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Análise crítica dos casos decididos pelo Supremo Tribunal Federal em que foi verificada citação de jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos

4 DIÁLOGO INTERJURISDICIONAL E ANÁLISE DE DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

4.2 Análise crítica dos casos decididos pelo Supremo Tribunal Federal em que foi verificada citação de jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos

Humanos

As decisões mencionadas neste subtítulo foram obtidas na forma indicada na introdução desta dissertação. Após a lá aludida triagem individual, identificou-se a citação de jurisprudência da Corte IDH pelo STF em 26 casos217. Contudo, dentre essas 26 decisões, observou-se que muitas possuem, no que se refere a este estudo, fundamentação quase idêntica. Isto é, na parte em que se cita jurisprudência da Corte regional, algumas decisões utilizam-se praticamente da mesma fundamentação. Esse é o caso dos oito Habeas Corpus citados a seguir, que tratam da (in)competência da Justiça Militar para o julgamento de civis que praticam crimes militares: HC 105.348/RS, HC 106.171/AM, HC 109.544-MC/BA, HC 107.731 Extn/PE, HC 105.256/PR, HC 112.936/RJ, HC 110.237/PA, HC 105.256/PR, HC 110.185/SP.

Ainda, verifica-se que algumas das decisões obtidas tratam-se de julgamentos ligados ao mesmo caso. Nessa situação estão as decisões do STF no famoso caso “mensalão” (AP 470/MG). Dentre as ações que citam a jurisprudência da Corte IDH, quatro referem-se a esse caso: além do acórdão principal referente ao processo (julgado em 17 de dezembro de 2012), as decisões nos seus 25º, 26º e 27º agravos regimentais também citam jurisprudência da Corte IDH.

Por fim, ainda cumpre sinalar que duas das ações que aparecem na pesquisa foram julgadas em conjunto, tratando-se, em verdade, da mesma decisão.

Esse é o caso da decisão do STF sobre a constitucionalidade da união homoafetiva,

217 Não se ignora o fato de que o banco de dados do site pode não conter todas as decisões proferidas por este Órgão, especialmente com relação às mais antigas. Contudo, tendo em vista que a discussão (tardia) a respeito da vinculatoriedade das decisões da Corte IDH no Brasil somente teve início – de modo geral – por volta do ano de 2006, acredita-se que os dados obtidos representem, ao menos proximamente, os números reais ao que se propõe neste trabalho.

que resultou do julgamento conjunto da ADPF 132/RJ e da ADI 4277/DF. Feitas essas considerações iniciais, volvamo-nos aos casos.

Embora o Brasil tenha reconhecido a jurisdição da Corte IDH já em 1998, a primeira vez que o Supremo Tribunal Federal fez referência à jurisprudência da Corte IDH ocorreu apenas em 6 de agosto de 2008, no julgamento da ADPF 144/DF, que teve como relator o Ministro Celso de Mello. O plano de fundo do aludido instrumento de controle concentrado de constitucionalidade foi a discussão acerca da inelegibilidade de candidatos a cargos eletivos, em razão de sua vida pregressa.

A ADPF foi ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para questionar a validade constitucional da interpretação que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estava efetuando quanto ao teor do parágrafo 9º do artigo 14 da CF218, cuja redação foi dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994.

Outrossim, a ação também teve por fim obter a declaração da não recepção pela Constituição de dispositivos da LC nº 64/90, quais sejam: o seu artigo 1º, I, “d”, “e” e

“h”219, e o seu artigo 15220.

O argumento da AMB foi o de que o dispositivo constitucional supracitado não exigiria o trânsito em julgado para que fosse declarada judicialmente a

218 Art. 14. [...] § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3 (três) anos seguintes;

e) os que forem condenados criminalmente, com sentença transitada em julgado, pela prática de crime contra a economia popular, a fé pública, a administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3 (três) anos, após o cumprimento da pena; [...]

g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se a questão houver sido ou estiver sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir da data da decisão (BRASIL, 1990, www.planalto.gov.br).

h) os detentores de cargo na administração pública direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econômico ou político apurado em processo, com sentença transitada em julgado, para as eleições que se realizarem nos 3 (três) anos seguintes ao término do seu mandato ou do período de sua permanência no cargo; (BRASIL, 1990, www.planalto.gov.br, sem grifos no original).

220 Art. 15. Transitada em julgado a decisão que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se já expedido (BRASIL, 1990, www.planalto.gov.br, sem grifos no original).

inelegibilidade de candidato a cargo público eletivo. Como visto, a CF menciona apenas que outros casos de inelegibilidade, além dos previstos nos parágrafos 4º até o 8º do artigo em tela, serão estabelecidos em lei complementar, no intuito de

“proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato” (BRASIL, 1988, www.planalto.gov.br).

Nada fala sobre a necessidade de trânsito em julgado ou de “decisão irrecorrível”, conforme exigem os dispositivos atacados pela ADPF.

Avaliando os objetos que foram postos em discussão pela AMB, o Ministro Celso de Mello expõe que a decisão do STF enfrenta os seguintes questionamentos, os quais resumem a celeuma: a) a presunção de inocência é de obrigatória observância na seara da inelegibilidade de candidatos a cargos eletivos, sanção que não possui natureza de direito penal? b) a exigência de coisa julgada colide com os princípios da probidade administrativa e da moralidade exigidas no art. 14, §9º, da CF? e c) uma vez que requer lei complementar, o mencionado dispositivo constitucional é autoaplicável?

Após enfrentar os questionamentos supracitados, o Ministro conclui (e essa é a decisão que coincide com a da maioria votante) que o pedido da AMB é improcedente, visto que desautarizado

não só pelo postulado da reserva constitucional de lei complementar (CF, art. 14, § 9º, c/c o art. 2º), mas, também, por cláusulas instituídas pela própria Constituição da República e que consagram, em favor da pessoa, o direito fundamental à presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII) e que lhe asseguram, nas hipóteses de imposição de medidas restritivas de quaisquer direitos, a garantia essencial do devido processo (CF, art. 5º, LIV) (STF, 2008a, www.stf.jus.br).

A citação de jurisprudência da Corte IDH aparece de forma indireta no voto do Ministro Celso de Mello, quando este colaciona trecho da obra de Luiz Flávio Gomes e Valerio Mazzuolli221 (apud STF, 2008a, www.stf.jus.br), esta, sim, com referência, ainda que discreta, à jurisprudência da Corte IDH. Enquanto tratava do princípio da presunção de inocência, o Ministro colacionou o trecho doutrinário, que abaixo transcrevo:

trata-se de princípio consagrado não só no art. 8º, 2, da Convenção Americana senão também (em parte) no art. 5°, LVII, da Constituição

221 Conforme referenciado pelo Ministro, trata-se da obra intitulada “Direito Penal – Comentários à Convenção Americana sobre Direitos Humanos/Pacto de San José da Costa Rica”, vol. 4/85-91, 2008, RT”.

Federal, segundo o qual toda pessoa se presume inocente até que tenha sido declarada culpada por sentença transitada em julgado. Tem previsão normativa desde 1789, posto que já constava da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Do princípio da presunção de inocência (‘todo acusado é presumido inocente até que se comprove sua culpabilidade’) emanam duas regras: (a) regra de tratamento e (b) regra probatória. ‘Regra de tratamento’: o acusado não pode ser tratado como condenado antes do trânsito em julgado final da sentença condenatória (CF, art. 5°, LVII). O acusado, por força da regra que estamos estudando, tem o direito de receber a devida ‘consideração’ bem como o direito de ser tratado como não participante do fato imputado. Como ‘regra de tratamento’, a presunção de inocência impede qualquer antecipação de juízo condenatório ou de reconhecimento da culpabilidade do imputado, seja por situações, práticas, palavras, gestos etc., podendo-se exemplificar: a impropriedade de se manter o acusado em exposição humilhante no banco dos réus, o uso de algemas quando desnecessário, a divulgação abusiva de fatos e nomes de pessoas pelos meios de comunicação, a decretação ou manutenção de prisão cautelar desnecessária, a exigência de se recolher à prisão para apelar em razão da existência de condenação em primeira instância etc. É contrária à presunção de inocência a exibição de uma pessoa aos meios de comunicação vestida com traje infamante (Corte Interamericana, Caso Cantoral Benavides, Sentença de 18.08.2000, parágrafo 119).

Veja-se que a decisão da Corte IDH aparece na última linha da citação, que traz à baila o parágrafo 119 do caso “Cantoral Benavides Vs. Perú222”. Observa-se que o caso mencionado indiretamente pelo STF, no parágrafo referido, trata de matéria pouco afeta ao caso sub judice. De acordo com o parágrafo 119 da decisão interamericana citada por Gomes e Mazzuolli

Assim, verificada a relação muito remota da decisão citada com o presente caso, pode-se concluir que a jurisprudência da Corte IDH não foi determinante para o julgamento do caso em tela, o que fica ainda mais evidenciado pelo fato de o Ministro tê-la mencionado de forma indireta mediante a citação da obra de Gomes e Mazzuolli. Destarte, entende-se que o presente caso não constitui hipótese em que o STF efetivamente promoveu um controle de convencionalidade com base na

222 Corte IDH. Caso Cantoral Benavides Vs. Perú. Fondo. Sentencia de 18 de agosto de 2000. Serie C No. 69.

223 Tradução livre: “a Corte observa, em primeiro lugar, que no presente caso está provado que o senhor Cantoral Benavides foi exibido ante os meios de comunicação, vestido com um traje infamante, como autor do delito de traição da pátria, quando ainda não havia sido legalmente processado nem condenado”.

jurisprudência da Corte IDH. Não obstante isso, é preciso reconhecer que sua decisão se afigura conforme o corpus iuris interamericano.

De fato, a jurisprudência da Corte IDH dá grande destaque ao princípio da presunção de inocência, positivado no art. 8.2 da CADH. Para ela, a única hipótese de mitigação a dito princípio (embora ainda limitado a certos pressupostos) é a hipótese de prisão preventiva, que se trata de garantia do processo e não de antecipação do efeito condenatório224 (BASTOS JÚNIOR; SANTOS, 2015, p. 248).

Além disso, a Corte IDH considera que as garantias judiciais previstas no artigo 8º da CADH, entre elas a presunção de inocência, não se limitam aos processos criminais, senão que vinculam “cualquier órgano del Estado que ejerza funciones de carácter materialmente jurisdiccional225" (CORTE IDH, 2001a, www.corteidh.or.cr, caso Tribunal Constitucional Vs. Perú226). Assim, nesse tímido e primeiro diálogo com a Corte IDH, pode-se dizer que foi realizada uma interpretação receptiva (não obstante tenha sido, nesse caso, quase acidental).

O segundo acórdão do STF, que contém citação de jurisprudência da Corte IDH, refere-se à decisão da Petição 3.388/RR, cujo julgamento ocorreu em 19 de março de 2009. O relator do acórdão foi o Ministro Carlos Ayres Britto. Com efeito, tratou-se de ação popular ajuizada por Augusto Affonso Botelho Neto, com vistas à declaração de nulidade da Portaria/MJ nº 534/2005, assim como do decreto que a homologa: o Decreto Presidencial de 15 de abril de 2005.

A intenção do peticionário foi a de invalidar, assim, a “demarcação administrativa da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, localizada nos Municípios de Normandia, Pacaraima e Uiramutã, no Estado de Roraima” (BRASIL, 2005, www.planalto.gov.br). Ele alegou que a demarcação poderia trazer consequências desastrosas tanto para Roraima quanto para o Brasil. Nesse passo, fez menção a questões relativas à segurança nacional, supostamente ameaçada por pretensões da Venezuela sobre parte do território brasileiro e por pretensões da ONU em limitar a ação das Forças Armadas em territórios indígenas.

224 Nesse sentido pode-se citar a sentença de mérito do caso Caso Suárez Rosero Vs. Ecuador, sentencia de 12 de noviembre de 1997.

225 Tradução livre: “qualquer órgão do Estado que exerça funções de caráter materialmente jurisdicional”.

226 Caso del Tribunal Constitucional Vs. Perú. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 31 de enero de 2001. Serie C No. 71.

O STF, tendo como principal fundamento jurídico o artigo 231 da CF227, julgou serem constitucionais a Portaria e o Decreto atacados pelo autor, observadas certas condições mencionadas no acórdão228. Com isso, afirmou ainda que

a caracterização da área como terra indígena, para os fins dos arts. 20, XI, e 231, da Constituição torna insubsistentes eventuais pretensões possessórias ou dominiais de particulares, salvo no tocante à indenização por benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé (CF/88, art. 231, § 6º) (STF, 2009a, www.stf.jus.br).

Quem citou jurisprudência da Corte IDH no aludido acórdão foi o Ministro Menezes Direito, em seu voto-vista. Ele mencionou o Caso de la Comunidad Mayagna (Sumo) Awas Tingni Vs. Nicaragua229, que “se refiere a la responsabilidad internacional del Estado por la falta de delimitación del territorio de la comunidad Mayagna Awas Tigni, así como a la ineficacia de los recursos interpuestos230” (Corte IDH, 2009a, www.corteidh.or.cr).

Segundo o Ministro, a condenação de Nicaragua por violação do direito de propriedade dos indígenas sobre suas terras, assim como pela violação de seu bem-estar e integridade cultural

revela que a comunidade internacional não medirá esforços para tentar aplicar aos Estados-Membros suas posições quanto a esses direitos. Pouco importa que no caso brasileiro a propriedade das terras indígenas seja da União (art. 21, XI, CR/88). E assim é porque, segundo a decisão, o art. 21 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Direito à Propriedade Privada, que garante a "toda pessoa o uso e gozo de seus bens"), que pode ser subordinado pela lei ao interesse social, deve ser interpretado como abrangente dos direitos dos índios às suas terras, na forma de sua ocupação tradicional e seu enfoque coletivo (STF, 2009a, www.stf.jus.br).

Trata-se do único ponto em que a jurisprudência da Corte IDH é invocada no acórdão. Ela funciona como reforço argumentativo dentro da decisão, que tem como principal fundamento o já citado artigo 231 da Constituição Federal. Não se vê aqui, ainda, o exercício do controle de convencionalidade com base na jurisprudência da

227 Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens (BRASIL, 1988, www.planalto.gov.br).

228 Dentre essas condições consta, por exemplo, que “o usufruto dos índios não lhes confere o direito exclusivo de explorar recursos minerais nas terras indígenas” (STF, 2008, www.stf.jus.br).

229 Corte IDH. Caso de la Comunidad Mayagna (Sumo) Awas Tingni Vs. Nicaragua. Supervisión de Cumplimiento de Sentencia. Resolución de la Corte Interamericana de Derechos Humanos de 3 de abril de 2009.

230 Tradução livre: “se refere à responsabilidade internacional do Estado pela falta de delimitação do território da comunidade Mayagna Awas Tigni, assim como à ineficácia dos recursos interpostos”.

Corte IDH. Entretanto, pode-se dizer que a decisão do STF constitui decisão conforme o corpus iuris interamericano.

Nesse sentido, o posicionamento da Corte Interamericana a respeito da matéria em apreço pode ser exemplificado pela decisão de mérito do próprio caso citado pelo Ministro Menezes Direito em seu voto. Veja-se que, após considerar o interesse social que acompanha o direito de propriedade insculpido no artigo 21231 da CADH, a Corte IDH, lançando mão da interpretação evolutiva e tendo em conta o artigo 29.b da Convenção, que impede seja feita uma interpretação restritiva dos direitos humanos, considerou que aquele dispositivo convencional “protege o direito à propriedade num sentido que compreende, entre outros, os direitos dos membros das comunidades indígenas no contexto da propriedade comunal232” (Corte IDH, 2009a, www.corteidh.or.cr). Com esse fundamento, a Corte Regional determinou ao Estado de Nicarágua, inter alia, que procedesse à demarcação das terras indígenas da comunidade Awas Tingni, de modo a garantir-lhes o gozo de seus direitos. Desse modo, fica demonstrado que a decisão da Petição 3.388/RR constitui modalidade de interpretação receptiva da jurisprudência da Corte IDH nesse segundo e ainda tímido diálogo jurisprudencial.

O terceiro caso decidido pelo STF em que consta citação de jurisprudência da Corte IDH é o acórdão da ADPF 130/DF, julgada em 30 de abril de 2009. Tratou-se de um julgamento relevante na história recente do país, em que Tratou-se discutiu a compatibilidade da lei de imprensa (Lei nº 5250/67), forjada no contexto do regime militar, com a CF/88.

Dentre as afrontas constitucionais da Lei nº 5250/67, que levaram a maioria votante do STF a julgá-la incompatível com a Constituição, estão a possibilidade de

231 Artigo 21 - Direito à propriedade privada

1. Toda pessoa tem direito ao uso e gozo de seus bens. A lei pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social. 2. Nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei. 3. Tanto a usura, como qualquer outra forma de exploração do homem pelo homem, devem ser reprimidas pela lei (OEA, 1969, www.cidh.oas.org).

232 Em bonita e interessante explicação acerca da propriedade comunal indígena, a Corte IDH, na decisão em apreço expõe que “entre os indígenas existe uma tradição comunitária sobre uma forma comunal da propriedade coletiva da terra, no sentido de que o pertencimento desta não se centra em um indivíduo, mas no grupo e sua comunidade. Os indígenas pelo fato de sua própria existência têm direito a viver livremente em seus próprios territórios; a relação próxima que os indígenas mantêm com a terra deve de ser reconhecida e compreendida como a base fundamental de suas culturas, sua vida espiritual, sua integridade e sua sobrevivência econômica. Para as comunidades indígenas a relação com a terra não é meramente uma questão de posse e produção, mas sim um elemento material e espiritual do qual devem gozar plenamente, inclusive para preservar seu legado cultural e transmiti-lo às futuras gerações” (Corte IDH, 2009a, www.corteidh.or.cr).

censura prevista nos parágrafos do artigo 1º da lei233, bem como o estabelecimento de penas mais rigorosas, quando comparadas às equivalentes no Código Penal, nos crimes de injúria e difamação praticados através dos meios de comunicação.

Um aspecto que gerou bastante discussão foi o capítulo da lei dedicado ao direito de resposta. Foi esse o principal ponto de divergência entre os ministros.

Gilmar Mendes foi um que votou pela parcial procedência da ADPF com o fim de manter este capítulo e assegurar o direito de as pessoas físicas e jurídicas poderem responder ou retificar informações acusatórias, ofensivas ou inverídicas sobre si.

É preciso reconhecer que, de fato, existem muitas partes da lei que não são incompatíveis com a Constituição, mas a parte que trata do direito de resposta, uma vez garantida como direito fundamental no artigo 5º, V234, da CF, com aplicabilidade imediata, pode-se dizer que é, ao menos, dispensável. Além disso, o direito de resposta também se encontra expressamente positivado, de forma até um pouco mais detalhada, no artigo 14 da CADH235.

E foi nesse sentido, de ser despicienda a regulação do direito de resposta pela lei de imprensa, o entendimento do Ministro Celso de Mello, em cujo voto consta menção à jurisprudência da Corte IDH. Para tratar da questão do direito de resposta, o Ministro valeu-se novamente da doutrina de Gomes e Mazzuolli e, assim, a primeira menção à Corte IDH feita pelo Ministro é indireta. Veja-se abaixo o trecho doutrinário colacionado pelo Ministro (GOMES, MAZZUOLLI, 2008 apud STF, 2009b, www.stf.jus.br):

a Convenção não se refere à “proporcionalidade” da resposta relativamente à ofensa, não indicando se as pessoas atingidas têm direito de responder

233 Art. 1º [...]

§ 1º Não será tolerada a propaganda de guerra, de processos de subversão da ordem política e social ou de preconceitos de raça ou classe.

§ 2º O disposto neste artigo não se aplica a espetáculos e diversões públicas, que ficarão sujeitos à censura, na forma da lei, nem na vigência do estado de sítio, quando o Govêrno poderá exercer a censura sôbre os jornais ou periódicos e emprêsas de radiodifusão e agências noticiosas nas matérias atinentes aos motivos que o determinaram, como também em relação aos executores daquela medida (BRASIL, 1967, www.planalto.gov.br).

234 Art. 5º [...]

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

235 Artigo 14 - Direito de retificação ou resposta

1. Toda pessoa, atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios

1. Toda pessoa, atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios