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SUMÁRIO

CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS 147 ANEXO A ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA FAMÍLIA DE CATADORES DE

2 REVISÃO DE LITERATURA

3.6 Análise dos dados

A análise dos dados ocorreu com o intuito de compreender a linguagem utilizada pelas crianças, filhas de famílias de catadores de materiais recicláveis, buscando maneiras de significar essa linguagem por meio da Análise de Discurso (AD) francesa sistematizada por Michel Pêcheaux (Orlandi, 2005) que, neste estudo, será denominada AD pechetiana. Essa opção se deu pela possibilidade de compreender a linguagem com um sentido, buscando “extrair sentidos dos textos” (ORLANDI, 2005, p.30).

A análise de discurso objetiva compreender de que maneira “um objeto simbólico produz sentidos, como ele está investido de significância para e por sujeitos” (ORLANDI, 2007, p.26). Para Orlandi (2001, p.15) discurso é “a palavra em movimento, prática de linguagem; com o estudo do discurso observa-se o homem falando”. No caso em questão “a criança falando” para o pesquisador por meio da brincadeira, que será, posteriormente, transformado em texto- corpus, desse estudo.

Desta forma, AD concebe a linguagem como mediação necessária entre a criança e a realidade natural e social. Segundo Orlandi (2005, p.15) a mediação, “que é o discurso, torna possível tanto a permanência e a continuidade quanto o deslocamento e a transformação do homem”. Neste estudo, consideramos o caso da criança e da realidade em que ela vive junto à família de catadores de materiais recicláveis.

A AD trabalha com o sentido e não com o conteúdo dos textos, um sentido que não é traduzido, mas produzido pela seguinte formulação: ideologia + história + linguagem. A

ideologia é entendida como o posicionamento do sujeito quando se filia a um discurso, sendo o processo de constituição do imaginário que está no inconsciente, ou seja, o sistema de ideias que constitui a representação; a história representa o conteúdo sócio-histórico e a linguagem é a materialidade do texto, gerando “pistas” do sentido que o sujeito pretende dar (CAREGNATO, MUTTI, 2006).

Em suma, a AD visa a compreensão de como um objeto simbólico produz sentidos, como ele está investido de significância para e por sujeitos. Essa compreensão, por sua vez, implica em explicar como o texto organiza os gestos de interpretação que relacionam sujeitos e sentidos, além de seus efeitos que são múltiplos e variados (BRASIL, 2011).

A seguir, destacam-se três etapas do processo de realização da Análise do Discurso e suas correlações (ORLANDI, 2007):

1ª etapa – Passagem da superfície linguística para o objeto discursivo; 2ª etapa – Passagem do objeto discursivo para o processo discursivo; 3ª etapa – Constituição dos processos discursivos

Nesta primeira etapa, a transcrição ocorreu a partir da enunciação no contexto discursivo e o uso de recursos linguísticos pelos sujeitos, conforme lista de símbolos específica abaixo:

/: pausa reflexiva curta //: pausa reflexiva longa

///: pausa reflexiva muito longa ...: pensamento incompleto

#: interrupção da enunciação de um sujeito por outro sujeito ##: interrupção da enunciação por outros dois sujeitos (...): recorte de um trecho ou da enunciação

[texto]: Comentários do pesquisador esclarecendo o contexto da enunciação, como movimentação do sujeito, a quem ou a que se referem.

“texto”: As aspas duplas indicam a fala ou texto de alguém citado dentro da enunciação de outra pessoa.

(-): Interrupção da fala do pesquisador

(INAUDÍVEL): A fala não pode ser transcrita, por ser inaudível ou por vários sujeitos falarem ao mesmo tempo.

O material linguístico é constituído, principalmente, de elementos e microssistemas lexicais, que organiza a expressão da subjetividade linguística (SAFARTI, 2010).

Nessa segunda etapa, entendida como busca da passagem do objeto discursivo para o processo discursivo, foram investigados e analisados os seguintes dispositivos analíticos:

metáfora, polissemia e paráfrase. A identificação cromática destes dispositivos possibilitou compreender os sentidos das palavras e dos enunciados, imprescindíveis ao processo de desvendamento de uma discursividade (GOMES, 2006). Os dispositivos identificados foram: o interdiscurso, a paráfrase, a polissemia, a metáfora, o dito e não dito.

Nesta segunda etapa, como recurso facilitador da análise, é utilizado quadros analíticos para a organização do corpus, bem como para identificação dos temas geradores. É utilizado em cada quadro analítico uma codificação cromática para salientar a presença das ferramentas analíticas do texto, conforme legenda criada em cada quadro específico para a pesquisa.

Esses quadros são construídos em cinco momentos, a saber: quadro analítico I, no qual as situações existenciais foram transportadas após seu recorte do corpus. Essas situações existenciais são identificadas como aquelas em que os sentidos das vivências dos sujeitos são relacionados com o objeto de estudo em que emergem.

No quadro analítico II, o analista/pesquisador faz perguntas ao texto (sobre as situações existenciais), com o intuito de identificar respostas para elas no próprio texto. A finalidade dessa etapa é extrair do texto os sentidos que possibilitem ao pesquisador responder a sua questão de pesquisa.

No quadro analítico III, emprega-se os dispositivos analíticos da AD ao corpus e elabora-se comentários analíticos a partir dos sentidos que emergiram dos textos. Nesse momento, o pesquisador dá os primeiros passos em direção aos possíveis temas geradores do estudo por meio dos dispositivos analíticos empregados. Os resultados, então, tomam forma e os primeiros temas geradores são identificados.

No quadro analítico IV, realiza-se a identificação dos temas geradores e sua relação com os resultados, bem como a recodificação temática dos resultados. Esse quadro possibilita a organização visual para a produção do quadro seguinte. Por fim, um último quadro é elaborado – o quadro síntese. Nesse, são apresentados de forma sistematizada os temas geradores e os comentários analíticos, configurando assim as categorias de análise do estudo.

A partir da identificação desses dispositivos analíticos buscou-se construir tanto aquilo que a análise do discurso chama de formações discursivas como também a dimensão do não- dito. Esta construção faz parte da terceira etapa da Análise do Discurso, que se constitui com a análise dos processos discursivos definidos como um conjunto de enunciados na medida em que se apoiam em uma mesma formação discursiva (ORLANDI 2005).

A Análise do Discurso pechetiana indica um caminho importante para a análise de objetos de pesquisa na enfermagem, principalmente em relação à subjetividade e a realidade destas crianças investigadas. Ao final, sintetizaram-se todas as temáticas que emergiram dos

discursos, em um quadro analítico, sendo codificados os temas, os subtemas e suas respectivas categorias, apresentado a seguir:

Quadro 1- Síntese da análise discursiva das entrevistas mediadas pela técnica do brinquedo - 2016. RODRIGUES, Santa Maria/RS.

Categorias Subtemas

A configuração da rede de apoio das famílias de catadores de materiais

recicláveis

Rede social Rede familiar Rede institucional

Vivências cotidianas de crianças, filhas de catadores de materiais

recicláveis

A importância da reciclagem para o meio ambiente na visão da criança: aprendendo com o contexto

A (im)possibilidade do brincar no contexto da reciclagem: transformando o

espaço/tempo da brincadeira

Fonte: própria autora (2016).