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3.3 Métodos de análise

3.3.1 Análise do conteúdo e do discurso

Terminadas as entrevistas e o processo de transcrição e revisão, elas foram analisadas segundo os métodos de análise do conteúdo e do discurso.

Para a análise do conteúdo, optou-se por uma abordagem interpretativa (BERG, 2004), na qual as informações obtidas em cada entrevista foram organizadas por temas e buscou-se descobrir padrões de atividades e significados no comportamento das entrevistadas de cada nacionalidade. Portanto, o primeiro passo foi estabelecer categorias analíticas de acordo com os objetivos do estudo segundo as quais as informações de cada entrevista seriam divididas (BERG, 2004). Como já havia sido previsto no roteiro das entrevistas, as categorias estabelecidas foram: (1) Comportamento de consumo de luxo; (2) Consumo consciente; e (3) Luxo e sustentabilidade, assim como subcategorias relacionadas a cada tema.

Posteriormente, as entrevistas foram lidas uma a uma, divididas em blocos de texto, e as informações de cada uma foram sistematizadas segundo as categorias e subcategorias analíticas em uma planilha em Excel®. É importante destacar que, mesmo organizadas, as informações foram consideradas segundo a locução literal das participantes, mantendo-se, assim, as escolhas de palavras e a forma do discurso original. Com as informações categorizadas de forma objetiva, a análise do conteúdo se deu com a contagem da recorrência de determinadas respostas e a busca por possíveis padrões para cada nacionalidade. O quadro 5 ilustra parte de uma das planilhas de análise.

Categoria analítica: Comportamento de consumo de luxo

Sub. Conteúdo Cód. § Comen-tários

Co n ce it o de luxo

Penso em status, poder, em reconhecimento, em sofisticação. P1 1

Luxo será algo que, não é necessário, portanto não é uma necessidade básica, não é? Não necessariamente um valor elevado, mas na maioria dos casos é.

P2 5

Para mim, luxo será ter coisas de valor elevado que gosto. Como, por exemplo, eu gosto muito de relógios. Adoro relógios. Acho-os bonitos, é um acessório que não sou capaz de sair de casa sem ele. E talvez, há alguns que gosto imenso e não os compro pelo valor, por que acho que é desnecessário, não é? E outros que se tiver que poupar para isso, também o faço.

P2 7

O luxo é, são matérias caras, de qualidade, que provavelmente vão durar por 20 anos e que sei lá, eu prefiro comprar uma peça que dure 20 anos clássica, do que comprar, sei lá, 100 e que provavelmente não vai estar na moda pra o ano porque quem marca as tendências são os grandes costureiros.

P3 5

O luxo é... Pra mim o luxo é ter tempo livre, isso que é luxo. Não é um luxo em termos de roupa, e de hotéis, é ter tempo.

P4 2 Quadro 5 – Parte da planilha de análise de conteúdo

Fonte: elaboração própria.

Onde: “sub.” refere-se à subcategoria de análise, “cód.” ao código da entrevistada e “§” ao parágrafo da transcrição da entrevista ao qual se refere.

Enquanto essa primeira fase se limitou ao conteúdo manifesto, objetivo e sistematizado, a análise do discurso feita em seguida foi buscar o conteúdo latente de cada entrevista, os diferentes significados atribuídos ao discurso, por meio de uma leitura interpretativa do simbolismo por trás das informações objetivas (BERG, 2004; PHILLIPS; HARDY, 2002). A escolha por esse método reflete a posição

filosófica do construcionismo social do estudo (ERIKSSON; KOVALAINEN, 2008). A análise do discurso exige do pesquisador uma sensibilidade contextual e interpretativa (PHILLIPS; HARDY, 2002) para analisar o que é trazido pelas entrevistas para além do conteúdo objetivo. Por meio da análise do discurso, foi possível identificar contradições, associações entre temas promovidas pelos próprios entrevistados, escolhas lexicais particulares, usos de recursos de linguagem e detalhes como silêncios, hesitações e ênfases (D’ANGELO, 2004), os quais não foram revelados na análise do conteúdo.

Como um dos intuitos do estudo é explorar a preocupação com a sustentabilidade dos indivíduos, a análise do discurso foi especialmente importante para que fossem identificados possíveis vieses de respostas socialmente desejáveis (Social

Desirability Response Bias – SDRB) nos relatos das entrevistadas. Em pesquisas onde os participantes devem reportar suas próprias condutas éticas, é comum que eles ressaltem atividades consideradas socialmente ou culturalmente desejáveis e omitam ou amenizem atividades tidas como indesejáveis, gerando vieses que podem questionar a validade da pesquisa (BERNARDI, 2006). Para tentar minimizar esses vieses, durante as entrevistas algumas perguntas relacionadas ao consumo consciente foram feitas tanto em primeira como em terceira pessoa, como proposto por Armacost et al.32 (1991 apud BERNARDI, 2006), e de forma a reduzir a

seriedade do comportamento de consumo sustentável (SUDMAN; BRADBURN33,

1982 apud GENDALL; HOEK, 1992). No momento da análise do discurso, as incoerências entre as respostas em primeira e em terceira pessoa, e as variações na ênfase dada a atitudes e comportamentos avaliados como positivos ou negativos foram observadas cuidadosamente para que os vieses fossem detectados e analisados separadamente.

Nessa segunda fase da análise, realizada logo após a finalização das planilhas de análise de conteúdo, as entrevistas foram relidas e anotações foram feitas ao longo delas, principalmente para marcar fragmentos contraditórios, vieses de respostas socialmente desejáveis e ligações espontâneas entre os assuntos feitas pelas

32 ARMACOST, R. L.; HOSSEIN, J. C.; MORRIS, S. A.; REHBEIN, K. A. An empirical comparison of

direct questioning, scenario, and randomized response methods for obtaining sensitive business information. Decision Sciences Journal, v. 22, p. 1073–1090, 1991.

entrevistadas. A sistematização realizada na fase anterior foi confirmada e ajustada ao contexto das declarações (D’ANGELO, 2004) e, logo depois, as principais descobertas foram resumidas segundo cada categoria, mantendo separados os resultados de brasileiras e portuguesas. Ao final, foi possível ter um panorama do comportamento de consumo de luxo e consumo consciente de brasileiras e portuguesas. Entretanto, para a análise comparativa dos resultados de ambos os grupos é preciso considerar a perspectiva cultural.