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A maioria dos estudos realizados sobre a pegada hídrica do cultivo de microalgas são avaliados por unidades de energia fornecida pois o principal objetivo é a produção de biocombustíveis a partir destas. A contabilização da água doce que é consumida ao longo das etapas até à obtenção do produto final tem mostrado uma importância cada vez maior pois os biocombustíveis provenientes da biomassa seca, como o biodiesel, são a solução mais sustentável para a produção de energia no futuro. No entanto, a produção de biomassa exige elevados consumos de água. Sabendo que os recursos hídricos, principalmente a água doce, não são ilimitados, o seu uso tem de ser comedido para não colocar em risco as gerações futuras. Gerbens-Leenes et al. (2014) realizaram um estudo sobre a pegada hídrica azul e o uso dos solos para produzir biocombustíveis a partir de microalgas, em sete localizações diferentes: Livorno, Itália; Perth, Austrália; Roswell, Novo México, USA; Tamaranset, Argélia; Utrecht, Holanda; Carpentras, França e Hawaii, USA. Nas duas primeiras localizações utilizam “open ponds”, na terceira usa uma combinação entre “open pond” e FBR e nas restantes utilizam FBRs. Na Tabela 22 encontram-se as caraterísticas dos sistemas utilizados em cada localização para a produção de biomassa.

Tabela 22 - Caraterísticas de cada localização do estudo da literatura para a produção de biomassa.

Localização Tipo de sistema Tipo de água

Dias de cultivo

Volume

(m3) Área (m2) Produção biomassa

(ton/ano)

Novo

México Open pond Salgada 365 483,3 2150 7 300

Austrália Open pond Salgada 300 0,17 1,05 0,006

Hawaii Open pond/FBR Doce 365 75 601 2 300

Itália FBR Salgada 180 488,8 10 000 32 000

Holanda FBR Doce 365 392 10 000 115 000

França FBR Doce 365 410 10 000 155 000

Argélia FBR Doce 365 458,7 10 000 185 000

Das localizações que utilizam “open ponds” para o cultivo das microalgas, a Austrália apresenta a menor produção anual de biomassa, pelo que não poderá ser comparada com as restantes localizações por se tratem de escalas diferentes. O mesmo acontece com a Itália relativamente às localizações que recorrem a fotobioreatores.

Neste estudo, como em qualquer outro, é importante conhecer a fronteira do sistema. Segundo Gerbens-Leenes et al. (2014), a fronteira para todas as localizações inclui a avaliação da pegada

hídrica das estapas de cultivo, colheita e secagem. Os “inputs” de consumo de energia e materiais considerados foram os seguintes:

- “Inputs” de consumo de energia: construção de infraestruturas, circulação da água do processo e de CO2 através de bombas e todos os equipamentos utilizados nas etapas de colheita

e secagem;

- “Inputs” de consumo de materiais: nutrientes (CO2, azoto e fósforo), metanol e catalisador.

A unidade funcional utilizada neste estudo encontra-se em m3/GJ de biocombustível produzido,

sendo nestas unidades que apresentam os resultados da pegada hídrica.

Com o intuito de comparar os resultados apresentados neste artigo com os resultados da empresa A4F e para ter uma melhor noção do significado dos valores obtidos, converteu-se os resultados para a mesma unidade funcional, ou seja, para m3/kg de biomassa seca produzida.

De entre os biocombustíveis produzido, optou-se por analisar os resultados obtidos para a produção de biodiesel pois prevê-se que entre 2030 e 2035 todo o biodiesel produzido será obtido a partir de microalgas, merecendo então um maior destaque.

Para converter os resultados nas unidades pretendidas, é necessário saber a quantidade de biomassa anual produzida e a percentagem de teor em lípidos que esta contém para poder determinar a quantidade de lípidos produzida em cada localização. Admitindo que 1 L de óleo equivale a 1 L de biodiesel, através da densidade e capacidade calorífica deste biocombustível, é possível estimar a quantidade de energia produzida, em GJ, de biodiesel. Por último, sabendo a pegada hídrica da produção de biocombustíveis, em m3/GJ, e as frações de conversão para

produzir biodiesel, determina-se a pegada hídrica do biodiesel nas mesmas unidades. Multiplicando esta pegada pela energia produzida e dividindo pela biomassa produzida, obtém-se a pegada hídrica azul em m3/kg biomassa. Na Figura 10 encontram-se os resultados

Avaliação da pegada hídrica de um fotobioreator para produção de microalgas

Resultados e Discussão 44

Figura 10 - Pegada hídrica azul da produção de biomassa microalgal de cada localização, do estudo da literatura.

Os resultados destacados a azul correspondem às localizações que utilizam FBRs e a vermelho as localizações que utilizam “open ponds” para a produção de biomassa microalgal.

A partir da Figura 10 é possível retirar as seguintes conclusões:

- A pegada hídrica de fotobioreatores é significativamente menor que a pegada hídrica de “open ponds”, devido à elevada evaporação de água por parte dos “open ponds” que se encontram expostos para a atmosfera. Para compensar a água evaporada é necessário repor com mais frequência, o que provoca um maior consumo de água doce;

- Comparando os resultados obtidos entre a Holanda e a Argélia, em que ambas produzem biomassa recorrendo a um fotobioreator, verifica-se que a pegada hídrica é superior na Argélia. Um dos possíveis motivos para este facto poderá estar relacionado com a necessidade de regular a temperatura do meio de cultura com mais frequência, acabando por consumir mais energia elétrica e consequentemente água para produzir essa energia, uma vez que este país situa-se perto do deserto Saara, caraterístico por atingir temperaturas muito elevadas durante o dia e temperaturas muito baixas durante a noite. Deste modo, um dos fatores que influencia a pegada hídrica é a localização geográfica das instalações;

- A maior pegada hídrica da produção de biomassa pertence ao Hawaii. Comparando o FBR desta localização com as restantes, verifica-se que a concentração da biomassa, em ton/m3, é menor,

o que significa que a biomassa está mais diluída e por isso é necessário um maior consumo de energia durante as etapas de colheita e secagem pois têm de processar um maior volume de água. Comparando a pegada hídrica do “open pond” do Hawaii com a do Novo México, verifica-se que estas são próximas e igualmente elevadas, por se tratar de um sistema aberto.

0,00342 0,0137 0,0308 0,0530 0,0557 0,00000 0,01000 0,02000 0,03000 0,04000 0,05000 0,06000

Holanda França Argélia Novo México Hawaii

PH az ul (m 3/kg bio ma ss a)

Para ter um termo de comparação das pegadas hídricas da produção de biomassa microalgal a uma escala piloto, analisou-se a produção da empresa A4F com a produção na Autrália. Na Tabela 23 encontram-se as condições de operação de cada localização e na Tabela 24 encontram-se as respetivas produções e pegadas hídricas do processo de obtenção de biomassa.

Tabela 23 - Condições de operação do FBR da A4F e de um “open pond” na Austrália.

Localização Tipo de

sistema Tipo de água Dias de cultivo Volume FBR (m3) Área (m2)

Portugal

(A4F) FBR Doce 330 1,5 22,4

Austrália Open pond Salgada 300 0,17 1,05

Tabela 24 - Comparação da produção anual e pegada hídrica da produção de microalgas no FBR da A4F com um “open pond” na Austrália.

Localização Produção de biomassa

(ton/ano) Pegada hídrica (m3/kg biomassa)

Portugal (A4F) 0,074 35,05

Austrália 0,0060 6,17

Com base nos resultados obtidos na Tabela 24, verifica-se que a pegada hídrica do FBR da A4F é superior à pegada hídrica do “open pond” da Austrália. No entanto, esta diferença é pouco significativa quando se comparam as produções anuais. O FBR da empresa A4F consegue produzir 12 vezes mais de biomassa do que no caso estudado na Austrália.

5 Conclusões

Os resultados da análise do fotobioreator multitubular horizontal revelam que este produz uma pegada hídrica anual de 35,05 m3/kg biomassa seca em que a etapa de construção do

fotobioreator representa 61 % dessa pegada e a etapa de operação e cultivo das microalgas representa 39 %, sendo a preparação do meio de cultura para o cultivo das microalgas a etapa que consome uma maior quantidade de água doce.

Com o intuito de tornar o estudo mais completo, analisou-se o ciclo de vida das microalgas considerando todas as etapas envolvidas na produção de biomassa microalgal seca. Ou seja, avaliou-se a pegada hídrica das etapas de colheita e secagem, considerando apenas os consumos de energia elétrica dos equipamentos utilizados. Os resultados indicam que durante a etapa de cultivo há um maior consumo anual de energia que se deve, essencialmente, à bomba hidropressora usada para promover a circulação da cultura. Quanto aos restantes equipamentos, verifica-se que o “spray-dryer”, utilizado na etapa de secagem, consome uma maior quantidade de energia elétrica do que a centrífuga, usada na etapa de colheita, apesar deste último equipamento processar um volume de água maior anualmente. Por este motivo é que o processo de secagem só se torna economicamente viável quando se pretende obter produtos de alto valor energético.

Posteriormente à identificação do local onde a pegada hídrica do fotobioreator tem um maior impacto ambiental, realizou-se uma análise de sensibilidade, em diferentes aspetos, de modo a reduzir quantitativamente a pegada hídrica. Verificou-se que a etapa de construção do FBR apresenta uma maior pegada hídrica associada, pelo que a alteração dos materiais utilizados seria uma boa opção para reduzir a pegada. Contudo, uma vez que o FBR tem um tempo de vida útil de 20 anos, não seria possível diminuir a pegada num curto espaço de tempo e por isso a análise de sensibilidade focou-se essencialmente à etapa de operação e cultivo das microalgas.

O aspeto mais relevante da análise de sensibilidade foi a pesquisa de outras fontes de nutrientes que apresentassem um menor consumo de água para preparar o meio de cultura e com esta análise verificou-se que é possível obter uma redução de 51 % da pegada hídrica da etapa de operação e cultivo das microalgas com a alteração dos compostos usados. Outros aspetos analisados foram a variação da produção anual de biomassa seca e a influência da origem da energia elétrica necessária para operar os equipamentos das diferentes etapas de produção de biomassa microalgal.

Avaliação da pegada hídrica de um fotobioreator para produção de microalgas

Conclusões 48

Por último, analisou-se os resultados obtidos de um estudo da literatura que compara a pegada hídrica da produção de biocombustíveis de dois sistemas diferentes, “open ponds” e fotobioreatores fechados, e os resultados indicam que os sistemas fechados apresentam um menor consumo de água doce, como era expetável, devido à evaporação da água nos sistemas abertos que não se verifica nos fechados.

6 Avaliação do trabalho realizado

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