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Análise das estratégias metodológicas adotadas nas dissertações

CAPÍTULO III – ANÁLISE DAS DISSERTAÇÕES PRODUZIDAS EM MESTRADOS

3.1 Análise das estratégias metodológicas adotadas nas dissertações

No capítulo anterior foram apresentadas as dissertações selecionadas para análise nesta pesquisa, abordando seus principais objetivos, resultados encontrados e, de modo geral, foram indicadas as metodologias empregadas na construção destes trabalhos de pós-graduação. Este último aspecto será retomado neste momento com o intuito de analisar as estratégias metodológicas utilizadas nas pesquisas, o que envolve entre outros aspectos a coleta e análise de dados.

Ao observar o conjunto de dissertações analisadas foi possível notar que a maior parte destas trata-se de pesquisa de caráter qualitativo, totalizando sete trabalhos dentre os onze que foram selecionados: Furtado (2001), Junqueira (2006), Luchezi (2005), Oliveira (2005), Santini (2006) e Silva (2007). Nenhuma das dissertações optou por um enfoque exclusivamente quantitativo e quatro combinaram os enfoques qualitativo e quantitativo (ANESI, 2007; GEICH, 2003; LEHN, 2004; MASCARENHAS, 2006).

A abordagem qualitativa de pesquisa difere da quantitativa, em princípio, por não ter a intenção de apresentar dados numéricos e comprovações estatísticas como base do processo de análise. Neves (1996) afirma que as pesquisas qualitativas surgiram, inicialmente, no contexto da Antropologia e da Sociologia e que, posteriormente, ganharam espaço em outros campos do conhecimento, tais como Educação, Psicologia, Administração e outros. Verifica-se, aqui, que as pesquisas qualitativas também vêm sendo utilizadas no campo do turismo para a abordagem da temática do lazer, conforme foi constatado na presente investigação.33

Segundo Rejowski (1996) não há um quadro geral de métodos e técnicas utilizadas nas pesquisas realizadas no campo do turismo, podendo-se empregar uma infinidade de procedimentos metodológicos. A autora destaca que a pesquisa realizada no campo do turismo recebe influência (assim como também influencia) dos métodos e técnicas de pesquisa já consagrados podendo, assim, englobar estratégias provenientes da Administração, da Economia, Geografia, Sociologia, Psicologia, Antropologia, entre tantas outras. Isso ocorre por ser este um fenômeno de múltiplas facetas, que penetra em muitos aspectos da vida humana, seja de forma direta ou indireta. Consequentemente, a investigação se processa de forma multidisciplinar34, com a contribuição de diversas áreas do conhecimento (REJOWSKI, 1996).

No que se refere às onze dissertações selecionadas para análise, foi possível observar que, dentre essas, seis possuíam um caráter exploratório-descritivo (GEICH, 2003; JUNQUEIRA, 2006; LEHN, 2004; OLIVEIRA, 2005; RESENDE, 2004; SANTINI, 2006), duas optaram pelo enfoque exploratório (FURTADO, 2001; LUCHEZI, 2005) e uma pelo descritivo (SILVA, 2007). Constata-se, assim, que os enfoques privilegiados nas dissertações analisadas foram o exploratório e descritivo. Embora possa ter sido uma opção metodológica motivada por interesses diversos, é possível que essa escolha esteja relacionada a dois fatores:

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Observou-se o uso de cálculos estatísticos e de percentagens apenas no estudo realizado por Geich (2003).

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Para essa autora, multidisciplinar é o termo utilizado na pesquisa e no ensino de turismo que pressupõe que cada uma das disciplinas envolvidas usa de seus próprios conceitos e métodos, apesar de o objeto de estudo ser o mesmo (REJOWSKI, 1996).

a) Ao conhecimento incipiente que alguns dos pesquisadores detinham, sobre o

tema investigado, antes de ingressarem no mestrado em Turismo, o que ressalta a

importância da realização de pesquisas exploratório-descritivas. No segundo capítulo desta pesquisa foram destacadas as experiências profissionais, relacionadas ao lazer, que os entrevistados detinham. Ao observar o conjunto de autores, pode-se verificar que nem todos atuaram profissionalmente com o lazer ou desenvolveram estudos aprofundados sobre esta temática anteriormente, o que foi destacado no fragmento de entrevista que será exposto em seguida:

Eu só estudei lazer nos grupos de pesquisa do meu orientador, estimulado pelo meu orientador. Eu não tive nenhuma disciplina ligada a essa temática. Foi mais por orientação do meu professor, o Francisco dos Anjos. A gente discutia essa temática, eu e outros orientandos que ele tinha e que estavam estudando o lazer. Mas ficou só mesmo nesses grupos de pesquisa. (JUNQUEIRA, 2010,

p.2, entrevista).

Do ponto de vista desta investigação, acredita-se que as experiências profissionais e acadêmicas podem ter uma grande relação com a escolha do tema de pesquisa nos cursos de pós-graduação, podendo contribuir significativamente com a realização da investigação no decorrer do curso.

b) Ao fato de que o campo de estudos é relativamente recente, o que justifica a

realização de estudos exploratório-descritivos. Como exposto anteriormente, foi a partir da década de 1970 que se percebeu um aumento expressivo de pesquisas sobre a temática do lazer no Brasil (GOMES; MELO, 2003). O turismo, assim como o lazer, também se caracteriza como um campo de estudos relativamente jovem. De acordo com Rejowski (1996), o estudo acadêmico do turismo teve início na Europa, sob a influência da economia e da geografia, chegando ao Brasil também na década de 1970.35

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Rejowski (1996) afirma que nessa época existia no Brasil, assim como em outros países, grande expectativa sobre o turismo como uma das “chaves” que “abririam as portas” do desenvolvimento econômico. Isso ocorreu devido ao boom do turismo massivo e à conseqüente movimentação e circulação de capital no país. Muitas informações eram veiculadas nos meios de comunicação especializados (revistas e boletins técnico-científicos), bem como nos meios de comunicação de massa (jornais diários, programas de rádio e televisão), divulgando os aspectos positivos da atividade

turística. Ainda segundo a autoracitada, decorreu daí o crescente interesse por parte de empresários,

políticos e estudiosos brasileiros na realização de investigações acerca deste fenômeno. A partir de então, foram publicados os primeiros livros e periódicos nacionais sobre o turismo, fundados os primeiros cursos em nível superior, realizados os primeiros eventos de caráter técnico-científico que

Outros tipos de pesquisa, por sua vez, foram pouco utilizados. A Pesquisa fenomenológica, por exemplo, foi desenvolvida somente por Furtado (2001) e nenhuma das dissertações analisadas utilizou a pesquisa-ação, por ser um tipo de investigação com metodologia mais complexa.36 Este aspecto foi destacado por um dos autores (OLIVEIRA, 2010) ao esclarecer que o tipo de pesquisa inicialmente desejada não foi adotado, como é possível verificar no excerto a seguir:

[...] a gente tinha que definir alguns tipos de pesquisa e eu queria trabalhar um pouco com pesquisa-ação e trabalhar no hotel junto com eles. Na verdade a gente barrou isso no começo porque falaram que era muito complicada a questão de tabulação de dados depois, no final da pesquisa. Então nós trabalhamos com a pesquisa tradicional mesmo, questionário e entrevista. (OLIVEIRA, 2010, p. 3,

entrevista).

Como se pode perceber, a pesquisa-ação foi substituída devido às dificuldades que poderia trazer à conclusão da pesquisa dentro do prazo de 24 meses previsto para a integralização do Mestrado no Brasil. Alguns tipos de pesquisa podem ser complexos e difíceis de realizar, principalmente devido à profundidade de envolvimento que o pesquisador deve possuir com o objeto investigado. Porém, tais possibilidades também podem trazer grandes contribuições ao estudo do lazer e do turismo, como é o caso da pesquisa-ação e da pesquisa fenomenológica, dentre outras.

Sobre essa questão, Santos; Possamai; Marinho (2009) explicam que através da fenomenologia, o pesquisador pode avançar na compreensão do turismo ao dar destaque à experiência vivida quando se está em contato com as coisas em si mesmas, deixando de lado especulações metafísicas abstratas ou enfoques positivistas. Considera-se nesta investigação que o mesmo poderia ser dito com relação aos estudos do lazer.

Retomando e avançando na discussão proposta, observou-se que nas dissertações analisadas os dados foram obtidos através de estratégias variadas, combinando-se sempre duas ou mais técnicas na coleta. Dentre as formas mais utilizadas, além da

buscaram discutir especificamente esse assunto e defendidas as primeiras dissertações e teses brasileiras sobre o turismo.

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Além desses enfoques, teve-se também: duas dissertações que privilegiaram o caráter interpretativo (SANTINI, 2006; SILVA, 2007), uma que utilizou o método indutivo (GEICH, 2003), o método hipotético-dedutivo-indutivo (MASCARENHAS, 2006), a abordagem histórica (RESENDE,

pesquisa bibliográfica – parte integrante de todos os trabalhos –, foi expressiva a realização de entrevistas, empregadas em dez das onze dissertações analisadas. No que se relaciona ao tipo de entrevista que os autores desenvolveram em suas pesquisas, notou-se também que as possibilidades foram diversificadas. Em quatro dissertações foram realizadas entrevistas com roteiros semiestruturados (JUNQUEIRA, 2006; LEHN, 2004; SANTINI, 2006; SILVA, 2007), uma utilizou roteiro estruturado (GEICH, 2003), uma utilizou roteiro não estruturado (ANESI, 2007) e três não especificaram de modo detalhado como as entrevistas foram desenvolvidas (LUCHEZI, 2005; OLIVEIRA, 2005; RESENDE, 2004). Além destas, em uma das dissertações foi identificado um tipo de entrevista denominado pela autora como “medida de opinião” (FURTADO, 2001).

Além da pesquisa bibliográfica e das entrevistas, verificou-se que a análise documental também foi amplamente utilizada, fazendo parte da coleta de dados de nove estudos (ANESI, 2007; FURTADO, 2001; GEICH, 2003; JUNQUEIRA, 2006; LEHN, 2004; MASCARENHAS, 2006; OLIVEIRA, 2005; RESENDE, 2004; SILVA, 2007).

Quanto à coleta de dados em documentos, em alguns casos o pesquisador atua/atuou profissionalmente em áreas, empresas ou instituições relacionadas ao objeto de pesquisa, o que facilitou o acesso aos documentos e registros. Esse é o caso de Luchezi (2005, 2010). A autora relatou, em sua entrevista, que havia atuado por alguns anos em uma entidade da indústria automobilística. Assim, pôde ter acesso a documentos disponibilizados pela empresa para a elaboração da pesquisa que daria origem à sua dissertação de mestrado. Quando o acesso aos documentos é mais fácil, a análise torna-se mais viável, uma vez que permite sua re-leitura indefinidas vezes.

As três estratégias metodológicas citadas anteriormente (pesquisa bibliográfica, entrevistas e análise documental) são frequentemente utilizadas nas ciências humanas e sociais, pois, são consideradas eficazes e objetivas e existe um grande número de publicações sobre o emprego destes recursos.

Outra estratégia utilizada em seis dissertações foi a observação. Enquanto um dos estudos optou pela observação dirigida (SILVA, 2007), outro adotou a observação participante (LUCHEZI, 2005), e uma das pesquisas combinou a observação livre com a dirigida (SANTINI, 2006). Outro estudo priorizou a “observação empírica” – conforme denominação do autor (MASCARENHAS, 2006) –, e dois autores não especificaram qual foi o tipo de observação desenvolvida e sistematizada em suas pesquisas (RESENDE, 2004; OLIVEIRA, 2005).

Há que se mencionar, ainda, que dois autores desenvolveram pesquisa de campo (ANESI, 2007; OLIVEIRA, 2005); uma autora realizou visita técnica (LUCHEZI, 2005); Junqueira (2006) fez um levantamento e Geich (2003) utilizou o instrumento inventário. Desta forma, as dissertações analisadas – produzidas no contexto de Mestrados Acadêmicos em Turismo/Hospitalidade – foram desenvolvidas por pesquisadores formados em diferentes áreas (Turismo, Educação Física, Administração, Geografia e Educação Artística), lançando mão de estratégias metodológicas variadas para realizar suas pesquisas, o que pode ser uma influência dos tipos de pesquisa mais comumente empregados em seus respectivos campos de formação acadêmica.

No que se refere à análise dos dados coletados, esta informação não estava claramente exposta em todas as dissertações analisadas. Entretanto, foi possível observar que a análise também foi feita de diferentes formas. Houve, principalmente, pesquisas que utilizaram o método de análise de conteúdo (FURTADO, 2001; LEHN, 2004; RESENDE, 2004). Ademais, teve-se a análise comparativa (OLIVEIRA, 2005); a análise qualitativa dos dados (LUCHEZI, 2005; OLIVEIRA, 2005), e a combinação de análise qualitativa e quantitativa (ANESI, 2007).

Foi possível constatar, também, o uso de categorias analíticas (ANESI, 2007; LEHN, 2004), de unidades de significado (SANTINI, 2006; SILVA, 2007) e a triangulação de informações obtidas (RESENDE, 2004; SANTINI, 2006; SILVA, 2007), a organização dos dados em gráficos e tabelas (LEHN, 2004; MASCARENHAS, 2006) e a análise através de planilhas (MASCARENHAS, 2006).

Uma técnica de análise interessante foi utilizada por Junqueira (2006): o Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) proposto por Lefèvre & Lefèvre (2003). Considera-se essa

metodologia interessante porque, através dela, teve-se no estudo a interpretação do discurso de cada um dos agentes da pesquisa separadamente, para, em seguida, relacionar todos os envolvidos, tornando possível, assim, observar onde havia coerências nos discursos e onde apareciam percepções diferenciadas. Sendo assim, compreende-se que essa técnica pode ser empregada em outros estudos onde diferentes agentes estejam envolvidos, tais como comunidade local e representantes dos setores público e privado.

Após tecer algumas considerações a respeito das estratégias metodológicas utilizadas nas dissertações aqui analisadas, é relevante identificar as dificuldades encontradas, pelos entrevistados, para o estudo da temática do lazer. Este é um passo dado na direção de se conhecer a produção científica sobre a temática do lazer que vem sendo realizada no campo do turismo. Compreende-se, no âmbito desta pesquisa, que se faz necessário um empenho no sentido de sistematizar o conhecimento que vem sendo produzido acerca da temática do lazer, a fim de esclarecer os condicionantes, avanços e limites dos trabalhos acadêmicos, além de identificar o quê, quem e onde se está pesquisando determinados temas. Assim, o próximo capitulo procurou se aproximar ainda mais do objeto da presente pesquisa.