticos. Os conflitos são fundamentais na produção da catarse e processos cognitivos. Na narrativa, explica o autor, o conflito é estrategicamente textualizado pelo narrador em um projeto dramático. Ele funciona como um frame, um marco ou enquadramento que se apropria da complexa realidade e a relata de uma determinada maneira.

5 - O quinto movimento é denominado pelo autor como personagem: metamorfose de pessoa a persona. A sua apresentação tem início com a definição de personagem e assume um tipo, traços singulares que caracterizam certos sujeitos arquetípicos. Seja como for, é figura central da narrativa, é o eixo do conflito em torno do qual gira toda a intriga, colocando-se como ponto de passagem de todos os acontecimentos da estória.

6 - O sexto movimento é dedicado às estratégias argumentativas. Motta (2013) relembra-nos que aquele que narra tem sempre algum propósito: nenhuma narrativa é ingênua, neutra, imparcial; toda narrativa é argumentativa. Ela busca atrair, seduzir, envolver, convencer, provocar efeitos de sentido. Por isso, estudar toda e qualquer narrativa é descobrir os dispositivos retóricos capazes de revelar o uso intencional de recursos linguísticos e extralinguísticos pelo narrador no processo de comunicação.

7 - O sétimo movimento consiste em permitir a emergência das metanarrativas. O pressuposto do autor é que nenhuma história é contada sem que haja um fundo moral, uma razão ética que a situe. Assim, toda narrativa, seja ela fática ou fictícia, se constrói contra um fundo ético e moral. Esse pano de fundo ético, moral ou filosófico, ainda que também possa ter aspectos políticos, religiosos, psicológicos ou ideológicos, é o pano de fundo sobre o qual se desenvolve o conjunto de uma sequência ou enredo a respeito de determinado assunto.

Com a utilização desta metodologia pretendeu-se compreender a construção da narrativa jornalística e o papel da mídia na produção e reprodução de conceitos e de representações sociais, a partir do seu caráter ideológico e político. A escolha do discurso para noticiar determinado acontecimento retrata a posição do jornalista ou do editorial do meio de comunicação. A proibição dos estudos de gênero na educação municipal de Palmas rendeu no mínimo seis meses de notícias, devido a sua polêmica criada em vários setores sociais. No recorte realizado foi possível identificar vários aspectos de uma história com início meio e fim, desde o começo da discussão, seu ápice, conflito, desdobramentos, personagens e desfecho.