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Neste último capítulo, me detenho em analisar as entrevistas, dentre as várias possibilidades de estudos, dei preferencia para três temas: a formação de professores; a função do currículo escolar, recorrendo a ferramentas de análises de Foucault; e a questão da pós- verdade e da Fake News, e suas atuais relações com o professor de História. Para continuarmos com as análises, é importante ter em mente que os relatos dados pelos entrevistados não são neutros, parto neste trabalho, do pressuposto que nenhum documento é neutro, assim leio as entrevistas como discurso, e como ação política.

3.1: Formação de Professores

Pensar a formação de professores acabou sendo a questão principal deste trabalho, logo grande parte das perguntas mais pontuais que realizei direcionavam os entrevistados para essa temática. Nas entrevistas percebi que os professores dão grande importância para a formação do dia a dia, a formação na/pela própria prática como docente, como podemos ver neste relato do professor Michel:

“A UFU me ajudou muito no pensar crítico, de olhar para as disciplinas de uma outra forma, para os temas de outra forma, para as fontes de outra forma, agora o dar aula mesmo é em sala de aula, estou crescendo constantemente como professor.”47

Ou no da professora Roberta:

“As matérias de didática e as outras em si, foram só teorias que para mim não acrescentaram em nada, eu aprendi ou aprendo a ser professora no meu dia a dia [...]”48

Os relatos sugerem, que a formação inicial não são determinantes na formação do professor, e que a prática é muito valorizada por eles, às vezes, chega-se a pensar que seria um

47 OLIVEIRA, Michel Ângelo A. de. Michel Ângelo A. de Oliveira: entrevista [mar. 2018]. Uberlândia. Entrevista

concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi. Link Entrevista completa em áudio [37:31m]: <https://www.dropbox.com/s/v6irbweons09akn/Entrevista%20Michel.mp3?dl=0>. Acesso em 15 jun. 2018.

48 SILVA, Roberta Helena R. da. Roberta Helena Rodrigues da Silva: entrevista [mar. 2018]. Uberlândia.

Entrevista concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi.. Link Entrevista completa em áudio [01:03h]: <https://www.dropbox.com/s/anu4x3wm81wgo41/entrevista%20Roberta%20Helena.mp3?dl=0>. Acesso 15 jun. 2018.

saber fazer não transmissível, e que, se bastaria a prática para formar o professor. Porém, faz- se também importante evidenciar que mesmo os professores atribuindo importância ao aprendizado prático, eles retornaram ou demonstraram interesse em retornar para cursos de extensão ou pós-graduação na universidade, buscando uma formação reflexiva, como o caso da professora Roberta, que deseja fazer mestrado futuramente e nos relatou que já fez um curso de extensão, ofertado pela UFU.

“[...] vim na UFU pegar meu diploma, e vi que a Educação estava lançando edital para especialização em docência e ensino superior, todo sábado por 18 meses, falei: quer saber de uma coisa, como não entrei no mestrado, eu vou fazer isso aqui, entrei e adorei”49

A formação de professores está estritamente ligada ao projeto político concebido, assim cada período histórico possui sua especificidade nos conteúdos, nas propostas político- pedagógicas, e nas concepções formadoras. Atualmente, vigora um projeto de formação que parte da concepção de que a escola é produtora de conhecimento, e também lugar de múltiplas trocas. Com isso, busca-se romper com uma concepção mais antiga de formação: de que as universidades seriam o local privilegiado de produção de conhecimento, e os professores seriam meros transmissores.

Ricci aponta que na primeira metade da década de 70, no Brasil, tínhamos o predomínio da Escola Comportamental, que induzia a uma compreensão de que o papel da escola seria o de formar uma ordem social, dentro dessa compreensão, se objetivava a indução de hábitos e o reflexo condicionado nos professores, a partir de um enfoque técnico e funcionalista. Porém, a partir dos anos 80, justamente devido ao processo de redemocratização do país, essa concepção passa a ser duramente criticada, abrindo espaço para uma perspectiva da escola como lugar de contradição.50

A partir da década de 90, pode-se observar uma maior centralidade no espaço de sala de aula, teóricos passam a entender esse espaço como formativo e como lugar de construção de identidades, cada vez mais tem se buscado valorizar as práticas inovadoras dentro das escolas. Acontece também uma mudança significativa no papel do Estado, ele já não irá exercer uma função tão controladora como antes. Essas mudanças de perspectivas vêm de encontro com o processo que chamo aqui de “tornar-se” professor, pois passa-se a entender como “[...]

49 Ibidem.

50 RICCI, Cláudia Sapag. A formação do professor e o ensino de História: Espaços e Dimensões de Práticas

Educativas (Belo Horizonte 1980/2003). 2003. Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Filosofia, Letras, e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo. pp-30-31.

fundamental que a formação de professores aconteça dentro das escolas, como movimento reflexivo das tentativas, experimentações, demandas do processo formativo [...] cujo o protagonista é o professor”51.

Para Nóvoa (2000), um dos expoentes dessa nova vertente analítica, a projeção de novos significados do espaço escolar advém da transição de uma concepção “técnica” de trabalho docente para perspectivas do professor reflexivo; de uma separação entre o lugar da prática e o lugar da teoria para a articulação entre o espaço escolar e o espaço universitário e da descoberta do professor como pessoa para a necessidade de conceber espaços de auto-conhecimento de reflexão ética.52

Pode-se observar, com esse novo protagonismo do professor, uma maior exigência do professor, que vai de encontro as novas competências profissionais requisitadas. Agora, o docente não necessita apenas ter domínio do conteúdo, mas também organizar e estimular situações de aprendizagens; gerar a progressão das aprendizagens; envolver os alunos em suas aprendizagens e no trabalho; trabalhar em equipe; utilizar novas tecnologias, participar da gestão da escola; entre outras, dando um papel mais complexo ao professor53. Ao analisar as entrevistas é perceptível nos três relatos como os professores vão aperfeiçoando essas novas competências com o passar do tempo. Os três professores relataram que com o passar do tempo melhoraram diversos aspectos como o sistema de avaliação, o trabalho em equipe, o domínio de sala, entre outras competências, como podemos ver no relato da professora Roberta:

“[...] acho que melhorei muito a questão de organização, eu era muito desorganizada, e para fazer prova? Meu Deus do céu, como minhas provas eram ruins, muito ruins. Eu guardei todas minhas provas em arquivinhos, e pego, por exemplo, uma prova de 2007 e falo: nossa, como eu dei isso? Que pergunta ridícula. E a de hoje não, hoje eu já sou mais esperta para fazer provas, para fazer diários que antes eu gastava horas, ajudo até os amigos que não sabem usar diário, também em relação a fazer projetos, eu tinha muita dificuldade para organizar projeto, hoje eu já sou até intrometida, até nos projetos que não são meus eu entro (risos).”54

E também no relato do professor Michel, ao falar sobre as dificuldades que encontrou no início da profissão: “[...] foram mais dificuldades práticas mesmo, que a gente aprende a lidar, a gente aprende a controlar a voz, a gente aprende a forma como passar certas coisas [...]”.55

51 Ibidem. p.37.

52 Ibidem. p.36. 53 Ibidem. pp. 40-41.

54 SILVA, Roberta Helena R. da. Roberta Helena Rodrigues da Silva: entrevista [mar. 2018]. Uberlândia.

Entrevista concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi.. Link Entrevista completa em áudio [01:03h]: <https://www.dropbox.com/s/anu4x3wm81wgo41/entrevista%20Roberta%20Helena.mp3?dl=0>. Acesso 15 jun. 2018.

55 OLIVEIRA, Michel Ângelo A. de. Michel Ângelo A. de Oliveira: entrevista [mar. 2018]. Uberlândia. Entrevista

concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi. Link Entrevista completa em áudio [37:31m]: <https://www.dropbox.com/s/v6irbweons09akn/Entrevista%20Michel.mp3?dl=0>. Acesso em 15 jun. 2018.

Desejo chamar atenção aqui para a capacidade desses profissionais de realizar uma reflexão sobre suas práticas, evidenciando a existência da produção de saber e de saber-fazer próprio do professor. Isso me faz pensar na importância de uma formação inicial crítica e reflexiva, sem perder de vista que o professor é uma pessoa, nessa concepção de formação encontra-se a necessidade de uma interação entre a vida profissional e pessoal, buscando como objetivo que o professor entenda-se como sujeito global. A criação de redes coletiva de trabalhadores é fundamental para manter o diálogo entre os professores, é através desses diálogos entre os docentes que se cria um corpo mais sólido de saberes, e auxilia no desenvolvimento de uma nova cultura profissional.

A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência.56

Ainda pensando a formação inicial de professores, as entrevistas me levaram a refletir sobre o papel dos estágios de licenciatura na formação. A professora Cinthia sinalizou sobre a dificuldade que o estagiário encontra nas escolas. Ao meu ver, essa dificuldade é um dos sintomas do distanciamento entre o ensino superior e o ensino básico, isso explicaria a sensação de ser um “estranho” sentida pelos estagiários no ambiente escolar. O estranho, nesse caso, me parece muito com o estrangeiro, como se o estagiário estivesse fora do seu local e não se reconhecesse naquele espaço, isso me faz pensar o quanto isso soa paradoxal, pois todos os professores já foram estudantes e passaram bons anos de suas vidas no ensino básico, como um lugar como esse pode tornar-se estranho, em tão pouco tempo de universidade?

“Muitos falam que estágio é o momento mais sofrido, hoje em dia como professora, vejo o quanto a realidade do estagiário é difícil, pois você ainda não tem contato com a realidade, você é um ser estranho no meio de uma sala de aula, os estudantes te olham como um ser estranho [...]”57

Porém, Cinthia relata que sua experiência, enquanto estudante de História, como estagiária foi positiva, ela diz que chegou a dar uma semana de aula para todas as turmas, em virtude da ausência da professora.

“Então no geral, a realidade do estagiário é bastante difícil, e para muitos casos, traumática, porque você encontra uma realidade modificada, mas para mim, minhas realidades de estágio foram tão boas!”58

56 NÓVOA, A. Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. p. 26.

57 MARTINS, Cinthia Cristina de Oliveira. Cinthia Cristina de Oliveira Martins: entrevista [jan. 2018].

Uberlândia. Entrevista concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi. Link Entrevista completa em áudio [01:07h]: <https://www.dropbox.com/s/k32lfg4rwawrk0j/Entrevista-Cinthia-Cristina.mp3?dl=0>. Acesso em 15 jun. 2018.

Já a professora Roberta entende que seu estágio não foi tão positivo, chegando a dizer: “o estágio não acrescentou nada para mim”59, porém é importante salientar, que quando ela

cursou história na UFU, ainda vigorava o currículo antigo, que era mais voltado para o Bacharelado. Ela mesmo relata que o curso eram dez períodos, sendo nove para o bacharelado e um para a licenciatura, e que o estágio ocorria em apenas três meses, diferentemente do currículo atual, em que ocorre em cinco semestres.

Na universidade onde eles se formaram, os estágios atualmente se propõem a realizar a união entre teoria e prática. Aliás hoje é muito comum o debate sobre a necessidade de mais práticas e menos teorias no ensino superior: os próprios entrevistados diversas vezes levantaram essa problemática, como a professora Roberta criticando algumas matérias, informando que foram muito teóricas: “Matérias de didática e as outras em si, foram só teorias que para mim não acrescentaram em nada”60. Eu mesmo, no início deste trabalho, parti do pressuposto de que

havia uma lacuna entre teoria e prática, mas o que quer dizer esses dois conceitos tão largamente utilizados? O que seria o estágio como prática de ensino?

Selma Garrido Pimenta indica que nos anos 60 o estágio como prática consistia em reproduzir modelos de ensino considerados eficazes. Esses modelos de referência normalmente advinham de escolas onde estudavam crianças do segmento social dominante, depois buscava- se reproduzir esses modelos em outras escolas, o que muitas vezes não dava certo devido a diferença entre os públicos. Por esse motivo é que, a partir dos anos 70, começa a circular entre os professores o sentimento de que a teoria era inútil, e que na prática sempre é outra coisa; é importante salientar que tal prática culpabilizava as crianças que não conseguiam se adaptar ao modelo, vemos que nessa perspectiva a prática se constitui simplesmente como observação e reprodução. A autora indica que, a partir dos anos 80, devido à insatisfação dos professores começam a surgir novas concepções que levam a uma tentativa de uma maior unidade entre teoria e prática.

[...] ou seja, no fazer pedagógico o ‘que ensinar’ e o ‘como ensinar’ deve ser articulado ao ‘para quem’ e ‘para quê’ e em ‘quais circunstâncias’, expressando a unidade entre conteúdos teóricos e instrumentos do currículo.61

59 SILVA, Roberta Helena R. da. Roberta Helena Rodrigues da Silva: entrevista [mar. 2018]. Uberlândia.

Entrevista concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi.. Link Entrevista completa em áudio [01:03h]: <https://www.dropbox.com/s/anu4x3wm81wgo41/entrevista%20Roberta%20Helena.mp3?dl=0>. Acesso 15 jun. 2018.

60 Ibidem.

61 PIMENTA, Selma Garrido. O estágio na formação de professores: unidade entre teoria e prática. Caderno de Pesquisas, São Paulo, n.94, ago. 1995. p.60.

Pimenta diz que quando se fala de unidade entre teoria e prática, ou em uma atividade teórico-prática, está se falando da ideia de práxis, a autora recorre a VÁSQUEZ (apud, 1968) para explicar o conceito da atividade docente como práxis. Segundo essa concepção, as dimensões teórica seriam as de conhecimento e de intencionalidade (teleológica), e as dimensões prática seriam as de intervenção e transformação, e a práxis é a atitude humana de transformação da natureza e da sociedade, ou seja, é necessário interpretar as coisas, mas também transformá-las. A autora afirma que o estágio, assim como outras disciplinas é teórico, mas ele permite a inserção e a instrumentalização para atuar e transformar a realidade educacional.62

Deve-se buscar então, formar o professor capaz de realizar o exercício de reflexão da/sobre a prática. Soares (2007) interpretando Libâneo (apud, 2000) defende que a universidade deve formar o professor de forma que:

[...] ele é ajudado a compreender o seu próprio pensamento e a refletir de modo crítico sobre sua prática. Sabendo da importância de os alunos aprenderem a pensar, serem críticos, resolverem problemas, é preciso que esses aspectos sejam inicialmente desenvolvidos com os professores. Não é apenas aprender a pensar, mas um pensar epistêmico [...]63

Todos os professores entrevistados apresentaram a preocupação de desenvolver a criticidade em seus alunos. De alguma maneira isso foi inspirador, já que pode se entender que a formação do professor de História, pelo menos desde 2005, pela Universidade Federal de Uberlândia, vem caminhando no sentido de formar professores capazes de realizar o exercício da reflexão prática, como vemos no relato do professor Michel, formado em 2011 e depois da professora Roberta formada em 2005:

“[...] eu atribuo ao curso até minha formação pessoal, sabe, opinião política, senso crítico, agradeço muito ao curso.”64

“E porque eu vejo o seguinte, somos críticos, nós como historiadores somos muito críticos, a gente critica tudo, é algo nosso, porque o que aprendemos aqui (UFU), e a carga de leitura que nós temos, nos torna muito críticos em tudo.”65

62 Ibidem. p.63

63 SOARES, Luciana Souza. Formação Contínua: Caminhos e Descaminhos.2007. Dissertação (Mestrado em

Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. p. 46.

64 OLIVEIRA, Michel Ângelo A. de. Michel Ângelo A. de Oliveira: entrevista [mar. 2018]. Uberlândia. Entrevista

concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi. Link Entrevista completa em áudio [37:31m]: <https://www.dropbox.com/s/v6irbweons09akn/Entrevista%20Michel.mp3?dl=0>. Acesso em 15 jun. 2018.

65 MARTINS, Cinthia Cristina de Oliveira. Cinthia Cristina de Oliveira Martins: entrevista [jan. 2018].

Uberlândia. Entrevista concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi. Link Entrevista completa em áudio [01:07h]: <https://www.dropbox.com/s/k32lfg4rwawrk0j/Entrevista-Cinthia-Cristina.mp3?dl=0>. Acesso em 15 jun. 2018.

Ainda pensando a questão da criticidade, a professora Cinthia, formada em 2013, relata a seguinte experiência, onde ela busca desenvolver com seus estudantes, o exercício de sempre questionar:

“É muito engraçado quando você está dando uma aula assim, você olha e fala: Espera gente, vocês acham que eu estou falando a verdade? Aí os meninos ficam: (ah) mas por quê? E eu: gente lembra, o que é a verdade? Aí eles: é a verdade não existe, você está tentando enganar a gente. Eu faço isso muito com eles. Eu falo: não, não é porque eu estou falando que está certo, eu não sou a fonte absoluta de conhecimento, tem que criticar. Aí os meninos falam: mas Cinthia eu discordo do que você falou. Beleza, acho ótimo. Então é você aprender a fazer a autocrítica, que não, eu não sou a detentora do conhecimento máximo, nem tudo o que eu sei está certo.”66

Finalizando a discussão sobre a Formação de professores, entendo que o professor que se busca formar, é o professor capaz de interpretar a realidade através de um aparato teórico, e transformá-la. Ele deve colocar o que aprendeu em prática, criar seus próprios materiais, não se limitar ao conteúdo e ao livro didático. Busca-se formar o professor ator, o professor sujeito (auto)crítico, capaz também de incitar a criticidade em seus estudantes.

3.2: Pensando a Educação Escolar e o Currículo

Durante a entrevista com o professor Michel, uma de suas falas me chamou a atenção para a problemática dos currículos. O professor Michel relata que em uma reunião de professores, um de seus colegas questiona o seguinte: “[...] eu só quero tirar uma dúvida, nós vamos focar para formação social, para nossa função social enquanto professor, ou nós vamos focar no ENEM?”67. Essa questão me levou a pensar sobre o papel dos currículos e a função

social da educação escolar.

Em todo o processo do trabalho, do projeto, a escuta dos entrevistados, às tentativas de compreensão do tornar-se professor, pensei a educação institucionalizada e as relações nela existente a partir das ferramentas de Foucault. Tratando Foucault não como um filósofo que tenha criado um método de análise foucaultiano ou fundado uma escola, mas que construiu e nos proporcionou várias ferramentas analíticas que se tornaram importantes para pensarmos as relações entre o “poder e o saber” dentro das escolas. Situando um pouco melhor o modo de pensar de Foucault, que apesar de realizar críticas à razão pura e iluminista que de alguma forma

66 Ibidem.

67 OLIVEIRA, Michel Ângelo A. de. Michel Ângelo A. de Oliveira: entrevista [mar. 2018]. Uberlândia. Entrevista

concedida a Felipe Cesar P. Tedeschi. Link Entrevista completa em áudio [37:31m]: <https://www.dropbox.com/s/v6irbweons09akn/Entrevista%20Michel.mp3?dl=0>. Acesso em 15 jun. 2018.

nos levaria ao progresso, sem ignorá-la, acredita ser importante uma constante crítica para podermos superar os “limites sociais” postos.

A hipercrítica está sempre em movimento; não em busca de um ponto de fuga que seria o núcleo da Verdade e como base no qual fosse possível traçar a perspectiva das perspectivas, mas que simplesmente se desloca sem descanso, sobre ela mesma e sobre nós. Nesse sentido, costumo referir que essa é uma crítica desancorada de qualquer entidade subjetiva a priori – chamemo-la Espírito, Deus, Razão, Uno, Ideia, Consciência etc. [...]68

Existe um grande debate sobre a divisão do pensamento e métodos analíticos de Foucault, alguns pesquisadores dividem cronologicamente, outros realizam a divisão por obras, mas a maioria tende a entender que são três eixos que norteiam seus trabalhos: ser-saber (arqueologia), ser-poder (genealogia) e ser-consigo. Neste trabalho, trago-o para o diálogo com professores, evocando o domínio do ser-poder, ou seja, utilizando-se do método ou da técnica de investigação genealógica que possibilita especificamente pensar as análises do método arqueológico em uma teia de relações de poder, e que essas relações de poder estão espalhadas desde o macro até o microscópio. Apoiando-nos nestas sugestões de Foucault, a partir desse viés, é que procuraremos analisar, desde os relatos de experiências dos professores entrevistados, o ensino institucionalizado como produzido por e produtor de uma sociedade panóptica.

A sociedade panóptica, tem como principal “tipo” de poder, o que Foucault denomina de pastoral, e ela age através da disciplinarização dos corpos, porém é preciso atentar-se que

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