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As razões por que as pessoas cumprem normas jurídicas ou formulam acordos e contratos vinculantes não é descoberta da AED. Esta é uma questão intrínseca à própria Ciência do Direito.

Basta que se faça menção a Kelsen quando aborda as razões por que os homens cumprem regras jurídicas ou por que o Direito ordena suas condutas. Para Kelsen19·, que define o Direito como uma “ordem coativa”, a obediência decorre do

receio da sanção imputável ou, nos casos de sanções premiais, para se beneficiar das conseqüências nelas previstas.

Percebe-se, de plano, que a noção de interesse no cumprimento da norma encontra ressonância desde o trabalho do maior jurista ocidental. Nessa perspectiva, a lógica sobre a estratégia formulada pelo sujeito em cumprir ou não a norma, passa por uma ação de avaliar se o risco da sanção é ou não compensatória quando cotejado com o eventual benefício decorrente da ação ou omissão não compatível com o comando normativo.

É dessa lógica que toma como ponto de partida o interesse do agente, que a AED busca compreender o universo jurídico, tendo como pressuposto o

19 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. J. B Machado. 6ª ed. São Paulo: Editora Martins

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ângulo de visão da economia ou do racionalismo econômico20. Uma das primeiras

abordagens, no Brasil, sobre o desenvolvimento desse movimento teórico assume que a interpretação dele decorrente pode ser explicada como a aplicação do

raciocínio econômico à problemática jurídica21.

Outros teóricos conceituaram a AED e os seus pressupostos teóricos, dos quais se colacionamos dois, como segue

a análise econômica do direito não constitui uma análise do tipo normativa, mas sim um método para analisar aquelas condutas humanas que se encontrem relacionadas, de algum modo, com o direito22

Generalizando, podemos dizer que a economia oferece um teoria do comportamento para prever como responderão os indivíduos ante as disposições legais23

A AED pugna pela interdisciplinaridade como forma de explicar as razões por que as normas jurídicas são obedecidas pelos sujeitos guiados por interesses e como essas normas podem ser mais eficientes, ressaltando a influência recíproca entre economia e direito. Nesse diapasão é que a AED pode se constituir numa teoria positiva do Direito ou teoria normativa do Direito. ALVAREZ (2006) descrevendo essa distinção assim pontua

Da mesma forma que a economia, o estudo do direito desde a perspectiva econômica admite o enfoque descritivo ou explicativo e normativo. Noutros termos, pode utilizar-se a análise econômica para explicar o que foi o direito (Posner) e para explicar o que deve ser (Calabresi), vale dizer, como a sociedade pode controlar de forma ótima o nível dos acidentes adotando normas institucionais baseadas em critérios econômicos. A este respeito afirma POSNER que “a distinção entre positivo e normativo, entre explicar o mundo como é e tratar de transformá-lo para torná-lo melhor, é básica para entender a AED”.(...) O enfoque descritivo, teoria positiva, corresponde à corrente maioritária e traduz a economia positiva da escola de Chicago cuja metodologia é refletida na teoria de Posner. A teoria de Posner desdobra-se em duas direções: a primeira, a teoria econômica do impacto legal, onde se analisam os efeitos das normas desde o ponto de vista econômico, aplicando a teoria econômica e econometria para especificar e quantificar os efeitos das

20 O racionalismo econômico aborda a figura do homo economicus, como o indivíduo “cujas ações

sempre racionais derivam exclusivamente de seus interesses econômicos dentro da sociedade” in PINHO, Diva Benevides; VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandolval de. Manual de Economia. 4ª. Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 5.

21 FARIA, Guiomar T. Estrella Faria. Interpretação Econômica do Direito. Porto Alegre: Editora

Livraria do Advogado, 1994, p. 14.

22 DIAZ, José Ramón Cossio. Derecho y Análisis Econômico. México: Edição conjunta do Instituto

Tecnológico Autónomo do México e Fondo de Cultura Econômica, 2002, p. 228

23 COOTER, Robert y ULEN, Thomas. Derecho y Economía. Tradução Eduardo L. Suárez. 1ª

normas: efeitos das normas, custos que acarreta e efeitos produzidos no mercado. Como resultado, introduz-se no processo de tomada de decisões um enfoque conseqüêncialista. Todavia, o aspecto inovador do movimento não se reduz a este aspecto. A novidade da AED é dar uma fundamentação econômica à teoria do direito e, neste sentido, mais que se centrar nos efeitos das normas, terá que se centrar na eficiência e, portanto no princípio da maximização.24

A corrente teórica da AED tem pouco a pouco adquirido importância no Brasil, mesmo porque, em face das grandes transformações institucionais e legais por que passou o país e dada à dinamicidade e complexidade do sistema econômico, a interdisciplinaridade entre economia e direito ganha relevância. Em livro-texto básico sobre economia e direito PINHEIRO E SADDI (2005) sintetiza a importância dessa interdisciplinaridade:

O movimento Direito & Economia vem a ser uma corrente acadêmica de juristas e economistas que procura analisar o fenômeno jurídico sob uma óptica comum, baseada em princípios econômicos. Essa linha de pensamento concebida originalmente como uma vertente das escolas mais liberais, foi logo abarcada pelas faculdades de Direito. Seus enunciados olham o direito como um sistema que aloca incentivos e responsabilidade dentro do sistema econômico e que pode, e deve, ser analisado à luz de critérios econômicos como o da eficiência.25

A nota predominante dessa escola é a inserção do fator econômico na interpretação do Direito para explicar o modo de se alcançar a eficiência social. De sorte que a interpretação da AED tem como referencial demonstrar o modo como normas podem ou não produzir o valor eficiência social mais do que tomar como referencial metodológico o valor justiça.

Este tem sido o ponto de controvérsia entre os seguidores da AED e os juristas refratários aos seus fundamentos.

As críticas seguem na direção de que o comportamento dos indivíduos não pode ser explicado unicamente a partir da motivação econômica, assim como a eficiência não é o valor prioritário da sociedade a ser esculpido em normas jurídicas.

24 ALVAREZ,Alejandro Bugallo. Análise Econômica do Direito: contribuições e Desmistificações

in Revista Direito, Estado e Sociedade. Rio de Janeiro,PUC/RIO, ANO XIV,v.9,nº 29, p.49-68, jul/dez 2006.

25 PINHEIRO, Armando Castelar; SADDI, Jairo. Direito, Economia e Mercados. Rio de Janeiro: Elsevier,2005,p.83-84.

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Entretanto, como afirma SZTAJN (2005), abstraindo os reducionismos incidentes sobre o debate eficiência e justiça, as confrontações entre partidários do Direito ou da Economia parecem mais centradas em diferenças metodológicas do que na

incompatibilidade material dos diálogos26

De resto, é preciso ter presente que eficiência e justiça não são valores que precisam ser postos em posições antagônicas, como se na presença de um o outro não se manifeste.

Ao reverso, são valores que têm relação de proximidade. Deve-se sopesar, no entanto, em havendo manifesto conflito, que a eficiência não pode aniquilar o conceito do justo ou vice-versa, a depender do caso concreto.

Não sem razão, a Constituição Federal no seu art.3º privilegia ambos os valores ao estipular que são objetivos fundamentais tanto a construção de uma sociedade livre, justa e solidária quanto a garantia do desenvolvimento nacional e erradicação da pobreza, da marginalização e redução das desigualdades sociais e regionais.

Nos limites deste trabalho interessa a abordagem da AED identificada com o enfoque de teoria positiva, posto se preocupar com os reflexos econômicos e os incentivos oferecidos para a formalização do futuro contrato, assim como os riscos intrínsecos por que passam todas as negociações contratuais. Do mesmo modo, descreve as estratégias de revelação de informação pelo TCU para mitigação de riscos e na execução desses contratos.

Ao cumprir esse mister como órgão controlador, o TCU, com fundamento na Constituição Federal, busca contribuir para dar sentido concreto ao princípio da eficiência contido no art.37 da Carta Magna que, se materializado, irradiará sobre a execução do dispêndio do orçamento público e contribuirá para a concretização do valor justiça, com a garantia da preservação do interesse público na execução dos contratos de outorga de concessões.