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CAPÍTULO III – APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS

1. Análise interpretativa do Projeto Educativo

A análise interpretativa realizada a partir do corpus da informação presente no PE, entendido como o documento que espelha a identidade de cada instituição escolar e as linhas mestras pelas quais se rege (Ricardo, Costa, Pinto e Braga, 2000), possibilitou-nos patentear um conjunto de aspetos, que nos permitem compreender a importância atribuída à criatividade pela comunidade educativa.

No que concerne à primeira categoria “Identificação”, é possível constatar que o “Título/Nome” atribuído ao PE se designa “Nós e o Mundo” (p. 2), o que permite subentender a existência de uma intenção centrada em questões curriculares associadas ao conhecimento e exploração do mundo e, ainda, na integração da criança num mundo que se encontra em permanente mudança e que desafia o ser humano à tomada de atitudes e de decisões adequadas a cada situação.

Quanto à análise da “Justificação do PE”, depreendemos que a conceção de criança defendida pelas autoras é a de um ser competente e capaz de assumir um papel ativo na estruturação do seu próprio conhecimento e aprendizagem, com identidade própria e que, por isso, as ações pedagógicas deverão ser pensadas de acordo com a sua realidade, a sua cultura, as suas necessidades e interesses. Ir ao encontro e satisfazer os interesses e necessidades das crianças, valorizar a sua curiosidade e desejo de saber, assim como a sua atitude de questionamento, evidenciam-se diretrizes que determinam a filosofia da instituição e que fornecem a base da aprendizagem. Tal questão é clarificada no PE, nas seguintes passagens: “visa uma melhor integração da criança no mundo partindo da curiosidade natural da criança e do seu desejo de saber e compreender o mundo que a rodeia” (p. 2) e “o ponto de partida do projeto terá que surgir sempre dos interesses e necessidades das crianças, assim como das suas interrogações e questões” (p. 19).

Foi possível identificar na subcategoria “O papel do educador” uma ideia-chave - a intencionalidade educativa. Mesmo sendo o tema do nosso estudo em torno da criatividade, seria erróneo pensar que o educador não deverá assumir igualmente o papel de observador da criança e de orientador da ação educativa. Neste sentido, deparamo-nos com o facto de uma das diretrizes definidas pela própria instituição realçar uma ação marcada pela intencionalidade educativa, que provoque na criança o gosto de aprender e de criar as suas próprias ideias sobre o mundo, o que vai ao encontro da opinião de Roldão (2005, p. 4) quando refere que “o conhecimento implica capacidade e possibilidade de uso”, o que

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envolve, mas não necessariamente, a capacidade criativa. Esta nossa interpretação emerge do seguinte excerto presente no PE:

O educador deve dar a conhecer à criança o mundo em que vive, enriquecendo, reforçando os seus conhecimentos e descobertas, permitindo assim novas perspectivas de ação (p. 22).

O papel das crianças surge associado à perspetiva sócio construtivista, o que significa que são encaradas como sujeito ativos do processo educativo. É valorizada a sua capacidade para construir o seu próprio conhecimento e assumirem um papel ativo quando confrontadas com problemas causadores de conflito cognitivo. Neste sentido, as autoras do documento socorrem-se de um poema da autoria de Isabel Minhós Martins:

Quando eu nasci não sabia quase nada. Agora, pelo menos, uma coisa já aprendi. Ainda há um mundo inteiro por conhecer, milhões e milhões de coisas e lugares onde as minhas mãos nunca chegaram. Milhões e milhões de respostas escondidas, milhões e milhões de cores que eu nunca vi. E de cheiros e de sons e de sabores.

Mas há uma coisa também certa.

Todos os dias descubro sempre mais um bocadinho. E isso é a coisa mais fantástica que há!

Outro dos aspetos tido em consideração pela comunidade educativa prende-se com a “Organização e gestão do ambiente educativo”. De facto, este aspeto é algo que influencia as aprendizagens e desenvolvimento das crianças, bem como determina a emergência de contextos inibidores ou facilitadores da criatividade. Ao analisarmos o conteúdo presente nesta categoria, destacam-se informações relacionadas com a organização e gestão do espaço e dos materiais, não existindo qualquer referência acerca do grupo e do tempo.

Relativamente à subcategoria “Organização e gestão do espaço”, não existe qualquer fundamentação elucidativa das potencialidades do espaço educativo da instituição, apenas é afirmado que “todas as salas, bem como o refeitório têm acesso directo ao espaço exterior, que é bastante amplo (cerca de 120 m 2)” (p. 8), o que nos deixa sem qualquer tipo de informação sobre os estímulos por ele oferecidos e reconhecidos pelos profissionais. Por exemplo, tão ou mais importante que a dimensão do espaço exterior são as potencialidades e situações educativas que este oferece à criança para que se torne progressivamente mais autónoma, curiosa e com espírito crítico, construindo o seu conhecimento baseado no tipo de exploração por ele oferecido.

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Ao nível da organização e gestão dos materiais, determinante para uma aprendizagem ativa, é referida a existência de vários materiais de carácter lúdico e pedagógico em todas as salas de atividades, referindo-se, ainda, que a sua seleção teve por base os pressupostos expressos nas OCEPE, como forma de abarcar todas as áreas de conteúdo, pois são fundamentais para o desenvolvimento global da criança em idade pré-escolar. É referido que todos os materiais se encontram ao alcance das crianças para desenvolverem a sua autonomia, mas, além disso, é visível uma preocupação com o facto de, sempre que desejarem, poderem utilizá-los livremente, o que promove a sua criatividade através da descoberta das suas diferentes potencialidades e interação entre os pares e o adulto.

Parece existir uma preocupação com o estímulo da criatividade da criança na escolha dos materiais, sendo a polivalência um critério a ponderar, assim como a sua mobilidade, o que oferece um leque de possibilidades mais vasto, podendo o educador diversificar as situações de aprendizagem e ir ao encontro dos seus interesses. Centremo-nos, pois, nos seguintes excertos do PE, que confirmam a nossa interpretação:

O material é constituído por vários elementos que apresentam uma boa mobilidade e polivalência, permitindo dar resposta às alterações na organização dos vários espaços que vão surgindo ao longo do ano letivo (p. 10).

Em relação ao material, este respeita os objectivos previstos na Legislação (p. 111), que são: favorecer a fantasia e o jogo simbólico; favorecer a criatividade; estimular o exercício físico; estimular o desenvolvimento cognitivo (p. 10).

As “Finalidades educativas” delineadas pela comunidade educativa referem a metodologia de trabalho de projeto como o cerne de toda a aprendizagem e desenvolvimento, entendida como respeitadora dos interesses da criança e propícia a uma aprendizagem significativa. Tal como expressa uma passagem do PE, “este método ambiciona, dar sentido às aprendizagens das crianças” (p. 19). No entanto, permite ainda ao educador acompanhar e apoiar as descobertas da criança, tornando-se seu companheiro de aprendizagem e aventuras, pois “pressupõe um plano construído pelas crianças com o educador, que coordena e apoia o trabalho desenvolvido” (p. 19). Depreende-se, assim, que existe uma identificação com a perspetiva de Dewey (2002), que é num processo de aprender fazendo que a criança, através da experiência, desenvolve os seus conhecimentos e, assim, se constrói a educação.

O trabalho desenvolvido na instituição revela uma aposta no “desenvolvimento da sensibilidade e imaginação criadoras” (p. 19), sendo este um dos “Objetivos gerais” enunciado no PE. Deste modo, entende-se que através da ação criadora, a criança organiza

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mentalmente as suas ideias e aprendizagens, o que a ajudará a expressar-se e a comunicar. É evidente, também, um respeito pela individualidade de cada criança, bem como uma aposta na sua livre expressão e valorização do seu desejo de compreender o porquê das coisas. Neste sentido, integram no PE os seguintes objetivos gerais pedagógicos definidos para a educação pré-escolar, enunciados na Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar:

e) desenvolver a expressão e a comunicação através de linguagens múltiplas como meios de relação, informação, de sensibilização estética e de compreensão do mundo; e f) despertar a curiosidade e o pensamento crítico (pp. 19-20).

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